lundi 12 décembre 2016

Travessias da leitura

Travessias da leitura
Prof. Dr. Jorge Pinheiro


O desafio maior para quem lê é o próprio exercício da leitura. O desejo de conservar o texto em sua aparente literalidade geralmente leva a um caminho oposto àquele que se pretende. Ou seja, é necessário atravessar o texto por diferentes caminhos. É necessário, sem dúvida, lê-lo a partir de sua literalidade, que é nossa primeira leitura. Mas a literalidade nos leva ao símbolo, às imagens que são trasmitidas pelas palavras ou conjunto de palavras. Por isso, o que parece simples e claro, geralmente não é, já que as palavras são imagens e símbolos.

Vejamos um exemplo simples, durante séculos os cientistas descreveram o mundo como semelhante a uma máquina, governando o mundo estavam os princípios de regularidade e ordem. Todas as coisas pareciam a soma das partes: as causas e efeitos estavam ligados linearmente e os sistemas se moviam de modo determinista e previsível. Mas, com o passar do tempo, os cientistas viram que existiam fenômenos que contradiziam a lógica linear: as formas espirais das chamas de fogo, os redemoinhos em correntes e as formações de nuvens, por exemplo, não podiam ser representadas por simples equações lineares.

E a travessia dos textos bíblicos nos mostraram que, para além da linearidade do texto, existe a leitura simbólica que nos remete às construções teológicas. Assim, se existe a realidade imediata do “deserto” como lugar árido, seco e de difícil sobrevivência, a imagem “deserto” nos remete ao conceito teológico de que espiritualmente e, mesmo existencialmente, muitas vezes, somos desafiados a através o “deserto” que não é literal, é simbólico, mas que também existe.

Por isso, falamos de travessias do texto bíblico. Essas travessias podem ser resumidas em quatro caminhos: o literal, a simbólico, o ético e o do futuro. Ora, quando lemos o texto numa primeira vez, sem dúvida, somos obrigados a partir da literalidade dele. E para mergulhar nessa literalidade devemos utilizar recursos de análise e intepretação como, por exemplo, pesquisar as condições e época em que foi escrito, a quem foi dirigido e com que finalidade. Mas também os recursos literários que foram utilizados na sua construção, ou seja, verbos, substantivos, adjetivos, e expressões idiomáticas, por exemplo. E palavras-chave que se destacam no texto serão importantes na compreensão dessa travessia, porque podem e devem ser cruzadas com outros textos que também utilizam as mesmas expressões, o que nos remeterão às imagens e aos símbolos construtores de um conceito teológico. Ou seja, como vimos no caso de “deserto”.

O conceito teológico, porém, vai apontar para o terceiro caminho. O que essa proposta teológica está sugerindo que eu faça? Essa terceira travessia é a da ética, que me exorta a viver de determinada maneira, a partir da travessia teológica. E se eu vivo de determinada maneira, a partir da ética proposta pelo travessia teológica, essa ética aponta para um futuro. Esse é a quarta travessia do texto bíblico. É a via que remete ao meu futuro e da minha comunidade, fruto da ética, que veio da teologia, que nasceu da literalidade do texto.

A esse conjunto de travessias, que fazem a riqueza da leitura e compreensão não linear do texto escriturístico, chamo de complexidade hermenêutica. Desculpem a expressão, mas ela encerra elementos, conjunto de informações, fatos e circunstâncias que têm nexo entre si, mas que navegam num mar aparentemnete caótico, que pode ser entendido como o vazio obscuro e ilimitado que precede e propicia a geração da compreensão final do texto para a vida de uma pessoa ou de uma comunidade. Na construção da leitura complexa do texto, partindo da literalidade, podemos ir mais fundo ainda nesta construção da compreensão do texto se vermos complexidade e caos como aqueles comportamentos imprevisíveis que aparecem em sistemas regidos por leis. Assim, determinadas questões teológicas são praticamente impossíveis de serem compreendidas numa abordagem tradicional de causa-efeito. Mas as dificuldades, às vezes, são atribuídas à impossibilidade de se isolar os ruídos externos ao sistema teológico como, por exemplo, os dogmas confessionais que, muitas vezes, levam às distorções de compreensão.

A compreensão, então, para questões teológicas nem sempre está na procura de mais informações para tentar encontrar uma relação de causa-efeito, mas em entender quais regras básicas regem o comportamento do sistema simbólico de nossa religiosidade judaico-cristã, que tipo de retroalimentação existe, de que forma esta retroalimentação atua no sistema e o tipo e duração dos ciclos de retro-alimentação. Isso é o que chamamos de hermenêutica da dinâmica não-linear ou hermenêutica da complexidade para uso na teologia, onde o caos se refere às áreas de instabilidade de fronteira, o que para nós significa, em termos teológicos, que se move entre o equilíbrio de um lado, em especial a revelação, e a complexa situação randômica da hermenêutica.

Necessitamos a hermenêutica da complexidade para melhor compreender a relação entre a simbologia da revelação e a interpretação e suas expressões estruturais e organizacionais. Essas estruturas são sistemas complexos constituídos por agentes interativos com uma tendência aparente para a auto-organização, pois os crentes nas religiosidades judaico-cristãs são adaptativos, de modo que as regras de seus comportamentos mudam à medida que eles aprendem. Na verdade, esse mundo religioso judaico-cristão não é aquele representado pela metáfora de uma máquina. As coisas são mais do que a soma de suas partes: equilíbrio é morte, causas são efeitos e efeitos são causas, desordem e paradoxo estão em toda a simbologia da revelação.

Por isso, dizemos que uma hermenêutica da complexidade deve levar em conta que se antes, na modernidade, a interpretação foi entendida como aparato de retroalimentação negativo, que possibilitou a construção de dogmáticas confessionais e encaminhou fiéis na direção da correção de seus desvios do plano traçado, à luz da hermenêutica da complexidade o quadro é mais rico. As interpretações de origem iluminista estão corretas para leituras ligadas às rotinas do viver diário, mas no que tange à produção criativa de conhecimento que responda às necessidades das confissões judaico-cristãs no mundo da alta modernidade elas se encontram em crise. Os resultados de suas ações não podem ser definidos porque a estrutura do sistema religioso torna o futuro impossível de ser controlado. O corolário é que o dogma viável não é o resultado de um intento prévio de um intérprete visionário, mas emerge das múltiplas possibilidades lançadas por várias dinâmicas em colisão entre o texto e a vida humana. Assim, nós leitores deveríamos pensar como jardineiros e, em vez de deliberar, deveríamos trabalhar possibilidades.


Na literatura da teologia moderna, os intérpretes controlaram suas produções a partir de estruturas e procedimentos ordenados. Se isso é tudo o que podemos fazer em um mundo complexo, a institucionalidade das confissões judaico-cristãs estão destinadas a seguir o caminho do Tyrannosaurus rex. A tentativa de estabilizar o sistema leva a torná-lo incapaz de interagir com o mundo e possibilitar a criação de alternativas futuras. Os intérpretes modernos enfatizaram que as culturas e os valores compartilhados são essenciais para fazer a leitura da religiosidade judaico-cristã. Em condições dinâmicas, onde o texto escriturístico é formado por múltiplas e variadas possibilidades, hermenêuticas monolíticas provavelmente falharão na geração da criatividade teológica necessária para dotar as confissões de compreensões adequadas. Por isso, as diversidades de opiniões e abordagens são importantes. O pensamento único, que não comporta diferentes visões, pode ter sido um dos fatores cruciais para a crise de parte das confissões judaico-cristãs no mundo moderno e, em especial, nas últimas décadas do século vinte. Os hermeneutas modernos acreditaram que o sucesso das leituras do texto poderia repousar exclusivamente na manutenção do equilíbrio interno ao texto, mas se isso fosse possível, o próprio texto teria deixado de apresentar novidade e a liberdade da religiosidade no século vinte deveria ter sido reduzida à escolha da adaptação certa ou errada. Mas no mundo da complexidade hermenêutica os riscos são muito maiores. 

Primeiro porque equilíbrio exclusivo e permanente da internalidade do texto significa morte, exatamente o contrário do que pensava a velha hermenêutica. Segundo porque em condições não-estáveis o ambiente humano também se fez presente no texto, tanto quanto ele no ambiente humano. As implicações disto significam que as leituras hermenêuticas não podem culpar o mundo por suas falhas: elas devem ser vertiginosamente livres para criar o próprio futuro da leitura. Há um verso de Nietzsche que pode nos servir de guia para uma hermenêutica da alta-modernidade: “Agora celebramos, seguros da vitória comum,/ a festa das festas:/ O amigo Zaratustra chegou, o hóspede dos hóspedes!/ Agora o mundo ri, rasgou-se a horrível cortina,/ É hora do casamento entre a Luz e as Trevas...[1] Nietzsche pensava a ausência de horizontes. Em Além do Bem e do Mal, ele pensa contra a modernidade: faz um libelo contra os valores da modernidade, como o sentido histórico, a objetividade científica e, logicamente, a fé numa razão autônoma. Assim, é o caso de perguntar: é possível continuar existindo algum contato com a chamada realidade hermenêutica, quando a virtualidade, por exemplo, fica indistinguível e até mesmo mais autêntica que o original, quando podemos criar mundos sintéticos que são mais reais que o real, quando a tecnologia glosa a natureza? Quando a hermenêutica livre das dogmáticas confessionais faz caminhos como o filme Matrix?

Mark C. Taylor, hermeneuta norte-americano, percorre sob outras condições questionamentos idênticos aos levantados por Nietzsche. Ao trabalhar a questão da virtualidade na comunidade da alta-modernidade, utiliza um conceito que já vinha sendo usado na crítica literária, a idéia de imagologia. Antes, na teoria literária, e agora na hermenêutica de Taylor, a identidade do texto não pode ser encarada como uma forma de ser plena e apriorística, mas como realidade dinâmica ou relacional, onde se cruzam questões de identidade textual e comunitária, o que também se dá na virtualidade, que acaba sempre por revelar uma dimensão estrangeira, que é manifestação de um outro. Na medida em que há constante busca identitária, o confronto com este outro supõe sempre uma comparação, explícita ou implícita, e se integra naquilo que na terminologia de Taylor será a imagologia, estudo das representações do outro, que também pode ser entendido como virtualidade. Nos últimos anos essa questão tem sido tema da simbologia da revelação, como da própria teologia. As mídias têm demonstrado a força das realidades artificiais. Essa questão, realidade e imagem na comunidade imagológica, já tinha sido analisada por psicólogos da escola piagetiana. Segundo eles, é difícil ensinar a pensar de modo lógico a um menino que está sob o bombardeio de imagens distantes da lógica, como acontece nos programas infantis. E onde até mesmo as entrevistas ao vivo fazem parte da criação de algum gênio da publicidade. A moda e os shows de rock, por exemplo, fazem parte desta realidade onde o que é apresentado pelo entrevistador não tem nada a ver com a realidade da audiência ou com o próprio intérprete/produto, já que suas imagens sofrem uma transformação mágica para poder ser popular, ou pelo menos este é o objetivo. 

Para Taylor, a comunidade imagológica leva à ansiedade que circula acima e debaixo do chão, que tem crescido e emaranhou-se num complexo tecnológico e financeiro. “Com a informação e o dinheiro que correm ao redor do mundo à velocidade da luz, nenhum de nós está seguro, porque qualquer um está no controle. As redes de terroristas assombram a estrutura e através da Web atuam nas comunicações e sistemas financeiros globais. Eles foram mais efetivos utilizando as tecnologias contra nós do que nós em nossa capacidade de usar essas tecnologias contra eles. Nós não seremos capazes de enfrentar redes de terroristas até que melhoremos a compreensão da lógica e operação de nossas próprias redes. Nestas teias emaranhadas e nas redes, está o limite entre nós e eles, dentro e fora, para quem nada é fixo e imóvel, mas restos fluidos e móveis”.[2] E essa discussão é uma discussão sobre o sentido da hermenêutica, porque vivemos um momento de complexidade sem precedentes, onde as coisas mudam mais rapidamente que nossa habilidade de compreender, por isso devemos resistir à tentação de procurar respostas simples, pois o que antes era força interpretativa da hermenêutica moderna agora é fraqueza que nos deixa abandonados à mercê da sorte.[3] Diante disso, será possível distinguir entre realidade e virtualidade na comunidade imagológica, se a tecnologia constrói a nova realidade? Bem, vivemos um mundo colocado em processo de equilíbrio instável, e para entendê-lo devemos ir às margens do sistema.   

A complexidade hermenêutica, na alta modernidade, é vista como marginal e fenômeno emergente. Não está fixa, porque a complexidade é móvel, momentânea e o momento marginal de seu aparecimento é inevitavelmente complexo. Longe de ser um estado, esse momento emergente da hermenêutica reconstitui o fluxo de tempo, enquanto impulso que mantém o texto em movimento. É significante que a palavra momento derive da idéia de impulso em latim, mostrando movimento como sendo também impulso. Embora freqüentemente representasse um ponto simples, o momento hermenêutico é inerentemente complexo. Seus limites não podem ser firmemente estabelecidos, porque sempre estão trocando de modos, que dão fluidez ao momento. Na hermenêutica da alta modernidade vivemos o domínio do intermediário, que a teoria da complexidade procura entender.[4] A dinâmica do caos e da complexidade da hermenêutica parte de certas características que diferem em importância e modos. Um sistema complexo é um sistema único composto de várias partes compatíveis, que interagem entre si e que contribuem para sua função básica, sendo que a remoção de uma das partes faria com que o sistema deixasse de funcionar de forma eficiente. Um sistema de tal complexidade não pode ser produzido diretamente, isto é, pelo melhoramento contínuo da função inicial, que continua a atuar através do mesmo mecanismo, mediante modificações leves, sucessivas, de um sistema precursor. 

O exemplo mais popular de complexidade irredutível foi apresentado por Michael Behe (A caixa preta de Darwin): é a ratoeira. Ela tem uma função simples, pegar ratos, e possui várias partes, uma plataforma, uma trava, um martelo, uma mola e uma barra de retenção. Se qualquer uma dessas partes for removida, o aparelho não funciona. Portanto, é irredutivelmente complexo. Um automóvel, em contrapartida, pode funcionar com os faróis queimados, sem as portas, sem pára-choques, etc, embora chegará um momento em que haverá um mínimo de peças essenciais para seu funcionamento. Originariamente, a teoria do caos foi desenvolvida como um corretivo para os sistemas fechados e lineares de físicas de Newton, pois diante da ausência de ordem, caos é uma condição na qual a ordem não pode ser averiguada por causa da insuficiência de informação. Enquanto a física de Newton imagina um mundo abstrato governado por leis definidas, que determinavam completamente as coisas reais, a globalidade não é transparente porque não temos a informação adequada e necessária para estabelecer leis, assim toda operação é sempre inacessível. A partir dessa compreensão da teoria do caos e da complexidade, duas razões hermenêuticas podem ser destacadas na abordagem dos textos escriturísticos judaico-cristãos. 

Primeiro que os sistemas finitos, como é o caso desses textos, não estão fechados, mas são sistemas abertos. E segundo que os sistemas ou estruturas dos textos escriturísticos judaico-cristãos envolvem relações que não podem ser entendidas apenas em termos de modelos lineares de causalidade. Nos sistemas escriturísticos judaico-cristãos recorrentes é impossível medir as condições iniciais com precisão para determinar as relações causais num período muito limitado de tempo.[5] Então, a imprevisibilidade é inevitável. Ao contrário dos sistemas lineares, nos quais causas e efeitos são proporcionais, nos sistemas escriturísticos judaico-cristãos recorrentes, a avaliação é complexa, porque esses sistemas se auto-alimentam da vida de seus leitores e na recorrência geram causas que podem ter efeitos desproporcionados. Em contraste com a teoria do caos, a teoria da complexidade está menos interessada em estabelecer a fuga ou o caos determinado, pois oscila entre ordem e caos. Assim, o momento de complexidade é o ponto no qual ecossistemas organizados emergem para criar novos padrões de coerência e estruturas de relação. Embora tenha se desenvolvido fora das investigações hermenêuticas dos textos escriturísticos judaico-cristãos, a percepção de teoria da complexidade pode ser usada para iluminar as questões da interpretação dos textos religiosos antigos. Aliás, poderíamos até nos perguntar o que há de comum entre as moléculas que se apressam em auto-reproduzir metabolismos, as células que coordenam esses comportamentos para formar organismos multicelulares[6] e os sistemas dos textos escriturísticos judaico-cristãos? E a resposta, complexa, é óbvia: a possibilidade da vida, que faz a travessia de um regime equilibrado de ordem e caos, é o que há de comum entre esses processos. Donde a hipótese hermenêutica maior é esta: a vida existe enquanto extremidade do caos.[7] 

Partindo da metáfora da física, a vida existe ao lado de um tipo de transição de fase. A água existe em três estados, gelo sólido, água líquida e vapor gasoso. Começamos a ver que idéias semelhantes podem ser aplicadas aos sistemas hermenêuticos complexos. Sabemos que as redes de genomas que controlam o desenvolvimento do zigoto podem existir em três regimes: ordenado congelado, caótico gasoso e líquido aquoso, localizados na região entre ordem e caos. É uma hipótese impressionante que sistemas de genomas ordenem regimes de transição entre uma ordem e o caos. Em tais sistemas, o regime ordenado congelado também coordena as sucessões complexas das atividades genéticas necessárias. Mas, nessas redes, também o regime gasoso caótico, perto da extremidade de caos, pode coordenar atividades complexas e evoluir. A partir das redes, a análise pode ser estendida às comunidades e às dimensões culturais, ou seja, por extensão às leituras interpretativas. Assim, equilibrado entre uma pequena ou grande ordem, o momento de complexidade da hermenêutica na alta modernidade é o meio no qual emerge a cultura de rede.[8]

Taylor projeta a discussão da teoria da complexidade para a hermenêutica ao afirmar que a noção de que as fundações tenham desaparecido é ameaçadora para muitas pessoas, mas que esse assunto é um tema recorrente na teologia. Pensadores importantes na história de filosofia ocidental, como Nietzsche, colocaram tal discussão na ordem do dia e influenciaram pensadores da alta modernidade como Derrida. Uma das coisas que golpeia o pensamento moderno é a ênfase desses filósofos na importância de entender que a idéia de fim de fundamentos é uma metáfora, assim como a teoria da complexidade também é uma metáfora. Ou como afirma Derrida, a metáfora é determinada pela filosofia como perda provisória de sentido, economia sem prejuízo irreparável de propriedade, desvio inevitável, mas história com vista e no horizonte da reapropriação circular do sentido. É por isso que a avaliação filosófica foi sempre ambígua: a metáfora é estranha ao olhar da intuição, do conceito e da consciência. [9] E por isso Derrida dirá que a metafísica é a superação da metáfora, donde ao discutir a hermenêutica devemos levar em conta que há rastros da metafísica nas palavras que usamos: entender é um exemplo disso. Entender algo é não agarrar alguma coisa superficialmente. O ato cognitivo envolve apreensão dentro de condições de superfície e relativos à profundidade. A distinção entre informação e entendimento é muito complexa. No domínio onde as pessoas pensam em informação devemos falar de sobrecarga de informação. Somos bombardeados com informação de todos os tipos. Entender é um modo de organizar e estruturar a informação. Na revolução da informação, dispositivos filtrantes estão começando a emergir. É crucial entender o poder das hermenêuticas que criam estas grades culturais. Este é um dos temas de Imagologies. [10] E essas grades culturais, por sua vez, desenvolvem-se e mudam para prover vigamentos interpretativos que criam possibilidades de construção da compreensão de informação na qual estamos imersos. Temos, então, dois mundos, um é o mundo tradicional, o mundo dos textos escriturísticos judaico-cristãos tal como o recebemos. É um mundo platônico, no qual o assunto percebido é colocado num nível agradável de fundação. Este mundo está presente, mas também está acima, é a transcendência. Esse modelo se torna um modo de saber. Quando começamos a conceber algo, concebemos figurando em termos de modelo. Através do contraste descrevemos um mundo no qual um modelo diferente predomina. Temos interações de planos, modelos e processos. Os textos escriturísticos judaico-cristãos, assim entendidos, podem ser chamados de locais de consumo. Mas uma estrutura não é aquilo que alguém busca, pois o texto enfatiza movimento e troca, troca de informação, etc. Os modelos hermenêuticos de que estamos falamos não são apenas conceituais, pois o conhecimento simbólico dos textos escriturísticos judaico-cristãos emerge de uma interação entre entendimento e as formas de fé, que são filtros através dos quais foram processadas a informação. Se alguém pensa tais categorias como um vigamento historicamente emergente de interpretação, em constante processo de formação, deformação e reforma, estamos diante de um salto como o das tecnologias de produção e reprodução em uma comunidade determinada. Começamos então a ver os modos em que processamos a experiência, onde o conhecimento é constituído em fluxo constante. Não é apenas uma questão de como pensamos, é uma questão de como vemos, ouvimos e tememos. As novas mídias abrem uma percepção nova e capacidades de apercebimento. O ponto em que se faz a troca também é uma questão importante. Uma das coisas que o estruturalismo nos ensinou é que em lugar de ser um local de origem, o texto deve ser entendido como constituído dentro e pelas redes de troca no qual está imbricado. É um tipo complexo de reversão. Pensando nessas estruturas como criadas por um tema original, temos que pensar no assunto como uma função das redes estruturais nas quais está situada. Essas redes estruturais levam a todos os tipos de formas. Podem ser econômicas, sociais, culturais, etc. Entender o texto como constituído por redes de troca é muito importante.
 
O século dezenove viveu a obsessão da genialidade. Mas o que é genialidade? Simples: é originalidade. E ser original na hermenêutica moderna significava não ser influenciado por nada diferente da relação direta texto/intérprete. O intérprete é, então, o imóvel que tudo move da teologia aristotélica. Essa noção de criatividade como absolutamente original definiu a liberdade como autonomia, que não recebe a lei de outro. Em termos hermenêuticos, sem dúvida, a troca da heteronomia pela autonomia foi uma importante troca de condicionamento: significou não receber a lei de outro alguém, mas procurar a lei na internalidade do próprio texto. Isto quer dizer, o texto livre é algo que não é determinado ou que se exclui. Este é o centro referencial da noção de liberdade na hermenêutica moderna. O modelo consistiu em trocar a noção de tema centrado, para uma visão do texto em termos de sistemas de troca nos quais os textos são locais de consumo. 

Tomemos a noção de troca como crucial, mas pensemos em redes. Em lugar de temas que criam estruturas, estruturas criam temas. Cada tema se torna algo como o nó de uma teia infinita de relações. A situação do texto dentro daquela rede que envolve trocas de todos os tipos, econômicas, psicológicas, simbólicas, constitui a particularidade do tema. São as relações que constituem a particularidade de qualquer texto. O texto se torna o que é em virtude de sua situação dentro de redes complexas. Estas, porém, não são redes fechadas e estáveis como os estruturalistas pensaram, mas estão abertas. Então, a subjetividade nunca é um produto acabado, está em mudança porque as redes dentro das quais se inscreve estão em permanente mudança. Por isso, as hermenêuticas podem se desenvolver de diferentes modos. Um dos problemas como percebemos o reino de Deus na terra é que não está separado da maneira como percebemos nossos medos. Assim, vamos ressaltar um aspecto da dogmática: Deus é onisciente e pode controlar tudo, já que nas comunidades modernas tudo está sendo visto. Temos então as economias da representação e da dominação que reforçam nossos medos, pois operam dentro de estruturas de referência que reivindicam para si o referir-se ao outro e são estruturas de ego-referência que usam o outro, humano ou divino, para a conformação de uma leitura de soberania. 

Porém, no esforço para afiançar a identidade intérprete/texto e estabelecer sua presença, o hermeneuta descobre diferença e ausência. Embora lute para negar isto, esta é a realidade. A procura pela presença em autoconsciência conduz à descoberta da ausência. A auto-afirmação e a negação provam estar ligadas indivisivelmente. Ser intérprete aparentemente tornou-se não ser intérprete. A viagem de volta ao ato de interpretar é uma viagem perigosa, pois na representação o texto é quebrado e aberto. A quebra do texto é registrada pelo rastro, que é, em geral, a abertura do texto à exterioridade, à relação enigmática de um interior atravessado pela externalidade. A ausência sempre está presente, e o exterior é sempre isto: morte. O presente vivo sempre é marcado pela morte. E esta morte é a não-conservação que assombra a presença, e dentro do espaço do rastro se inscreve uma cruz que marca o local do desaparecimento do texto.[11] 

Os intérpretes necessitam compreender o que é a realidade imagológica, e como pode ser usada para prover uma interface mais íntima entre o que é humano e a relatividade hermenêutica, e como dados sensoriais se transformam em experiência real. No entanto, o fundamental é analisar a representação que se coloca por trás da imagem e dentro da estrutura. Pode-se dizer que tudo que o computador faz é simulação, mas para definir simulação é necessário respostas científicas e matemáticas. Assim, a realidade da imagem, que poderia ser um novo paradigma, se tornou uma metáfora. É um conceito estranho e provocante, com certo senso de aventura tecnológica. Esta filosofia da hermenêutica leva à uma totalidade estrutural na qual tudo está dentro e tem seu próprio outro. Assim, alteridade e diferença são componentes essenciais da hermenêutica, e a relação entre alteridade e diferença é, em última instância, hermenêutica.[12] Por isso, o texto, nos modernos projetos filosóficos de estruturas totalizantes, é um texto de valor utilitário na construção do intérprete. Quando o texto resiste a este papel, quando recusa ser usado ou consumido, sua territorialidade é invadida ou sua alteridade colonizada.[13] Dessa maneira, a realidade da imagem que o texto nos oferece termina sendo real. Promete a realidade, que deixa de ser metáfora, e se transforma em criação verdadeira. Nesse sentido, a imagem deixa de ser metáfora e se faz metafísica. Assim, a mundialização dos textos escriturísticos judaico-cristãos, a partir das tecnologias, computarização, digitalização, comunicações e internet, criou a partir delas uma perspectiva do que são os textos escriturísticos judaico-cristãos. Ou seja, estamos diante da recorrência da teoria da complexidade. Se a perspectiva anterior era a divisão, a perspectiva da mundialização dos textos é integração forçada. O símbolo do sistema anterior era um muro que dividia o mundo. O símbolo da mundialização é a Web. Estes processos de mundialização criam uma nova cultura de leitura dos textos cuja lógica complexa e dinâmica só agora começamos a entender. O contraste entre grades e redes clarifica a transição do sistema anterior para o de cultura em rede. O sistema anterior nasceu para manter a estabilidade através de relações complexas e situações que deveriam ser simplificadas em termos de grades com oposições precisas. Este era um mundo onde as paredes pareciam prover segurança. Paredes e grades, porém, não oferecem nenhuma proteção diante da possibilidade de se criar teias. Assim, as paredes se desmoronam e tudo começa a mudar. [14] Novas estruturas deslocam o velho, embora isso não signifique a aparição imediata do novo. Nesta situação, as oposições estruturais que tinham formado o pensamento hermenêutico anterior se desfazem e o equilíbrio de forças desaparece. Considerando que as paredes dividiam e traduziam um esforço para impor ordem e controlar, teias relacionam o emaranhado do mundo, transformando conexões nas quais nenhum intérprete está no controle. Como proliferam conexões, a mudança se acelera, trazendo tudo à extremidade do caos.

Partindo de Derrida[15] podemos dizer que o fim do ser humano, como limite antropológico, anuncia-se ao pensamento hermenêutico depois do fim do ser humano como abertura determinada. O intérprete é aquele que tem relação como o fim. E o fim transcendental só pode aparecer e desdobrar-se sob a condição da mortalidade, por isso o intérprete se inscreve na metafísica entre estes dois fins.[16] A unidade destes dois fins do intérprete, a unidade da sua morte, do seu acabamento, do seu cumprimento, envolve os conceitos de temporalidade, lugar e consumação. Dessa maneira, o fim do intérprete sempre esteve prescrito na metafísica, e o que é difícil pensar hoje é um fim do intérprete que não seja uma teleologia na primeira pessoa do plural. 

Nesse sentido, quando a hermenêutica articula a consciência natural e a consciência filosófica assegura a proximidade para si de fixo e central, e aí se produz essa reaproximação circular. Mas, a partir do niilismo o intérprete reconhece que a redução ao ser humano é percebida atualmente como uma redução do ser humano, por isso a noite trazida pelo fim do fundamento é uma noite em que toda identidade texto/intérprete perece. Quando o fundamento desaparece, o intérprete não se levanta autônomo e só. Deixa de estar de pé, deixa de colocar-se a si próprio e ao texto, deixa de ser autônomo e separado. Já não conserva pessoalidade e autoconsciência, já não conserva identidade e autonomia. Por isso, o fim do fundamento encarna a morte de toda hermenêutica autônoma.[17] Mas será que os textos escriturísticos judaico-cristãos, que se pensava firmes e objetivos, que sustentavam as confissões diante das incertezas, desmoronou sob as imagens? Podemos arriscar uma hipótese e dizer que não necessariamente, pois novas hermenêuticas, entre as quais citamos a da complexidade e a da crítica das ideologias, podem fazer a travessias dos textos e criar leituras que vão além. E essa relação imagem versus novas leituras se tornou preocupação hermenêutica, quando se descobriu que ela abria a possibilidade de uma reflexão que rompe as tradicionais relações entre imanência e transcendência.

Se na modernidade a teologia oscilou entre enfatizar a transcendência ou imanência divina, e podemos citar como exemplos extremos Karl Barth, que procurou reafirmar a transcendência diante da degradação da realização humana, e Thomas Altizer, que tentou restabelecer a imanência divina como afirmação dos valores humanos. Nos perguntamos o que a oposição transcendência versus imanência omite? Há elementos de correlação entre transcendência e imanência? Um desses elementos não pode ser a complementaridade? Estes elementos abrem o tempo-espaço de uma relação diferente que subverte as polaridades da reflexão teológica e da hermenêutica.[18] Tal questionamento nos leva a um modo de pensar que nos mantém abertos a uma diferença necessária que não podemos controlar.[19] Isto significa falar dos limites, uma parapráxis que resiste ao fechamento e niilismo do fundamentalismo, que denigre o mundo, e do antifundamentalismo religioso, que santifica o mundo. Nem a não-declaração da religião fundamentalista, nem a declaração positiva do humanismo religioso criam espaços através do qual o sagrado pode ser olhado como afirmação de alteridade e diferença sem fim. Tais questões mostram as falhas das estruturas hermenêuticas totalizantes, ou como afirmou Nietzsche, “a crença fundamental dos metafísicos é a crença nas oposições de valores. Nem aos mais cuidadosos entre eles ocorreu duvidar aqui, no limiar, onde mais era necessário, mesmo quando haviam jurado para si próprios de tudo duvidar. Pois pode-se duvidar, primeiro, que existam absolutamente opostos; segundo, que as valorações e oposições de valor populares, nas quais os metafísicos imprimiram seu selo, sejam mais que avaliações de fachada, perspectivas provisórias, talvez inclusive vistas de um ângulo, de baixo para cima talvez”, [20] expondo a fragilidade da relação entre as estruturas lingüísticas de representação amarradas a um significado transcendental e estruturas sociais, políticas, econômicas de dominação.[21]

Para Maraschin, Taylor tem chamado a atenção para a falácia da hermenêutica platônica.

Permitam-me citar este trecho de um de seus livros: No fim, tudo se reduz à questão da pele. E dos ossos. A questão da pele e dos ossos é a questão do esconderijo e da procura. E essa é também a questão da detecção. Será a detecção ainda possível? Quem são os detetives? Quem são os detectados? Existe ainda alguma coisa que possa ser escondida? Existirá ainda algum esconderijo? Poderá ainda alguém continuar a viver escondido? Será que a pele esconde alguma coisa ou tudo não passa de pele? Peles roçando peles... peles, peles, peles”.[22]

Assim, tudo precisa ser desenredado e nada decifrado. A estrutura pode ser percebida, desenrolada como a linha das meias em todos os pontos e níveis, mas nada haverá debaixo disso; o espaço da escrita é para ser percorrido, não violado. Dessa maneira a escrita ao recusar aceitar determinado segredo, transforma-se em atividade última, atividade essa revolucionária posto que a recusa de fixar sentidos é, afinal, a recusa da hipótese de razão, ciência e lei.[23] Dessa maneira, o fim do fundamento hermenêutico é seguido pela morte do tema autônomo.[24] O desaparecimento de um requer o desaparecimento do outro. Mas, o fundamento não desapareceu simplesmente, ele foi lançado fora. Esta é a questão: o fundamento não morreu, tornou-se humano. Pois, uma das coisas que precisam ser pensadas neste contexto é a mundialização. É o caso de perguntar qual será o impacto das novas hermenêuticas na noção tradicional dos textos escriturísticos judaico-cristãos. Podemos antever problemas quando vemos como os novos processos criam dificuldades para as confissões nacionais. Outra questão é a relação entre espaço e identidade texto/intérprete, já que a geografia e a cultura são fundamentais para o intérprete, enquanto mediação simbólica. Parte do processo de mundialização seguramente é a mundialização dos textos escriturísticos judaico-cristãos e o fluxo livre dos textos através de redes no mundo inteiro, que não estão restritos aos limites nacionais. Infelizmente não se fala do ato hermenêutico propriamente, quando intérpretes livres, usuários dos textos escriturísticos judaico-cristãos, rompem com a geografia produzindo uma desterritorialização, que coloca de lado a relação entre lugar físico e identidade texto/intérprete e de outro a noção de espaço simbólico. 

Da mesma maneira, por serem usuários, ao esquecerem o lugar primário das comunidades de fé, a identidade texto/intérprete pode ser trocada do lugar físico para espaço telemático,[25] criando um tipo diferente de configuração hermenêutica. E esse espaço telemático, o espaço mediado pelas tecnologias de telecomunicações, televisão, rádio e internet, tendencialmente crescem em importância. Os processos de desterritorialização não são totalmente negativos. Se o intérprete livre olha a partir da mundialização e compreende as lutas hermenêuticas presentes no mundo da leitura dos textos das escrituras judaico-cristãs, o esforço para retificar o choque territorial pode ser positivo, pois uma das oportunidades das novas hermenêuticas é criar um espaço para a troca de informações. E isso é muito importante para intérpretes livres que podem entrar nesse espaço para apresentar modos construtivos e criativos. Sem dúvida, há uma conexão entre os tipos de discussões da academia e da cultura relativo às perguntas hermenêuticas feitas pelos jovens estudantes de teologia. Há uma semelhança entre os debates nos Estados Unidos e os tipos de desenvolvimentos que vemos na Europa e no Brasil. Para Taylor, as forças que emergem da mundialização são irresistíveis. A internet criou um foro que nunca existiu. O mundo onde os estudantes vivem e trabalham não é o mundo no qual fomos educados. Nós temos a tarefa de preparar os estudantes para o mundo no qual estão se movendo. 

O mundo seria melhor se nós e nossos estudantes nos encontrássemos no espaço comum de salas de aula globais. Mas, infelizmente, nossa amnésia cultural é extraordinária.[26] Esquecemos que a universidade é uma invenção moderna. O modelo da universidade moderna foi posto abaixo por Kant no fim do século dezoito. A estrutura da universidade moderna tem como modelo a indústria moderna. Parece ingênuo pensar que as mudanças associadas ao modelo industrial, fabricando economia para um contexto pós-industrial de informação não leve a uma universidade da alta-modernidade. E aqui Taylor afirma que a universidade da alta-modernidade será caracterizada por muitas das práticas pós-industriais. O número de universidades será reduzido. Haverá uma crescente especialização dentro das universidades. Como fica cada vez mais difícil para as universidades fazer todas as coisas, a noção de que cada universidade deve ser um todo se desmoronará. O que significa isso? Departamentos serão eliminados, programas serão reconstruídos e reconfigurados. Mas há oportunidades nesta situação.[27] Tipos diferentes de oportunidades educacionais surgirão para as instituições, não só para compartilharem recursos dentro uma nação, mas globalmente. Talvez nem toda universidade precisará de departamento de teologia. Tipos diferentes de instituições vão surgir. Será discutida a viabilidade da educação residencial. 

Terminou a idéia de alguém que recebe educação após o secundário deva ter entre 18 e 22 anos. Pessoas serão educadas em fases diferentes e ao longo de suas vidas e sempre poderão cursar uma faculdade residencial. Atualmente, cursar o colegial via internet já é uma possibilidade. Um dia não só haverá cursos on-line, mas a pessoa poderá participar das discussões de sala de aula sem sair de suas casas. E isso terá um impacto tremendo nas hermenêuticas, no trabalho dos intérpretes e nas leituras confessionais. Por isso, o desafio é repensar sistema e estrutura de tal um modo que possamos imaginar estruturas hermenêuticas não-totalizantes, que possam criar possibilidades para conexão e cooperação, que reconhecem a necessidade e a inevitabilidade de interconexões sem ter essas estruturas repressivas. Se não podemos imaginar aquela estrutura hermenêutica não-totalizante, parece que o futuro é sombrio. Na lógica de redes e teias há um modelo alternativo para sistemas e estruturas. Pensar e cultivar estas redes poderiam criar a possibilidade para superar o impasse no qual nos achamos na relação entre hermenêuticas e as confissões judaico-cristãs. Este é o terreno que precisa ser explorado. Teólogos conservadores acharão tal movimento insatisfatório, resistirão porque imaginar a estrutura hermenêutica não-totalizante vai contra tudo o que eles consideram sagrado. [28]

Para entender a hermenêutica moderna

Diante dos desafios colocados pela hermenêutica da complexidade faz-se necessário percorrer os caminhos da construção hermenêutica na modernidade, já que estamos analisando possibilidades de superação. Enquanto ramo da filosofia, a hermenêutica estuda a interpretação dos textos religiosos. A palavra deriva do nome de Hermes, o mensageiro dos deuses, a quem os gregos atribuíam a origem da linguagem e da escrita e consideravam o patrono da comunicação humana. Assim, hermenêutica provém do verbo grego “hermeneuein” e significa anunciar, interpretar e, também, traduzir. Significa que alguma coisa é tornada compreensível ou levada à compreensão. Alguns autores, no entanto, afirmam que o termo hermenêutica deriva do grego “ermeneutike” que significa ciência, técnica. Seria, então, interpretação do sentido das palavras dos textos: teoria voltada à interpretação dos signos e de seu valor simbólico.

A interpretação faz parte da existência. Nem sempre damos conta de que as escolhas e decisões se fazem a partir de interpretações. Elas se processam ao longo do dia, dos anos e da vida. Mas vamos nos perguntar mais uma vez: o que é interpretação? Questionar radica no que há de mais profundo em nós. Sabemos e não sabemos, queremos e não queremos. O caminho da hermenêutica é a interpretação do caminho como o não-querer e o não-saber de uma questão. Se já soubéssemos o que desejamos na interpretação, não questionaríamos. Por isso, existir é interpretar desafios. Mas o que é a interpretação para que nela se dê o desafio? A interpretação, o questionar e o que somos estão interligados. Quando tomamos como tema a interpretação, é em nossa própria existência que estamos pensando. Interpretar nessa dimensão é interpretar-se. O desafio é: o que é o interpretar para que nele possa acontecer um interpretar-se?


Mas, para entendermos essas dimensões da interpretação vamos em primeiro lugar pensar como se construiu na modernidade o conhecimento hermenêutico. Desde o século dezessete o termo hermenêutica foi empregado no sentido de uma interpretação objetiva das Escrituras Sagradas judaico-cristãs. Spinoza, filósofo judeu, foi um dos precursores da hermenêutica bùiblica. Já para Schleiermacher, teólogo luterano, a hermenêutica não visava o saber teórico, mas sim o uso prático, a técnica da boa interpretação de um texto falado ou escrito. Tratava-se da compreensão, que se tornou a finalidade da questão hermenêutica. Schleiermacher definiu a hermenêutica como reconstrução histórica e divinatória, objetiva e subjetiva, de um dado discurso. Já Wilhelm Dilthey afirmou que há uma dualidade no processo hermenêutico, entre as ciências da natureza e as ciências do espírito, que se distinguem por meio de um método analítico esclarecedor e de um procedimento de compreensão descritiva, assim os eventos da natureza devem ser explicados, mas a história deve ser compreendida. Ele entendia compreensão como a apreensão de um sentido, e sentido é o que se apresenta à compreensão como conteúdo. Dessa maneira, só poderíamos determinar a compreensão pelo sentido e o sentido apenas pela compreensão. O que parece um correr atrás do rabo, já que toda compreensão é apreensão de um sentido. Essa visão de Dilthey acerca da hermenêutica se diferenciava daquela de Schleiermacher, que fazia distinção entre compreensão divinatória e comparativa. Para ele a compreensão comparativa se apoiaria em uma multiplicidade de conhecimentos objetivos, gramaticais e históricos, deduzindo o sentido a partir do enunciado. E a compreensão divinatória daria significação a uma apreensão imediata do sentido. O filósofo alemão Martin Heidegger, em sua análise da compreensão, vai além, ao dizer que toda compreensão apresenta uma estrutura circular, pois para que uma interpretação possa produzir compreensão ela já deve ter compreendido o que vai interpretar.

A partir dessas leituras, podemos falar na modernidade de quatro estruturas básicas de compreensão: (1) estrutura de horizonte, quando o conteúdo singular é apreendido na totalidade de um contexto de sentido, que é pré-apreendido e co-apreendido; (2) estrutura circular, quando a compreensão se move numa dialética entre pré-compreensão e compreensão da coisa, em um acontecimento que progride em forma de espiral, na medida em que um elemento pressupõe outro e ao mesmo tempo faz com que ele vá adiante; (3) estrutura de diálogo, quando mantemos nossa compreensão aberta, para enriquecê-la e corrigi-la; (4) e estrutura de mediação, quando a imediatez se apresenta e se manifesta em todos os conteúdos, mas imbrica à compreensão o mundo e a história. Mas não podemos esquecer que para Dilthey, estes dois métodos hermenêuticos estariam opostos entre si, já que a explicação é própria das ciências naturais, e compreensão é própria das ciências humanas. Ou seja, esclarecemos por meio de processos intelectuais, mas compreendemos pela cooperação de todas as forças sentimentais na apreensão, pelo mergulhar das forças subjetivas no texto. Paul Ricoeur, filósofo cristão reformado francês, no entanto, procurou superar esta dicotomia, afirmando que compreender um texto é encadear um novo discurso no discurso do texto. Isto supõe que o texto seja aberto e que ler é apropriar-se do sentido do texto. De um lado não há reflexão sem meditação sobre os signos e por outro não há explicação sem a compreensão do mundo e de si mesmo.

Travessias subjetivas na construção simbólica

Vamos nesse estudo sobre hermenêutica e por extensão sobre os símbolos e a linguagem utilizar o caminho circular do midrash judaico como forma de aproximação de nosso objeto. E vamos começar pela história contada por um jornalista, o Robson Pereira. [29] Ele relata que quando o antropólogo francês Claude Lévi-Strauss escrevia Tristes Trópicos, publicado em 1955, viveu uma curiosa experiência junto aos índios nhambiquara. Compenetrado em suas anotações, Lévi-Strauss foi surpreendido por índios que pegaram lápis e papel, rabiscaram coisas e depois devolveram a folha. Segundo Pereira, o gesto tinha um significado: os nhambiquara queriam que ele lesse o que haviam escrito. A partir daí, e dos estudos posteriores de Lévi-Strauss, o jornalista concluiu que a leitura pressupõe sempre algum grau de entendimento não contido no que se está lendo. E que por isso, decifrar rabiscos ou palavras não é uma função meramente visual. Mas é necessário recorrer a algo mais, acionar uma complexa rede de neurônios para compreender e dar sentido a um simples conjunto de letras e espaços em branco colocados à nossa frente. Assim, caberá ao escritor fornecer o nível de informações necessário para que o leitor absorva a mensagem. Somente neste caso, o texto terá cumprido integralmente o seu propósito. Talvez por isso Kafka tenha dito que ler é fazer perguntas. Se for assim, cabe ao texto, revelado ou não, instigar o leitor, guiando-o por um labirinto de indagações até um porto seguro. Dessa maneira, podemos dizer que interpretar o texto bíblico, decifrá-lo, arrancar dele significações é um desafio que não se resume a uma pessoa ou a um curto período de anos. É nosso pressuposto que as Escrituras, enquanto automanifestação do Deus criador apresenta mais conteúdos do que é perceptível na leitura de toda uma geração. Aqui há uma dialeticidade que permanecerá no equilíbrio de seus contrários, sem solução ou síntese enquanto houver história, afinal a revelação do que é perfeito dá-se através de um instrumento dinâmico, a linguagem humana. Nossa necessidade histórica de interpretar nasce daí, desse processo construtivo entre significante e significado. Em relação aos textos sagrados, a tarefa do intérprete consiste na explicitação da mensagem através de um raciocínio dirigido e sistematizado. As conclusões nada acrescentam ao significado do texto, pois estavam contidas ali; embora sejam novas, uma vez que diferem do que está escrito. 

Em si não são diferentes, porque estavam gravadas no subsolo do texto, que foi interpretado. Mas por serem as Escrituras obra de um ser infinito, as interpretações nunca se esgotam. Cada novo corte no texto aprofunda o seu sentido, mas sempre é possível avançar. As interpretações se sucedem no tempo, mas se situam no mesmo locus.[30] Assim, cabe ao intérprete reconstruir a realidade sócio-cultural onde o texto foi construído, ao partir do pressuposto de que as Escrituras possibilitam um diálogo que permite uma reconstrução dos significados da natureza humana. Tal estudo deve tomar por base a revelação enquanto projeto de interação. Por isso, a questão antropológica no processo da revelação é determinante, pois o desafio é viver. Nesse processo desigual e combinado da revelação podemos distinguir elementos que se sobrepõem e se complementam. Dentre eles, o mais fascinante é a questão do significado e do significante. A revelação dá-se através de um processo de adequação histórica e lingüística. 

Entretanto esse conhecimento não demanda unicamente a apreensão de uma determinada realidade. Faz-se necessário que esta realidade seja apreendida de determinada maneira, consoante a uma construção de análise e síntese. Como premissa fundante temos que reconhecer uma justaposição entre conhecimento intuitivo e conhecimento discursivo. O conhecimento intuitivo faz-se a partir das condições necessárias para que ele se processe, imediatamente, frente a uma determinada realidade, ao passo que o discursivo requer passar de algo conhecido, através de uma série de juízos, à apreensão do ainda não apreendido. Ao primeiro processo chamamos juízo sintético e ao segundo juízo analítico. Mas a revelação não se dá simplesmente como processo de adequação da mente humana ao novo que lhe é apresentado. É necessário que o novo, inerente ao processo cognoscitivo, tenha um significado. Uma relação de significado em que o ser humano opera como ser significante e o novo como ser significado. Desta forma, a revelação não se processa entre realidades ahistóricas, mas em relação espacial e temporal, exigindo para que a interação humano e realidade se estabeleça que haja algo maior, alguma coisa além de ambos, não causal, mas essencial. No processo da revelação, o ser humano se encontra em construção, já que não é pleno senhor do processo. É um ser colocado no tempo e no espaço, que estabelece relação com a realidade que o cerca dentro do processo cognoscitivo enquanto dimensão humana e histórica. Por isso, dizemos que a hermenêutica exige do estudioso qualidades sem as quais os símbolos serão para ele mortos, e ele morto para eles. Suzane Langer fala da simbolização como “um ato essencial ao pensamento, anterior a ele”, uma necessidade básica da mente. Todo tipo de sensação captada pelos sentidos são transformados em símbolos, idéias elementares que servem para acumular informações de um jeito prerraciocinativo, mas não pré-racional. Langer coloca o cérebro como um grande transformador, e a simbolização como o ponto de partida de toda intelecção. Nossos atos seriam, segundo ela, governados por representações e símbolos de várias espécies. Somente uma parte de nosso comportamento é prática, e o restante surge de uma necessidade interna de expressar estas representações “sem qualquer objetivo de satisfazer outras necessidades, exceto a necessidade de contemplar em ação declarada o processo simbólico do cérebro”. Sendo então tal capacidade, o simbolizar, fundamental para o pensar e o agir, quais seriam as qualidades essenciais do estudioso para que se entenda em profundidade o que é e qual o papel de um dado símbolo, qual sua eficácia em nosso ser? Podemos partir de uma constatação empírica, a de que a revelação se apresenta através do simbólico, em níveis de complexidades crescentes, onde aquilo que é evidente só será visto no desenrolar do texto, com densidade na definição dos símbolos e no entendimento deles. Ou seja, qualquer interpretação deve ser feita com todo o ser e não usando partes do que somos, já que o símbolo faz-se ponte entre as partes visando a construção de uma totalidade maior.

Em nosso midrash, ato de rodear o texto, vamos fazer uma viagem ao redor dos símbolos e trabalhar com as travessias subjetivas que desafiam a interpretação. Em primeiro lugar, torna-se quase impossível tal tarefa sem entender a travessia através da simpatia, enquanto atração pelas significações presentes no texto. Essa travessia simpática traduz a atração que a comunidade de fé tem pelo texto sagrado, na maioria das vezes uma cumplicidade, um amor por este diálogo a que foi chamada. Essa correlação simpática no diálogo está na atitude de colocar o texto como momento de uma revelação que extrapola limites, indo além do momento, atravessando a história em direção ao reino de Deus. Esse choque simpático diante da significação aparentemente deslumbra a comunidade de fé, criando êxtase e adoração. Compreendemos tal postura e acreditamos que nenhum hermeneuta deixará de levar tal fenômeno em conta, mas a tarefa hermenêutica está desafiada a equilibrar-se entre a compreensão desse deslumbramento diante da revelação e a análise dos componentes simbólicos da revelação, responsáveis pela construção do destino humano expressos na redenção, já que tal simbolismo visa manter a ligação com a totalidade do processo histórico e transistórico a que chamamos reino de Deus.

Compreendemos, assim, que os signos nas Escrituras são representações construídas pelas comunidades de fé, que expuseram os estados mentais dessas comunidades. É uma forma de ação onde a pessoa traduz a totalidade da revelação. Esse processo se perpetua através da manutenção dos signos por operações mentais e materiais, conectando as pessoas à sua cultura de fé e apontando sempre em direção ao reino de Deus. E o reino de Deus, nesse processo, se realiza no tempo presente enquanto expressão moral e de significados, que possibilitam a construção da consciência pessoal. Permite que a pessoa ao participar da comunidade ultrapasse a si mesmo, quando pensa, quando age no ato de adoração, quando desfruta das sensações de integração oriundas desta força. É um ato através do qual a comunidade toma forma e existe, por meio de movimentos exteriores, de significações, pois a ação domina a adoração e a comunidade é sua fonte.[31] Há um imbricamento de forças comunitárias, concepções pessoais e significados. Esta é a forma pela qual o texto sagrado age no fiel, através de bases conceituais e coletivas. Assim, para que apareça a consciência coletiva é preciso que se produza uma síntese das consciências particulares, que desencadeia uma multiplicidade de sentimentos, de idéias, de significações.[32] Logicamente todo esse processo está localizado num tempo, com dias e tempos religiosos definidos, e num espaço, numa geografia delimitada. Tais definições permitem que as atividades produzam um acúmulo de imagens, por uma associação de idéias e sentimentos, o que subordina o psicológico à ação religiosa da comunidade. De todas as maneiras, permanece o ato pessoal, embora tenha raízes na comunidade. Esta experiência tão intensa traduz um ponto de vista positivo, de poder, subjetivo, mas eficaz. É a travessia simpática presente em todo o processo da revelação, que o hermeneuta deve perceber presente no texto escriturístico sagrado. Mas se falamos de simpatia, há uma segunda travessia nesta construção, é a fé, compreendida como entendimento que sente o que está além do símbolo. E aqui temos que relacionar símbolo e estrutura, construindo aquilo que Lévi-Strauss[33] chamou de estrutura simbólica, por funcionar como reorganização estrutural ao nível do psiquismo. 

Essa reorganização estrutural possibilitaria a edificação de processos orgânicos, do psiquismo e do pensamento, atuando sobre o inconsciente. Ou seja, atuaria sobre a função simbólica, e por extensão sobre a fonte da história pessoal e seus significados, que tem suas raízes na comunidade onde está inserida a pessoa. E se já vimos as travessias da simpatia e da fé devemos falar da razão, que analisa, ordena e reconstrói noutro nível o símbolo, mas o faz a partir da simpatia e da fé. A travessia da razão cumpre a tarefa de examinar os símbolos num processo de correlação daquilo que está em cima e daquilo que está embaixo. Mas, não poderá fazer isso se a simpatia não tiver lembrado tal relação, se a fé não tiver chamado à cena o que estava oculto. Só então a razão, indo além do discurso se tornará analógica e o símbolo poderá ser interpretado.

Assim, ao entrarmos na semiologia descobrimos uma interpretação que procura romper com a força da comunidade na compreensão do símbolo, favorecendo os processos propriamente simbólicos, entendidos como visões que interpretam o mundo. Mas, um dos problemas da semiologia é exatamente a definição de símbolo. Poderíamos dizer que o símbolo permite a fusão de idéias e imagens, e que por isso poderia ser interpretado de muitos modos, por ser uma forma dinâmica de pensamento, que coloca as idéias em movimento e as mantêm neste movimento. Se for assim, o símbolo é passível de interpretação, mas não de solução. Está é a opinião do exegeta judeu Gershom Scholem, que define o símbolo como uma representação expressiva de algo que em si mesmo está além da esfera da expressão e comunicação, uma realidade escondida e inexpressível.[34] Essa definição de símbolo de fato nos remete ao signo, sinal ou marca, categoria que pode ser subdividida em uma complexa série de associações, em geral de caráter emocional e difícil de descrever.[35] Nestas definições podemos ver a idéia de polivalência dos símbolos, que funcionariam como tijolos numa construção, como conjunto de classificações cognoscitivas que estabeleceriam a ordem no universo, mas também dispositivos capazes de despertar e canalizar emoções.[36] Apesar da importância da teoria dos símbolos, a cultura continuou a ocupar seu espaço como fator emergente que possibilita a centralidade da pessoa, que tem a oportunidade de se expressar no diálogo e transformar a comunidade onde se acha inserida. Assim, a pessoa é a matriz simbólica da comunidade. Essa compreensão nos levará da idéia de diálogo à idéia de conversa, onde não temos apenas duas personagens, a pessoa, a comunidade, mas também aquele que através da revelação abriu a conversa. Nesse contexto, os símbolos passam a ser estudados a partir daquele que chama à conversa, da pessoa e da comunidade. 

Temos então a idéia de símbolos multivocais, ou seja, passíveis de significações, mas ancorados numa nova estrutura, que trabalha com canais de comunicação internos ao texto, mas também expressos na relação entre pessoa/comunidade, representações que traduzem a ordem temporal da estrutura. Essa nova compreensão da estrutura como trindade simbólica nos remete àquele que abre a conversa a partir de sua automanifestação. Nesse sentido, a revelação enquanto texto sintetiza essa automanifestação e por isso deve ser entendida como elemento que possibilita as travessias da simpatia, da fé, da razão e da cultura.

Essas travessias subjetivas fundamentam a natureza genética da linguagem, que se encontra em constante devir. Dessa maneira, significado e significante estão intimamente ligados à linguagem, enquanto revelação e construção histórica e cultural. Assim, compreendemos que, dependendo da utilização de determinado objeto ou realidade, o ser humano conhece de determinada forma, e no processo pode construir conceitos diferentes a partir de um objeto ou realidade anteriores. Podemos inferir ao que isso conduz. A revelação está ligada à vida do ser humano, já que será a própria experiência humana que agregará valor ao objeto ou realidade antes conhecidos e vividos. Dessa maneira, o velho vai gerar o novo, uma essência que transcende, uma universalidade, a partir da própria experiência de vida, que teologicamente podemos chamar de obediência ao mandamento de Deus. Mas ainda não definimos a importância do significado e do ser significante dentro do processo da revelação. Se a revelação é histórica, é importante notar que a própria revelação age sobre a vida humana, sobre a historicidade do ser humano. E mais do que isso, ao definir a historicidade humana muda o próprio meio onde o ser humano vive e atua. Dessa forma, a revelação cria processos de formação, escalas de valores, normas e condicionamentos. E é aí que reside toda a problemática da revelação enquanto conhecimento: como o ser humano, a partir da revelação, pode conhecer a Deus, seu propósito e dar um sentido ao mundo que o cerca, assim como achar o seu papel dentro de todo esse complexo?

A verdade da revelação é o significado que uma determinada realidade tem para a comunidade e a pessoa. Há uma construção intuitiva, quando a experiência da revelação produz uma interação entre o ser humano e a divindade, sem que essa experiência necessariamente influa no processo discursivo de conhecimento. Mas mesmo neste caso o ser humano não abandona ou perde sua formação. Não deixa de ser aquilo que é: pessoa inserida em determinada comunidade. Mesmo quando esse processo dá-se em um nível superior, instantaneamente, sem elaboração discursiva, o ser humano está condicionado pela historicidade de ser cognoscente. E dentro dessa condicionante sempre se processa a interação ser humano/realidade. Aqui, sentimentos e afetividades, que geralmente passam despercebidos, são realçados. Isso porque nesse momento específico, determinada realidade passa a ter significado, que mesmo não sendo inerente, exige que se lhe dê um. E nesse caso o conhecimento da revelação faz do ser humano ser significante. 

Assim a revelação dá ao mundo um significado imanente. O ser humano, enquanto pessoa e comunidade, através da revelação passa a estar dotado de significado, mas ao mesmo tempo este conhecimento, este significado dado, não se dá sem história, mas dentro das limitações de sua própria obediência. Podemos, então, concluir que a partir da revelação o ser humano é o significante da construção da comunidade, pois através do conhecimento da revelação é ele quem historicamente pode modificar causas e efeitos, imprimindo ao processo nova direção. Mas como se processa a relação entre significado e significante, quer no caso isolado da interação entre ser humano e realidade, quer no caso de todo o processo simbólico da revelação? Se dentro do conhecimento da revelação o ser humano é um ser significante, podemos, então, ver que a escala de valores do sistema ético, oferecido pela revelação à comunidade, é parte integrante do significado dado ao mundo pela própria revelação. Donde, dentro de uma interação significado significante existem elementos dinâmicos de transformação.

O universo é o mundo do ser humano. Nesse sentido, aí ele constrói seu habitat. Desta forma, através do significado dado pelo ser humano à natureza, enquanto domínio e expansão, dentro de um significado de utilização que lhe empresta, atua sobre ela, produzindo cultura e transformação. E vejo a cultura como conjunto integrado de costumes, crenças e instituições, onde incluo a revelação e a espiritualidade, além de todos os hábitos e aptidões apreendidas pelo ser humano enquanto membro de uma comunidade. [37] Existem nesta definição duas grandes ordens de fatos, uma que diz respeito à antropologia por tudo que somos, desde nosso nascimento, como características legadas por nossos pais e ancestrais, à qual se liga à biologia e à psicologia; e, de outra parte, todo o universo onde vivemos enquanto membros de uma comunidade. O hermeneuta, armado de uma primeira leitura antropológica, procura fazer na ordem da cultura interpretação idêntica àquela que o cientista faz na ordem da natureza, na medida em que trata de necessidades fundamentais e de necessidades cujas origens estão na antropologia e por isso são idênticas no seio da espécie homo sapiens. Ao hermeneuta que se faz filósofo interessa o geral, mas não pode esquecer as modulações, diferentes segundo as comunidades e as épocas, que se impuseram a uma matéria-prima, por definição, sempre idêntica e presente em todos os lugares. Assim, para o hermeneuta, como para o antropólogo, um dos eixos da discussão é a linguagem, pois ela faz a ponte entre as características e necessidades estruturais do homo sapiens e o fato cultural. É uma característica, uma aptidão que vem da tradição externa, mas ao mesmo tempo é instrumento essencial, o meio privilegiado que dá possibilidade à realização do homo sapiens. Mas, ao mesmo tempo em que é a mais perfeita manifestação da ordem cultural, e, nesse sentido, manifestação histórica, permite o estabelecimento de um relacionamento entre o ser humano e seu Criador. É verdade, no entanto, que o uso da linguagem pelo homo sapiens é mais complexo quando se trata da espiritualidade do que em relação a outras formas estéticas, já que usa e combina não somente elementos fornecidos pela linguagem propriamente dita, mas também elementos brutos, que por assim ser estariam fora da cultura.

A revelação, e o homo sapiens faz parte dela, não pode ser identificada apenas como expressão do Criador, nem somente com os estados que provoca nos sujeitos receptores. Cada estado de consciência subjetiva tem algo de pessoal e momentâneo que o torna inapreensível e incomunicável em seu conjunto, mas a revelação está destinada a servir de intermediário entre seu autor e a comunidade. A linguagem enquanto representação da revelação no mundo sensível, sem nenhuma restrição, é acessível à percepção de todos. Mas, ainda assim, não podemos reduzir a revelação à linguagem, pois acontece que a revelação, deslocando-se no espaço e no tempo, muda de aspecto e reformata conteúdos. A linguagem traduz na maioria das vezes apenas o significante, ao qual na consciência da comunidade corresponde uma significação, dada pelo que têm de comum os estados subjetivos provocados pela linguagem nos membros da comunidade. 

Além desse núcleo central, pertencente à consciência da comunidade há em todo ato de percepção da revelação elementos psíquicos subjetivos, que podem ser entendidos como fatores associativos de percepção emocional e estética. Tais elementos subjetivos podem, por sua vez, ser objetivados, mas somente na medida em que sua qualidade geral ou sua quantidade são determinadas pelo núcleo central, situado na consciência da comunidade. Quanto às diferenças qualitativas, é evidente que a quantidade de representações e emoções subjetivas é mais considerável numa revelação em construção do que naquela que já foi conscientizada coletivamente. O primeiro momento da construção da revelação deixa a cargo do ser humano imaginar quase toda a contextura do tema, enquanto que a revelação conscientizada pela comunidade suprime quase por completo a liberdade de suas associações subjetivas pela enunciação concisa. É desta maneira que, indiretamente, através do núcleo pertencente à consciência da comunidade que os conteúdos subjetivos do estado psíquico do sujeito perceptor adquirem um caráter objetivamente semiológico, similar ao que têm as significações acessórias de uma palavra. Ao negarmos a relação existente entre a revelação com um estado psíquico subjetivo rejeitamos a realidade estética da revelação. Sem esses conteúdos emocional e estético a revelação pode no máximo atingir uma objetivação indireta na qualidade de significação acessória potencial. Porém, não podemos dizer que esses conteúdos emocional e estético fazem necessariamente parte da percepção da revelação, mas, sem dúvida, no processo progressivo da revelação há épocas em que esses conteúdos tendem a reforçá-la, assim com há outras épocas em que perdem força ou mesmo, aparentemente, desaparecem. 

Assim, é no contexto dos fenômenos sociais que a revelação, enquanto fenômeno social distintivo, é capaz de caracterizar e representar época e história. Por isso, não podemos confundir história da revelação com história da cultura, pois a história humana acontece como subconjunto da história da revelação. É verdade que a relação entre revelação e contexto social muitas vezes nos parece mal amarrada. Quando dizemos que a revelação visa a transformação definitiva do contexto social, não afirmamos com isso que ela coincide necessariamente com ele, mas que como signo, tem sempre uma relação indireta com o contexto social, mesmo enquanto metáfora. Assim, da natureza semiológica da revelação decorre que jamais uma revelação específica deve ser explorada como documento histórico ou sociológico sem a interpretação prévia de seu valor documentário ou da qualidade de sua relação com o contexto dado de fenômenos sociais. Dessa maneira, o estudo objetivo dos fenômenos simbólicos da revelação deve considerar cada revelação específica como um signo composto de símbolo sensível criado por Deus; de uma significação ou objeto estético e emocional depositada na consciência da comunidade; e de uma relação com a realidade significada, relação esta que visa o contexto social. O segundo desses componentes contém a estrutura propriamente dita da revelação.

É por isso que dissemos que a revelação tem a função de signo autônomo. Mas ao lado da função de signo autônomo, a revelação tem ainda a função de signo comunicativo. Assim, uma revelação dada não funciona somente como revelação, mas também como fala que exprime um estado da vida, pensamento, emoção, etc. A revelação tem, portanto, uma dupla função semiológica, autônoma e comunicativa. Por isso, vemos aparecer no movimento progressivo da revelação a antinomia relacional da função de signo autônomo e de signo comunicativo. É lógico que não podemos separar ou opor homo sapiens e cultura. Se entendermos por revelação o conjunto das manifestações da divindade no universo no qual vivemos, é claro que a cultura faz parte do homo sapiens e não somente o homo sapiens da cultura. Quando opomos homo sapiens e cultura tomamos o termo homo sapiens num sentido mais restrito, de conteúdo apriorístico. Nesse sentido, homo sapiens e cultura se antepõem porque a cultura não provém do conteúdo apriorístico, mas da tradição externa, isto é, da educação. Mas podemos dizer que a cultura em si, o fato de que existem pessoas, de que essas pessoas falem, sejam organizadas em comunidades que se distinguem uma das outras por costumes e instituições diferentes, tudo isso é parte da comunidade dos homo sapiens, e mais do que isso, é unidade e homogeneidade dessa humanidade.

A simbologia da revelação, enquanto relação entre significante e significado, é relacional. Pois se é ela que faz da pessoa e da comunidade ser significante, permite ao ser humano e sua comunidade transferir ao mundo que o cerca a cosmovisão que utiliza essa mesma significação. Ao fazer significante a realidade que o cerca, o ser humano dá origem a transformações, engendra causas, e passa à construção do futuro, já não como sonho, mas como realidade. Para viabilizar tais transformações é necessário que transfira, enquanto comunidade, novos significados aos processos históricos e sociais. Assim, através da relação estabelecida entre significado e significante encontraremos as causas de conotações. À circuncisão, por exemplo, a partir de determinado momento, daremos a conotação de aliança. A circuncisão se faz aliança, signo, marca de um povo separado, mas só será assim quando pessoas e comunidade que se tornaram significantes lhes dê significado.

A hermenêutica crítica das ideologias

Em nosso labor interpretativo trabalhamos a partir da hermenêutica da complexidade, mas entendemos que o texto está e sempre esteve aberto ao fogo das ideologias e isto é uma das razões que explicam os debates hermenêuticos entre Jesus e os intérpretes literalistas de sua época.  Entendemos ideologia como conjunto de idéias orientado para as ações culturais e religiosas. É um conceito genérico para os processos pelos quais o sentido é produzido, contestado e  transformado, por isso a hermenêutica crítica das ideologias se preocupa em teorizar os processos de produção de sentido como realidades culturais e religiosas. Daí que os interesses da hermenêutica crítica das ideologias se correlacionam com formas diferentes de interpretação, como a crítica cultural, a crítica sociológica e a crítica ética, entre outras. A hermenêutica crítica das ideologias trabalha ao nível de três dimensões: a relação  entre a linguagem e a produção de sentido; os diferentes discursos que atuam no texto; e a natureza das relações de poder. A partir dessas buscas constrói os contextos institucionais dos textos, de sua recepção e a influência exercida sobre os leitores em suas posições sociais específicas. E, particularmente, sempre a utilizo como apoio ao uso que faço da hermenêutica da complexidade. 

Quando utilizamos a hermenêutica crítica das ideologias devemos levar em conta que a consciência humana é sempre cultural, histórica e social, e sofre influência das condições concretas da existência. Isso significa que as idéias nem sempre representam a realidade exatamente como ela é, mas que muitas vezes por causa das determinações culturais, históricas e sociais nos apresentam essa realidade de forma distorcida. Daí a necessidade de trabalhar como a hermenêutica da crítica ideológica para descobrirmos as ideologias que se confrontaram na produção da simbologia da revelação e, também, nas leituras interpretativas de leitores, sejam eles teólogos ou não. A tarefa do hermeneuta, para Paul Ricoeur, na crítica das ideologias é desmascarar os interesses que impedem a realização humana e pautar a construção da linguagem sem limite e coação. Jürgen Habermas, filósofo alemão fundador da hermenêutica crítica das ideologias, e citado utilizado por Ricoeur, apresenta três interesses como constitutivos das ciências: o interesse técnico, baseado nas ciências empírico-analíticas; o interesse prático, que constrói a esfera da comunicação a partir das ciências histórico-hermenêuticas; e o interesse pela emancipação, constituído pelas ciências sociais críticas. A partir daí deve partir a hermenêutica crítica das ideologias, mas, sem dúvida, é o interesse pela salvação e liberdade que funciona nela como mola propulsora. Assim, a crítica das ideologias situa-se na base de atuação das ciências histórico-hermenêuticas, ou seja, a comunicação. É no reconhecimento desse espaço que se constitui a idéia reguladora da conversa livre da dominação. Ora, a comunicação é uma herança cultural da humanidade, uma tradição, que é criada e recriada pela interpretação humana. O ideal da comunicação nada mais é do que uma antecipação, que depende da hermenêutica mesmo para ser anunciada como tal. Ou como disse Habermas:

“Não podemos antecipar simplesmente no vazio, um dos lugares da exemplificação do ideal da comunicação é justamente nossa capacidade de vencer a distância cultural na interpretação das obras recebidas do passado. É bem provável que quem não é capaz de reinterpretar seu passado, também não seja capaz de projetar concretamente seu interesse pela emancipação”.[38]

Parafraseando Heidegger,[39] quando fala dos poetas, podemos dizer que os intérpretes são os vigias da casa do ser, daquilo que somos, são os vigias da linguagem. Por isso, as interpretações são as ações de vigiar a casa do ser, mas não são o ser. Interpretar não é explicar nem analisar, é conduzir à conversa poética, onde o real se manifesta na sua verdade multivocal. A interpretação não substitui a obra da revelação, possibilita a conversa. O intérprete não salvaguarda o mundo que a obra da revelação abre, mas salvaguarda a abertura de mundo. Salvaguardar a abertura de mundo manifesta a obra da revelação como vigor de ter sido no vir a ser do porvir. A interpretação da revelação é acontecer, que não se propõe, criticamente, como a única verdadeira. 

Mas a revelação sempre esconde ideologias, sejam elas as predominantes na comunidade ou aquelas que se encontram à margem. Isto porque os intérpretes, ou aqueles que produzem idéias separam-se dos que produzem coisas e à medida que a revelação vai ficando cada vez mais distante da comunidade real, os que pensam começam a acreditar que a consciência e o pensamento estão, em si e por si mesmos, separados das coisas materiais, existindo em si e por si mesmos. Esse é um fenômeno presente na leitura das Escrituras, já que os intérpretes, devido à ideologia tendem a acreditar na independência entre a consciência e o mundo material. Surge, então, a compreensão das Escrituras como leitura de massas predominantemente ideológica. Assim a ideologia torna-se ideologia quando não aparece sob a forma de sonho, mas como explicação ideal da comunidade. A ideologia surge quando desloca a palavra revelada e apresenta idéias descoladas da revelação sobre o ser humano, o que é o bem, etc. E no século vinte apoiou-se esse tipo de hermenêuticas, que ofereceram às comunidades imagens de ocultamente da realidade comum, apresentando uma lógica ideológica de dominação social e política. Por isso, ao interpretar o texto sagrado somos chamados à conversa com o lado de ocultamento da ideologia, mas também a escutar a voz do real na palavra da revelação. 

Nessa escuta, que advém da apropriação do que somos, a interpretação não é método ou mediação, mas conversa e limite, experiência de sentido e verdade do ser. Interpretar torna-se então abrir-se para a escuta e sentido do ser como ethos. Este abrir-se implica um interpretar-se e não um exteriorizar-se diante do texto escriturístico. Não consiste numa contemplação externa ou interna, mas um abrir-se para a vigência do real, pela qual se dá na interpretação uma experiência da revelação. Nesta, quem advém é o real como mundo. Experienciar a verdade do real como mundo é, então, apropriar-se do que nos é próprio. A apropriação se dá nos limites da travessia. Interpretar-se é experienciar a experiência de ser. Ser é o apropriar-se em toda travessia do vigor de ter sido. Por ter sido é que podemos nos projetar nos caminhos da interpretação. Por isso, a possibilidade e sentido de toda interpretação é a questão da interpretação como possibilidade e sentido. É sempre uma travessia. Tudo isso nos leva à questão da interpretação. E aí voltamos a Guimarães Rosa, quando diz que “mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende”.[40] A questão da interpretação, então, como experiência da revelação nos leva a inversão: à interpretação do desafio. E se aprendemos no exercício de ensinar, nessa aventura vemos que a interpretação como travessia e experiência da revelação são o concentrar-se na espera do inesperado.






[1]  Friedrich Nietzsche, Além do Bem e do Mal, São Paulo, Companhia das Letras, 2002, p. 205.
[2]  Mark C. Taylor, Awe and Anxiety, Los Angeles, Los Angeles Times, 28.09.2001.
[3]  Mark C. Taylor, About Religion: Economies of Faith in Virtual Culture, University of Chicago Press, 1999.
[4]  Mark C. Taylor, The Moment of Complexity, Emerging Network Culture, Capítulo 1, “From Grid to Network”, University of Chicago, 2002, pp. 19-46. 
[5]  Mark C. Taylor, The Moment of Complexity,op. cit., pp. 19-46.
[6]  Mark C. Taylor, The Moment of Complexity, op. cit., pp. 19-46.
[7]  Mark C. Taylor, The Moment of Complexity, op. cit., pp. 19-46.
[8]  Mark C. Taylor, The Moment of Complexity, op. cit., pp. 19-46.
[9]  Jacques Derrida, Margens da Filosofia, Campinas, Papirus, 1997, p.312.
[10] Mark C. Taylor e Esa Saarinen, Imagologies, Routledge, New York, 1994.
[11] Mark C. Taylor, Erring, A postmodern A/theology, Chicago, The University of Chicago, p. 51.
[12] Mark C. Taylor, Tears, p. 93.
[13] Mark C. Taylor, Erring, A postmodern A/theology, p. 29.
[14] Mark C. Taylor, The Moment of Complexity, op. cit., pp. 19-46.
[15] Jacques Derrida, Margens da Filosofia, op. cit., pp. 161-162.
[16] Jacques Derrida, Margens da Filosofia, op. cit., p. 163.
[17] Mark C. Taylor, Erring, op. cit., p. 33.
[18] Mark C. Taylor, The End(s) of Theology, op. cit., p. 242.
[19] Mark C. Taylor, The End(s) of Theology, op. cit. , p. 248.
[20] Nietzsche, op. cit., p. 10.
[21] Mark C. Taylor, Tears, p. 206.
[22] Jaci Maraschin, “Religião e pós-modernidade: a possibilidade da expressão do sagrado”, in Correlatio nº 1, www.metodista.br/correlatio/num_01/a_marasc.htm
[23] Mark C. Taylor, The Moment of Complexity, op. cit., p. 149.
[24] Mark C. Taylor, entrevista a David Lionel Smith, jan. 1997.Nietzsche
[25] Idem, entrevista de Mark C. Taylor a David Lionel Smith.
[26] Idem, entrevista de Mark C. Taylor a David Lionel Smith.
[27] Idem, entrevista de Mark C. Taylor a David Lionel Smith.
[28] Idem, entrevista de Mark C. Taylor a David Lionel Smith.
[29] Robson Pereira, Rabiscos de Nhambiquaras, São Paulo, Agência Estado, 31/05/98.
[30] Renato Mezan, Freud: A Trama dos Conceitos, São Paulo, Editora Perspectiva, 1982, p. 342.
[31] J. A. Rodrigues, Sociologia, Durkheim, São Paulo: Editora Ática,1981, p. 168.
[32] J. A. Rodrigues, idem, op. cit., pp. 171-172.
[33] C. Lévi-Strauss, Antropologia Estrutural, Rio de Janeiro,Tempo Brasileiro, 1967, p. 233.
[34] R. Firth, Symbols, Public and Private, Ithaca: Cornell University Press, 1973, p. 73.
[35] R. Firth, idem, op. cit., p. 75.
[36] R. Firth, idem, op. cit., p. 60.
[37] Georges Charbonnier, Revelação, Linguagem e Etnologia (Entrevista com Claude Lévi-Strauss), Campinas, Papirus, 1989, p.136.
[38] Paul Ricoeur, Interpretação e ideologias, org., trad. e apresent. de Hilton Japiassu, 4.ª ed., Rio de Janeiro: Editora Francisco Alves, 1983, p. 142.
[39] Emmanuel Carneiro Leão, “O pensamento de Heidegger no silêncio de hoje”. In Revista Vozes, 4, 1977, ano 71, p. 6.
[40] João Guimarães Rosa, Grande Sertão: veredas, 6. ed., Rio de Janeiro, José Olympio, 1968, p. 235.