vendredi 21 juin 2013

A ordem reina em Berlim!?

Alerta cidadãos!

As manifestações da nova classe média e setores populares brasileiros se organizam como espera. Mas por serem tão jovens e estarem afastadas da tradição proletária de lutas históricas, não sabem que as lutas sociais não podem contar com milagres que transformem a realidade histórica. É interessante ver como essa perspectiva está presente no pensamento de Rosa Luxemburgo em seu último escrito, datado de 14 de janeiro de 1919, e que diz a respeito à derrota do levante operário em Berlim:

“(...) mas, inevitáveis derrotas são a melhor garantia da nossa vitória final... Claro que isso tudo entranha uma condição! E é a de sabermos em que circunstâncias teve lugar cada derrota, quer dizer, se esta foi o resultado de massas imaturas que se lançam à luta ou de uma ação revolucionária paralisada no seu interior pela indecisão, a mornidão e a falta de radicalismo. (...) As massas cumprirão a sua missão, porque fizeram desta nova “derrota” o elo que nos une legitimamente à cadeia histórica de “derrotas” que constituem o orgulho e a força do socialismo internacional. Podemos ter a certeza de que desta “derrota” também há de florescer a vitória definitiva. A ordem reina em Berlim!... Ah! Estúpidos e insensatos carrascos! Não repararam que a sua “ordem” está alicerçada sobre a areia. A revolução se levantará amanha vitoriosa e o terror se estampará em seus rostos ao ouvir anunciar sob trombetas: era, sou e serei”.

Para o romanticismo político, as mobilizações, assim como as ações dos manifestantes são o caos ou a barbárie que quebram a harmonia do princípio burguês. Mas para o socialismo são momentos que fundamentam a espera, da mesma maneira que a profecia clássica não renunciou ao clamor apesar de decepções cruéis. Da mesma forma que a profecia literária vétero-testamentária não predizia eventos imediatos, ou dizia que uma predição prova ser verdadeira pelo fato de realizar-se a curto prazo, o socialismo enquanto atitude de clamor e práxis supõe uma coisa: a cada momento a história se move para o novo, para o que é prometido. Mas como vemos nas palavras de Rosa Luxemburgo, a espera não é uma atitude subjetiva. Acha-se fundada no mesmo impulso de tornar-se. é esse impulso que objetiva transformar a utopia em era de abundância. A realização não é um conceito meramente empírico.

Quando reduzido a algo empírico gera a utopia e, com ela, a decepção por ter a espera como fim objetivo. A espera é passagem. É bem mais que o mito da origem ou que um esperado fim objetivo. Ao contrario, a espera não é coisa objetiva, mas a revolução do novo no velho. O socialismo tem um caráter profético porque vive tal atitude, mas como a profecia todas as vezes que ameaça chegar ao objetivo, derrapa na resignação ou na utopia. Orientado para o novo, a espera inclui dois momentos: o que é esperado é o que virá, porém o que virá não depende apenas da ação humana imediata. Mas o que é esperado é o que tem que vir, o que é requerido, porém o que não é requerido pode ser alcançado pela ação humana. É a tensão destes dois elementos aparentemente contraditórios que faz a profundidade do princípio socialista. Esta tensão faz extremamente difícil a construção da teoria socialista e confere à prática alta importância. O que caracteriza o caráter profético do socialismo é que o profeta requer e promete.

"O que faz vir súbita destruição sobre o forte, de sorte que vem a ruína sobre a fortaleza. Eles odeiam ao que na porta os repreende, e abominam ao que fala a verdade. Portanto, visto que pisais o pobre, e dele exigis tributo de trigo, embora tenhais edificado casas de pedras lavradas, não habitareis nelas; e embora tenhais plantado vinhas desejáveis, não bebereis do seu vinho. Pois sei que são muitas as vossas transgressões, e graves os vossos pecados; afligis o justo, aceitais peitas, e na porta negais o direito aos necessitados. Portanto, o que for prudente guardará silêncio naquele tempo, porque o tempo será mau. Buscai o bem, e não o mal, para que vivais; e assim o Senhor, o Deus dos exércitos, estará convosco, como dizeis". (Profeta Amós).

O profeta -- e este é um dos papéis fundantes da partido comprometido com proletários e excluídos de bens e possibilidades -- relaciona a situação imediata a uma situação sem igual que nunca se apresentará sob essa forma, cujas exigências não se repetirão e cuja realização só acontecerá uma vez. O que é planejado, requer. A realidade orienta nesse sentido, um evento particular puxa para lá, uma constelação de fatos aponta nessa direção: pode ser alcançado, mas também não ser alcançado. Esta conjunção da exigência, assim como a promessa caracterizam a espera como profética. Isso determina a espera socialista, ela se caracteriza claramente como profética. Como a espera está esperando o que é requerido, ela é diferente da espera passiva, que de fato não está esperando. Até mesmo etimologicamente, há na espera mais que um olhar passivo. A espera inclui a ação. Sem a ação, a espera seria uma teoria fútil.


A consciência inspirada pelo mito original da democracia burguesa requer e também age. Entretanto a exigência não é atitude profética socialista. No campo do mito original, a exigência aponta para a manutenção da origem, enquanto a ação procura alcançar aquilo que está nos limites do ciclo que, partindo da origem, não deve voltar à origem.

A exigência não se move no sentido do novo, para o que está além da origem, mas confirma os poderes democráticos e republicanos da origem. A exigência profética socialista, pelo contrário, submete à crítica todos os poderes, democráticos e republicanos. Por ultrapassar a origem não depende de qualquer poder estabelecido. Tal é o sentido de igualdade, da exigência de solidariedade na profecia e no socialismo.

A exigência incondicional, que fala a cada um, faz todos semelhantes. Por isso, o poder perde toda a significação diante da exigência do sentido de igualdade. Isto porque no limite da existência o ser humano é desafiado à realização de seu destino à justiça. é isso que explica a valorização do excluído de bens e possibilidades na profecia e no socialismo. Pelas mesmas razões, daí parte a exigência de se tratar todo ser humano conforme sua destinação, de lhe permitir alcançar a abundância que lhe está proposta e sem a qual a humanidade como um todo caminha para a estagnação.

O ideal do ser é a realização, mas isso não exclui a possibilidade do enfraquecimento extremo do ser, pelo contrário, abundância e fraqueza sempre se fazem presentes. é por isso que a profecia luta contra a opressão do pobre pelo poderoso e para que a injustiça não arraste pessoas ao abismo. E é pelo mesmo motivo que se levanta contra a reificação do ser humano e a favor de um real humanismo.


É por isso que o socialismo considera a situação proletária como crise da sociedade burguesa e como confrontação do romanticismo político. Esta luta contra a opressão não exclui, em muitos casos, o sacrifício das vidas daqueles que combatem, mas exclui todas as ideologias de dominação que procuram justificar a situação de excluídos e proletários.