jeudi 11 août 2022

A sabedoria caminha conosco

A sabedoria caminha conosco
Jorge Pinheiro

Comece esta sexta-feira, 12 de agosto de 2022

Uma pergunta que devemos nos fazer é por que estudamos a Palavra de Deus? E, o que pretendemos fazer com o conhecimento que adquirimos? Existem duas possibilidades: estarmos buscando um fim em si mesmo ou procurando conhecer para servir. Se nossa intenção é apenas o conhecimento pelo conhecimento, tendemos a ficar orgulhosos, convencidos e em nada vamos ajudar nosso crescimento na vida espiritual. Mas, se desejamos aprender para servir, estamos no caminho certo. E aí sim, podemos orar como o salmista: 

“Derrama sobre nós as tuas bênçãos, ó Senhor, nosso Deus! Dá-nos sucesso em tudo que fizermos. Sim, dá-nos sucesso em tudo”. (Salmo 90.17). 


Nessas doze travessias da comunhão, apresento estudos semanais e diários que em muito poderão ajudar você em suas reflexões diárias sobre a Palavra de Deus, assim como em estudos que podem ser realizados em grupos familiares ou em escolas bíblicas da sua igreja. Mas também apresento as alegrias e as dores de passagens de minha vida, de minha infância, adolescência, enfermidade, exílio político e caminhada para a morte. São estórias que podem ser lidas por puro prazer ou servirem como ilustrações para discussões. 

Eu e você, e muita gente mesmo, passamos por dores e sofrimentos, por isso, acredito que não estamos falando de algo que nós, mesmo cristãos, não conhecemos. Mas aqui estão também pesadelos, quando o inconsciente revela sua visão do mundo. É difícil dizer qual é maior: o pesadelo ou a realidade da dor. Ambos são terríveis e por isso se complementam. E fica mais fácil entender um no debruçar-se sobre o outro. É, inclusive, difícil dizer qual vem primeiro, já que o pesadelo pode ser sentido como porvir que se faz presente, como leitura de uma estória ainda não contada. Mas não esqueçamos que quem suporta a provação com galhardia e persevera na virtude receberá a coroa da vida. Por isso, nas travessias podemos, afetivamente, viver o bom, justo e verdadeiro, narrar estórias e construir o futuro. 

“A mensagem que Cristo nos deu e que anunciamos a vocês é esta: Deus é luz, e não há nele nenhuma escuridão. Portanto, se dizemos que estamos unidos com Deus e ao mesmo tempo vivemos na escuridão, então estamos mentindo em palavras e ações. Porém, se vivemos na luz, como Deus está na luz, então estamos unidos uns com os outros, e o sangue de Jesus, o seu Filho, nos limpa de todo pecado” (1João 1.5-7). 

A travessia da comunhão com Deus

A palavra comunhão provém do grego koinonia, relacionamento, comunicação, que por sua vez tem como origem koiné, que significa comum. Quando foi traduzida para o latim, agregou o sentido de servir à alguém e de trabalhar junto. 

1. Comunhão é chamado: “Deus é fiel e chamou vocês para que vivam em união com o seu Filho Jesus Cristo, o nosso Senhor" (1a. Carta aos Coríntios 1.9). 

2. Comunhão com o Pai: "Contamos a vocês o que vimos e ouvimos para que vocês estejam unidos conosco, assim como nós estamos unidos com o Pai e com Jesus Cristo, o seu Filho" (1a. Carta de João 1.3). 

3. Comunhão com o Filho: "Porque, onde dois ou três estão juntos em meu nome, eu estou ali com eles" (Evangelho de Mateus 18.20). "Escutem! Eu estou à porta e bato. Se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, eu entrarei na sua casa, e nós jantaremos juntos" (Apocalipse 3.20). 

4. Comunhão com o Espírito Santo: "Que a graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a presença do Espírito Santo estejam com todos vocês!" (I2a. Carta aos Coríntios 13.13). 

5. A quebra da comunhão é distanciamento e separação -- “Vocês estão pensando que o SENHOR perdeu a força e não pode nos salvar? Ou pensam que ele está surdo e não pode nos ouvir? Pois são os erros de vocês que os separam do seu Deus, são as suas maldades que fazem com que ele se esconda de vocês e não atenda as suas orações” (Isaías 59.1,2). 

Endurece o coração -- “Não sejam teimosos, como os seus antepassados foram em Meribá, quando estavam em Massá, no deserto” (Sl 95.8). 

E atrapalha o Espírito -- “Não atrapalhem a ação do Espírito Santo” (1a. Carta os Tessalonicenses 5.19). 

6. Manter a comunhão é um imperativo -- “Um dia, quando estava com os apóstolos, Jesus deu esta ordem: — Fiquem em Jerusalém e esperem até que o Pai lhes dê o que prometeu, conforme eu disse a vocês. (...) Porém, quando o Espírito Santo descer sobre vocês, vocês receberão poder e serão minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judéia e SaMíriam e até nos lugares mais distantes da terra” (Atos dos Apóstolos 1.4 e 8). 

“E todos continuavam firmes, seguindo os ensinamentos dos apóstolos, vivendo em amor cristão, partindo o pão juntos e fazendo orações” (At 2.42). 

“Louvavam a Deus por tudo e eram estimados por todos. E cada dia o Senhor juntava ao grupo as pessoas que iam sendo salvas” (At 2.47). 

7. Os resultados travessia da comunhão com Deus -- “Eu estarei com você e o protegerei em todos os lugares aonde você for” (Gn 28.15). 

“Deus disse: — Eu irei com você e lhe darei a vitória” (Ex 33.14). 

“Moisés disse ao povo: — Quando vocês saírem para combater os inimigos e virem que eles têm mais soldados do que vocês e que têm muitos cavalos e carros de guerra, não fiquem com medo deles. Pois o SENHOR, nosso Deus, que os livrou do Egito, está com vocês” (Deuteronômio 20.1). 

“Quando você atravessar águas profundas, eu estarei ao seu lado, e você não se afogará. Quando passar pelo meio do fogo, as chamas não o queimarão” (Is 43.2). 

“E lembrem disto: eu estou com vocês todos os dias, até o fim dos tempos” (Evangelho de Mateus 28.20). 

Medite nesses exemplos 

Adão tinha comunhão com Deus, mas a desobediência criou o distanciamento. “Naquele dia, quando soprava o vento suave da tarde, o homem e a sua mulher ouviram a voz do Senhor Deus, que estava passeando pelo jardim. Então se esconderam dele, no meio das árvores” (Gênesis 3.8). 

Enoque teve comunhão com Deus e foi arrebatado: “Ele viveu sempre em comunhão com Deus e um dia desapareceu, pois Deus o levou” (Gn 5.24). 

Noé viveu em comunhão com Deus e foi salvo do dilúvio: “Esta é a história de Noé. Ele foi pai de três filhos: Sem, Cam e Jafé. Noé era um homem direito e sempre obedecia a Deus. Entre os homens do seu tempo, Noé vivia em comunhão com Deus” (Gn 6.9-10). 

Abraão, era amigo de Deus e foi abençoado: “Assim aconteceu o que as Escrituras Sagradas dizem: 'Abraão creu em Deus, e por isso Deus o aceitou.' E Abraão foi chamado de 'amigo de Deus'” (Tiago 2.23). 

Moisés também foi amigo de Deus e foi restaurado: “O Senhor Deus falava com Moisés face a face, como alguém que conversa com um amigo” (Êxodo 33.11). 

Mas, Deus também se aproxima daqueles que estão tristes e deprimidos: “Ele fica perto dos que estão desanimados e salva os que perderam a esperança” (Salmo 34.18). E se aproxima daqueles que O procuram: “Mas tu, ó Senhor, estás perto de mim” (Sl 119.151). “Cheguem perto de Deus, e ele chegará perto de vocês” (Tg 4.8). 

Comunhão com Deus 
Charles Haddon Spurgeon 

"Contamos a vocês o que vimos e ouvimos para que vocês estejam unidos conosco, assim como nós estamos unidos com o Pai e com Jesus Cristo, o seu Filho" (1a. Carta de João 1.3). 

Mas vocês sabem, irmão, que a palavra "comunhão" não significa somente concórdia de coração, como também implica no cuidado de levar essa concórdia um pouco mais longe, na conversação ou na mútua comunhão. 

Queira o Espírito Santo conceder que não digamos uma palavra que não se verifique estritamente pela nossa experiência! Mas espero que possamos dizer que temos conversado com o divino Pai. Não O vimos jamais, nem contemplamos Sua forma. Não nos foi dado, como o foi a Moisés, ser colocados na fenda da rocha e vê-lo por trás, ou ver o séquito do invisível Jeová; contudo, temos falado com Ele; temos dito a Ele: "Aba, Pai"; temo-lo saudado com aquele tratamento que veio do nosso coração: "Pai nosso, que estás no céu". 

Temos tido acesso a Ele de tal maneira que não é possível que nos tenhamos enganado. Nós O encontramos e, pelo precioso sangue de Cristo, chegamos até os Seus pés, expusemos a nossa causa diante dEle e enchemos a nossa boca de argumentos; e não foi só do nosso lado que houve fala, pois a Ele aprouve derramar, por Seu Espírito, o Seu amor em nosso coração. 

Enquanto nós sentimos o Espírito de adoção, Ele, por outro lado, mostrou-nos a amorosa bondade de um terno Pai. Sentimos, embora não se ouvisse nenhum som; sabemos, embora nenhum mensageiro angélico nos tenha dado testemunho algum, que o Seu Espírito deu "testemunho com o nosso espírito de que nascemos de Deus". 

Fomos abraçados por Ele — não mais estando à distância; fomos "trazidos para perto pelo sangue de Cristo". Espero, meus irmãos e minhas irmãs, que vocês podem, que cada um de vocês pode dizer, — ainda que preferindo ser mais profundos que isso — Em todas essas coisas tenho tido comunhão com o Pai, pois tenho conversado com Ele, e Ele tem falado comigo". 

Trecho do sermão sobre 1João 1.3, pregado em 15 de setembro de 1861. Fonte: D. M. Lloyd-Jones, "Os Filhos de Deus", Editora PES, pp. 464-465. 

Estudo 

Quem é Deus? 

"Cremos que há um só Deus, que é Espírito – o Criador de todas as coisas – o Pai de tudo, que é sobre tudo, e por tudo e em tudo; o qual deve ser adorado em espírito e em verdade – do qual dependemos continuamente, e a quem rendemos louvor por nossa vida, alimento, abrigo, saúde, enfermidade, prosperidade, e adversidade. Nós O amamos por ser a fonte de toda bondade; e O reverenciamos pois é o ser sublime, que sonda e prova os corações dos filhos dos homens". Confissão de fé valdense, 1554. 

O único Deus vivo e verdadeiro é Espírito pessoal, eterno, infinito e imutável. 

“Deus é Espírito, e por isso os que o adoram devem adorá-lo em espírito e em verdade”. (João 4.24) 

“Escute, povo de Israel! O Senhor, e somente o Senhor, é o nosso Deus” (Dt 6.4). 

“Porém para nós existe somente um Deus, o Pai e Criador de todas as coisas, para quem nós vivemos. E existe somente um Senhor, que é Jesus Cristo, por meio de quem todas as coisas foram criadas e por meio de quem nós existimos” (1Co 8.6). 

“Pois existe um só Deus e uma só pessoa que une Deus com os seres humanos—o ser humano Cristo Jesus, que deu a sua vida para que todos fiquem livres dos seus pecados. Esta foi a prova, dada no tempo certo, de que Deus quer que todos sejam salvos” (1Tm 2.5,6). Leia o Salmo 139. 

Sábado

Deus é onipotente, onisciente e onipresente. 

“Deus disse: Eu sou quem sou. E disse ainda: Você dirá o seguinte: “EU SOU me enviou a vocês” (Êxodo 3.14). 

“Eu sou o Senhor, o Santo Deus de vocês, o Criador de Israel e o seu Rei” (Isaías 43.15). 

“Ao Rei eterno, imortal e invisível, o único Deus -- a ele sejam dadas a honra e a glória, para todo o sempre! Amém!” (1Tm 1.17). 

Domingo

Deus é perfeito em santidade, justiça, verdade e amor. 1Pd 1.16,17). 

“Portanto, orem assim: Pai nosso, que estás no céu, que todos reconheçam que o teu nome é santo” (Mt 6.9). 

“O Senhor diz: Eu sou o Senhor e não mudo. É por isso que vocês, os descendentes de Jacó, não foram destruídos”. (Malaquias 3.6) 

“Tudo de bom que recebemos e tudo o que é perfeito vêm do céu, vêm de Deus, o Criador das luzes do céu. Ele não muda, nem varia de posição, o que causaria a escuridão” (Tiago 1.17). 

Segunda-feira 

Deus é o criador, sustentador, redentor, juiz e Senhor da história e do universo, que governa pelo seu poder, dispondo de todas as coisas, de acordo com o seu eterno propósito e graça. 

“No começo Deus criou os céus e a terra” (Gn 1.1). 

“Quando Abrão tinha noventa e nove anos, o Senhor Deus apareceu a ele e disse: Eu sou o Deus Todo-Poderoso. Viva uma vida de comunhão comigo e seja obediente a mim em tudo” (Gn 17.1). 

“Não há outro deus como tu, ó Senhor! Quem é santo e majestoso como tu? Quem pode fazer os milagres e as maravilhas que fazes? Estendeste a mão direita, e a terra engoliu os que nos perseguiam. Por causa do teu amor tu guiaste o povo que salvaste; com o teu grande poder tu os levaste para a tua terra santa. Os povos ouviram falar do que fizeste e estão tremendo de medo. Os filisteus ficaram apavorados. Os chefes dos edomitas estão assustados, os poderosos moabitas perderam a coragem, e todos os cananeus estão tremendo. O medo e o terror caíram sobre eles. Eles viram o teu grande poder e ficaram parados como se fossem pedras até que tivesse passado o teu povo, o povo que livraste da escravidão. Tu levarás o teu povo para viver no teu monte, o lugar, ó Senhor, que escolheste para morar, o Templo que tu mesmo construíste. O Senhor Deus será rei para todo o sempre!” (Êx 15.11-18). 

Terça-feira 

Deus é infinito em santidade e em todas as demais perfeições. 

“Deus, que fez o mundo e tudo o que nele existe, é o Senhor do céu e da terra e não mora em templos feitos por seres humanos. E também não precisa que façam nada por ele, pois é ele mesmo quem dá a todos vida, respiração e tudo mais. De um só homem ele criou todas as raças humanas para viverem na terra. Antes de criar os povos, Deus marcou para eles os lugares onde iriam morar e quanto tempo ficariam lá” (At 17.24-26). 

“Pois o Altíssimo, o Santo Deus, o Deus que vive para sempre, diz: Eu moro num lugar alto e sagrado, mas moro também com os humildes e os aflitos, para dar esperança aos humildes e aos aflitos, novas forças” (Is 57.15). 

“Agora, vocês que têm juízo, me escutem. Será que Deus faria alguma coisa errada? Será que o Todo-Poderoso cometeria uma injustiça?” (Jó 34.10). 

Quarta-feira 

Deus é triúno, o eterno Deus se revela como Pai, Filho e Espírito Santo, pessoas distintas, mas sem divisão em sua essência. 

“Portanto, vão a todos os povos do mundo e façam com que sejam meus seguidores, batizando esses seguidores em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo” (Mt 28.19). 

“Nessa ocasião Jesus veio de Nazaré, uma pequena cidade da região da Galiléia, e foi batizado por João Batista no rio Jordão. No momento em que estava saindo da água, Jesus viu o céu se abrir e o Espírito de Deus descer como uma pomba sobre ele. E do céu veio uma voz, que disse: Tu és o meu Filho querido e me dás muita alegria” Evangelho de Marcos” (1:9-11). 

“Que a graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a presença do Espírito Santo estejam com todos vocês!” (2Co 13.13). 

Um pouco de história 

Aqui em Les Cèvennes, no sul da França, frequentemente, há reuniões de pastores e comunidades originárias desta região conhecida pelos protestantes como o “país do refúgio”. Mas um dos acontecimentos mais importantes é, sem dúvida, a Assembléia do Deserto, que acontece no verão. Pastores de regiões e países diferentes, na maioria francofônicos, reúnem suas comunidades para cultos conjuntos. Todos de origem reformada, mas que com o passar do tempo se tornaram diferentes, às vezes no que se refere à liturgia, às vezes no que se refere à teologia. Por isso, a Assembléia do Deserto é tão importante, permite redescobrir a fé comum, presente na resistência dos séculos XVII e XVIII, e no estabelecimento do protestantismo no século XIX. 

Embora a grande maioria dos fiéis presentes reconheça suas raízes huguenotes, que deu origem entre outros aos presbiterianos e à própria Igreja Reformada francesa. Também, por influência indireta, pastores e fiéis batistas, metodistas e pentecostais se dirigem à Assembléia do Deserto não muito preocupados com essas origens. Assim, a diversidade do protestantismo europeu se faz presente em Les Cèvennes, no verão, para adorar ao Eterno, realizando cultos nas cidades de Anduze, Saint-Jean-du-Gard e Alès, em reuniões de até novecentas pessoas, o que é um número expressivo quando nos referimos à Europa. 

Os pentecostais se sentem próximos às manifestações inspiradas dos antigos profetas “cèvenols”. Uma dessas correntes que reivindica a tradição profética “cèvenol” é a Mission Timothè, que inquieta os mais tradicionais. 

Quando falamos de “camisards”, temos que voltar ao levante popular, originado com a revogação do Édito de Nantes, em 1685, que deu início a uma violenta perseguição à fé reformada. Os templos foram fechados, os cultos proibidos, pastores obrigados pela força a se converter ao catolicismo ou a fugir para o exílio. Os huguenotes que não fizeram o caminho do exílio para a Suíça, Alemanha, Países Baixos ou a Inglaterra, se refugiaram nas montanhas e nas florestas, formando as primeiras assembléias do deserto. 

Nessa época, se desenvolveu entre os crentes um interessante fenômeno espiritual: o profetismo, que levou camponeses, mulheres e crianças a profetizar, a anunciar acontecimentos extraordinários, chamando à resistência. Em resposta ao testemunho da fé protestante, os “dragonnades”, dragões do rei, católicos arregimentados, atacaram com violência maior os fiéis protestantes. 

Na noite de 24 de julho de 1702, um pequeno grupo de protestantes, liderados pelo profeta Abraham Mazel e por Pierre “Esprit” Séguier atacaram a abadia de Chala. A intenção era libertar um grupo de jovens presos em Pont-le-Monvert. A abadia era também residência do inspetor das missões católicas de Les Cèvennes, a serviço da diocese de Mende, famoso pela perseguição sem piedade que fazia aos protestantes. Nessa noite a abadia foi massacrada. 

Como esses ataques guerrilheiros dos protestantes aconteciam, em geral, à noite, os jovens combatentes costumavam vestir uma camisa branca para serem reconhecidos por seus companheiros durante os combates. Do uso dessas camisas brancas veio o nome “camisard”, que hoje é sinônimo de “maquis”, resistente. Essa guerrilha foi amplamente apoiada pela população de Les Cèvennes e foi crescendo numa sucessão de vitórias. 

Diante das derrotas sistemáticas, no final de 1703, o governo decidiu incendiar todas as vilas, cidades e fazendas que pudessem apoiar os camisards. Em 1704, o profeta Roland foi morto, e, em 1710, o mesmo aconteceu com Abraham Mazel. Mas a igreja protestante resistiu e se reorganizou. Em 1787, com o Édito da Tolerância, depois, em 1789, com a Declaração dos Direitos do Homem, e, em 1791, com a adoção da liberdade de culto pelo governo francês, os protestantes após cem anos de resistência puderam adorar ao Eterno a seu modo. 

E se você vier a Les Cèvennes, no verão, participe dos cultos da Assembléia do Deserto e não se esqueça de fazer uma visita ao Museu do Deserto, na comuna de Mialet, cidade natal de Pierre Laporte, o camisard Roland. O museu, através de objetos usados nos cultos e da vida cotidiana, é um impressionante documento da resistência dos protestantes à perseguição sofrida entre os anos de 1685 a 1789. 

Esses acontecimentos se deram numa época de intolerância religiosa, que não nos autoriza ao ódio contra os católicos. Devemos sim defender a liberdade religiosa, de pensamento e de expressão, deixando que o Espírito toque os corações. E, como os irmãos que hoje se fazem presentes à Assembleia do Deserto, agradeçamos ao Eterno por sua fidelidade, por ter mantido viva a igreja protestante na França. 


A existência e a eternidade 

A vida é matéria-prima da existência humana, mas também motivação que anima a existência, que lhe dá entusiasmo e nesse sentido é espírito, alma e corpo. Não é apenas razão, mas correlação entre o céu e a terra. Quando correlacionamos o céu e a terra surgem questões difíceis de serem respondidas. Entre essas questões podemos citar o esvaziamento, a encarnação e a ressurreição de Cristo. 

Outra questão difícil, por implicar nesse cruzamento da infinitude com a finitude é a própria vida. Nesse sentido, alguns olham esta questão a partir do infinito. E há outros que olham esta questão a partir do finito. Mas há outra maneira de olhar a vida, a partir da humildade do reconhecimento de que estamos diante de um cruzamento do céu com a terra, do infinito com o finito. E é esta perspectiva que orienta a vida. 

Para entendermos a eternidade e a humanidade devemos começar a partir da cruz. O Eterno veio aqui e a expiação acontece quando o Eterno chega até o ser humano, que vive sob a ira da lei. O movimento divino em direção ao humano, que resulta em fé, produz uma “alegre troca”: Jesus toma a natureza humana e entrega aos homens e mulheres sua vida imortal. E nessa cruz está embutida a primeira compreensão daquilo que chamamos de eternidade soberana. 

O que vem de cima é uma esperança. Pois, nos momentos de sofrimento, de cruz e das angústias da morte, é a providência do Eterno que dá garantia da presença da graça nas vidas. 

Dessa maneira, a travessia começa com o ato de ouvir o Evangelho, com o reconhecimento do pecado, mas também da graça de Deus, em Cristo. Continua no atravessar o mar profundo e a secura do deserto e, quando debaixo da sombra da cruz e do sofrimento, é a providência do Eterno que garante a esperança. 

O ser humano não tem como discutir e mergulhar na compreensão da eternidade soberana, por isso a esperança é entregue, vem do infinito nos momentos de dificuldades e sofrimentos. Mas a base é o chamado eterno. A esperança vem da eternidade, mas não acontece como fim, mas como começo e centralidade. Este é um olhar que parte de cima, do ponto de vista do Eterno. 

A eternidade, vista a partir do olhar de Deus, pode ser definida em três palavras: absoluta, dupla e particular. É absoluta porque não está condicionada a nenhuma contingência finita; é dupla porque Deus sabe quem por livre escolha e obra permanecerá na alienação, e quem arrependido, fará o caminho da metanóia; e é particular porque o chamado do Eterno é feito em primeiro lugar a pessoas, e só depois a comunidades. 

Visto a partir da eternidade, céu e terra podem ser entendidos no sentido de que a vida depende dessa chamado do Eterno; e que a própria fé depende dessa conversa de Deus com o ser humano. A eternidade soberana nos apresenta um lado da moeda, e deve ser entendida como esperança, uma confissão de confiança na graça de Deus, de que existe garantia para os momentos de provação. 

Quando olhamos para a humanidade, falamos de necessidades e da graça que está diante dela. Temos a liberdade aceitar ou recusar a vida plena que nos é oferecida, pois Cristo morreu pela vida existente em todas as épocas e lugares. A eternidade não define os seres humanos para o distanciamento, a separação e para o caminhar no rumo contrário ao sentido pleno da vida. 

A eternidade e humanidade podem ser lidas a partir da compreensão da vida. O texto do apóstolo Pedro (2Pedro 3.9) é paradigmático, pois diz que “o Senhor não demora a fazer o que prometeu, como alguns pensam. Pelo contrário, ele tem paciência com vocês porque não quer que ninguém seja destruído, mas deseja que todos se arrependam dos seus pecados”. 

Eternidade e humanidade são correlacionais, não se opõem, mas se complementam levando a compreensão do chamado ao sentido pleno da vida. Esta vida é chamado da eternidade, a partir da graça. É ação, chamado, destino e comissionamento. Ainda que baseada na eternidade, a vida está em perfeita consonância com a liberdade de pessoas e comunidades. Viver de forma plena implica em consciência da ação e ato de viver. 

Assim, existe uma correlação entre infinito e finito. E essa correlação leva à própria ação de viver. Ela é síntese. A eternidade em sua graça cria e mantém a vida, e através de Cristo, chama, destina e comissiona pessoas e comunidades, sob à luz da presciência, e de acordo com a liberdade de cada de cada pessoa e comunidade. 

Entre o céu e a terra está a vida. Por isso, a vida é para todos e acontece através de Cristo por ação graciosa do Eterno. A infinitude presciente e de acordo com a liberdade da finitude relativa entregue ao humano colocou sob chamados, destinos e comissionamentos a vida e os viventes. 

A vida implica em geração e regeneração, relação dialética que é ato inicial em que a eternidade faz crescer o humano. É obra do infinito. Mas geração e regeneração implicam em arrependimento e fé. Arrependimento é mudança na raiz da vida humana. E fé é a confiança e aceitação da vida como comissionamento. Nessa experiência de vida radical o humano pisa na terra, mas se eleva em direção ao céu. E o céu se derrama em direção à terra através do humano. 

Assim, a partir da consistência ontológica do humano, podemos compreender a vida. Quando descartamos a reflexão sobre o ser humano a quem a eternidade fala, temos um discurso meramente ideológico, distanciado do homem e da mulher verdadeiros e da realidade em que vivem e transformam. Temos, então, um ser humano-mito, onde naturalidade e historicidade transformam-se em alegoria. 

O pressuposto fundamental dessa reflexão sobe o sentido da vida traduz a verdade de que a compreensão da eternidade leva à compreensão do humano e de sua existência. Não se trata de conhecer o humano para conhecer o Eterno, porque o finito relativo não é infinito absoluto. Nesse sentido, a vida parte da infinitude absoluta. 

Se a revelação é uma conversa entre a eternidade e a humanidade, é a partir desse diálogo que temos os elementos fundamentais para conhecer a vida, embora ela própria no diálogo adquira características específicas. É nesse contexto que se dá a liberdade de consciência necessária para aceitar ou não esse diálogo de vida e para a vida. 

Por isso, comissionamento é a propagação da vida e de seu sentido ao mundo, visando a geração e regeneração da própria vida. É destino e chamado. A responsabilidade da propagação da vida se estende até os confins da terra. Pessoas e comunidades devem promovê-la. E assim nos posicionaremos radicalmente entre o céu e a terra.