lundi 13 juin 2016

A escolha livre

O arbítrio livre é um princípio do judaísmo desde a construção dos textos antigos. Assim, Deuteronômio nos diz "e você vai praticar o que é certo e bom aos olhos de Eterno, para alcançar a felicidade ..." (6.18). Tal princípio é uma idéia-chave na tradição judaica, um pilar da Torá e está presente nos trabalhos do exegeta judeu Moisés Maimônides -- Mishnah Torah Hilkhote Teshuvah 5.3.


האיש הוא חינם

Na verdade, o arbítrio em liberdade é a pedra angular de todos as correntes judaicas, pois compreende que o Eterno deu essa liberdade ao ser humano quando o criou, fornecendo a ele o poder de saber escolher entre o certo e o errado. Confiante na sua criatura, Ele espera que o ser humano naturalmente escolha o bem, ou como diz Eclesiastes, "o Eterno criou o homem certo" (7.29). Mas se em relação a toda a criação, o Eterno disse ki tov --porque é bom – em relação ao humano omitiu tal afirmação. Esta omissão atesta a idéia de que o humano tem em si a possibilidade de escolha de fazer o bem ou o mal, e de reparar os erros cometidos, por ato de desejo intenso, e assim se livre dos grilhões que impedem o seu ser de crescimento, ao fazer dele escravo de sua própria natureza. O conceito de teshuvá, de voltar para o que você deve ser e para o Eterno, traduz esse princípio judaico.

"Mas se o ímpio se converter de todos os pecados que cometeu... praticar a lei e virtude, viverá..." (Ezequiel 18.21). E Simeão ben Zoma diz: "quem é forte? aquele que domina suas paixões?" Quem domina suas paixões supera o guerreiro que domina uma cidade. (Provérbios 16.32 e A ética dos Pais 4.1).

Assim, o Eterno sabendo que Abel corria perigo, após a recusa de ofertar como Caim, apelou para a consciência do irmão mais velho. "Se você fizer o melhor, o bem vai até você, se o pecado jaz à sua porta, ele deseja a chegar até você, mas você, deve saber dominá-lo" (Gênesis 4.7).

ישנם שני נתיבים

De acordo com Maimônides, "dois caminhos se encontram nas mãos do homem e ele é livre para ir aonde ele quer, nada impede, nem homens nem anjos". E o Gaone Vilna explica que o arbítrio livre implica exceder nossa natureza, o que é possível na contínua luta entre forças opostas. E tal idéia está explícita quando o Eterno nos diz "Eu dou hoje uma bênção e uma maldição" (Deuteronômio 11.15). Um primeiro nível de conhecimento do bem e do mal está no coração humano e o leva à sabedoria, onde saber distinguir entre o bem e o mal se torna o prêmio no conhecimento iluminado pelo Eterno.

Mas não nos enganemos. A moralidade não é escolher entre o bem e o mal. Todo mundo decide ser bom, mesmo as pessoas que são más e desprovidas de sentido moral. Hitler tinha concluído que os judeus eram os inimigos da humanidade e, portanto, em sua mente, pensando assim fazia o que era bom. Mas, na verdade, o livre arbítrio é a escolha entre a vida e a morte. Como está escrito na Torah, "Eu pus diante de ti a vida a morte... Escolhe a vida e viverás, então, tu e tua descendência". (Deuteronômio 30.19)

חופשי להיות

Mas os sábios judeus se fizeram uma pergunta, o humano é completamente livre em seus pensamentos, palavras e ações? Ele pode reivindicar a conquista da felicidade perfeita? Não! Ele está sujeito, por um lado, às restrições internas adquiridas pela educação e ditados pelo subconsciente escravizado por necessidades triviais, e em segundo lugar, pelas normas impostas pelo ambiente. Por isso, arbítrio livreé um chamado para que ele domine suas forças internas e impulsos.

E na sequência perguntaram: quais os limites do arbítrio livre? E porque o Eterno não intervém para por fim à iniquidade e parece indiferente à dor humana? "Por que você me deixa ver a iniquidade, e porque testemunha à injustiça?" (Habacuque 1.3). E a ética dos Pais 3.15 diz: "Quando violamos a justiça humana em face do Altíssimo, quando o mal é feito para o homem no seu pleito, o Senhor não vê isso? Quem vai dizer que algo acontece sem que o Senhor ordene? Não é a vontade do Altíssimo fazer surgir o mal e o bem?"

Como a vontade divina, que gera a história deste mundo, está conciliada com a idéia do arbítrio em liberdade? E mais uma vez a Ética do Pais nos orienta: "O mundo é julgado com benevolência e tudo depende da maioria das obras" (3.15). Ou seja, se a liberdade de ação dos seres humanos parece absoluta, a escolha a preferir a vida à morte, de fato, nos é ordenada pelo Eterno: escolha a vida.

Assim, as questões éticas no judaísmo repousam menos sobre a questão do determinismo, ou como o filósofo judeu Yitzchak ben Yehuda Abravanel esclarece, apoia-se em um caminho que conduz à melhoria do ser humano. Toda a bondade e a perfeição do ser humano repousam sobre o livre-arbítrio e sua habilidade sincera em reparar a falha cometida. A culpa de Caim, depois que matou seu irmão Abel, reside na sua recusa em aceitar a oportunidade oferecida pelo Eterno, de arrependimento, de reconhecimento do erro e confessar, de acordo com o princípio da escolha livre, a sua responsabilidade. Caim, sujeito à sua natureza cruel, ao contrário, levanta a questão: sou eu o guarda do meu irmão?

חופש הבחירה

Paradoxalmente, a perfeição, longe de ser o resultado de uma vida sem falhas, é sim uma expressão do poder do arbítrio livre para distinguir o certo do errado. "Dependo do Eterno, exceto do medo do Eterno" (O tratado das bênçãos, Bérakhote 33). "O homem foi criado apenas para deleitar-se com o Eterno e apreciar o esplendor da sua presença", disse o sábio Chaim Luzzatto, em sua Méssilate Yesharim. Na verdade, escravo é aquele que, privado de toda a liberdade de pensamento, está proibido de ação autônoma.

Vejamos um exemplo, o faraó, negou o conhecimento primeiro, ignorou essa tselem Elohim, a imagem do Eterno nos filhos de Israel e no humano em sua dimensão universal, por isso foi punido, perdendo o direito ao arbítrio livre. Gênesis 1.26. Isto se dá porque nas primeiras cinco pragas do Egito, o Eterno diz claramente ao faraó que ainda há tempo para libertar os filhos de Israel. Mas foi em vão, porque o "faraó endureceu o seu coração". E no correr das outras cinco pragas, faraó se torna escravo de si mesmo. "Meu rio é meu, sou eu que me fiz". Ele afasta de si a sua própria consciência e não retorna a ela. Nega sua imago Dei, rechaça sua consciência, faz sua opção pelo mal... E esta realidade é traduzida com a expressão, "o Eterno endureceu o coração de faraó".

Onde o homem decide ir, o Eterno o conduz. Ele paga "a cada um segundo os seus caminhos e de acordo com o mérito de suas obras" (Jeremias 32.19). Assim, os filhos de Israel provaram sua maturidade e mostraram sua grandeza ao firmar a decisão de deixar a escravidão. Esse é o ponto de referência. E no seu arbítrio em liberdade, "tomaram para si um cordeiro, e o sangue foi um sinal para todo o povo". Dessa maneira, o Eterno nunca impõe aos seres humanos a liberdade; eles têm a responsabilidade de aceita-la e impô-la. O Eterno elege aqueles que optam por agir como serres humanos livres.

רצונו של אדם הוא חופשי

E voltemos a Maimônides: "... o homem tem o poder absoluto para agir naturalmente por seu livre arbítrio e sua vontade" (Guia dos Perplexos 3.17). E porque "a felicidade decorre do esforço humano" (A ética dos Pais), a escolha em liberdade é o esforço que só os seres humanos são capazes de fazer e que lhes permite distinguir a vida da morte. 

E como afirma a Declaração Universal dos Direitos, "todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade".