mercredi 29 juillet 2009

O PRÍNCIPE DO RANCHO

Jorge Pinheiro, O príncipe do rancho, São Paulo, Versus no 33, junho de 1979, pp. 28-32.

A política e a ficção se confundem. Certa vez, eu dizia para meu amigo Alejandro Arizcún Cela – um dirigente socialista espanhol – na cidade de Vigo, que a política é um aramo da ficção científica. Ele concordou. Afinal, se a primeira trabalha com hipóteses e procura dar respostas ao futuro imediato, a segunda trabalha com a especulação e pensa o futuro. E mais do que isso, ambas trabalham com a realidade, com a vida. Assim, o que às vezes parece distante, um sonho, pode ser a resposta metafórica para nossos problemas do hoje ou do amanhã. É exatamente por isso, que nesta análise da situação nacional e dos caminhos da reorganização partidária, “Ratos e Homens” de John Steinbeck se confunde com os planos de Figueiredo e a consciência de nosso proletariado. São por incrível que pareça um mesmo mundo. Afinal, na política sempre teremos um magro das mulas, aquele que procura “matar com o chicote uma mosca pousada na anca da mula da carroça sem tocar a pele do animal”.
“Há um sendeiro através dos salgueiros e dos sicômoros, um caminho batido pelos mesmos que descem das fazendas para vir nadar no poço e trilhado pelos vagabundos que, à noitinha, deixam fatigados a estrada real para vir acampar à beira d’água. Diante do ramo horizontal e baixo dum sicômoro gigante vê-se um monte de cinza feito por muitas fogueiras: o tronco está gasto e polido de tantas foram as pessoas que se sentaram nele.
O anoitecer dum dia cálido pôs em movimento a brisa por entre as folhas. A sombra subiu as colinas na direção dos topos. Os coelhos estavam sentados imóveis nas margens arenosas como pequenas esculturas de pedra cinzenta. E depois, das bandas da estrada estadual, veio o som de passos sobre as folhas secas de sicômoro. Os coelhos correram furtivos para seus esconderijos. Uma garça empertigada se ergueu pesadamente no ar e sobrevoou o rio, corrente abaixo. Por um momento a vida como que cessou naquele recanto...”

Recordemos um pouco a época de Geisel
De certa forma, por razões de método de análise, podemos dividir o período Geisel em três etapas.
A primeira fase vai de 15 de março a 15 de novembro de 1974. Nessa primeira etapa, o governo vivia o fim do milagre econômico e, embora apresentasse um projeto diferente ao de Médici, tinha de fato muitas semelhanças com o governo anterior.
De 15 de novembro de 1974 a maio de 1977 vivemos, realmente, uma segunda etapa do governo Geisel. Antes de mais nada, Geisel sofreu uma violenta derrota eleitoral em 1974, embora esta tenha se dado ao nível da superestrutura e da democracia formal. E foi, contraditoriamente, esta derrota que afirmou as características bonapartistas de Geisel, que começou a tentar uma tímida abertura. Tímida porque as pressões que sofria eram, fundamentalmente, superestruturais, ao nível do regime, já que o movimento de massas não tinha se lançado à luta. Assim, o bonapartismo de Geisel vai se delinear durante todo o período por esses elementos. Ele apresentava força, e de fato a tinha, embora sua base social não fosse muito ampla. Em última instância, sua força surgia do fato de que a oposição existia apenas com superestrutura, dentro do regime.
A terceira fase, que começa a partir das grandes mobilizações de maio de 1977, vai se consolidar com as greves operárias de maio de 1978, que golpeiam o governo, fazendo estremecer o bonapartismo. E aí se dá um fenômeno interessante: ele começa a receber mais apoio da burguesia. Há um voto de confiança burguês e anti-operário no governo que, contraditoriamente, aumenta sua base social, mas como resultado do confronte de forças na sociedade se torna mais fraco porque começa a enfrentar-se com setores do movimento de massas que se mobilizam. A partir da ofensiva das massas delineam-se dois projetos, o “realista” e o “desenvolvimentista”, que se enfrentarão mais claramente no governo Figueiredo..
É esta terceira fase de Geisel que nos dá a chave para entender Figueiredo. É exatamente neste último período de Geisel que a etapa deixa de ser contra-revolucionária e passa a não-revolucionária, já que como as mobilizações estudantis de 1977 e com as greves de 1978 surge uma nova correlação de forças ao nível social. Há uma clara medição de forças entre os proletariados e as camadas assalariada médias e a burguesia, sem grandes derrotas para as classes trabalhadoras, mas ao contrário, com vitórias ainda pequenas, mas que aumentam o ânimo de luta e vão conscientizando uma ampla vanguarda do movimento de massa.
Aqui há um problema de dialética que podemos tentar explicar através de um exemplo da física, que é o do paralelogramo de forças. Antes, na segunda fase do governo Geisel, as forças burguesas embora não estivessem aglutinadas ao redor do governo (desde os imperialismos até a Igreja), formavam um vetor muito maior do que as forças do movimento de massas (que não estava mobilizadas), o que dava uma direcionante favorável ao governo. A partir da terceira fase de Geisel aumenta o vetor das forças que apóiam o governo, mas aumenta o vetor do movimento de massas, que inclui setores mobilizados, como os do proletariado e das classes médias assalariadas, donde o direcionamento passa a ser maior.
Assim, podemos dizer em relação a Figueiredo – nesses primeiros 100 dias de governo – que ele tem maior apoio burguês e imperialista que Geisel, embora como dinâmica seja mais fraco. E mais: a etapa continua sendo não-revolucionária, mas diferente inclusive da terceira fase de Geisel, já que os dois vetores aumentam, mas com sentido inverso. Donde a dinâmica está determinada pelo movimento de massas, pela sua dinâmica.

...havia remédios, pequenos frascos
“A casa dos peões era um comprido edifício retangular. Por dentro as paredes estavam caiadas e o piso não tinha pintura. Em três dessas paredes havia pequenas janelas quadradas e na quarta uma sólida porta com trinco de madeira. Contra as paredes se alinhavam oito tarimbas, cinco delas feitas já com mantas, e as outras três com a serapilheira de riscado dos colchões à mostra. Por cima de cada tarimba estava pregada uma caixa de maçãs vazia com a abertura para a frente, de modo a formar duas estantes para guardar coisas de uso pessoal do ocupante da cama. Estas estantes se achavam cheias de pequenos artigos: sabão e pó de talco, navalhas e números dessas revistas do Oeste que os trabalhadores das fazendas costuma ler, com ar de pouco caso, mas nas quais acreditam secretamente. E havia também remédios, pequenos frascos e pentes; e nos pregos de ambos os lados estavam penduradas algumas gravatas. Perto de uma parede via-se uma estufa negra de ferro fundido cuja chaminé subia reta através do teto. No meio do compartimento se erguia uma grande mesa quadrada coberta de cartas de baralho, ao redor da qual se agrupavam as caixas que serviam de cadeira aos jogadores”.
É necessário levar em conta que o movimento de massas está começando a fazer suas experiências. Essas greves fazem parte de um primeiro ensaio e, além disso, em relação ao conjunto das massas proletárias e das classes médias assalariadas, ainda é muito pequeno o setor mobilizado.
Além disso, o enfrentamento está se dando contra a burguesia mais forte da América Latina, que não está em crise (embora enfrente sérios problemas de redirecionamento do modelo) e está muito unida contra o ascenso operário e popular. E por fim existe um outro fato que é o da relação entre as questões sindical, democrática e política.
Está claro (já no governo Figueiredo) que a ascensão começa a partir de questões salariais, mas não podemos esquecer que vivemos há quinze anos sob o arbítrio e a repressão, e que exatamente por isso as lutas dos trabalhadores tendem a caminhar a solução das questões democráticas.
Lutar por melhores salários significa cada vez mais lutar também por sindicatos fortes e independentes, contra as intervenções e os pelegos, contra a polícia e em certa medida contra o governo. Num primeiro momento, a alternativa para lutar por melhores condições de vida foi votar no MDB, mas isso não ajudou muito. Contraditoriamente, o fortalecimento do MDB nas eleições e sua passividade real após 15 de novembro de 1978 acabou por fortalecer as greves. E se com as greves se deram as intervenções, a resposta foi o fabuloso 1º de Maio em São Bernardo e as assembléias multitudinárias. E essa relação está se dando cada vez mais: salário-democracia-salário, em espiral que chega aos recantos do país.
E se esse processo não se transforma claramente numa luta política contra o autoritarismo é exatamente porque não existem organismos políticos que canalizem essas insatisfações salariais e democráticas.
O MDB não serviu para isso. Daí a defasagem entre a questão salarial/democrática e a questão política. E aqui a relação é a seguinte: quanto mais o fator político for se fortalecendo, mas se fortalece a questão democrática. Mas como falta o elemento político, se fortalece a questão salarial.
Essa relação entre esses elementos (a questão salarial e a democrática) vai nos permitir entender a atual vanguarda que surgiu com as mobilizações, a partir de maio de 1978. Esta vanguarda classista surge mais como necessidade do que como consciência. É a passagem da questão democrática à política, só que fica no meio. Explicando: a necessidade de unificar as lutas, de dar respostas democráticas, de conseguir vitórias salariais, está levando um setor da vanguarda a tentar uma resposta política para o país, mas esta resposta não está surgindo da consciência de que o problema do país é político e de que só um partido dos trabalhadores é a solução. Para a maioria dos trabalhadores esta situação não está clara, nem mesmo para um setor da vanguarda. Eles entendem, empiricamente, que é necessário criar algo que permita o avançar das lutas, e que este algo não é o MDB. Assim, a vanguarda classista é de fato a meditação entre a questão salarial/democrática e a questão política.
Dessa maneira, em relação à etapa, dizemos que ela é não-revolucionária e que seu ritmo é determinado pela ascensão. Este movimento tende a se manter, mas não é explosivo. Ele parte das questões salariais e se combina rapidamente com as questões democráticas. Mas pela falta de organismos políticos de classe e pela unidade burguesa se transforma numa ascensão mediada.

As mãos, de dançarina de templo
“... entrou na sala, movendo-se com uma majestade que só têm os reis e os mestres artífices. Era um condutor de mulas, o príncipe do rancho; podia conduzir dez, dezesseis e até vinte mulas com uma só rédea simples presa às dianteiras. Era capaz de matar com o chicote uma mosca pousada na anca da mula da carroça sem tocar a pele do animal. Havia em suas maneiras uma gravidade e uma quietude tão profundas que toda a conversa cessava quando ele estava a falar. Era tão grande que a sua autoridade, que sua palavra era aceita como definitiva sobre qualquer tema, fosse ele de política ou de amor. Era o Magro das mulas. A cara delgada não tinha idade. O homem tanto poderia ter trinta e cinco como cinqüenta anos. Seu ouvido escutava mais do que lhe diziam e sua fala lenta tinha tons ocultos, não de pensamento, mas sim de uma compreensão que ia além dos pensamentos. Suas mãos grandes e descarnadas eram na ação tão delicadas como as de uma dançarina de templo”.
O governo Figueiredo pretende, em seus seis anos de mandato, conseguir a transição de um regime bonapartista, vivido até Geisel, a um democrático-burguês, controlado, entregando –- então -– a presidência do país a um civil eleito através do voto indireto e que conte com a aprovação das Forças Armadas. Assim, depois de 21 anos de autoritarismo, o novo/futuro governo garantiria a continuidade do anterior. Se esta é a estratégia, a tática é chegar gradualmente à democracia controlada. Nesse processo iria desmontando os elementos institucionais característicos do bonapartismo,e incorporando os da democracia formal burguesa.
Esse plano de alguma maneira parece seguir as pegadas do modelo espanhol. No entanto, na equação política há várias incógnitas para as quais ainda não vemos respostas. Quem cumpriria o papel de Juan Carlos e/ou de Suárez? Poderia a Arena, readaptada e com novo nome, representar o papel da UCD espanhola? Por enquanto não temos respostas.
Mas, mesmo assim existe outro problema sério a resolver, que é o de criar os canais sindicais e políticos que enquadrem o movimento operário e de massas. Este é o ponto mais difícil. Quais serão as organizações que se candidatarão a cumprir o papel que cumprem na Espanha o PCE e o PSOE. Afinal, o próprio Petrônio Portella já disse que “é preciso novos partidos para impedir que a política seja feita através dos grupos de pressão”.
Bem, como hipótese geral podemos dizer que o projeto de abertura tem características espanholas, mas não podemos dizer que a institucionalização desta abertura seja exatamente a do modelo espanhol.
Até agora parece que o projeto do governo em relação aos partidos, e à reestruturação do sistema eleitoral, se aproxima mais do modelo francês, ou seja, da existência de dois partidos fortes ligados ao movimento de massas, com peso eleitoral, e mais dois, muito possivelmente ambos de centro-direita. Este projeto tem como finalidade fazer com que do choque entre os dois maiores partidos governe sempre um terceiro, de centro-direita. Aliás, sinteticamente, essa foi a grande descoberta de De Gaulle para neutralizar a força crescente das esquerdas francesas.
Assim, a Arena renovada e o partido de Magalhães Pinto tendem a cumprir o papel dos partidos de centro-direita, e o MDB (com nova sigla, muito possivelmente) e o PTB seriam de fato os dois grandes partidos que dividiriam o eleitorado. Aliás, a partir dessa elaboração, o governo necessitaria da cor vermelho/Moscou dentro do MDB, o que lhe daria –- unido à burguesia liberal -– um conteúdo específico e ideológico diferente do PTB social-democratizado. Assim, esses dois partidos funcionariam como pólos opostos dentro de uma mesma unidade, o movimento de massas.
Mas essas são hipóteses que levantamos a partir das propostas e manobras do governo. Inclusive, é bom entender que o governo está menos interessado em acabar realmente com o MDB, do que infiltrá-lo de liberais com Severo Gomes, Teotônio Vilela e outros, os quais não fortalecem o MDB de fato, mas acentuam e definem o seu caráter de partido da burguesia liberal, isolando cada vez mais os autênticos. É exatamente dentro desse processo que o governo necessita do PTB, como partido que aglutine os descontentes à esquerda, que não comungam com as idéias do Partido Comunista.

E a democracia-cristã?
Bem, até agora os cardeais e bispos brasileiros têm se pronunciado contra a formação de um partido ligado à Igreja. E há razões para isso. Primeiro porque a Igreja no Brasil não está coesa ideologicamente A corrente democrata-cristã vai desde um Franco Montoro até a um Nei Braga, desde um dom Paulo Arns ou um dom Hélder Câmara até um dom Sigaud. E juntar tudo isso num único partido seria problemático. Além disso, há a experiência internacional naqueles lugares onde a Igreja lançou partidos políticos e estes fracassaram, caiu também, o prestígio da Igreja. O exemplo mais complicado dessa situação é a própria Itália, onde a Santa Sé não sabe como se livrar do peso que é o Partido Democrata Cristão. Por isso, a tendência maior é que a Igreja jogue no seu papel atemporal, e tenha elementos nos mais diferentes partidos. Aliás, é o que tem feito desde 1945: apresentar uma cara antiditatorial e democrática, sem lançar-se como opção política definida.

Temos que encontrar ele
“Depois o Magro se aproximou, lento, da mulher e apalpou-lhe o pulso. Um dedo débil tocou-lhe a face e depois a mão baixou à nuca lentamente torcida e os dedos exploraram o pescoço. Quando o Magro se ergueu os homens se aproximaram e o encanto se quebrou.
O Magro se voltou vagarosamente para George.
– Acho que foi o Lennie -– afirmou.
– Ela está com o pescoço quebrado. Lennie podia ter feito isso.
George não respondeu, mas fez um lento sinal de assentimento com a cabeça. O chapéu estava tão enterrado na cabeça, que lhe cobria os olhos.
– Talvez -– prosseguiu o Magro -– tenha sido o mesmo que aconteceu em Weed, como você me contou.
George tornou a fazer um gesto afirmativo. O Magro suspirou:
-- Bem, acho que temos que encontrar ele. Para onde achas que ele foi?
George deu a impressão de que necessitava de algum tempo para soltar as palavras
-- Decerto... decerto foi para o Sul. Nós vimos do Norte, de modo que talvez ele tenha ido para ao Sul.
-- Acho que temos que encontrar ele – repetiu o Magro”

Que fenômeno é este, o do tal Partido dos Trabalhadores?
Antes que nada ele parte de um elemento, o desenvolvimento econômico e social dos últimos vinte anos, que geraram duas novas classes, uma classe operária industrial, altamente concentrada nos grandes centros urbanos, e uma classe média assalariada moderna. Desde 1978, tanto os operários como esta classe média estão num processo de mobilização.
Essa combinação de fatores, o surgimento de estratos novos na sociedade e o conjuntural -– um ano de mobilização –- levam ao surgimento (ou condicionam o surgimento) de fenômenos novos na sociedade.
Falamos que o centro das lutas é o salarial, mas dissemos também que se chocam freqüentemente com o governo da mão estendida e com o MDB, que não apresentam soluções para a questão do nível de vida. Outra coisa que deve ser levada em conta é que o Partido Comunista, neste momento, não aparece ao nível das lutas com um grande peso específico, o mesmo acontecendo com outros setores menores da esquerda.
O PTB, que é outro elemento, deve ser entendido da seguinte maneira: antes de mais nada as direções sindicais do movimento operário brasileiro não estão hoje ligadas umbilicalmente ao populismo, já que estes novos estratos de classe surgem praticamente quando o populismo começava a dar seu últimos suspiros. Assim, estas direções não surgem a partir do PTB,e não tiveram relações mais profundas com o populismo. E mais: durante os últimos 15 anos, o populismo não apresentou alternativas, nem esteve ligado às lutas dos trabalhadores. E agora, de um ano para cá, a proposta de ressurgimento do PTB não está passando pelas lutas que se deram nas fábricas e nos sindicatos. Tanto a proposta de Brizola, como a de Ivete Vargas não levaram em conta de forma concreta as reivindicações e mobilizações dos trabalhadores. Na verdade, ambos projetos passam pelo MDB, e isso só serve para confundir mais a situação... E por fim, para que surja o PTB é necessário que Brizola esteja no Brasil. Dessa maneira, a realidade do PTB existe mais como possível do que como concreto imediato.
Todo esse processo é o que faz com que os trabalhadores, que enfrentam duras lutas salariais, misturadas com problemas democráticos e políticos, tenham como necessidade alguma expressão de tipo político. É aí que começa a brotar, de forma superestrutural e vacilante, entre alguns dirigentes sindicais, a idéia de um partido dos trabalhadores. Um pouco mais trabalhada pela Convergência Socialista esta proposta começou a ser discutida como possibilidade de superação da necessidade concreta do momento.
A idéia do PT surge então de quatro fatores: (1) de uma nova realidade social; (2) das mobilizações e lutas que estão se dando há mais de um ano e que geram uma nova experiência, não somente sindical, mas democráticas e política; (3) a não existência de alternativas para esta nova vanguarda, que necessita expressar-se politicamente; e (4) de que esta necessidade se expressou através de algumas direções sindicais e através da Convergência Socialista, que cumpriu um papel mais ideológico.
De toda a maneira, o Partido dos Trabalhadores não estava nos planos do governo. Sua intenção é de que todos os dirigentes sindicais classistas e autênticos, assim com o ativismo, estejam controlados pelo PTB ou o MDB. Esta é a única garantia para a burguesia, enquadrá-los e vencer o movimento de massas através de uma saída democrática controlada, entrilhando seu descontentamento para a luta estritamente parlamentar.
Na verdade, a construção do PT passa por grandes dificuldades. Como os dirigentes sindicais chegaram à questão do PT através do classismo, como mediação entre a questão democrática e política, por uma necessidade, e não exatamente por um salto de consciência, o Partido dos Trabalhadores passa a ser de difícil concretização. Os dirigentes sindicais estão procurando um partido, algo que possa cumprir uma necessidade que têm. Como antes o projeto do PTB estava distante, eles começaram a baralhar a hipótese do PT, mas na medida em que o PTB venha a concretizar-se, aumenta a possibilidade de que os classistas aceitem esta alternativa. Já que é mais fácil entrar num partido do que construir um.

Mais um detalhe importante
Todo o processo novo que se dá a partir de mais de 1978 é muito rico porque combina e interliga muitas coisas, como o fato de que setores do movimento de massas se mobilizem a partir do sindical, mas também combinam o democrático e o político e geram uma importante vanguarda, mas se dá de forma desigual e combinada, mais ainda, não é um fenômeno ideológico, mas concreto.
Assim, diríamos que se dão, misturados, três níveis de consciência. Um primeiro mais amplo, que é o sindical-classista e que se traduz no surgimento de uma nova vanguarda classista, em sindicatos autênticos, chapas classistas de oposição, vencedoras, etc.
O segundo nível de consciência é o classista-político, o mais heterogêneo, que se traduz na compreensão empírica, vacilante e não claramente definida ainda, da necessidade de um partido sem patrões, que expresse as necessidades mais gerais da classe trabalhadora. Isto é laborismo.
E o terceiro nível de consciência seria o da consciência revolucionária, daqueles que entendem a necessidade de um partido socialista para a transformação da sociedade.
Sem entender que existem níveis diferentes de consciência e desigualdades não entenderemos o processo vivido pelo PT. A construção do Partido dos Trabalhadores depende dos próprios trabalhadores. A participação dos socialistas nesta construção pode ser fundamental, mas ainda assim é secundária. De todas as maneiras, caso se concretize o PT será talvez o maior salto que a classe operária brasileira já deu no processo de consolidação de sua consciência-para-si. E, um rombo efetivo nos planos de Figueiredo. Dezesseis de junho de mil novecentos e setenta e nove. Anno domini.

“A funda bacia verde do rio Salina estava muito parada naquele fim de tarde. O sol já havia deixado o vale para ir trepando pelas encostas das montanhas Gabilan e os cumes dos outeiros estavam tocados duma luz rosada. Junto do poço, porém, entre os sicômoros mosqueados, havia caído uma sombra agradável.
Uma cobra d’água deslizou tersamente pela laguna, torcendo dum lado para outro a cabeça de periscópio; e nadou toda a largura da bacia, chegou até as pernas de uma garça imóvel que se achava nos baixios. Uma cabeça silenciosa e um bico projetaram-se para baixo, como uma lança, e seguraram a cobra pela cabeça: e o bico engoliu a pequena cobra, enquanto seu rabo coleava freneticamente”.

Fonte
Jorge Pinheiro, O príncipe do rancho, São Paulo, Versus no 33, junho de 1979, pp. 28-32.

mardi 14 juillet 2009

A paridade entre o cristianismo e a consciência social crítica e militante

Conforme explica Paul Tillich em artigo publicado em Das neue Deutschland, de 1919, a consciência e a militância social são produtos do desenvolvimento econômico e espiritual, que surgiu lentamente e se impôs com a Renascença, a Reforma e o capitalismo. A consciência e a militância social surgiram em oposição à cultura autoritária e unitária da Idade Média e sedimentaram suas bases nas criações culturais dos últimos séculos.

A práxis socialista só pode ser compreendida a partir desse desenvolvimento e sua permanência está ligada diretamente a ele. Foi do interior do cristianismo que brotou a consciência e a militância social e, por isso, um socialismo sem pressupostos cristãos se mostra capenga. Ou seja, aqueles que defendem o socialismo devem defender também os princípios sobre os quais ele repousa.

A organização econômica e espiritual da Idade Média estava fundada sobre um sistema de centralização da autoridade que, ancorado no sobrenatural, associava a natureza e a sobrenatureza numa unidade poderosa, à qual os povos se encontravam sujeitos.

A Reforma, sustentada pela visão humanista que surgiu com a Renascença, golpeou o sistema de autoridade, trouxe a fé para o plano formal ao recorrer à autoridade dos textos escriturísticos judaico-cristãos e, no plano material, valorizou a subjetividade da consciência pessoal.

Apoiada formalmente sobre os textos escriturísticos judaico-cristãos, o protestantismo eclesiástico engendrou novas contradições. Mas o sistema centralizado de autoridade já estava em frangalhos: as autoridades anularam a autoridade. Agora cabia ao indivíduo decidir a que grupo ele queria ligar-se.

Por causa das guerras religiosas, essa realidade viveu um processo lento transmitindo a cada lado a esperança de que poderia chegar a uma vitória exclusiva. Mas com o fim dos combates o que se viu é que as oposições às confissões se tornaram permanentes. Dessa maneira, brotou o espírito autônomo e crítico nos mais variados campos. A consciência européia ocidental atacou as muralhas autoritárias das confissões e não deixou subsistir sob o solo protestante nada mais que destroços do constrangimento autoritário.

Descartes deu o golpe decisivo. A certeza que eu tenho de mim mesmo é o princípio de toda certeza objetiva. Embora a autoridade não possa me livrar da dúvida, é em mim mesmo, somente, que se enraiza a certeza. E o Iluminismo tirou suas conclusões: toda tradição deve ser submetida à crítica.

No domínio econômico, espiritual e político nada ficou de positivo que não fosse pensado, confrontado com a consciência, medido e negado. Os sistemas de fé, as formas de Estado, as definições econômicas sofreram o assalto da autonomia, que não livraram nada, que não tiveram nenhum respeito pelas autoridades humanas e divinas.

Lamentou-se a perda do sistema de autoridade ou festejou-se tal acontecimento como um passo em direção à maturidade cultural. De todas as maneiras, houve o reconhecimento de que a vida cultural não podia ser pensada sem autonomia e que a consciência e a práxis social estão presentes em todos os lugares. Líderes e camponeses tiveram o mesmo sentimento, conquistaram a liberdade das mãos do autoritarismo irracional, fosse ele imanente ou transcendente. Este foi o primeiro fato que o cristianismo teve de levar em conta.

Do lado positivo, a autonomia significou o reinado da razão. Pela primeira vez, depois de um milênio e meio, a razão humana não via limites para seu poder. Através da análise ela penetrou as profundezas da vida cultural e social, simultaneamente, e através da síntese dos elementos descobertos apresentou um sistema novo, racional. Depois de séculos de arbítrio, as pessoas foram possuídas por uma vontade de dar forma ao mundo de maneira racional.

E a vida econômica também foi formulada racionalmente. Não era o prazer de certos indivíduos ou povos que deveriam fazer a lei, mas era a humanidade inteira, que é sujeito e objeto dos processos econômicos, quem deveria fazê-lo a partir de critérios racionais. A mesma autonomia que substituiu a autoridade, a partir da razão precisava construir um mundo sem arbítrio. Eis o segundo fato que o cristianismo teve de levar em conta.

Sem dúvida, foi Marx quem introduziu o pensamento histórico objetivo no socialismo, a partir do idealismo alemão, ao dizer que a razão precisa ser separada da decisão humana e colocada ao nível das necessidades objetivas. O processo dialético é racional e a fé nele é uma fé na razão: uma fé que adquiriu uma força enorme graças à sua amarração metafísica objetiva e que se tornaria o dogma fundamental de milhões de pessoas.

Foi o processo da própria história que fez o mundo conformar-se à razão e levou este combate à vitória. E foi essa vitória que deu cara ao mundo que conhecemos como moderno.

A fé na razão estava fundamentada sobre os resultados conquistados pela ciência da natureza. Mas atrás da ciência da natureza veio a cultura moderna. Preparada de várias maneiras a partir do fim da Idade Média, ela surgiu com uma força irresistível na Renascença e conduziu a uma afirmação alegre deste mundo, que durante muito tempo foi negado, desdenhado e rebaixado por um outro onírico e místico.

Os outros mundos empalideceram diante da astronomia, diante da validade universal das leis da natureza, diante da redescoberta da beleza do real na arte, diante da consciência de unidade do finito e do infinito na filosofia da natureza. Foi assim que a imanência ressoou no humanismo e na filosofia das Luzes, com Goethe e no idealismo alemão, da mesma maneira que o socialismo se uniu à consciência da autonomia e à fé do poder formador da razão na construção de um sentimento unitário da vida e do mundo. Este foi o terceiro fato que o cristianismo teve de levar em conta.

Se o socialismo é, nesse sentido, uma herança da cultura universal, ele teve, no entanto, uma originalidade que não se restringiu aos conceitos, mas à experiência vivida. O conceito de humanidade, que manifestou a vitória da idéia de tolerância, não teve no desenvolvimento da práxis burguesa mais que uma realização acidental. A consciência de humanidade foi neutralizada pela consciência de classe burguesa, pela educação e pela dependência nacional.

A humanidade se colocou antes de tudo no campo das confissões religiosas, sob formas absolutamente contrárias a idéia de uma transformação racional do mundo. E foi pela pressão econômica e política sobre os trabalhadores, nos primeiros decênios do capitalismo, que nasceu uma consciência solidária, no coração do qual estava presente o sentimento universal de humanidade, que se opõe àquele que vê as pessoas como meios e não como fim.

O combate contra o feudalismo, o capitalismo, o nacionalismo e o confessionalismo religioso constituiu a expressão negativa da consciência de humanidade, que derruba barreiras e reconhece a pessoalidade de cada ser humano. Este foi o quarto fato que o cristianismo teve de levar em conta.

Esses elementos formadores da consciência social crítica e militante são fundamentais para a compreensão das relações entre cristianismo e socialismo. Eles possibilitam entender até que ponto o cristianismo pode ter uma atitude positiva em relação à essa consciência social crítica e militante.

Um sistema como o catolicismo pré-Vaticano II, que foi erigido sobre o princípio da autoridade centralizada, só poderia se opor a um movimento autônomo como o socialismo. Esse tipo de catolicismo e o socialismo são opostos na medida em que tal catolicismo se afirma enquanto sistema de autoridade.

Eles se colocam como opostos mesmo quando o catolicismo aceita as exigências do socialismo em matéria de economia política. Entre os católicos continua a ser determinante a ética social do tomismo, estabelecida de maneira autoritária, em estreita relação com a dogmática. Ela permite uma ampla margem de manobra, mas a unidade do sistema católico impõe limites bem definidos, que uma doutrina econômica autônoma não pode jamais reconhecer.

O protestantismo quebrou o sistema de autoridade em seu princípio-base e deu voz à autonomia. Por isso, é um erro considerar de forma heterônoma os evangelhos ou dizer que o comportamento da comunidade de Jerusalém em Atos dos Apóstolos conduz a uma política econômica socialista.

Do ponto de vista histórico, os fatos não são assim tão simples, porque os evangelhos não apresentam um programa de reforma social radical, embora Jesus, convencido da irrupção iminente do reino de Deus, tenha apresentado aos seus discípulos as conseqüências éticas do mandato do amor.

Fazendo uma abstração histórica, deve-se reconhecer que no terreno da autonomia, a justiça de uma ética social ou a verdade de uma doutrina não depende de sua conformidade às escrituras judaico-cristãs. Por isso, a consciência social crítica e militante pode ter por base, num determinado contexto, um sólido apoio psicológico a seu favor, enquanto convicção pessoal, que não nasce da autoridade imposta.

Quando os laços do cristianismo com a consciência social crítica e militante estão fundamentados de maneira heterônoma sobre as escrituras judaico-cristãs não há um protestantismo autêntico, mas uma legalidade sectária. Isto porque o protestantismo como essência é autônomo. Mas, sem dúvida, as fórmulas “pela graça somente” e “pela fé somente” transportaram vida ao domínio do conhecimento ao rejeitarem o legalismo, o farisaísmo da posse da verdade e o desejo de querer impor a verdade aos outros.

A religião e o espírito autônomo podem ser entendidos como paritários quando se chega a essa união através da autonomia, que livra do arbítrio. Diante da decomposição da cultura burguesa, o socialismo propôs a criação uma nova vida cultural e social unidas sobre a base de uma economia planejada. Mas tal proposta só é possível quando a autonomia caminha em direção à teonomia. Ou seja, é necessário uma práxis que permita à incondicionalidade apoderar-se de todas as realidades. Este é um ponto sobre o qual cristianismo e socialismo precisam se colocar de acordo.

A idéia de dar forma racional do mundo fez oposição à concepção do cristianismo que via o mundo como contra-divino e a razão como caída, e que via a redenção não como ação que dá feitio ao mundo, e o conhecimento não como razão, mas como revelação. Por isso, nesses últimos séculos, a teologia protestante propôs-se a superar a oposição entre razão e revelação, através da idéia de uma história universal da revelação, humana e imanente ao espírito, que nada mais é que a história do espírito em geral e do cristianismo em particular.

Essa concepção ética elaborada pela cultura protestante considerou que a pessoalidade livre é impossível sem o fundamento natural de sua individualidade psíquica e corporal, com suas inevitáveis particularidades lógicas, fisiológicas e biológicas e que o valor da pessoalidade consiste em ir além, elevar-se acima dessa naturalidade.

Tal concepção de mundo, que repousa sobre o absoluto, que aprofunda esta contradição entre o ser e o mérito, fundamento de toda liberdade moral, não é um estado ideal, pois seria onírico, desprovido de liberdade e de mérito inferior. Assim, o protestantismo traduziu uma vontade de dar forma ao mundo de maneira imanente: o reino de Deus vem ao mundo. Mas, ao mesmo tempo, tal concepção apresentou limitações: o dar feitio está situado no âmbito da técnica, não no da ética, no âmbito da categoria de meio e de fim e não dos juízos e do mérito.

Fazer é técnica, mas a técnica não é o fim em si, não é um fim último. Mesmo que toda economia fosse uma produção racional, a organização jurídica englobasse todos os povos, a vida material estivesse livre do imprevisível, restaria ainda o mérito da pessoalidade, a revelação do espírito e a idéia criativa que traduzem graça e brotam das profundezas do fazer.

Por isso, e essa será uma das sacadas de Tillich, é importante que o olhar lançado nas profundezas da existência não seja turvado, que a fé enquanto experiência da incondicionalidade apóie a vontade de dar forma ao mundo e a livre do vazio e do nada de uma simples tecnificação do mundo. Esta é outra questão sobre a qual cristianismo e socialismo devem se colocar em acordo, pois é com a experiência do imanente que surge claramente a oposição entre o socialismo e o cristianismo, já que o cristianismo está comprometido, enquanto fé, com o lá em cima, e o socialismo voltado para o aqui embaixo. Mas esta oposição não é correta.

Lá onde se vive a profundidade última da experiência humana, onde a experiência da incondicionalidade é pronunciada sobre todas as coisas e sobre todos os méritos, é onde acontece a supressão da oposição entre o em cima absoluto, perfeito, e o embaixo relativo. Sim e não são pronunciados sobre o aqui embaixo, que afinal é a única realidade conhecida. É no coração das pessoas que acontece a separação entre céu e terra, o julgamento paradoxal que confronta absoluto e relativo, perfeito e vão, eterno e terrestre. É assim que devemos entender a teologia do “somente pela fé”, que não admite nem perfeição, nem conhecimento, nem estado absolutos, mas que vê brotar o absoluto em todo relativo.

Temos aqui o fundamento da compreensão positiva que cristianismo nos dá sobre a questão da imanência. Mas aqui também o cristianismo deve oferecer ao socialismo alguma coisa sem a qual ele não pode existir: a experiência vitoriosa da incondicionalidade em tudo que está condicionado, imanente, na totalidade do real.

Existe uma atitude profana e uma atitude religiosa no olhar o mundo: essas atitudes se tornam nulas num estado puro, exclusivo. Num, a primeira predomina fortemente, noutra, a segunda. Pode-se conceber a arte, a ciência, a moralidade, a vida econômica e jurídica, a política exterior e nacional como fazeres profanos e se pode concebê-las de maneira religiosa.

Pode-se vê-las como atividades úteis e agradáveis, necessárias e desagradáveis, mas pode-se ver o espírito agir nelas e ver a vida nelas se revelar e, por isso, aproximar-se de tais coisas com respeito.

O espírito cristão está vivo no movimento socialista: é uma vibração religiosa que circula através das massas. Mas há também presenças profanas no movimento, mesmo entre seus ‘padres’ e ‘bispos’. A santificação da vida cultural no geral e no socialismo em particular é a marca deixada pelo cristianismo no socialismo. Esta é a terceira questão sobre a qual cristianismo e socialismo devem entrar em acordo.

A santificação da vida cultural não será possível sem uma concentração dos elementos religiosos mais expressivos da cultura e da sociedade, sem a constituição de comunidades que estejam imbuídas em aprofundar e transmitir a experiência da fé às gerações futuras. É para isso que servem idéias expressivas e as instituições, que existem com toda a sua riqueza e sua vitalidade no seio das confissões religiosas, e que a partir da força de uma tradição provada apresentam um vigor popular em oposição a uma interconfessionalidade racionalista e artificial.

Sem desejar apresentar uma nova forma de confessionalismo, com verdades e formas absolutas, devemos insistir na necessidade de falar sobre um quarto ponto: a experiência humana universal.

Esta experiência tem seu fundamento nada menos que no próprio cristianismo. Nós podemos ver na cruz de Cristo não somente a negação do judaísmo, mas também do cristianismo, no sentido de que se absolutiza enquanto confissão.

As comunidades cristãs não podem deixar essa consciência tomar-se efetiva, pois é sobre este terreno que se deram as condições para as guerras religiosas. Em relação a isso o espírito deve ser autônomo. O caminho da cultura cristã é entender esta consciência como elemento agregador de todas as culturas e todas as confissões, sem aboli-las, inspirando um sentimento de comunhão mais profundo que todas as barreiras concebíveis.

O cristianismo confere assim conteúdo à experiência humana. A solidariedade nascida da pressão exterior deixa de existir quando a pressão cessa. Os fatos confirmam isso. O socialismo falha em relação ao sentimento de comunidade que suscita a unidade a partir das profundezas últimas do humano, lá onde o incondicionado desperta a alma.

Não devemos entender o cristianismo como confissão exclusiva, mas como irrupção da fé, incondicionalidade que vê uma só humanidade, sem as barreiras internas e externas que caracterizam as comunidades. Esta fé não se mostra hostil a não ser com os domínios econômicos, políticos e religiosos, que se colocam eles próprios contra os outros.

Estes são os fundamentos da paridade entre o cristianismo e a consciência social crítica e militante que deve ser mais que uma associação, que traduz um desenvolvimento de ambos através de uma nova forma de fé e vida. E qual é o papel dos cristãos e dos militantes da consciência social crítica neste desenvolvimento? Essa questão deverá ser respondida no futuro próximo, já que exige uma postura diferente daquela que cristãos e socialistas tiveram até agora.

Fonte
Paul Tillich, Christianisme et Socialisme, Écrits socialistes allemands (1919-1931), Les Éditions du Cerf, Éditions Labor et Fides, Les Presses de l’Université Laval, 1992, Christianisme et Socialisme I, pp.24-30.

mercredi 8 juillet 2009

Che cos’è l’analogia? [Apologética e Filosofia II]

Analogia
Alberto Strumìa

Concilio Lateranense IV, DH 806; Concilio Vaticano I, DH 3016; Providentissimus Deus, DH 3283; Divino afflante Spiritu, DH 3826; Humani generis, DH 3887; Dei Verbum, 12; Fides et ratio, 19.

I. Che cos’è l’analogia? - II. L’analogia nella logica e metafisica aristotelico-tomista - III. Analogia e teologia

1. Significato comune del termine analogia. Il termine «analogia», nell’accezione comune della lingua italiana odierna, sta ad indicare un «rapporto di somiglianza tra alcuni elementi costitutivi di due fatti od oggetti, tale da far dedurre mentalmente un certo grado di somiglianza tra i fatti e gli oggetti stessi» (G. Devoto, G.C. Oli, Il dizionario della lingua italiana, Firenze 1990). Recentemente è divenuto, poi, di uso assai frequente, con un significato tecnico, l’aggettivo “analogico”, contrapposto a “digitale”, o “numerico” in riferimento a due diversi modi di operare delle apparecchiature elettroniche. L’origine del termine «analogia», come suggerisce la sua radice greca (analoghía), è però molto più antica e si fonda sul concetto matematico di “proporzione” (a : b = c : d) che stabilisce una similitudine dovuta ad una uguaglianza di rapporti. Si pensi, per esempio, alla similitudine di due triangoli i cui lati stanno in un rapporto prefissato. Il suo trasporto dalla matematica alla logica e alla filosofia risale a Platone (427-347 a.C.) che tuttavia non ne elabora una teoria. Sarà Aristotele (384-322 a.C.) a darne una formulazione sistematica nell’ambito della logica. Nel medio evo Tommaso d’Aquino porterà a compimento l’opera aristotelica con un intento nel contempo filosofico e teologico. Nelle epoche successive l’analogia sarà sempre meno compresa, a partire dai nominalisti, e via via abbandonata nella logica e nella filosofia, e ridotta nella sua portata fino ad essere identificata come una semplice “metafora” letteraria. Ed è in questo senso che oggi, là dove se ne parla, essa viene fatta normalmente rientrare nel contesto disciplinare dell’ermeneutica.

2. Analogia e logica. L’esigenza di introdurre l’analogia, nel quadro del pensiero greco, sembra nascere simultaneamente da due ordini di problemi: l’uno strettamente “logico-linguistico”, l’altro più propriamente “metafisico”. Dal punto di vista logico-linguistico Aristotele, come più tardi Tommaso, partono dalla constatazione che nel linguaggio comune — che esprime e quindi riflette all’esterno la struttura del procedimento del pensiero — uno stesso termine (“predicato”) può essere attribuito a diversi soggetti in modo “univoco”, “equivoco” o “analogo”. Nel primo caso il predicato ha esattamente lo stesso significato per l’intera classe dei soggetti ai quali viene attribuito: ad esempio quando si dice «Tizio è un uomo», «Caio è un uomo», il termine “uomo” corrisponde alla stessa definizione “animale razionale” in entrambi gli esempi. Nel secondo caso, al contrario, lo stesso termine viene impiegato con significati completamente differenti e tra loro non realmente correlati: come quando si dice «questo animale è un toro», «questa superficie geometrica è un toro». In questo secondo caso il termine “toro” corrisponde a definizioni diverse in ciascuno dei due esempi: nel primo si tratta di un “bovino maschio adulto”, nel secondo di una “superficie di equazioni parametriche x = (R + r cos u) cos v, y = (R + r cos u) sin v, z = r sin u riferita ad una terna cartesiana ortogonale Oxyz di assi di simmetria”. Di conseguenza l’impiego della stessa parola per designare oggetti diversi è puramente convenzionale, tanto che l’equivocità può essere legata alla lingua nella quale ci si esprime e scomparire se si usa un’altra lingua. Nel terzo caso, infine, lo stesso termine viene impiegato con significati differenti tra loro, ma in qualche modo realmente correlati, per cui l’uso dello stesso termine denota una somiglianza reale e non una mera scelta convenzionale: ad esempio, come quando si dice «Einstein è stato geniale», «la teoria della relatività generale è geniale». Propriamente parlando solo un uomo può essere geniale, ma una teoria può essere detta tale in quanto espressione, “effetto reale” dalla genialità del suo autore (e non per pura convenzione!).

3. Analogia e metafisica. Il secondo ordine di problemi che hanno condotto all’analogia non è puramente logico o linguistico, ma è propriamente metafisico, in quanto è insito nelle cose e si trasferisce successivamente al pensiero e al linguaggio che cercano di cogliere la realtà ( REALISMO). I pensatori greci si sono trovati di fronte al problema di conciliare due dati dell’ esperienza che apparivano contraddittori: l’“essere” delle cose e il loro “divenire”, o in termini fisici il “moto”. Una soluzione “monistica” del problema — cioè fondata sull’assunzione che la realtà si regga su di un solo principio costitutivo (sia esso materiale o immateriale) — richiede di accettare che uno dei due dati dell’esperienza sia apparente: se si ammette la realtà solo dell’essere, come un unico stato indifferenziato, questo non potrà mai essere che se stesso, non potendo mutare in qualcos’altro da sé, e non si riesce a dare una spiegazione dell’esperienza del moto che ci si presenta, al contrario, come il passaggio da uno stato ad un altro e si deve dire che questo passaggio non è reale, ma pura apparenza (è la soluzione proposta da Parmenide, VI-V sec. a.C.). E rimane comunque il problema di capire che cosa produce in noi questa apparenza. Se, viceversa, si ammette solo la realtà del divenire bisogna ammettere la contraddizione che il divenire, per il solo fatto che è, coincide con l’essere, che la molteplicità coincide con l’uno, che il nulla, cioè il non essere è uno stato dell’essere e il divenire è il continuo alternarsi di questi due stati contraddittori. Ma ammettere la contraddizione comporta, in ultima analisi, l’impossibilità della conoscenza (è la conclusione estrema alla quale perviene Cratilo, seguendo la via aperta da Eraclito, VI-V sec. a.C.). Per spiegare compiutamente l’esperienza che l’uomo fa delle cose occorre, perciò, ipotizzare che l’essere si possa dare in più “stati differenziati” che costituiscono una gamma di modi di esistenza, che si interpongono tra l’essere nella sua pienezza assoluta (Dio, Atto puro) e la sua totale assenza (il nulla). Al dato metafisico che suppone l’essere come attuato (partecipato) in gradi e modi differenziati nelle cose che sono, corrisponde dal punto di vista logico e nel linguaggio una nozione analogica di “ente” — “ente” è ciò che ha l’“essere” e “essere” è il principio per cui l’ente è — termine che si predica in modo differenziato, ma non equivoco, dei diversi soggetti: così alla teoria metafisica della partecipazione corrisponde la teoria dell’analogia sul piano della logica.

II. L’analogia nella logica e metafisica aristotelico-tomista
Nella logica aristotelico-tomista si danno, in origine, tre tipi principali di analogia (anche se ulteriori distinzioni sono state introdotte dalle scuole successive): l’analogia di “attribuzione”, o di “proporzione semplice”, l’analogia di “proporzionalità propria”, o “intrinseca” e l’analogia di “proporzionalità impropria”, o “estrinseca ”, o “metaforica”.

1. L’analogia di attribuzione o di proporzione semplice. L’analogia di attribuzione viene presentata solitamente con un esempio classico: «Tizio è “sano”, il suo colorito è “sano”, il cibo è “sano”, l’aria è “sana”». Osservando l’esempio notiamo che la caratteristica di essere “sano” è propria solo di Tizio che, essendo l’unico vivente, è l’unico soggetto di cui si possa dire che goda buona salute. Degli altri soggetti non si può dire questo propriamente perché non sono degli esseri viventi. Questi altri soggetti si possono dire in qualche modo “sani” solo in riferimento al buono stato di salute di Tizio, il quale solamente e propriamente è soggetto del predicato “sano”. Per questa ragione Tizio viene detto “primo analogato” o “sommo analogato” o “analogato superiore”.

Per quanto riguarda gli altri soggetti si può individuare la relazione che hanno con l’essere sano di Tizio: il colorito sano è indizio del suo buono stato di salute di Tizio, in quanto ne è un “effetto”. Il cibo sano è quello che favorisce la buona salute di Tizio come una delle sue “cause”. Va ben compreso che il riferimento al primo analogato non è convenzionale, o occasionale, ma è fondato sulla realtà e confermato dall’esperienza (dal fatto che realmente un cibo sano contribuisce alla buona salute di chi se ne nutre, realmente un colorito sano è il segno del buono stato di salute, e così via) e per questo il cibo, il colorito, il clima si dicono “analogati inferiori”. È questo riferimento, fondato sulla realtà, che permette all’attribuzione di non essere semplicemente “equivoca”. Le cose, le realtà sono e restano diverse, ma il nome comune del predicato esprime qualità che, pure in se stesse diverse, sotto un certo aspetto hanno un rapporto diretto con la medesima qualità che è quella del primo analogato (cfr. Summa theologiae, I, q. 13, a. 5 c).

2. L’analogia di proporzionalità propria o intrinseca. Anche questo secondo tipo di analogia, viene solitamente illustrata partendo da un esempio classico che consiste nel paragonare la vista con l’intelligenza. Noi utilizziamo spesso l’idea della “visione” sia in riferimento alla “vista dell’occhio” che al “capire della mente”. Così diciamo per esempio: «La luce della verità illumina la mente», «capire a prima vista», «una visione filosofica della realtà». Abbiamo, in questi esempi, un termine che esprime un’azione (vedere) che attribuiamo a due soggetti diversi (l’occhio e la mente). In questo tipo di analogia la somiglianza viene stabilita non più tra i significati dello stesso predicato attribuiti ai diversi soggetti, ma tra le “relazioni”, o “rapporti” che intercorrono tra il predicato e i soggetti. Questa somiglianza di relazioni, o di rapporti si può esprimere con una formula che ricorda quella di una proporzione matematica: «Il “vedere” sta all’“occhio” come il “capire” sta alla “mente”». Tuttavia, mentre in matematica, quando scriviamo una proporzione, stabiliamo che i due rapporti sono “uguali” (2:3 = 4:6), nel caso dell’analogia di proporzionalità affermiamo che i due rapporti soggetto-predicato non sono uguali ma “somiglianti” (cfr. De Veritate, q. 2, a. 11 c). Va sottolineato, poi, che l’azione che viene attribuita ai soggetti è realmente connessa con ciascuno di essi. La capacità di vedere è intrinseca all’occhio e la capacità di capire è intrinseca alla mente: per l’uno e per l’altra si tratta di una capacità naturale, di una facoltà propria, quindi posseduta realmente. Per questo si parla di analogia di proporzionalità “propria” o “intrinseca”. Notiamo che in questo tipo di analogia non si danno né un primo analogato, né degli analogati inferiori: abbiamo invece un rapporto soggetto-qualità che si verifica propriamente per un soggetto (l’occhio nel caso della visione) e in modo “simile” per l’altro soggetto (la mente). Il vedere conviene propriamente all’occhio, non alla mente. Si può dire, allora, che ciò che tiene, in certo modo, il posto di un primo analogato non è un soggetto a cui si attribuisce propriamente il predicato, ma una relazione tra un soggetto (l’occhio) e un predicato (capace di vedere).

3. L’analogia di proporzionalità impropria o estrinseca o metaforica. Il terzo tipo di analogia è la “metafora”. Si tratta di un’analogia che, a differenza delle due precedenti, non si basa su un vero e proprio fondamento reale della somiglianza che istituisce, ma si basa piuttosto su una somiglianza ravvisata dal soggetto conoscente, che non trova nella natura dei soggetti e del predicato alcuna relazione di causa-effetto, né una somiglianza reale nei loro rapporti. Propriamente parlando non è una vera analogia, ma possiamo considerarla tale in senso lato, o improprio. Un esempio tipico per illustrarla è il seguente: «Tizio ha un coraggio da leone». Anche in questo caso abbiamo implicitamente una sorta di proporzione: possiamo, infatti, riformulare l’esempio in questi termini: «Tizio è così coraggioso come il leone è coraggioso». Osserviamo subito che la qualità “coraggioso” per cui Tizio è paragonabile al leone è una qualità che viene riconosciuta al suo massimo grado nel leone: questo ricorda in un certo senso l’analogia di attribuzione. Tuttavia c’è una differenza fondamentale: non c’è alcun legame di causa-effetto tra il coraggio del leone e quello di Tizio, in quanto Tizio non è reso coraggioso da alcuna partecipazione al coraggio del leone. Non si può parlare quindi di analogia di proporzione. È piuttosto una somiglianza che il soggetto conoscente riconosce, come dall’esterno, tra il coraggio di Tizio e il coraggio del leone. In questo caso abbiamo, piuttosto, una somiglianza di relazioni, o di rapporti tra il soggetto e la sua qualità, come in un’analogia di proporzionalità. Tuttavia non si può parlare neppure di una vera analogia di proporzionalità propria. Infatti per avere un’analogia di proporzionalità “propria”, la proporzione da istituire dovrebbe essere: Tizio sta al coraggio (di Tizio) come il leone sta al coraggio (del leone), mentre nell’analogia di proporzionalità impropria, a Tizio viene attribuita la stessa qualità di coraggio propria del leone (coraggio leonino). Propriamente parlando Tizio ha un coraggio umano, mentre gli viene attribuito un “coraggio da leone”. Si tratta di una sorta di attribuzione “estrinseca”, in quanto si attribuisce alla dote naturale di Tizio un carattere che è naturale e proprio del leone (cfr. Summa theologiae I, q .13, a .3, ad 1um).

4. L’analogia entis. La scoperta fondamentale della metafisica antica è stata probabilmente proprio l’analogia dell’ente (analogia entis). A differenza dei “generi” che, dal punto di vista logico si formalizzano nei concetti “universali”, che si predicano in modo “univoco” dei diversi soggetti — come “uomo” che si dice con identico significato di Tizio, Caio e Sempronio — “ente” si predica in modo “analogo” dei diversi soggetti, collocandosi al di sopra dei generi e dei concetti universali che li descrivono (cfr. Aristotele, Metafisica, III, 998b, 22-27).

Notiamo qui due aspetti rilevanti: a) In particolare “ente” si dice secondo un’“analogia di proporzionalità propria” di un oggetto (sostanza) e delle sue proprietà (accidenti). Questo deriva dal fatto che una proprietà è sempre proprietà “di qualcosa”, può esistere solo “in altro” e non per se stessa. Un colore, un’estensione, una temperatura esistono sempre e solo in un oggetto, mentre un oggetto possiede un’esistenza autonoma. Così si deve dire che una proprietà sta al suo modo di essere in maniera simile a come un oggetto sta al suo modo di essere, ma i due modi non sono identici, pur avendo in comune il fatto di essere. b) Inoltre “ente” si dice di un oggetto limitato, che ha l’essere per partecipazione, e lo si dice secondo un’analogia di proporzione rispetto all’Atto puro che è l’essere per se stesso ed è la causa dell’essere dell’oggetto limitato. Un comportamento simile a quello di “ente” è cartatteristico anche delle nozioni superuniversali di “vero”, “uno”, “bene” che insieme ad “ente” vengono dette “trascendentali”.

5. Crisi dell’analogia. L’analogia che vede il suo massimo sviluppo e utilizzo con Tommaso d’Aquino, conosce, già con i suoi contemporanei, le premesse della sua futura crisi. Infatti, a partire proprio dal XIII secolo, le due grandi scuole del pensiero filosofico-teologico che hanno sede a Parigi, dove hanno operato prima Alberto Magno (1200 ca.-1280) e poi il suo discepolo Tommaso, e a Oxford, dove vediamo all’opera tra gli altri Ruggero Bacone (1214-1292) e Roberto Grossatesta (1175-1253), poi Giovanni Duns Scoto (1275-1308) e Guglielmo di Ockham (1280-1349), si trovano a confronto e di fatto seguiranno vie diverse senza comprendersi. La linea aristotelica, seguita da Alberto e Tommaso, acquisterà grande rilievo soprattutto per la teologia cattolica e, tre secoli dopo, sarà accolta ufficialmente, in buona parte, dalla Chiesa nel Concilio di Trento (1545-1563), mentre la linea platonica, prevalente ad Oxford, si concentrerà, a partire da Ruggero Bacone sul problema della matematizzazione delle scienze, creando le premesse remote metodologiche per lo sviluppo della scienza moderna.

Ha inizio, così, quel graduale allontanamento del pensiero scientifico sempre più univoco — in quanto matematizzato — da quello metafisico e teologico, analogico. Scoto risolverà l’analogia dell’ente in una molteplicità di univoci così come Ockham dissolverà la realtà dell’universale in un puro nome (nominalismo) negandogli un’esistenza reale extramentale. Questa operazione, otterrà poi, con il successo della scienza galileiana e newtoniana una ricaduta anche sul pensiero filosofico, attraverso Descartes (1596-1650) prima e Kant (1724-1804) poi, fino alla dissoluzione della possibilità stessa di una metafisica come scienza e di conseguenza di una teologia come scienza sistematica. Da qualche decennio, tuttavia, assistiamo ad una novità nel campo delle scienze che sembrano ricercare, in qualche modo di ritrovare l’analogia per poter adeguatamente affrontare nuovi problemi legati sia alla teoria dei fondamenti logici e matematici delle scienze, sia alla complessità delle strutture auto-organizzantesi. Anche se è ancora presto per pronunciarsi, si direbbe che l’analogia, inizialmente esclusa dal pensiero scientifico per timore dell’equivocità, chieda ora uno spazio ed una formulazione teorica il più possibile adeguata.

III. Analogia e teologia
Il ricorso all'analogia in teologia si rende necessario per molteplici ragioni. Non potrebbe essere diversamente, in quanto la ragione umana, di per sé creaturale, può accostarsi al mistero di Dio solo conservando la distanza fra creatura e Creatore, riconoscendo cioè che si può parlare di Lui non certo in modo univoco, ma neanche equivoco, bensì “analogo”. Nel contesto di una metafisica dell'essere, l'analogia entis consente di accedere all'esistenza di Dio come fondamento dell'essere delle cose e di poter predicare di Dio attributi e perfezioni che si riconoscono presenti, in modo partecipato, nelle sue opere. Ma è lo stesso linguaggio della rivelazione divina, così come presentato dalla Sacra Scrittura, a ricorrere all'analogia in varie delle sue forme sia proprie che improprie, come lo sono ad esempio la metafora, ma anche la “parabola”, per esprimere, servendosi di concetti umani, ciò che di per sé resterebbe trascendente ed inesprimibile. Il linguaggio analogico viene poi utilizzato dalla teologia nel suo tentativo di accostarsi, mediante il ricorso ad immagini e paragoni, ai misteri della fede, ma anche per collegarli fra di loro, cogliendone così l'intima coerenza nel piano salvifico di Dio.

1. La conoscenza di Dio e i nomi divini. Le applicazioni dell’analogia alla teologia si collocano dunque a diversi livelli. Il primo problema che si pone è quello della conoscenza di Dio, sia al livello della sola ragione umana ( DIO, IV.1) che al livello della fede che si fonda sulla conoscenza rivelata di Dio. La teologia ha percorso, tradizionalmente due vie a questo scopo: la prima è la via “apofatica” o “negativa”, tipica della tradizione dell’oriente cristiano, che pone l’accento sul fatto che di Dio possiamo conoscere con certezza ciò che “non è” piuttosto che quello che è. Seguendo questo approccio dalla nozione di Dio viene esclusa, ad esempio, la composizione e quindi la corporeità, la limitatezza, ogni forma di imperfezione, e così via. A questa teologia negativa l’occidente cristiano, trovando appoggio nel riferimento esplicito all'analogia contenuto nel Libro della Sapienza (cfr. Sap 13,5), ha affiancato una teologia “positiva” ( SAPIENZA, LIBRO DELLA, III.3). Basandosi sull’analogia di proporzione semplice, essa permette di riconoscere in Dio una somiglianza con le perfezioni che riscontriamo nelle creature, quali effetti il cui analogato principale è Dio stesso (cfr. Summa theologiae, I, q. 12). Si tratta di una approccio conoscitivo che certamente non dissolve il mistero in quanto, come ricorda il Concilio Lateranense IV, «fra il Creatore e la creatura, per quanto grande sia la somiglianza, maggiore è la differenza» (DH 806).

Un altro problema classico della teologia, strettamente legato a quello della conoscenza di Dio, è quello degli appellativi che si possono attribuire correttamente a Dio (“nomi divini”). Già trattata nel De divinis nominibus dallo pseudo-Dionigi, la tematica viene svolta compiutamente da Tommaso d’Aquino, il quale farà giocare ancora all'analogia un ruolo determinante. Anzitutto egli stabilisce che non vanno attribuiti a Dio i nomi che designano ciò che certamente Dio non è (imperfezioni e limiti ontologici e morali). Poi, dal momento che l’uomo si esprime necessariamente attraverso un linguaggio che denomina primariamente le creature, noi possiamo attribuire a Dio gli appellativi con i quali designiamo le perfezioni delle creature, ma solo analogicamente. Queste ultime, infatti, sono un effetto rispetto a Dio che ne è la causa, una causa che non è conosciuta da noi direttamente. Non possiamo parlarne univocamente perché Dio è una causa infinitamente superiore ai suoi effetti e trascende la loro natura, non rientrando in alcun genere; non equivocamente in quanto c’è un rapporto di causa-effetto, una relazione reale da parte delle creature nei confronti di Dio. Così i nomi delle perfezioni di Dio si dicono secondo un’analogia di proporzione essendo Dio l’analogato principale: quando si dice che Dio è “buono”, lo si dice più propriamente di Dio che è buono in se stesso, che delle creature che lo sono per partecipazione. Altri nomi vengono poi attribuiti a Dio solo metaforicamente: questo accade quando si designa una perfezione attraverso il nome della creatura che la possiede e si attribuisce a Dio il “nome della creatura” anziché quello della perfezione, intendendo riferirgli la perfezione. Ciò avviene ad esempio quando la Sacra Scrittura chiama Dio con gli appellativi di “roccia” o “leone” intendendo attribuirgli le perfezioni della roccia e del leone (cfr. Summa theologiae I, q. 13).

2. Esempi di analogia nella Scrittura. È proprio il linguaggio della Sacra Scrittura ad offrire, mediante i suoi diversi generi letterari, una notevole ricchezza di analogie e di metafore. Ciò è dovuto, come già segnalato, alla necessità di esprimere con parole umane che si rifanno all’uso di termini legati primariamente alle creature, dei contenuti che riguardano la realtà trascendente di Dio, che la sola ragione non potrebbe raggiungere e che non sono oggetto di esperienza comune. È Dio a comunicare il suo volere ed i suoi progetti mediante immagini che fanno appello all'analogia. Ad Abramo si chiede di capire l'estensione della discendenza di cui è chiamato ad essere padre fecendo, se può, un'analogia con l'immenso numero delle stelle del cielo e della sabbia del mare (cfr. Gen 15,5 e 22,17). Il profeta Geremia, un esempio fra i molti possibili, invitato da Dio a guardare come un vasaio modella e quindi distrugge l'opera delle sue mani, per rifarla poi nuovamente, deve così comprendere, per analogia, il rinnovamento che Dio compirà con la casa di Israele (Ger 18,1-4). Saranno poi i profeti stessi a parlare al popolo mediante numerose immagini ed analogie, servendosi di quanto accade nella natura, nella storia personale o nella storia dei popoli (Ez 31,1-14; Os 1,2-9; Dan 2,31-45).

Gesù impiegherà con frequenza il linguaggio delle “parabole” per descrivere, con immagini efficaci e coerenti, la realtà del Regno, al fine di renderlo comprensibile ai suoi ascoltatori. L’espressione «Il Regno dei Cieli [o di Dio] è simile a…» è di uso ricorrente nei Vangeli (cfr. Mt 13,1-51; Mc 4,1-34; Lc 8,4-18). Questo paragone si fonda su un’analogia di proporzionalità. L'impiego di immagini e di metafore istituisce una similitudine tra una realtà nota ed una ignota, o di più difficile comprensione, favorendo la trasposizione di proprietà o di relazioni dall'immagine più nota a quella meno nota. La parabola viene più spesso rappresentata sotto forma di un racconto la cui forza argomentativa consiste nel presentare la narrazione di un fatto — spesso non accaduto, ma verosimile — che l’ascoltatore può comprendere bene e a partire dal quale è indotto, dalla logica, a trarre certe conclusioni. Le conclusioni tratte, in forza dell’analogia, vengono poi applicate anche in questo caso alla realtà inizialmente ignota per farne comprendere alcuni aspetti fondamentali. Il linguaggio delle metafore e delle parabole, o se si preferisce della “narrazione”, è particolarmente confacente alla persona umana, immersa in una storia ove, al di là di molti elementi cangianti, è sempre possibile identificare una serie di relazioni stabili fra l'uomo e le cose, o degli uomini fra di loro, che possono essere utilizzate come coordinate logiche, cosmologiche ed antropologiche, per trasmettere un certo messaggio. Non sorprende pertanto che la Parola di Dio, che di tale struttura conoscitiva e comunicativa ne ha assunto, insieme all'umanità del Verbo, la storia e la logica, vi ricorra come ad una sorta di “linguaggio umano fondamentale”.

Da un punto di vista ermeneutico, il linguaggio analogico mostra nella Scrittura un utilizzo specifico, riconoscibile ad esempio da quello del linguaggio simbolico, pur largamente presente. Nel primo caso è sempre presente un analogato, mentre nel secondo siamo in presenza di un rimando operato oltre i limiti del linguaggio umano, di un segno che indica una realtà diversa da quella conosciuta, cui dirigersi con categorie nuove, non analoghe. Da un punto di vista più generale, va osservato che il simbolo resta incompleto senza l'ausilio dell'analogia. Sebbene più flessibile perché libero dal riferimento ad un analogato, esso corre il rischio di rimandare costantemente fuori di sé, verso altri simboli ancora, lasciando sempre sfuggire l'ultimo orizzonte di comprensione.

3. Utilizzi dell'analogia in teologia. Un uso frequente dell'analogia in teologia lo incontriamo in ecclesiologia, a proposito delle “figure della Chiesa” (cfr. ad es. l’impiego fattone dal Magistero nella Lumen gentium, 6). Il mistero della Chiesa, che trae la sua origine dal mistero della volontà salvifica di Dio Padre, rivelata e compiuta mediante le missioni del Figlio e dello Spirito Santo, partecipa della ricchezza e trascendenza di Dio. Per essere espressa, la realtà della Chiesa necessita anch'essa di analogie di proporzionalità intrinseca od estrinseca. Basandosi su un fondamento biblico e sulla predicazione dei Padri della Chiesa, la teologia propone una serie di immagini: la Chiesa è un gregge guidato da un pastore, la vigna del Signore, una casa edificata sulla pietra angolare che è Cristo, il regno, la famiglia e la dimora di Dio, ma soprattutto è il popolo di Dio e il Corpo di Cristo. Di quest'ultima analogia, verrà osservato, si deve però predicare in senso proprio e non solo metaforico (cfr. Lumen gentium, 7; Pio XII, Mystici corporis, 29.6.1943). Il rapporto fra Cristo e la sua Chiesa viene inoltre paragonato a quello dello sposo con la sua sposa, ma anche a quello del capo con il suo corpo. La particolarità di tali immagini analogiche sta nel fatto che nessuna di esse, da sola, risulterebbe adeguata ad esprimere il mistero della Chiesa (visibile ed invisibile; terrena ed eterna; una, eppure presente in molti luoghi; distinta dal suo sposo, eppure una sola cosa con il suo Capo...), mentre tutte insieme possono concorrere a delucidarne caratteri e proprietà.

Esempi classici di applicazioni dell’analogia sono quelli che si riferiscono alla dottrina sui sacramenti: essi vengono paragonati, quali tappe della “vita cristiana”, alle varie fasi della “vita naturale”, sia personale che sociale, secondo un’analogia di proporzionalità propria. Così il Battesimo è come la “nascita” nella vita cristiana, la Confermazione come il “farsi adulto” del battezzato, l’Eucaristia come il “cibarsi” per il cammino della vita spirituale, e così via (cfr. ad es. Summa theologiae, III, q. 65). Nella vita della grazia poi, il peccato è paragonato alla morte, perché ne vengano intesi gli effetti sull’ anima spirituale, in analogia con quanto la morte determina sul piano corporale. Pur con i limiti propri di qualsiasi paragone, si tratta di utilizzi che hanno senza dubbio favorito la comprensione dei misteri della fede e facilitato la loro trasmissione.

All'interno dei rapporti fra fede e pensiero scientifico, meritano interesse quelle analogie teologiche impiegate lungo la storia per comprendere il rapporto fra la fede e la ragione o, anche, fra la filosofia e la teologia. Nel pensiero medievale si è parlato della filosofia come ancella della teologia. Non di rado presentato in modo riduttivo e strumentale, tale paragone suscitò la reazione ironica di Kant, il quale osservò che l'ancella avrebbe dovuto in realtà precedere la sua signora, come una torcia, per illuminarle la strada. Ma il rapporto fra la fede e la ragione è stato anche visto come una relazione sponsale, sulla scorta di un'immagine già usuale per descrivere il rapporto fra natura e grazia, riservando tuttavia una maggiore dignità alla fede-sposo. La teologia contemporanea parla volentieri dell'analogia mariologica e di quella cristologica. Seguendo la prima analogia, la fede-parola-Spirito viene accolta dalla ragione-ascolto-Maria, generando il frutto della teologia, qui indicata in senso forte come sapienza che partecipa, in forza della Rivelazione, della Sapienza increata che è Cristo. Nella analogia cristologica, la ragione e la fede sono viste in rapporto come lo sono la natura umana e la natura divina nella persona del Verbo di Dio fatto uomo ( GESÙ CRISTO, RIVELAZIONE E INCARNAZIONE DEL LOGOS). Come l'umanità di Cristo offre espressione visibile e storica alla natura e alla Persona divine, così la filosofia e la ragione offrono alla teologia e alla fede il linguaggio necessario per esprimere, in modo evidentemente limitato ed incompleto, però vero, ciò che si conosce per fede, ed appartiene perciò alla trascendenza di Dio.

Dal punto di vista della storia della teologia e dei suoi rapporti col pensiero scientifico, va menzionato il saggio di Joseph Butler (1692-1752) L'Analogia della Religione, naturale e rivelata, con la costituzione e il corso della natura (1736), nel quale l'autore presenta il corso della natura e della storia umana come una grande analogia per comprendere il linguaggio ed il significato della Rivelazione cristiana. L'opera diverrà poi famosa per il grande influsso che eserciterà sul pensiero di John Henry Newman (1801-1890), che riserverà al lavoro del vescovo anglicano numerose citazioni in quasi tutti i suoi libri.

4. L’analogia fidei. Un significato diverso, almeno nella sua origine, da quello che interviene nella filosofia aristotelico-tomista, si rinviene nell’espressione analogia fidei o “analogia della fede”. Questa espressione è presente, originariamente, nella lettera ai Romani dell’apostolo Paolo («Chi ha il dono della profezia la eserciti secondo la misura della fede», Rm 12,6), ove il termine greco analoghía viene impiegato nel senso di “misura”, o “proporzione”. Nella tradizione cattolica questa espressione ha assunto carattere tecnico ad indicare l’adeguatezza e l’armoniosa proporzione tra le verità della fede che non possono entrare in conflitto fra loro. Il Catechismo della Chiesa Cattolica, la definisce oggi nel modo seguente: «Per “analogia della fede” intendiamo la coesione delle verità della fede tra loro e nella totalità del progetto della Rivelazione» (CCC 114). Essa guida nell’interpretazione dell’antico testamento alla luce del nuovo, nella comprensione organica e unitaria di tutto il Magistero, nell’elaborazione della teologia alla luce della tradizione. Essa è fondamentale per una corretta comprensione dello “sviluppo del dogma” che non va inteso come un mutamento del contenuto di verità, ma come un’approfondimento coerente della comprensione della medesima verità rivelata (fonti classiche della comprensione di tale sviluppo in Vincenzo di Lerins, Commonitorium, 53: PL 50, 668; per la teologia, esposizione ragionata in Newman, Lo sviluppo della dottrina cristiana, 1845).

La teologia dei riformatori, specie con Karl Barth (1886-1868) ha fatto uso dell’espressione analogia fidei per indicare nella divina rivelazione l’unica fonte di conoscenza di Dio, contrapponendola alla analogia entis intesa come fondamento della via percorsa dalla ragione naturale per una conoscenza non rivelata di Dio che, nella visione luterana, è negata in radice ( LUTERO). Rifiutando la possibilità di una conoscenza analogica di Dio partendo dal creato, tali autori cercano di fondare la possibilità e l'intelligibilità della Rivelazione unicamente sul dono della grazia: «I nostri concetti e i nostri termini umani — affema Barth —, in quanto nostri, sono totalmente incapaci di esprimere Dio e il suo mistero; la loro possibilità di essere veri viene loro soltanto dalla rivelazione». Per Barth, di Dio si può dire soltanto ciò che Dio stesso dice di Sé, cioè solo la sua Parola, il Cristo. Va tuttavia osservato che tale prospettiva non risolve in modo convincente il problema di fondare l'intelligibilità e la comprensione della parola rivelata, in quanto, sebbene aiutati dalla grazia, la nostra comprensione di Dio continuerà ad esprimersi con le parole del nostro linguaggio, perché le uniche disponibili. In definitiva, non si potrà mai prescindere dalla necessità dell'analogia dell'essere: «se il Cristo può utilizzare tutte le risorse dell'universo creato per farci conoscere Dio e i costumi divini, è perché la parola creatrice ha preceduto ed è il fondamento della parola rivelatrice, ed è perché l'una e l'altra hanno come principio la stessa Parola interiore di Dio. La rivelazione del Cristo suppone la verità dell'analogia» (R. Latourelle, Teologia della Rivelazione, Assisi 1986, p. 425).

Fonte
Alberto Strumìa, Analogia, Dizionario Interdisciplinare di Scienza e Fede
http://www.disf.org/voci/29.asp