mardi 1 décembre 2015

A nova esquerda -- segunda parte

A nova esquerda -- segunda parte
Jorge Pinheiro, PhD


Para a Polop convergiram antigos militantes do PCB, da Juventude Socialista do PSB do Rio de Janeiro, da Juventude Trabalhista do PTB de Minas Gerais, e socialistas independentes. Entraram para a Polop militantes conhecidos na política e na intelectualidade brasileira, como Theotônio dos Santos, Moniz Bandeira, Ruy Mauro Marini, Juarez Guimarães, Emir e Eder Sader, Michel Lowy e Eric Sachs, mais conhecido pelo pseudônimo de Ernesto Martins. Unificados pela crítica ao PCB e procurando novas fontes teóricas, deram origem à Organização Revolucionária Marxista, que por editar o periódico Política Operária (jornal e depois revista), ficou conhecida como Polop. Esta foi, sem dúvida, a precursora da nova esquerda no Brasil e a primeira organização, depois dos trotskistas, a realizar uma análise da revolução brasileira que confrontou a concepção da revolução por etapas proposta pelo stalinismo.[1] Defendeu a necessidade de elaboração de um programa socialista para a revolução brasileira, que deveria levar em conta a revolução proletária e a insurreição armada. Sua linha de formulação teórica a distanciou dos sindicatos, mas encontrou terreno fértil entre os jovens universitários.[2]

A Polop foi assim uma das matrizes da nova esquerda brasileira, tendo sido o primeiro agrupamento a se organizar como opção partidária ao PCB, em fevereiro de 1961, excetuando as organizações trotskistas. Nesse congresso de fundação, reuniu “círculos de estudantes provenientes da Mocidade Trabalhista de Minas Gerais, da Liga Socialista de São Paulo (luxemburguistas), trotskistas e dissidentes do PCB do Rio, São Paulo e Minas”.[3] Mas, a presença e permanência dos militares no poder levaram a esquerda brasileira a um processo de fracionamentos. Assim, três anos depois do golpe, do fracionamento da Polop surgiram algumas das principais organizações que povoaram o universo da esquerda brasileira no final dos anos 60 e início dos 70: Comando de Libertação Nacional, Vanguarda Popular Revolucionária, Partido Operário Comunista, Vanguarda Armada Revolucionária-Palmares, Organização de Combate Marxista-Leninista-Política Operária, Movimento Comunista Revolucionário e Movimento pela Emancipação do Proletariado.

Desde o seu surgimento, a Polop deu mais importância ao debate teórico e doutrinário dentro da esquerda marxista do que a um projeto de construir uma alternativa política ao PCB. Não chegou, dessa forma, a se constituir em uma organização nacional, embora tenha alcançado certo prestígio nos meios universitários (...)”.[4]

Em permanente choque com as posições defendidas pelo PCB, a Polop não aceitava o chamado para a formação de uma aliança com a “burguesia nacional”, a fim de fazer frente ao imperialismo e à herança feudal no campo brasileiro. Elaborou um Programa Socialista para o Brasil, onde afirmava que o modo de produção no país era capitalista e por isso exigia transformações socialistas imediatas, sem necessidade de uma etapa intermediária, nacionalista-democrática. Com o golpe militar de 1964, a Polop pendeu para a guerrilha, participando em duas articulações em aliança com ex-militares cassados pelo novo regime. A principal delas, a Guerrilha de Caparaó, aconteceu em 1967, liderada por militares vinculados ao Movimento Nacionalista Revolucionário, MNR.

Na verdade, em 1967, aconteceu com a Polop um impacto semelhante ao ocorrido no interior do PCB com a desestalinização. Influenciada pelo movimento guerrilheiro que se alastrava pela América Latina sob a inspiração da Revolução Cubana, viveu duas grandes cisões. A primeira em Minas, quando uma parte dos militantes constituiu o Colina. E em São Paulo, uma ala à esquerda da organização se uniu aos militantes remanescentes do MNR e criaram a Vanguarda Popular Revolucionária, VPR.

Após as cisões que geraram a VPR e o Colina, essa organização restou claramente debilitada. Reagiu a isso, aproximando-se da Dissidência Leninista do Rio Grande do Sul (do PCB) e de mais alguns círculos de militantes, para constituir o Partido Operário Comunista (POC). O POC conseguiu ter certa expressão no Movimento Estudantil de 1968, onde atuava sob a designação de Movimento Universidade Crítica. Suas propostas políticas assinalavam uma nítida continuidade da linha seguida anteriormente pela Polop. Procurou também estabelecer alguma presença junto do meio operário das capitais”.[5]

Em 1970, militantes se desligaram do POC para voltar a constituir a Polop. Fizeram a autocrítica das ações armadas e da estratégia guerrilheira, concentrando seus militantes no trabalho de propaganda junto a operários. E rebatizaram a Polop como Organização de Combate Marxista-Leninista - Política Operária, OCML-PO.[6] Mas essa nova Polop durou pouco. Antes de completar um ano de vida, a organização foi dividida pela Fração Bolchevique da Polop que, em 1976, adotou o nome de Movimento pela Emancipação do Proletariado, MEP. Esse fracionamento colocou um ponto final nos 15 anos de história da Polop. 

O caso da Ação Popular é peculiar. Trata-se de uma síntese construída nos anos 60 entre o socialismo e o catolicismo social. As origens da AP, suas propostas e sua trajetória nos ajudam a compreender subjetividades, potencialidades e contradições de projetos socialistas construídos posteriormente. As relações entre religião e política surgiram então como discussões dentro dos agrupamentos de esquerda: existe uma possibilidade de sacralização da política? Podemos falar em secularização da religião num sentido político? 


Notas

[1] Nilmário Miranda e Carlos Tibúrcio, Dos Filhos deste Solo, São Paulo, Boitempo Editorial, Ed. Fundação Perseu Abramo, 1999, pp. 509-510. 
[2] Jaime Sautchuk, Luta armada no Brasil dos anos 60 e 70, São Paulo, Editora Anita, 1995, p. 33. 
[3] Um relato para a História, Brasil Nunca Mais, Petrópolis, Vozes, 1985, 7a. edição, p. 102. 
[4] Brasil Nunca Mais, op. cit., p. 102. 
[5] Brasil Nunca Mais, op. cit., p. 105. 
[6] Nilmário Miranda e Carlos Tibúrcio, Dos Filhos deste Solo, op. cit., pp. 509-510.