vendredi 30 janvier 2015

Pinheiro, Portugal

A família Pinheiro tem seu sobrenome em origem toponímica cuja antiguidade recua pelo menos ao século XIII, uma vez que já neste século surgem indivíduos a usá-lo. Como já mencionado, os Pinheiros são uma família Marrana, ou seja, de origem judia,porém, mudou seu nome para fugir da perseguição dos cristãos da idade média aos judeus que viviam na península Ibérica. Estes adotavam sobrenomes de árvores ou montes para assim poderem se identificar como judeus sem serem perseguidos.

Com o tempo alguns judeus realmente se converteram ao cristianismo, ou seja, passaram a acreditar na doutrina religiosa cristã, e assim aconteceu com os Pinheiros.

A maior expressão disso, foi a vida do mais famoso dos antigos Pinheiros, "Dom Pedro de Afonso Pinheiro", um cavaleiro da "Ordem de Avis", que defendeu a região de Rebordões dos Mouros, liderando grupos e batalhas, até finalmente os expulsar por completo em 1314 todos os Islâmicos da área, e assim, ser conhecido como um dos grãos Mestres da "Ordem de Avis".

Em reconhecimento as suas vitórias recebeu do Rei de Portugal o Brasão de Armas da Casa Pinheiro, onde o azul está sobre a prata e divide-se em três parte, uma o leão vermelho representando a coragem, a força, o combate, e a honra, na outra, três cruzes representando a cristandade e lembrando o seu momento do seu maior sacrifício que foi a crucificação de Jesus, o terceiro, cinco pinheiros representando toda a família.

Desta família Pinheiro se originaram várias famílias, continuou se o ramo somente dos Pinheiros, mas gerou-se também os Pinheiro de Andrade e os Pinheiros Barcelos, ainda, descenderam vários ramos familiares com outros títulos como o da família Outiz. cujo o primeiro ascendente foi um do netos de Dom Pedro de Afonso Pinheiro, o Cavaleiro Gomes Nunes de Outiz, nome que foi buscar à Quinta de Outiz de que foi senhor. [1]

Este Gomes Outiz foi cavaleiro de um escudo e uma lança, como informa o conde D. Pedro Afonso, conde de Barcelos, na sua obra chamada Livro de Linhagens do conde D. Pedro (1340-1344), uma recompilação da genealogia das principais famílias nobres de Portugal inseridas no contexto peninsular e universal[2] ,[1] e neto de Pedro Afonso Pinheiro, pessoa a quem o rei Afonso III de Portugal nascido na cidade de Coimbra a 5 de Maio de 1210 e falecido na mesma cidade em 16 de Fevereiro de 1279,[3] havia dado propriedades na cidade de Santarém. Este Pedro Afonso Pinheiro, como informam as linhagens genealógicas, terá sido filho de Afonso Pinheiro, que foi morador no Minho no ido ano 1301, local onde por honra defendia o lugar de Rebordões, localidade da freguesia de Insalde, concelho de Paredes de Couraça.

O já mencionado Gomes Nunes de Outiz, foi casado com D. Felicia Fernanades Camelo, filha que foi de Fernão Gonçalves Camelo e de D Constança pires de Arganelo. Estes tiveral três filhos, Estevão Gomes de Outiz, senhor que foi da Quinta de Outiz e Pedro Gomes Pinheiro, com geração extinta e Tristão Gomes Pinheiro, casado na cidade de Barcelos. O mencionado Estevão Gomes de Outiz, foi pai de Gil Esteves de Outiz, senhor que foi da Quinta de Outiz, cavaleiro da Casa Real e vassalo do rei D. Fernando I de Portugal, que foi o nono rei de Portugal, nascido em Lisboa, 31 de Outubro de 1345e falecido em 22 de Outubro de 1383, e do do rei D. João I de Portugal, nascido em Lisboa a 11 de Abril de 1357 e falecido na mesma cidade a 14 de Agosto de 1433), Destes recebeu, dando-lhe D. Fernando I, a terra da Cunha, o uso do castelo e a renda dos seus casais na cidade de Guimarães. Deu-lhe também a vila e terra do Prado, esta confirmada por D. João I, que também lhe doou várias outras propriedades corria o ano de 1385.

Estas doações de El-rei, foram devidas a Gil Esteves de Outiz, já mencionado ter tomado armas pelo rei de Portugal contra o Reino de Castela. Dado esse fato, o rei deu-lhe o Couto e honrou a Quinta de Oliveira, na Vila do Prado.

Deste Gil Esteves Outiz, é descendente D. Mor Esteves Pinheiro, que sucedeu parte importante da casa paterna, tendo sido casada com Martim Lopes, este que foi Ouvidor Geral das terras do Duque Afonso I, Duque de Bragança, (Veiros - Estremoz, 10 de Agosto de 1377 - Chaves, 15 de Dezembro de 1461) foi o 8º conde de Barcelos, 2º conde de Neiva e o 1º Duque de Bragança, filho de D. João I de Portugal. Segundo alguns genealogistas, foi também alcaide da Vila de Barcelos.

Os Pinheiros trazem o seguinte Brasão de Armas: De prata com cinco Pinheiros arrancados, de verdes, postos em sautor. Timbre: Um pinheiro dos escudo.

Os Pinheiros de Andrade trazem o seguinte: De prata com cinco pinheiros arrancados de verde, postos de sautor e chefe do mesmo, carregado por uma banda de vermelho, perfilada a ouro, abocada por duas serpes do mesmo. Por timbre: Apresentam um pinheiro de verde, saindo da boca de uma serpe em ouro e posto em pala.

Os Pinheiros Barcelos[4] usam: De vermelho com um pinheiro de sua cor, arrancado de prata com frutos de ouro e um leão no mesmo. À esquerda do escudo em posição rampante, virado para o tronco de árvore.

Bibliografia

Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira - 50 vols. Editorial Enciclopédia, Lisboa, vol. 1 - pág. 809.

Referências

Armorial Lusitano, edic. Zairol, Lad. 4ª edc. 2000, pág. 437 e 438. Dep. Legal nº 149062/00. ISBN 972-9362-24-6
A prosa medieval portuguesa A prosa medieval portuguesa, Séc XIII-XIV. HALP N.4 (1997)
Brasões da Sala de Sintra-3 vols. Anselmo Braamcamp Freire, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2ª Edição, Lisboa, 1973, vol. I-pg. 4.

jeudi 29 janvier 2015

O mundo novo

Construir o novo mundo. Quem?
Jorge Pinheiro

O planeta jaz na barbárie. Quem poderá construir o novo mundo? Esta discussão sobre a construção de um mundo novo nos leva à discussão de questões imbricadas à teologia, como alienação e ética. Hoje, o mundo se pergunta: quem deve dirigir o processo de construção? Obama crê que devem ser os Estados Unidos. A Europa, os países ricos. E a esquerda institucional, no Brasil, o conjunto das nações reunidas em assembléia geral. Quem tem razão? Quais os critérios?

Vamos analisar tal questão a partir do conceito de estranhamento em Marx e da proposta de uma ética crítica de defesa da vida. Para tal partiremos de dois trabalhos acadêmicos, um de Maria Norma Alcântara Brandão de Holanda e outro de Tarcyane Cajueiro Santos, citados na bibliografia.

Então eu me arrependi de ter trabalhado
tanto e fiquei desesperado por causa disso.”
Eclesiastes 2.20

Karl Marx em Teorias sobre a mais valia, conforme expõe Maria Norma Alcântara Brandão de Holanda, afirma que o desenvolvimento das forças produtivas enquanto "desenvolvimento da riqueza da natureza humana como fim em si" se efetiva mediante "um processo no qual os indivíduos são sacrificados".

O que está em questão aqui não é o desenvolvimento das forças produtivas, mas o reconhecimento de seus limites ontológicos, que se expressam no âmbito do desenvolvimento econômico-social.

O desenvolvimento das forças produtivas é também o desenvolvimento da capacidade humana, mas este não produz obrigatoriamente desenvolvimento da pessoalidade humana. Ao contrário, muitas vezes, potencializando capacidades singulares, pode desfigurar tal pessoalidade.

Estamos aí diante de um processo de alienação antropológica e existencial. Estamos diante de um paradoxo, desenvolvimento das forças produtivas e desenvolvimento da pessoalidade humana. E, pelo que vemos hoje, mais desenvolvidas as forças produtivas mais evidentes tais contradições.

As exigências colocadas pelo desenvolvimento da economia globalizada, ao mesmo tempo em que apresenta possibilidades para o desenvolvimento humano, tem produzido um impressionante nível de desumanidade.

Marx, nos Manuscritos econômico-filosóficos de 1844 escreve: "quanto mais produz o operário com seu trabalho, mais o mundo objetivo, estranho que ele cria em torno de si, torna-se poderoso, mais ele empobrece, mais pobre torna-se seu mundo interior e menos ele possui de seu".

Ao partir de sua preocupação central, o estudo da economia política de seu tempo, Marx diz que "a miséria do operário está em razão inversa do poder e da grandeza de sua produção". Mais produz, maior é a sua miséria.

Assim, a produção não faz apenas do homem mercadoria, a mercadoria humana, o homem sob forma de mercadoria, mas o faz também ser espiritual e fisicamente desumanizado....

Se o desenvolvimento das forças produtivas ao mesmo tempo em que desenvolve as possibilidades humanas cria a reprodução da desumanidade, evidenciam-se os limites antropológicos e existenciais de tal desenvolvimento, já que toda relação social não se dará apenas através de uma elevação espiritual, mas de movimentos de deixam em aberto as possibilidades para a própria destruição do humano.

Como a justiça encaminha para a vida,
quem insiste no mal caminha para a morte”.
Provérbios 11.19

Se olharmos sob a perspectiva da ética, tal processo leva ao esgotamento da moral que deve ser, presente na história ocidental cristã, e na emergência da amoralidade globalizada, que se transformou em instância de definição da legitimidade de comportamento imperial hegemônico em detrimento das singularidades nacionais e culturais.

O choque entre projeto imperial hegemônico e diferenças culturais deve nos levar a uma consciência crítica de defesa das barreiras éticas contra a destruição do humano, fruto, como vimos, tanto do desenvolvimento das forças produtivas, como do estranhamento humano presentes nesse mesmo desenvolvimento.

É nessa fronteira entre elevação espiritual e degradação, que globalidade e culturas devem negociar as margens do caos.

Aqui a ética nascerá da delimitação da violência capitaneada pelo império hegemônico, já que a globalização se tornou personagem principal do processo de desenvolvimento das forças produtivas mundializadas.

Assim, a ética crítica, como meio e não como fim, “está baseada no livre exercício do corpo e da alma, no desejo e na afirmação da vida”, como afirma Tarcyane Cajueiro Santos.

Porém, a virtude esbarra na heteronomia, na contradição do estranhamento, conforme detectou Marx. Somos parte da natureza, vivemos circundados por número ilimitado de efeitos externos e poderosos. Somos seres passivos ou cheios de paixão, enquanto  causa parcial, dominados e conduzidos por forças externas ao nosso corpo e à nossa alma.

E as paixões, como afirma Spinoza, não são em si nem boas nem más, pois fazem parte da natureza: a alegria, a tristeza e o desejo vibram em nosso ser. A alegria aumenta a capacidade de existir, enquanto o estranhamento degrada a existência.

Sem conselhos os planos fracassam,
mas com muitos conselheiros há sucesso”.
Provérbios 15.22

O movimento da paixão à ação, da heteronomia à autonomia, ocorre na imanência do próprio desejo, a partir do instante que temos condições de controlar e submeter o estranhamento que degrada. Nesse momento, a liberdade torna-se “atividade que transcende o presente pela possibilidade do futuro como abertura no tempo”, conforme diz Marilena Chauí.

No caminhar da globalização, a ética deixa de ser dever moral, imperativo categórico a priori, e passa a ser compreendida como balizadora daquilo que é humano.

Para construir tal ética crítica é necessária a existência ao nível mundial de um sujeito ético moral, nas palavras de Chauí, “que sabe o que faz, que conhece as causas e os fins de sua ação, o significado de suas intenções e de suas atitudes e a essência dos valores morais”.

Hoje no planeta, com todas as dificuldades reais, tal sujeito só pode ser traduzido na existência de um organismo internacional democrático. Assim, a construção do novo mundo deve ser obra dos humanos, na diversidade de credos, gêneros e raças, apoiados por uma assembléia global, que traduza as realidades e os sonhos da espécie humana.


Fontes
Karl Marx, Manuscritos Econômico-Filosóficos, Coleção Os Pensadores, São Paulo, Editora Abril, 1997.
Maria Norma Alcântara Brandão de Holanda, Lukács e o estranhamento em Marx, Unicamp, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Centro de Estudos Marxistas: www.unicamp.br/cemarx
Marilena Chauí, Convite à filosofia,  São Paulo, Ática, 1999.
Tarcyane Cajueiro Santos, O eticismo da sociedade tecnólogica e a ética em Espinosa, ECA-USP, Núcleo de Estudos Filosóficos da Comunicação: www.eca.usp.br/nucleos/filocom


mercredi 28 janvier 2015

Socialismo brasileiro

Questões que o socialismo brasileiro deve levar em conta

Jorge Pinheiro



É possível construir roteiros teóricos que possibilitam abordar a questão socialista a partir de uma leitura teológica. Com a finalidade de orientar nesse sentido apresento pontos que apontam nessa direção:

1. Condições especiais levam a massa proletária e a individualidade pessoal a formarem uma síntese chamada massa orgânica, que corresponde ao ideal da teonomia. Essa massa orgânica nem sempre caminha em direção ao ideal da teonomia, mas quando o tempo histórico orienta nessa direção temos a massa dinâmica. Esta é revolucionária, não só no sentido político do termo, mas em um sentido de fé espiritual e social. É necessário que a massa dinâmica seja revolucionária, porque o sentido de seu movimento é precisamente ir além do estado de massa.

2. O conflito interno do socialismo tem como ponto de partida a própria situação proletária. O conflito da situação proletária vem do fato de que o proletariado tem que se apoiar no princípio burguês e ao mesmo tempo deve se opor a esse princípio. Ou seja, o conflito tem por base o fato de que o proletariado deve ir além, sobrepujar o princípio burguês com os meios deste mesmo princípio. Esta oposição é inevitável, pois a existência proletária é a expressão conseqüente do princípio burguês: a objetivação, a reificação e a ruptura com sua própria origem estão presentes em sua existência. Então, o proletariado não pode reagir ao pensamento burguês com total liberdade e independência. Isto porque não se pode responder à reificação apenas com o ethos, isto é, há necessidade de usar meios políticos. 

3. A situação proletária mostra que a situação da existência humana está em contradição com o destino do ser humano. É por isso que o princípio protestante tem função especial na compreensão da situação humana quando se olha a partir da situação proletária, pois esta se apresenta como cisão demoníaca ou alienação. Estes elementos estão imbricados à situação de classe e à consciência de luta pelo socialismo, mas também têm uma significação universal. Eles não são atributos de uma classe, mas fazem parte do conteúdo humano e estão presentes na história. O proletariado descobriu que esses elementos o ligam aos outros grupos humanos. Nele, os elementos originais do ser humano são realidade presente que o leva à uma luta a favor de si mesmo, a uma recusa do princípio burguês. 

4. Quando analisada a partir do princípio protestante, a situação proletária mostra que a miséria humana toca tanto o corpo como a alma. E o socialismo, por sua parte, lembra ao protestantismo que o dualismo platônico, idealista ou burguês, não tem correspondência nem com a mensagem bíblica, nem com a teologia protestante. Tillich diz que “o protestantismo está livre para o materialismo proletário”. De sua parte, o princípio protestante diz ao socialismo que a miséria humana não é somente uma miséria socioeconômica, mas também humana.

5. A oposição entre o marxismo e a fé crista, não está no método dialético, e nem mesmo no materialismo, mas na leitura dos fatores intra-históricos. Na visão cristã é a combinação dos fatores intra e supra-históricos que define a história. A ausência desse elemento transistórico no marxismo, tende a levar as correntes socialistas a caminharem numa direção contrária a do próprio marxismo. Assim, o fator decisivo não é o contraste intelectual entre cristianismo e marxismo, mas o contraste na prática.

6. A utopia quer realizar a eternidade no tempo, mas esquece que o eterno abala o tempo e todos seus conteúdos e que é por isso que a utopia leva, necessariamente, à decepção. E o progresso mitigado é o resultado dessa utopia revolucionária desencantada. A realização da espera socialista não é um conceito meramente empírico. A utopia é impotente para enfrentar os poderes da sociedade, por isso se não se pergunta a respeito da promessa socialista, sua espera deixa de estar orientada em direção à realização. 

7. Há um choque entre a utopia, que pensa poder fixar a eternidade no tempo presente e o kairós, que se traduz enquanto espírito profético da responsabilidade inelutável. E é a partir dessa compreensão do que significa o espírito da profecia no tempo presente, que voltamos ao kairós, que irrompe no instante concreto, no sentido profético, enquanto plenitude do tempo. Kairós não é um momento qualquer, uma parte do curso temporal: kairós é o tempo onde se completa aquilo que é absolutamente significativo, é o tempo da destinação. Considerar uma época como um kairós, considerar o tempo como aquele de uma decisão inevitável é considerá-lo enquanto espírito da profecia. 

8. Toda mudança, toda transformação exige uma compreensão do momento vivido que vá além do meramente histórico, do aqui e agora. Deve projetar-se no futuro. Tal desafio não pode ser resolvido por um homem ou por uma mulher, por mais que encarnem o espírito da profecia. O sujeito da transformação será, em última instância, o movimento da massa dinâmica.

9. A esperança exorta a luta política a caminhar na direção do futuro prometido. A ação humana deve criar novas possibilidades de existência, provocar antecipações significativas do futuro. Na ação animada pela espera, há transformações e superações, mas não se alcança uma existência humana isenta de ameaça. O princípio último da justiça é o reconhecimento concreto da dignidade de todo ser humano como pessoa e, em primeiro lugar, dos injustiçados ou ameaçados pela injustiça.

Assim, a teologia possibilita uma releitura do socialismo e das lutas dos trabalhadores, mas não podemos esquecer a produção latino-americana, construída nas últimas décadas. Esta leitura latino-americana é fundamental e nos possibilita uma crítica e enriquecimento tanto do socialismo e como da teologia.


A lembrar um passado presente

A alegria cristã e a reforma social

A lembrar um passado presente 15/10/2002
Jorge Pinheiro

O rei Josias foi um reformador social e sua reforma teve por base a justiça proposta na lei deuteronômica. O que isso tem a ver com o candidato eleito, Luís Inácio Lula da Silva? O que, nos evangélicos, queremos do futuro governo Lula?


No dia 15 de outubro, o então candidato à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, garantiu em João Pessoa que, se eleito, pretendia estabelecer um pacto social para a conquista da cidadania: (1) capaz de gerar empregos; (2) ampliar o acesso dos jovens ao ensino público de qualidade; (3) e elevar o padrão de qualidade de vida da população brasileira.

Falando no parque Sólon de Lucena, em João Pessoa, Lula garantiu que fará uma reforma agrária capaz de estabelecer a paz no campo, sem violência, sem invasões e com diálogo.

Disse ainda: "Vamos colocar empresários e trabalhadores na mesa de negociação" para firmar um pacto social a serviço do desenvolvimento brasileiro.

A Palavra de Deus nos diz: Tenham sempre alegria, unidos com o Senhor! Repito: tenham alegria! [Filipenses 4.4-5]. Este texto, que remete a Sofonias 3.14-18, nos ensina que a alegria cristã não deve ser evasiva, efêmera e superficial. A Palavra de Deus mostra que neste salmo de alegria Sofonias aponta para a salvação e para o retorno dos remanescentes a Israel [3.11-13.19-20] e, por isso, convida todos à alegria [3.14-18].

O convite de Sofonias coincide com a esperança trazida através do rei Josias, que se apresentou como reformador social, e também pelo declínio da Assíria, que afrouxava sua influência opressora.

A lei deuteronômica, encontrada no Templo durante o reinado de Josias, expressa a vida íntima da comunidade, a necessidade de que cada pessoa tenha o mínimo para sobreviver e que ninguém viva numa situação miserável.

Deste modo, a lei deixa de ser uma obrigação imposta e pesada e passa a ser um dom que Deus oferece a todo o povo. Este dom ou aliança se fundamenta no direito de cada pessoa e família a possuírem o necessário a uma vida digna e cidadã. Ou como diz a promessa deuteronômica: O Senhor, nosso Deus, os abençoará ricamente na terra que lhes vai dar. Portanto, não haverá nenhum israelita miserável, se todos derem atenção ao que o Senhor ordena e obedecerem a todos os mandamentos que hoje eu estou dando a vocês. [Deuteronômio 15.4-5].

A aliança, a lei, o dom deve ser interiorizado. A convivência no país que Deus deu ao povo peregrino exige uma mudança de mentalidade que se traduz numa organização social onde o direito divino prevalece sobre todas as instituições. O mais importante deste direito é a justiça entre as pessoas, que deve ser entendida como fundamento da convivência social.

Dez dias depois, das afirmações de Lula na Paraíba, pós-graduandos da Unicamp, em carta de apoio à candidatura de Lula, afirmaram que “a postura ética sempre foi uma importante característica da trajetória de vida de Lula, isso associado à sua maturidade política lhe fornece ainda mais credibilidade para liderar a execução de um projeto nacional que tenha como metas o crescimento econômico e a geração dos empregos de que o país tanto necessita. Consideramos, ainda, que com esse perfil de exímio aglutinador e integrador de forças, Lula criará as condições necessárias para o estabelecimento do diálogo com amplas camadas da sociedade, dentre as quais os empresários, os trabalhadores e os movimentos sociais, viabilizando a construção de um pacto social em torno de um novo modelo de desenvolvimento que possibilitará a inclusão sócio-econômica de cerca de 40 milhões de brasileiros”.

A isso nós chamamos reforma social. Não queremos que Lula seja um reformador religioso, esse papel cabe a nós, à igreja brasileira, mas que – como disseram os pós-graduandos da Unicamp -- estabeleça o diálogo com amplas camadas da sociedade, com os empresários, os trabalhadores e os movimentos sociais, viabilizando a construção de uma aliança social em torno de um novo modelo de desenvolvimento que possibilite a inclusão sócio-econômica de milhões de brasileiros.

Essa deve ser a oração dos evangélicos brasileiros. Para que possamos verdadeiramente nos alegrar com as maravilhas que o Deus Eterno pode fazer nesta terra brasileira.




mardi 27 janvier 2015

Jerry Lee Lewis

http://youtu.be/Fa5kKnRwgcc


Amar e ser amado

Diferentes interpretações de um mesmo tema
Jorge Pinheiro

Ai flores, ai, flores do verde pio,
se sabedes novas do meu amigo?
ai, Deus, e u é?

Ai flores, ai flores do verde ramo,
aquel que mentiu do que pôs comigo?
ai, Deus, e u é?
[Julião Bolseiro, Cantiga de amigo, do cancioneiro de Dom Diniz].

O Cântico dos Cânticos é o único livro da Bíblia que tem o amor como seu tema exclusivo. Seu título poderia ser traduzido como A mais bela das canções, o que faz juz a esta que é uma das mais bem escritas estórias de amor de toda a literatura universal. Ao traduzir a rica imaginação oriental, o texto fala de amada e amante, interligando os quadros com coros e falas de grupos de personagens, como as filhas de Jerusalém e os guardas.

O texto tem forte conteúdo erótico, parte da realidade vivida por uma jovem camponesa, mostrando que estamos diante de um exemplar da dramaturgia do período áureo da literatura poética hebraica. Várias interpretações têm sido apresentadas para O Cântico dos Cânticos.

Aqui, faremos a leitura do Cântico dos Cânticos partindo de um conselho do intelectual inglês Daniel de Morley em suas memórias de viagens, no século 12, conforme citado por Jacques Le Goff (Os intelectuais na idade média, Lisboa, Editorial Estúdios Cor, 1973, pp. 25-26).

Morley conta que seguiu “as Artes, que esclarecem as Escrituras, em vez de as saudar à passagem ou de as evitar, fazendo resumos. Então, como nos dias de hoje é em Toledo que o ensino dos Árabes, que consiste, quase exclusivamente nas artes do quadrivium, é dispensado às multidões, apressei-me a partir, para aí ouvir as lições dos mais sábios filósofos do mundo. Tendo alguns amigos pedido para eu voltar e tendo sido convidado a deixar a Espanha, vim para Inglaterra com uma preciosa quantidade de livros”.

“Que ninguém se indigne se, tratando da criação do mundo, eu invoco o testemunho não dos Padres da Igreja, mas de filósofos pagãos, porque, ainda que estes não figurem entre os fiéis, algumas das suas palavras, desde que sejam cheias de fé, devem ser incorporadas no nosso ensino. Nós que também fomos misticamente libertados do Egito, o Senhor ordenou-nos que despojássemos os Egípcios dos seus tesouros, enriquecendo com eles os Hebreus. Despojemos, pois, conforme o desejo do Senhor, e com a sua ajuda, os filósofos da sua sabedoria e da sua eloqüência, despojemos esses infiéis de modo a enriquecermo-nos com os seus despojos na fidelidade”.

As cantigas de amigo


Assim, queremos aprender com as cantigas de amigo, do medieval ibérico, por terem semelhanças que podem nos ajudar a entender a poesia de Cantares. As cantigas de amigo eram de autoria masculina, assim como Cantares e, também, apresentavam um eu lírico feminino.

Para entender esta questão do eu lírico feminino, é bom ler Magadelene Luise Frettloeh, O amor é forte como a morte: uma leitura de Cânticos dos Cânticos com olhos de mulher (in: Fragmentos de Cultura, Instituto de Filosofia e Teologia de Goiás, IFITEG, Goiânia/GO, Brasil, 2002, vol.12, no. 4, pp .633-642).

Ela explica que é necessário ler Cântico dos Cânticos em perspectiva de gênero, pois neste livro canta-se o amor espontâneo entre uma mulher e um homem, um amor que é forte como a morte. E que nos poemas do início e do final do livro há um protagonismo feminino: “no decorrer da história da interpretação tentou-se soterrar essa herança; hoje importa redescobri-la".

Assim, encontramos tanto no Cântico dos Cânticos como nas Cantigas de Amigo a questão do amante ausente: a amada estava a espera dele ou tinha sido abandonada. Ambas poéticas traduzem a força do Eros humano. Outra característica marcada das cantigas de amigo era o fato de estar dirigida às amigas, a mãe ou irmãs, ou as forças da natureza e, em alguns casos, a Deus. A ambientação, rural ou urbana, estava sempre distante do castelo do senhor feudal.

Um dos maiores cancioneiros do medieval ibérico foi Julião Bolseiro e um de seus poemas, que intercala este artigo, expressa esse eu lírico feminino, que se lamenta porque o amante desapareceu e ela não sabe onde se encontra.

O amor entre os dois, diferentemente do amor cortês, vigiado, expressa a força do natural e espontâneo no amor humano, pois a cantiga parece insinuar que houve um relacionamento físico entre os amantes.

Nesta cantiga de amigo, a ambientação é rural, e não somente distante do castelo do senhor feudal, mas com presença marcante da natureza.

Se sabedes novas do meu amado
aquel que mentiu do que mi á jurado?
ai, Deus, e u é?

Vós me preguntades polo voss' amigo?
E eu ben vos digo que é são e vivo:
ai, Deus, e u é?

Salomão, o herói


Uma interpretação, quase unânime entre antigos rabinos e os pais da Igreja, considera o rei Salomão o herói da estória. Dentro desta perspectiva, o roteiro seria mais ou menos assim: o rei possuía um vinhedo na região de Efraim, 80 quilômetros ao norte de Jerusalém (8:11). Essas terras estavam arrendadas (8:11) a uma viúva e seus quatro filhos (dois rapazes e duas moças -- cf. 6:13, 1:5 e 6). A Sulamita, a mais bonita das filhas, era responsável pela casa e também cuidava dos rebanhos (1:8).

Certo dia, o rei, disfarçado para não ser reconhecido, visitou o vinhedo e ficou impressionado com a beleza da moça. Ela tomou Salomão por um pastor de ovelhas e este lhe dirigiu palavras de amor, prometendo voltar no futuro e lhe trazer presentes (1:8-11). À noite, a moça sonhava com a volta do amado, chegando mesmo, em determinado momento a pensar que ele estava chegando (3:1). Mais tarde, ele volta. Mas, agora, não como camponês e sim como rei de Israel (3:6 e 7). Segue-se, então, o casamento e seus desdobramentos.

Partindo desse roteiro temos cinco poemas:
Título e prólogo - Cap. 1:1 a 1:4
1. O desejo e a satisfação da jovem camponesa - Caps. 1:5 a 2:7
2. A visita do amado e o sonho da moça - Caps. 2:8 a 3:5
3. A festa de casamento e as canções do rei - Caps. 3:6 a 5:1
4. A tardia recepção da amada e sua busca prolongada - Caps. 5:2 a 6:3
5. Sulamita e seu amado conversam - Caps. 6:4 a 8:4.
Epílogo e últimas adições - Cap. 8:5 a 8:14.

Para o teólogo chileno Samuel Fernández Eysaguirre. A manifestis, ad occulta, Las realidades visibles como único camino hacia las invisibles en el comentario al Cantar de los Cantares de Orígenes (in: Anales de la Facultad de Teología. Universidad Católica - Campus Oriente, Santiago, Chile, 2000, vol. 51, no. 2, pp.135-159) a leitura literalista levou os teólogos da Igreja antiga a um beco sem saída:

"Una lectura meramente literal del Cantar de los Cantares presentaba graves dificultades a la sensibilidad religiosa de la antigüedad. El libro exalta, al menos en su sentido inmediato, el amor humano y abunda, como pocos textos bíblicos, en descripciones de los miembros del cuerpo. Y por otra parte, el Cantar no menciona explícitamente a Dios. El sentido literal del texto no parecía edificar moralmente a sus lectores. Era posible preguntarse ¿qué hace en las Escrituras un libro que no habla de Dios? Las serias dificultades que presentaba su lectura literal, sumadas al carácter poético del Cantar, favorecían fuertemente una interpretación de tipo simbólica, interpretación que se impuso tanto en el ámbito judío como cristiano. Las dificultades recién descritas llevaron a algunos rabinos a dudar de la canonicidad del Cantar...".

Vós me preguntades polo voss' amado?
E eu ben vos digo que é viv' e são:
ai, Deus, e u é?

E eu ben vos digo que é são e vivo
e seerá vosc' ant' o prazo saido:
ai, Deus, e u é?

E eu ben vos digo que é viv' e são
e s[e]erá vosc' ant' o prazo passado:
ai, Deus, e u é?

Salomão, o vilão


Outra interpretação, formulada pelo teólogo Heinrich Ewald, no século 19, vê no amante um pastor de quem a jovem estava noiva, antes de ser capturada e levada para o harém de Salomão, por um de seus servos. Depois de ter resistido com sucesso a todas as tentativas do rei para conquistar sua afeição, ela é libertada e se reúne a seu amado, com quem aparece na cena final.

A jovem relembra o amado (1:2 e 3). Pede que ele a leve de volta logo, pois o rei a introduziu nas seduções da corte (1:4). Suas recordações do amado a perturbam (1:7). O rei tenta seduzi-la com jóias (1:11) e perfumes (1:12), mas ela prefere o cheiro do campo que lembra o corpo do amado (1:13 e 14). A moça se recorda de uma visita feita por ele e de um sonho que se seguiu (2:8 - 3:5). Depois disso, ela é novamente visitada e louvada por Salomão (3:6 - 4:7). Diante da persistente ofensiva do rei, antecipa seu casamento com o jovem camponês (4:8 - 5:1). Sua vida e seus sonhos estão impregnados com as lembranças do amado (5:2 - 6:3). Salomão mais uma vez tenta conquistar Sulamita (6:4 - 7:9). Ela, no entanto, mantém sua fidelidade ao pastor e resiste às tentativas do rei (7:10 - 8:3). Diante disso, Salomão a liberta, verificando que é impossível conquistar a moça.

Dentro desta perspectiva, é interessante ler Cântico dos Cânticos, O fogo e a ternura de Ney Brasil Pereira e Pablo Andiñach, (Col. Comentário Bíblico, Petrópolis/São Leopoldo, Editora Vozes/Editora Sinodal, 1998, 128p., in: Estudos Bíblicos. Editora Vozes, Petrópolis/RJ, Brasil, 2000. no. 65, p9.81-84).

Para os dois teólogos, os poemas do Cântico foram redigidos, em sua redação final, por uma mulher. Seria, portanto, o único livro bíblico de uma autora. Isso dá ao comentário um cunho especial, uma vez que se assume que ela, a autora, tenha deixado nos poemas sua marca feminina e seu modo peculiar de viver a sexualidade e a vida. Ao mesmo tempo, a autora teria feito uma crítica sutil, mas firme, ao modelo salomônico de sexualidade, marcado pela frivolidade e a poligamia.

A partir dessa interpretação temos outro roteiro:
1. No palácio, a moça relembra o amado e é assediada por Salomão - Caps. 1:1 a 2:7
2. Lembra-se de uma visita do jovem e de um sonho - Caps. 2:8 a 3:5
3. Sulamita mais uma vez é visitada e elogiada por Salomão - Caps. 3:6 a 4:7
4. Resiste às investidas do rei e antecipa seu casamento - Caps. 4:8 a 5:1
5. A moça relata outro sonho e descreve seu amado - Caps. 5:2 a 6:3
6. Salomão mais uma vez tenta conquistar Sulamita - Caps. 6:4 a 7:9
7. Saudosa e fiel, a moça anseia a companhia do amado - Caps. 7:10 a 8:3
8. Enfim, recebe alforria, e retorna para casa com seu esposo - Cap. 8:4 a 8:14.

O amor é mais forte

Em meio às várias interpretações, é bom relembrar, como diz Isidoro Mazzarolo, Cântico dos Cânticos - Uma leitura política do amor (1a. ed., Mazzarolo Editor, Rio de Janeiro/RJ, Brasil, 2002. 249 p.), que "o livro dos Cânticos está entre as grandes obras da sabedoria bíblica ao propor uma visão do ser humano, homem e mulher, como duas criaturas colocadas no universo e dotadas de liberdade e dignidade".

Assim, a mensagem de amor permanece. E talvez possamos dizer, como nos lembram as Cantigas de Amigo, que esta é a grande mensagem do livro.