vendredi 13 juin 2014

Em defesa do respeito a todas as religiões

Manifestamo-nos contra a decisão do Juiz Eugênio Rosa de Araújo que, além de negar a solicitação do Ministério Público Federal, para que a Google Brasil retirasse do Youtube vídeos que incitam à intolerância contra as religiões de matriz africana, considerou que estas não constituem religião. Tal decisão arrisca a jurisprudência brasileira a abrir precedente favorável ao crime de ódio religioso e racismo. Além disto, desconsidera o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial e o Pacto de São José da Costa Rica (Convenção Latino-Americana de Direitos Humanos). A decisão do Magistrado fere também a Lei da Igualdade Racial, 12.288/10. 

A discriminação e perseguição sofridas por praticantes de religiões afro-brasileiras perpassam a história de nosso país. Elas são expressões do racismo e da dificuldade de reconhecer como legítima as diversidades cultural, étnica e religiosa constitutivas do Brasil. A intolerância religiosa nunca deixou de existir em nosso país. Os protestantes, inclusive, foram alvo dela no interior do Brasil no início do século XX. Em tempos recentes, no entanto, as redes sociais têm sido um espaço privilegiado de manifestações de preconceito e incitação ao ódio contra as religiões afro-brasileiras. Segundo a Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos, no ano de 2012, foram realizadas 494 denúncias de intolerância religiosa praticadas em perfis do Facebook. No período de 2006 a 2012, foram 247.554 denúncias anônimas de páginas e perfis em redes sociais que continham teor de intolerância religiosa. Diante destes números, a decisão do magistrado pode contribuir para estimular e ampliar práticas deste tipo de intolerância. O Ministério Público Federal recorreu acertadamente à decisão.

O EPJ é formado por pessoas de várias correntes teológicas evangélicas que buscam a justiça para todos e não desejamos entrar em um debate doutrinário a respeito do tema. Entendemos que a intolerância religiosa deve combatida. Não aceitamos a utilização das religiões como bandeiras para incitar a violência e discriminações. Acreditamos que, antes de tudo, deve prevalecer o respeito à diversidade étnico-religiosa de nosso país. Defendemos um estado laico, no sentido da garantia do pluralismo cultural e religioso e do tratamento isonômico a todas as religiões. Entendemos que divergências doutrinárias, rituais e ético-religiosas não podem ser a base para ações públicas de discriminação, intimidação, vilipêndio ou violência. E ao Estado cabe não só zelar para que a consciência e a prática religiosa sejam asseguradas, mas também abster-se de tomar posições que se configurem em tomada de posição oficial em benefício ou prejuízo desta ou daquela religião. Na ausência de violações de direitos ou da legalidade, não compete ao estado laico patrocinar definições, classificações e assumir parâmetros de compreensão que, pertencendo a uma religião ou a nenhuma, se apliquem sem qualificações a outras religiões.

Neste contexto, ao mesmo tempo em que conclamamos a sociedade brasileira a aprofundar o diálogo social e cultural sobre as diferenças que nos constituem, juntamente com outras organizações religiosas, somamos nossas vozes à reivindicação de lideranças do Movimento Negro e de parlamentares para que o Conselho Nacional de Justiça analise o comportamento de tal magistrado. Apesar de se tratar de um caso aparentemente isolado, entendemos que os agentes do estado numa sociedade que já completa mais de 25 anos de construção democrática e indelevelmente marcada pela pluralidade religiosa, não há pretexto justificável para posicionamentos desse teor.

EPJ – Evangélicos Pela Justiça
www.epj.org.br
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