samedi 18 mai 2019

פעולת המחאה נגד הזרם (1)



פעולת המחאה נגד הזרם (1)

חורחה Pinheiro [1]

"מה טוב הוא טוב, אם הטוב מתבטל בבת אחת, או שהם מחוסלים עבורם הם טובים?" (ברטולט ברכט, של השיר אשר משרת את הטוב).

התיאולוג האמריקאי-אמריקני פאול טיליך, בנצרות ובסוציאליזם (1919-1931), סוציאליסטיס אלמינדס, מספק בסיס לעיצוב של פעילות מחאה נגד הזרם. ואחד מבסיסים אלה הוא המושג של העיקרון הפרוטסטנטי, הנחוץ להבנת תופעות השינוי החברתי מנקודת מבט תיאולוגית, גם כאשר אירועים כאלה מתרחשים מחוץ למבנים דתיים.

עבור טיליך, הרדיקליות של פעולות המחאה קיימת כאשר האפשרות של הישות החדשה מוצהרת. הפרוטסטנטיות היא זו. היא עשויה להיות נוכחת בדתות מאורגנות, אך היא אינה תלויה בהם. אולי, אם כן, אנשים יחוו את הרדיקליזם של להיות פרוטסטנטי יותר בחוץ מאשר בתוך הכנסיות. הרדיקליזם הזה, הקיים במערב, אינו מרמז על זיקה כנסייתית או מוסדית, אלא מתרגם את המצב האנושי לפני האתגרים של טרנסצנדנטליות החיים. כאשר במצבים אלה חי את העיקרון הפרוטסטנטי, אז זה שם ולא בכנסיות כי הפרוטסטנטיות הופכת בחיים.

על בסיס תפיסה כזו, יש לנו כלי מתודולוגי שעליו לבסס את עצמנו כדי לבנות את פעולת המחאה נגד הזרם. בניתוח העקרון הפרוטסטנטי כמבקר רדיקלי יש לקחת בחשבון היבטים היסטוריים, כמו גם את התנועות האידיאולוגיות של המודרניות.

לדבר בעמדה של ביקורת רדיקלית, של שיפוט והפיכת המציאות, פירושו דיבור על כיוונים: אנכיים, לפני האופק והאופק, לפני הסיבה. לנוכח המצבים, כאשר עלינו להתנגד לקטסטרופה ההיסטורית, המסר של המחאה חייב להיות פשוט, לא אשליה, אלא מודע ומלא תקווה.

בהקשר זה, אנו רואים שהמודרניות כבר נתנה למערב את עקרון האוטונומיה, אך שמרה, באופן סותר, את האדם חסר הביטחון בתוך האוטונומיה הזאת. זה לקח חלק מן הארגונים הפוליטיים של העובדים לניסיון לשחרר עובדים על ידי כניעה לקריאות הישנות של החיים, כלומר, היררכיה ומסורת. תופעה זו אנו קוראים ביורוקרטיזציה. אבל החירות כבר נוסתה וזו חוויה שמאחדת את כל מי שמוחים.

"מה טוב החופש, אם החופשי צריך לחיות בין הלא-חופשיים? מהו השימוש של התבונה, אם רק unreason מקבל את האוכל שכולם צריכים? (ברטולט ברכט, משירו של זה משרת את הטוב).

טיליך השתמש במושג, במצב של גבול, כדי להתייחס אל אותם רגעים שבהם יש איום על משמעות החיים. לקום להגנה על החיים ומשמעותה היא הפרש של הפרוטסטנטיות. ביטוי זה נולד סביב רעיון של רפורמציה פרוטסטנטית, של הצדקה על ידי האמונה. משמעות הדבר היא שהחיים בחופש מרמזים על הכרה בחוסר הצדק של הצדק. לכן הביקורת והפעולה הרדיקלית של המחאה נוטשים מן ההכרה בקיומם של מצבים גבוליים, שיש לשפוטם ולהשתנותם, לא מילים ומעשים לטובת היררכיה ומסורת.

Une saga de combat

L'histoire anabaptiste nous en apprend beaucoup. L'histoire anabaptiste est une saga à la manière du christianisme antique, antérieure à la stabilisation impériale post-Constantin du sang, de la persécution et du martyre. Et les événements remarquables et les actes héroïques du mouvement anabaptiste à ce jour résonnent dans l'imaginaire protestant, conduisant certains historiens et théologiens à exorciser le mouvement et ses dirigeants.

Selon Weber, l'ascèse séculaire du mouvement anabaptiste [2] s'est répandue dans les pays d'Europe occidentale et aux États-Unis aux XVIe et XVIIe siècles, donnant naissance directement ou par adoption à de nouvelles formes de pensée religieuse, telles que celles de baptistes [ 3], Mennonites et Quakers. Au Brésil, les évangéliques ne peuvent oublier l'histoire des anabaptistes car les influences ecclésiologiques du mouvement, héritées des baptistes, ont été transmises aux communautés, aux églises et aux penseurs évangéliques qui, à un moment ou à un autre de leur histoire, ont communié avec la pensée baptiste.

Par conséquent, nous aborderons les origines de l’anabaptisme, en particulier celui du contenu social fort, de la lecture historique et de la sociologie de la religion, dans le but de démontrer que, dans sa pratique, l’anabaptisme a construit une ecclésiologie qui a façonné une théologie et non le sinon. Mais alors que nous travaillons ici sur la relation entre l’ecclésiologie et la révolution paysanne dirigée par les anabaptistes, nous devons comprendre ce que l’ecclésiologie signifie. Nous la considérons comme l’étude théologique de la réalité des communautés de foi sous ses aspects structurels: sa manière de se rapporter au monde, son rôle social et sa forme de gouvernement. Voyons maintenant le communautarisme, qui a ensuite été qualifié de socialisme utopique par Karl Marx et Friedrich Engels, comme une construction religieuse et politique centrale et frappante du mouvement anabaptiste.

Les anabaptistes étaient des chrétiens réformés qui se sont soulevés contre l'hégémonie de l'Église catholique et des princes allemands. De la phrase de l'évangile de Marc (16:16), "celui qui croira et qui sera baptisé sera sauvé, mais celui qui ne croira pas sera damné", ils déduisent que celui qui ne croit pas avance le baptême qu'il a reçu comme un enfant. Ils ont nié toute valeur pour le baptême des enfants, affirmant que ce sacrement catholique et réformé ne devrait être reçu que lorsque la personne était pleinement consciente de ce qu'elle faisait. Par conséquent, ceux qui ont été baptisés avant d'être conscients du bien et du mal devraient être baptisés à nouveau.

Le fait qu’ils soulignent l’importance du choix personnel dans le choix de la marche chrétienne a conduit les groupes et les communautés anabaptistes à se développer rapidement. Mais la croissance des anabaptistes en Allemagne et en Europe centrale est devenue un problème pour les autorités ecclésiastiques, après tout, elles ont proposé que les gens ne baptisent pas leurs enfants. Bien sûr, les catholiques et les réformés se sont opposés à cette idée. Et comme le pouvoir ecclésiastique était lié aux forces du féodalisme ou aux forces de la bourgeoisie naissante, les deux camps ont opté pour l'extermination des anabaptistes.



A ação do protesto contra a corrente (2)

Jorge Pinheiro



Para Engels, a descentralização, a autonomia local e regional, a diversidade comercial e industrial das províncias alemães e a insuficiência das comunicações foram os fatores que explicam o agrupamento das classes sociais da Alemanha no início do século dezesseis em três campos: o feudal nucleado ao redor do catolicismo; o burguês reformista, ao qual se aliaram os luteranos; e o plebeu/camponês liderado pelos anabatistas.[5]



É bom lembrar que na Alemanha medieval a Igreja católica tinha o monopólio da educação, o que fazia com que todo o ensino tivesse um caráter religioso. Nas mãos do clero católico estavam a política, a jurisprudência e o conhecimento, que era visto como extensão da teologia. E os dogmas do catolicismo, assim como a compreensão católica das Escrituras tinham força de lei em todos os tribunais. Dessa maneira, críticas ou ataques ao feudalismo traduziam-se em confronto com o catolicismo.



A oposição ao feudalismo, começou bem antes do século dezesseis, com os albigenses e valdenses, com as insurreições nos cantões suíços e foi tomando conta da Alemanha com as reivindicações religiosas, sociais e políticas que tomaram corpo como pensamento divergente. Os plebeus e camponeses alemães queriam o estabelecimento da igualdade cristã, que devia se traduzir em igualdade civil e social. Ou seja, a nobreza devia colocar-se ao nível dos camponeses, e os patrícios e burgueses no mesmo nível dos plebeus. Ou seja, reivindicavam, pela primeira vez na história, direitos cidadãos universais. Além disso, exigiam o fim das leis feudais, tais como obrigatoriedade dos serviços pessoais, tributos, privilégios e nivelamento das escandalosas diferenças no que se referia à propriedade. Dessa maneira, essas reivindicações democráticas levaram às reivindicações pelo estabelecimento de comunidades onde a propriedade e os bens fossem comunitários, o que era visto como a realização da promessa do Reino de Deus.



Até 1525-1526, o movimento protestante era mais ou menos informal na Alemanha. Mas com as guerras camponesas, os conventos foram secularizados, o direito canônico abandonado e, com a recusa dos bispos de se associarem ao movimento pelas reformas, as autoridades civis foram empurradas a se tornar favoráveis às novas orientações e a se envolver na reorganização da igreja. Estas ações se inspiraram nas antigas visitas pastorais efetuadas antes pelos bispos. Os príncipes passaram, então, a visitar as paróquias, com delegações compostas de juristas e teólogos. A partir de 1530, criaram instituições permanentes com superintendentes, levando as igrejas a ficarem dependentes do príncipe que, de fato, substituiu o bispo. Nasceu assim a igreja territorial reformada.



Em 1555, a Dieta de Augsbourg proclamou o princípio do “cujus regio, ejus religion” segundo o qual o príncipe ou uma outra autoridade podia determinar a religião das pessoas. A legislação e o órgão jurisdicional, em especial matrimonial, passaram para o poder do príncipe, que o entregava a uma instância jurídica: e o príncipe ou o magistrado das cidades passaram a ser a autoridade última em matéria de liturgia, doutrina ou nomeação de sacerdotes. Os bens eclesiásticos secularizados foram incorporados às possessões dos príncipes, ou geridos por administradores autônomos, em especial as escolas. Dessa maneira, passou a existir um controle sobre o comportamento religioso, e o estado jurídico e financeiro das paróquias, bem como sobre a doutrina e a vida moral dos pastores.



Thomas Münzer e outros dissidentes do protestantismo reformado procuraram mobilizar seus pares e exigir das autoridades políticas liberdade de expressão e de ação religiosas e criaram comunas autônomas, proibindo os seus adeptos de exerceram funções políticas no Estado. Entre suas ações, Münzer suprimiu completamente o uso do latim, em 1522, antes de Lutero. Em Altstadt, nos cultos que dirigia vinha gente de todas as partes ouvi-lo. Seus ataques voltaram-se em especial contra o clero católico, chamando os príncipes e o povo à intervenção armada contra a Igreja católica.



“Não disse Cristo, vim trazer-vos não a paz, porém a espada? E que deveis fazer com ela? Nada, senão afastar a gente má que se opõe ao Evangelho. Cristo ordenou com grande severidade (Lucas 19.27): quanto, porém, a esses meus inimigos, que não quiseram que eu os governasse, trazei-os aqui e matai-os diante de mim... Não vos valhais do vão pretexto de que o braço de Deus deve faze-lo sem ajuda da vossa espada que bem poderia enferrujar-se na bainha. Os que se oponham à revelação divina que sejam aniquilados sem piedade, como Ezequiel, Ciro, Josias, Daniel e Elias destruíram os pontífices de Baal; de outro modo a Igreja cristã não pode retornar à sua origem. Na época da vindima temos que arrancar a erva daninha das vinhas do Senhor. Deus disse (Deuteronômio 7.5): nem terás piedade dos idólatras;... deitarás abaixo seus altares... e queimarás a fogo as suas imagens de escultura... Porque tu és um povo santo e Jeová teu Deus...” [6]



Münzer, segundo Tillich, foi o mais criativo dos evangélicos radicais e acreditava que o Espírito podia falar por meio das pessoas. No entanto, para se receber o Espírito era preciso participar da cruz.



“Lutero, dizia ele, prega um Cristo doce, um Cristo do perdão. Devemos também pregar o Cristo amargo, o Cristo que nos chama a carregar sua cruz.”[7]



Assim, os anabatistas atacavam a teologia de Lutero a respeito das Escrituras, porque consideravam que Deus não falara apenas no passado, tornando-se mudo no presente. Mas que sempre falou e fala nos corações ou nas profundezas de qualquer ser humano preparado para ouvi-lo por meio de sua própria cruz. O Espírito habita nas profundezas do coração. A cruz, explica Tillich, representava a situação limite, era externa e interna.



Surpreendentemente, Münzer expressa esta idéia em termos existencialistas modernos. Quando percebemos a finidade humana, desgostamo-nos com a totalidade do mundo. E nos tornamos pobres de espírito. O homem é tomado pela ansiedade de sua existência de criatura e descobre que a coragem é impossível. Nesse momento Deus se manifesta e ele é transformado. Quando isso acontece, o homem pode receber revelações especiais. Pode ter visões pessoais não apenas a respeito de teologia como um todo, mas sobre assuntos de vida diária”.[8]



Nessa conjuntura de choque, em Zurique, na Suíça, no meio dos seguidores do reformador Zwinglio, surgiu um grupo de cristãos que rejeitou o poder eclesiástico, fosse ele católico ou reformado, exigindo a autonomia das comunidades cristãs. Assim, os anabatistas fundaram sua primeira comunidade no dia 21 de janeiro de 1525. E eles próprios passaram a escolher seus pastores e a construir comunidades separadas do estado.


Mas, no sul da Alemanha, sem dúvida, foi Thomas Münzer quem se levantou como defensor de uma proposta de revolução social camponesa. Em 1521, liderou um grupo de anabatistas que se somaram aos camponeses sublevados ao redor da reivindicação de terra e liberdade. Münzer criou, assim, pela primeira vez na história um movimento de libertação camponês anabatista.



Münzer não foi apenas um pensador, mas um militante que praticava a fé. Acreditava ser um profeta, chamado para implantar o Reino de Deus. Considerava ser seu dever denunciar e executar as sentenças contra os governantes que exploravam o povo. Suas pregações estavam impregnadas de conteúdo social e político: o fim da velha Igreja deveria marcar o inicio de uma nova ordem social.



Engels, que junto com Marx foi um dos pais do socialismo moderno, considerou as guerras camponesas lideradas pelos anabatistas como combates sociais. Afirmou que “se, em termos gerais, a burguesia podia arrogar-se o direito de representar, em suas lutas com a nobreza, além dos seus interesses, os das diferentes classes trabalhadoras da época, ao lado de todo grande movimento burguês que se desatava, eclodiam movimentos independentes daquela classe que era o precedente mais ou menos desenvolvido do proletariado moderno. Tal foi na época da Reforma e das guerras camponesas na Alemanha, a tendência dos anabatistas e de Thomas Münzer”.[9]



Considerou que, apesar de terem uma face cristã reformada, as reivindicações anabatistas iam além da expressão religiosa que apresentavam. Para Engels,[10] a política de Münzer nasceu de seu pensamento revolucionário, que caminhava adiante da situação social e política de sua época. Seu programa propunha o estabelecimento do Reino de Deus, com o milênio de justiça, paz e felicidade, com a supressão de todas as instituições que se encontravam em contradição com o mandamento do amor.



Para Münzer, o céu estava aqui no chão. E, por isso, o cristão deveria construí-lo na vida. A esse cristão anabatista cabia a missão de estabelecer o Reino de Deus sobre a terra. Seus sermões eram clamores políticos e estavam dirigidos a instaurar uma nova ordem social. A partir de Münzer, os anabatistas fizeram dos sermões proféticos, elaborados a partir da realidade social em que estavam inseridos, manifestos revolucionários, cujas propostas atemorizavam as autoridades, governantes eclesiásticos e príncipes de toda a Europa.



A crise econômica fruto exploração agrícola predatória e extensiva; a crise demográfica, por causa das epidemias e fome; a crise social gerada com o surgimento da burguesia e dos assalariados; a crise clerical, devido às contradições e o enfraquecimento da Igreja católica e a crise espiritual ocasionada pelo surgimento de novas leituras do cristianismo fizeram da baixa Idade Média um período de alta instabilidade e angústia coletiva. Milhares de camponeses sem terra e plebeus desempregados vagavam pelos campos e cidades. Essa situação levou às propostas de construção de comunidades formadas por camponeses e plebeus, onde pudessem viver e trabalhar juntos, num sistema de vida em comum com os bens partilhados, disponíveis segundo as necessidades das pessoas e famílias. E, de fato, os anabatistas organizaram comunidades com este formato, organizações baseadas na propriedade social autônoma em relação ao Estado e aos poderes eclesiásticos e laicos da época, em primeiro lugar católico e depois reformado.



Dessa maneira, a compreensão que os anabatistas tiveram de que o cristianismo era uma ferramenta para a mudança da condição social em que se encontravam os camponeses e deserdados da terra, sem dúvida, partiu de suas próprias experiências de vida e trabalho e quebraram o paradigma de que a fé devia estar alienada da vida social e política.



Mais tarde, em combate, e exército de Münzer foi derrotado e ele foi preso, torturado e executado. Mas a guerra camponesa na Alemanha se estendeu até 1525, quando os anabatistas revolucionários foram afogados em sangue. O conflito, que teve lugar nas áreas do sul, centro e oeste da Alemanha, também afetou regiões vizinhas  na Suíça e Áustria, e envolveu no seu auge, no verão de 1525, cerca de 300 mil camponeses. Estimativas da época situaram o número de mortes em torno de 100 mil camponeses e plebeus.



O sonho anabatista, porém, não morreu aí, subsistiu no coração de milhares de cristãos. Vejamos alguns exemplos. Sete anos depois da morte de Münzer, em 1532, uma insurreição tomou conta da cidade de Münstzer. Ela foi iniciada por um ex-padre da Catedral de Münstzer, que se tornou luterano, Bernard Rothmann, e acabou sendo expulso da cidade. Dois anos depois, em 1534, o pastor anabatista Jan Matthys, junto com outros líderes, entre os quais Jan van Leiden e Gert Tom Kloster, declarou a cidade de Münstzer livre do domínio dos príncipes e do poder eclesiástico.


Matthys iniciou uma revolução social: os proprietários de terras foram expropriados e suas terras e bens distribuídos entre os camponeses. Dando seqüência à revolução, ele e um grupo de anabatistas atacaram a guarnição liderada pelo príncipe Franz von Waldeck, que era bispo de Münstzer e também chefe do exército. No confronto Matthys foi  morto. Foi, então, sucedido por Jan van Leiden. Após um ano de resistência, Waldeck liderou um exército bem equipado e assaltou a cidade. Jan van Leiden e seus oficiais foram presos, torturados e executados. Os combatentes anabatistas foram lançados às prisões e, posteriormente, deportados para outras regiões da Alemanha e Suíça.



A partir desse momento as comunidades anabatistas passaram a viver umas isoladas das outras, de forma clandestina. Seus líderes eram leigos que pregavam em roupas civis. Adotaram uma disciplina e uma ética rígidas a fim de sobreviverem na clandestinidade. Essas pequenas comunidades se refugiaram no interior da Europa e se estruturaram de forma autônoma. Cada comunidade de fé sobrevivia do compromisso de serviço e financeiro de seus afiliados.




A ação do protesto contra a corrente (3)

Jorge Pinheiro



Há um poder formador no ato do protesto. E dele podemos dizer: a espiritualidade conquista profundidade no mergulho dentro da materialidade; o que chamamos de Eterno deve se expressar em relação à situação presente; o mandato da vida deve ser expresso com ousadia e risco; e, enfim, o poder formador do protestantismo deve expressar o seu radicalismo.



A ação protestante é uma experiência transcendente ao nível da materialidade humana, uma experiência que aconteceu em todos os tempos. Nesse sentido, a ação protestante não pode ser identificada com um tipo determinado de organização social, mas sempre com a transcendentalidade da justiça.



Por isso, o protestantismo é portador de poder de transformação e oferece uma mensagem de vida tanto para a pessoa, como para a comunidade. Mas, não se pode dizer que a ação protestante é um movimento que mecanicamente parte da interioridade em direção à exterioridade, apropriando-se de formas culturais ou passando ao largo delas. Na verdade, a ação radical de protesto dá forma às expressões culturais e toma novas formas a partir delas. Dessa maneira, o protestantismo está ligado a modelos sociais e econômicos, embora tenha mais afinidade com determinadas formas de organização social.



A ética da vida, por exemplo, leva o protestantismo a ter uma postura crítica diante da ordem social que se apóia na opressão e na exclusão social. E proclama a necessidade de uma ordem na qual a vida e seu o sentido sejam o fundamento da organização social.



“Em vez de serem apenas bons, esforcem-se para criar um estado de coisas que torne possível a bondade. Ou melhor: que a torne supérflua!” (Bertolt Brecht, do poema De que serve a bondade).



Tal ética propõe uma economia solidária onde a alegria não seja fruto do ganho, mas do próprio trabalho. E prega a submissão das nações, ricas e pobres, à idéia do direito, e à construção de uma consciência comunitária, soldada sobre a paz, que leve a uma globalidade real entre povos e nacionalidades.



Historicamente, rupturas religiosas acontecem associadas a rupturas econômicas, isto porque o núcleo da unidade cultural de determinada época ou povo é a religião, quer esteja institucionalmente expressa ou não. Assim, o fracionamento religioso característico de determinadas épocas traduz fracionamento econômico, distanciamento e choque entre classes. E naquelas épocas em que temos um processo cultural de unidade temos também uma nova base de unidade e solidariedade social e econômica.



Nesse sentido, há um processo de desenvolvimento que se realiza de forma desigual na história, mas que combina mudanças religiosas e transformações econômicas e sociais. Diante de tais circunstâncias a ação protestante está eticamente obrigada a fazer escolhas: participar dos processos de transformação ou se retrair e entrar em processo de caducidade, ao afastar-se da vida real das comunidades.



Seja qual for a opinião ética sobre as organizações políticas dos trabalhadores, um fato deve ser ressaltado: o protestantismo deve apresentar a elas uma leitura radical da incondicionalidade da justiça, que emprenhe a construção das comunidades futuras.



No século vinte, a concepção materialista da história negou a possibilidade da aproximação do protestantismo às organizações políticas dos trabalhadores, mas se entendemos que em Marx esta concepção do fato histórico não é materialista, mas econômica, vemos que há uma relação de causalidade entre fundamento econômico e organização da cultura. E, ao contrário, tal fundamento dá às ciências humanas uma possibilidade metodológica fecunda, que vai além do ateísmo.



“Em vez de serem apenas livres, esforcem-se para criar um estado de coisas que liberte a todos e também o amor à liberdade torne supérfluo!” (Bertolt Brecht, do poema De que serve a bondade).



Assim, ao contrário do que antes parecia, não podemos dizer que o ateísmo seja um elemento constitutivo das organizações políticas dos trabalhadores. É uma herança burguesa, que foi adotada pelas organizações políticas dos trabalhadores sob a crença de que ajudaria a extirpar a idéia de opressão e abriria o caminho para a construção de um mundo mais justo.



A crítica das organizações políticas dos trabalhadores esteve dirigida às instituições eclesiásticas, já que a religião se tornou negócio. Mas, essas organizações buscaram inspiração ética nas potencialidades da universalidade humana e, por isso, hoje, devem aceitar os princípios da tolerância religiosa e da separação entre religião e Estado.



Embora tenham existido razões históricas para as críticas às instituições eclesiásticas, e ainda existam, as organizações dos trabalhadores não podem negar a base solidária e comunitária do ideal da ação radical protestante. E quanto à revolução, é preciso dizer que não existe uma relação natural entre o ideal das organizações políticas dos trabalhadores e tática revolucionária. Nem sempre se pode dizer que as táticas propostas pelos trabalhadores são contrárias às ações protestantes. Basta ver como Engels analisou a revolução anabatista na Alemanha.



É caros leitores e leitoras, tenho plena consciência do caráter permanente e universal da revolução, já que está ligada à própria vida. E creio que os movimentos libertários da história humana traduzem esse anseio inerente à alma humana. Por isso, como disse um amigo e intelectual sofisticado, Tomás Rosa Bueno, "cada revolução fala a língua da sua época, radicalizada. É natural que os anabatistas e tantos outros nos séculos pré e peri-renascentistas adotassem a da face mais humana da religião. Mas, no fundo, é sempre a mesma velha toupeira que cava os seus túneis sob os palácios do poder. Nós todos vamos chegar à luz um dia. E vamos refazer a história, dando razão aos anabatistas, tirando Espártaco da cruz, trazendo à Terra o nosso reino".



Essa é a força do reino: é utopia humana que baliza sonhos e esperanças, em tempos e lugares diferentes. Por isso, também resgato o pensamento libertário das comunidades cristãs anticlericais que pontuaram a Idade Média e que culminaram com o messianismo revolucionário anabatista de Thomas Müntzer, que propôs uma revolução social, sem a qual não poderia haver revolução cristã, já que para ele o reino de Deus estava presente no cotidiano. Ele quis instaurar a dignidade de homens e mulheres, um reino de Deus no aqui e agora. É esse caminho que me permite dialogar fraternalmente com as comunidades cristãs. Na verdade, esse socialismo em construção permanente não estabelece doutrinas e dogmas, mas contextualiza as reflexões e práticas cristãs e revolucionárias. Por isso nadamos pela orla da Reforma protestante, mergulhamos na ação revolucionária dos cristãos anabatistas e chegamos a Marx a braçadas.



As pessoas que vivem o princípio protestante podem, sem temor, ter uma atitude positiva em relação às organizações políticas dos trabalhadores. Atitude positiva deve ser entendida como a realização da incondicionalidade da justiça e da defesa do sentido da vida, que entende a necessidade de eliminar as condições que geram exclusão e miséria. Tal atitude traduz a urgência de combater os fundamentos do egoísmo econômico e de ações para a construção de uma ordem social, que sem deixar de ser globalizada, inclua excluídos e periféricos. Isto porque o pensamento e a ação da radicalidade protestante não são tarefas, apenas, de operários e trabalhadores fabris, mas um ideal ético que traduz anseios e esperanças de todos que se levantam por uma sociedade mais justa.



“Em vez de serem apenas razoáveis, esforcem-se para criar um estado de coisas que torne a desrazão de um indivíduo um mau negócio”. (Bertolt Brecht, do poema De que serve a bondade).



Notas


[1] É Pós-Doutor em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (2011) e pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2008), Doutor em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (2006), Mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (2001) e Graduado em Teologia pela Faculdade Teológica Batista de São Paulo (2001). Professor e Jornalista Profissional. Atua na área de Ciências da Religião, com especialização nas relações entre política e religião; filosofia e teologia; judaísmo e cristianismo.

[2] Max Weber, «Anticritique à propos de l´esprit du capitalisme» (1910), in L’Ethique protestante et l’esprit du capitalisme suivi d’autres essais, Paris, NRF Gallimard, 2003, trad. Jean-Pierre Grossein, pp. 344-380. Ver também: Max Weber, A ética protestante e o espírito do capitalismo, São Paulo, Editora Pioneira, 2000, pp. 102, 196-197.

[3] John Smyth (†1617), ministro anglicano, desejava uma reforma profunda do cristianismo inglês. Discordava da organização episcopal anglicana. Formou em Gainsborough uma comunidade dissidente em 1604. Foi perseguido pelo anglicanismo oficial e obrigado a exilar-se com seus companheiros, fugindo para Amsterdã, na Holanda. Ali residiu na casa de um padeiro menonita, que lhe expôs a eclesiologia e a teologia anabatistas. De volta à Inglaterra, ele e seus companheiros fundaram a primeira Igreja batista, que ficou conhecida como a igreja dos Batistas Gerais, porque ensinava que Cristo salvara na cruz todos os fiéis e não apenas os predestinados. Segundo Weber, dos batistas, só os Batistas Gerais tiveram suas origens no movimento anabatista (Weber, op.cit. p. 196). Mas, no que se refere à eclesiologia, também os Batistas Particulares são herdeiros (indiretos) dos anabatistas.

[4] É Pós-Doutor em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (2011) e pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2008), Doutor em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (2006), Mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (2001) e Graduado em Teologia pela Faculdade Teológica Batista de São Paulo (2001). Professor e Jornalista Profissional. Atua na área de Ciências da Religião, com especialização nas relações entre política e religião; filosofia e teologia; judaísmo e cristianismo.

[5] Friedrich Engels, As guerras camponesas na Alemanha, São Paulo, Editorial Grijalbo, 1977, p. 37.

[6] Friedrich Engels, idem, op. cit., p. 47.

[7] Paul Tillich, História do pensamento cristão, O conflito de Lutero com os evangélicos radicais, São Paulo, ASTE, 2000, p. 238.

[8] Paul Tillich, idem, op. cit., p. 238.

[9] Friedrich Engels, Do socialismo utópico ao socialismo científico, in Karl Marx e Friedrich Engels, Textos, volume I, São Paulo, Edições Sociais, 1975, p. 28.

[10] No prefácio do seu livro As guerras camponesas na Alemanha, Engels conta que utilizou como fonte para as pesquisas das insurreições camponesas e de Thomas Münzer o trabalho do historiador Wilhelm Zimmermann (1807-1878), que publicou Allgemaine Geschichte des grassen Bauernkrieges (História da Grande Guerra Camponesa), em três volumes, em Sttutgart nos anos 1841-1843.


[11] É Pós-Doutor em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (2011) e pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2008), Doutor em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (2006), Mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (2001) e Graduado em Teologia pela Faculdade Teológica Batista de São Paulo (2001). Professor e Jornalista Profissional. Atua na área de Ciências da Religião, com especialização nas relações entre política e religião; filosofia e teologia; judaísmo e cristianismo.