samedi 20 avril 2019

A ceia pascal de 14 de Nissan


A Páscoa do Senhor
Jorge Pinheiro


Nosso texto é

Chegou o dia da Festa dos Pães sem Fermento, dia em que os judeus matavam carneirinhos para comemorar a Páscoa. Então Jesus deu a Pedro e a João a seguinte ordem: – Vão e preparem para nós o jantar da Páscoa. Eles perguntaram: – Onde o senhor quer que a gente prepare o jantar? Jesus respondeu: – Escutem! Quando entrarem na cidade, um homem carregando um pote de água vai se encontrar com vocês. Sigam esse homem até a casa onde ele entrar e digam ao dono dela: “O Mestre mandou perguntar a você onde fica a sala em que ele e os seus discípulos vão comer o jantar da Páscoa.” Então ele mostrará a vocês uma grande sala mobiliada, no andar de cima. Preparem ali o jantar. Os dois discípulos foram até a cidade e encontraram tudo como Jesus tinha dito. Então prepararam o jantar da Páscoa. Quando chegou a hora, Jesus sentou-se à mesa com os apóstolos e lhes disse: – Como tenho desejado comer este jantar da Páscoa com vocês, antes do meu sofrimento! Pois eu digo a vocês que nunca comerei este jantar até que eu coma o verdadeiro jantar que haverá no Reino de Deus. Então Jesus pegou o cálice de vinho, deu graças a Deus e disse: – Peguem isto e repartam entre vocês. Pois eu afirmo a vocês que nunca mais beberei deste vinho até que chegue o Reino de Deus. Depois pegou o pão e deu graças a Deus. Em seguida partiu o pão e o deu aos apóstolos, dizendo: – Isto é o meu corpo que é entregue em favor de vocês. Façam isto em memória de mim. Depois do jantar, do mesmo modo deu a eles o cálice de vinho, dizendo: – Este cálice é a nova aliança feita por Deus com o seu povo, aliança que é garantida pelo meu sangue, derramado em favor de vocês. Lucas 22.7-20.

E os textos de apoio são Mateus 26.17-25, Marcos 14.12-21 e João 13.21-30.

1. O que é o Pessach?

O Pessach é a celebração judaica que recorda a morte dos primogênitos no Egito, a fuga da escravidão e o êxodo dos israelitas para a terra prometida. A palavra Pessach significa “passagem”, “travessia”, e Êxodo 12.12-14 Deus conta o que faria. Podemos dizer que o Pessach judaico é a festa da libertação do Egito e a conquista da liberdade em Canãa.

O nome Pessach, Páscoa, foi adaptado pelos cristãos, e como, muito possivelmente, Jesus morreu no dia 14 de Nissan, que é o dia do início de Pessach, se acredita que a última Ceia de Jesus foi um Seder de Pessach, ou seja, um jantar, uma ceia de Páscoa.

2. A ceia pascal de 14 Nissan

Uma leitura singela da ceia do Pessach. Durante a ceia judaica da páscoa, Jesus disse fazei isto para se lembrarem de mim. A celebração da Páscoa judaica, para nós cristãos, passou a ser o aniversário da crucificação de Jesus. O pão partido durante a ceia é o seu corpo. E o vinho no cálice é a benção do resgate através de seu sangue. Fazer isso, partir o pão, comer a ceia de Páscoa, e beber o vinho do cálice, simboliza a redenção da nova aliança. E devemos celebrar essa ceia em memória dele.  Portanto, é necessário lembrar, que a centralidade dessa ceia pascal é a morte do Messias.

A ordem do serviço da Páscoa judaica começa com uma oração, a bênção do cálice de vinho. E o cálice circula entre os convivas. Em seguida são servidas ervas amargas em água salgada. O chefe da família, que lidera este momento da ceia, apresenta um pão sem fermento, o parte e, em seguida, coloca um pedaço de lado. O participante mais jovem pergunta o que torna essa noite diferente de todas as outras noites? A resposta é dada pela história da primeira Páscoa. Canta-se os Salmos 113 e 114 antes de encher o segundo cálice de vinho.

Antes da refeição, os convivas lavam suas mãos. A ceia começa com bocados de ervas mergulhados em um molho. E há um momento especial, quando um cordeiro assado é repartido entre os comensais. A ceia termina com o canto dos salmos 115 a 118 e do salmo 136, quando se bebe a última taça de vinho.

O memorial da última ceia do Messias, simbolicamente, traz à cena a ceia do Pessach, que prefigura em certa medida as idéias de aliança e redenção. Mas o Pessach judaico nos fala de libertação da escravidão no Egito, da libertação de um reino de opressão e o caminhar em direção à terra prometida. Aponta para o passado e situa todo o acontecimento num espaço geográfico definido. É uma lição para as novas gerações.

A páscoa do Senhor toma os símbolos do Pessach e aponta para o futuro. É, sobretudo, não espacial e não temporal, e aponta para o sacrifício vicário do Senhor Jesus, para a nova aliança feita em cima de seu sangue derramado e para a promessa de sua volta, quando o Senhor instalará um novo Reino de alegria, justiça e paz, eternas. É uma páscoa que nasce nos corações e se projeta na eternidade.

A "páscoa do Senhor", celebrada por Jesus, é diferente da "festa dos pães ázimos" (Levítico 23.6, Lucas. 22.1).

·      É sacrifício vicário (“o que faz às vezes de outro”) de Jesus, conforme ... Depois pegou o pão e deu graças a Deus. Em seguida partiu o pão e o deu aos apóstolos, dizendo: – Isto é o meu corpo que é entregue em favor de vocês. Façam isto em memória de mim.
·      Lucas 22.19.
* É nova aliança de Deus com seu povo, conforme ... Depois do jantar, do mesmo modo deu a eles o cálice de vinho, dizendo: – Este cálice é a nova aliança feita por Deus com o seu povo, aliança que é garantida pelo meu sangue, derramado em favor de vocês. Lucas 22.20.
* É promessa da sua volta, conforme ... Pois eu digo a vocês que nunca comerei este jantar até que eu coma o verdadeiro jantar que haverá no Reino de Deus. Lucas 22.16.

3. O banquete da páscoa

Ela virou e respondeu em hebraico: Meu mestre!

[De Montpellier, França] -- Na sala, o notebook toca música brasileira. Eu, Naira e Paloma convidamos quatro jovens para o almoço de páscoa: Andreas, alemão, que estuda engenharia; Georgine, de Barcelona, que estuda economia; Térèse, alemã, que estuda Teologia; e Serge, de Barcelona, que veio passar uma semana em Montpellier. Jovens cujas famílias estão longe, cristãos na diáspora acadêmica.

Enquanto eles conversam, Djavan canta que amar é um deserto e seus temores, e a vida vai na cela dessas dores. Lá fora, junto ao pinheiro, companheiro da janela da sala, a primavera chega a passos largos. Eu preparo coelho a caçadora e Naira manchon de canard. Essas serão as carnes do almoço. O almoço é a francesa, com toda a liturgia que isso implica. E os Paralamas do sucesso dizem que o calibre do perigo é não saber de onde vem o tiro.

Como vocês notaram estamos em pleno domingo de páscoa. E quando se fala de páscoa, se fala de morte, já que não haveria ressurreição se não houvesse morte. Donde, procedem os temores de Djavan e dos Paralamas. E isso me leva à teologia, através de um velho amigo dos últimos anos, Paul Tillich.

Ele conta em sua autobiografia, “Minha busca pelo Absoluto”, que a primeira Guerra Mundial colocou um ponto final em sua formação, pois sua geração foi chacoalhada de tal maneira pela guerra, que deixou para trás sua existência individualista e predominantemente teórica.

Tillich serviu como capelão do exército alemão de setembro de 1914 a setembro de 1918. Ele conta que “antes que as primeiras semanas tivessem passado, meu entusiasmo original desapareceu, e depois de alguns meses me convenci de que a guerra duraria indefinidamente e arruinaria toda a Europa. Acima de tudo, vi que a unidade das primeiras semanas era uma ilusão, que a nação estava fendida em classes, e que as massas industriais consideravam a Igreja como um aliado incontestado dos grupos governantes. Esta situação se tornava mais clara conforme se aproximava o fim da guerra. Produziu a revolução que fez desmoronar a Alemanha imperial. O modo como tal situação deu origem ao movimento socialista religioso na Alemanha já foi descrito. Porém, eu quero acrescentar algumas reflexões”.

Revela que apoiou o movimento socialista que fez a revolução de 1918 na Alemanha, revolução que foi morta pela fraqueza dos próprios socialistas, por seus erros políticos, como a utilização do Exército na repressão aos comunistas; por razões econômicas, como a inflação galopante; e pela volta das forças reacionárias que cresceram nos anos vinte. “Minha empatia com os problemas sociais da revolução alemã teve raízes em minha infância (...). Talvez fosse uma gota do sangue que induziu minha avó a construir barricadas na revolução de 1848, talvez a impressão deixada pelas palavras dos profetas hebreus contra injustiça e pelas palavras de Jesus contra os ricos, estas palavras eu aprendi de cor quando menino”.

E Tillich constata que essa empatia aumentou com o passar dos anos e se transformou em militância socialista religiosa que, depois da segunda Guerra Mundial definhou em resignação e amargura por ver o mundo dividido em dois grupos todo-poderosos, que esmagaram as sobras de um socialismo democrático e religioso. Mas, confiante no futuro,  afirma: “se a mensagem profética é verdadeira não há nada além do socialismo religioso”.

Quando Tillich fala de socialismo, fala da necessidade incondicional de justiça, presente no coração humano, e que deve fundamentar toda ação política. E isso só é possível se o amor ágape fecundar a política e produzir frutos de justiça. Por isso, socialismo verdadeiro é aquele socialismo que está pleno de sentido último [ultimate concern] e transcendência. Se isso não se der, o socialismo se transformará em quase-religião, idolatria que violenta e oprime o ser humano.

Ao falar de páscoa, ao nos lembrarmos da ressurreição, nos vem à mente os dois dias e meio de silêncio e tristeza, que marcaram a pós-morte de Jesus. Por que esses quase três dias? Na verdade, eles fazem parte de uma pedagogia que transcende. Através desses quase três dias de silêncio e tristeza, Deus possibilitou aos discípulos a aprendizagem da unidade do corpo. Em meio ao silêncio daqueles que fogem e se escondem, em meio ao silêncio da dor da separação daquele que é querido, e da tristeza diante daquele que está morto, mas devia estar vivo, os discípulos se uniram, abandonaram velhas brigas e juntos oraram pela misericórdia daquele que é amor.

A unidade foi selada por condições tão adversas. E Jesus levantou-se para dizer que o que separava não separa mais. Agora, ao invés de silêncio temos louvores; ao invés de tristeza, alegria; ao invés de morte, vida.

E assim, como a primavera que cobre de flores o jardim em frente de minha casa, que faz algumas semanas estava seco, a páscoa possibilita o encontro. Estamos reunidos ao redor de uma mesa, brasileiros, espanhóis, alemães. Oramos em francês, mas falamos também em português, espanhol, alemão.     

Quero dizer a Djavan que de fato há o momento do deserto, do temor e da dor, mas já não pode durar para sempre. Quero dizer aos Paralamas que já sabemos de onde vem o tiro, por isso o perigo pode ser enfrentado. A mensagem é verdadeira e por isso o mundo será coberto pela justiça. O Cristo ressurreto nos une, e o mundo conhecerá sua glória e o amor que tem por nós.

O banquete da páscoa estava delicioso, porque foi multiplicado, porque foi ágape de paz, amor e justiça.

Jesus disse: Não me segure, pois ainda não subi para o meu Pai. Vá se encontrar com os meus irmãos e diga a eles que eu vou subir para aquele que é meu Pai e o Pai deles, o meu Deus e o Deus deles. [João 20.16-17].

4. Então, o que é a Páscoa do Senhor?

* É sacrifício do Primogênito de Deus para nossa libertação do pecado
* É aliança eterna que começa aqui e se projeta na eternidade
* É a Sua volta, quando celebraremos com Ele a festa eterna da Páscoa, que é libertação pecado, mas também celebração da vida eterna!