vendredi 20 octobre 2023

Cristianismo social - a fé em movimento

A fé em movimento

Jorge Pinheiro - Fraternidade da Cruz huguenote





O clamor ético procede porque em nosso país o cristianismo é a primeira consciência que a pessoa tem de si mesmo, e as relações morais são relações de formatação cristã. Tal realidade, de forma paradoxal, se expressa também no cristianismo conservador e fundamentalista. Isto explica porque as massas, enquanto oprimidas e passivas, vivem a ideologia das classes dominantes e aceitam as respostas que o sistema oferece de forma ambígua para as suas necessidades. 

Ao aceitar esse cristianismo de superestrutura das classes dominantes, enquanto rito simbólico do triunfo dos dominadores, as massas se colocam sob resignação passiva. Por isso, é tarefa dos cristãos sociais verificar a realidade e desmascarar a santidade da auto-alienação. Devem, sem dúvida, fazer a crítica do céu para que se transforme em crítica da terra. Mas, também procede a crítica que o cristianismo social faz, quando diz que o ateísmo, por negar a necessidade da essencialidade perde sentido, pois, ao negar afirma, através da negação, a existência do humano. 

O cristianismo social não necessita dessa mediação, já que surgiu como consciência teórica e prática do humano e da natureza como essência. O cristianismo social, então, deve fazer a negação da negação da emancipação e da recuperação humana, enquanto princípio, embora não seja nem o fim do desenvolvimento humano, nem a forma última da sociedade humana. Diante disso, os cristãos sociais precisam entender que sua militância faz parte de uma luta mais ampla, onde o cristianismo infraestrutural é aliado estratégico de trabalhadores e de reformadores sociais e que o ateísmo, por isso, é ocultamento, pois fecha as portas ao aliado estratégico, que se fará presente enquanto houver seres humanos obstinados pela responsabilidade diante do excluído, sentido incondicional de justiça, esperança de um kairós. 

Para o cristão social a história brasileira e nela as possibilidades do partido de classe de operários e trabalhadores em geral serão uma produção das massas em movimento, a partir da ação de milhões de excluídos, que transformarão, criarão uma nova cultura e produzirão o nascimento de uma nova sociedade. É num processo permanente que os trabalhadores e seus partidos constróem sua essencialidade: do ser humano em direção ao ser humano. 

O êxito nesse processo depende das condições de possibilidade, donde é impossível separar teoria e práxis. Por isso, os cristãos sociais dentro dos partidos de operários e intelectuais sociais propõem a integração dos princípios na escolha de fins, que permitam levar à práxis de libertação aqueles que estão excluídos. E diante da crise, o cristianismo social chama pessoas e comunidades à co-responsabilidade pela construção de uma nação com identidade própria, e estimula os cristãos, em nome da sua fé, a se engajaram na política, pois vale a pena servir a uma causa que ultrapassa o momento da crise: a política será um exercício de amor maior. 

A práxis participativa e o potencial entrevisto nas formas de uma economia solidária devem ser repensadas como formas avançadas de construção do poder: um projeto de transição, que pode abrir espaços de experiência social para dar a essas inovações um caráter nacional. A práxis do cristianismo social pode ser, também, uma forma de disputar valores na democracia de participação e representativa com os poderes do liberalismo. E como dissemos, neste encontro entre cristianismo social e partidos de trabalhadores deve-se repensar as relações entre utopia, aquilo que se almeja, o solidarismo social, e o kairós, a revolução, questão colocada pela teologia social de protestantes e católicos. O conceito de transição formulado no contexto de avanços da democracia direta e participativa atualiza seu sentido, unindo as conquistas do cotidiano com a noção de uma civilização organizada fora dos parâmetros dominantes do mundo do capital e da opressão. 

E porque as utopias brasileiras não cessaram de interrogar-se sobre suas origens, um partido dos trabalhadores deve revisitar a práxis das comunidades cristãs, católicas e protestantes, solidárias sociais e religiosas, que se fazem presentes como forças básicas de sua formação. Conhecer suas origens, transformar-se a si mesmo para transformar o mundo: neste campo da práxis não há derrota definitiva para as forças da emancipação. O cristianismo, enquanto síntese de práxis, adquiriu no processo da civilização brasileira uma universalização. Nesta dialética entre comunidade cristã e povo brasileiro, o ideal de justiça é redentor, pois trará paz e alegria.


Jorge Pinheiro
por Théo Pinheiro Murakami