A
Páscoa do Senhor
Jorge Pinheiro
Nosso
texto é
Chegou
o dia da Festa dos Pães sem Fermento, dia em que os judeus matavam carneirinhos
para comemorar a Páscoa. Então Jesus deu a Pedro e a João a seguinte ordem: –
Vão e preparem para nós o jantar da Páscoa. Eles perguntaram: – Onde o senhor
quer que a gente prepare o jantar? Jesus respondeu: – Escutem! Quando entrarem
na cidade, um homem carregando um pote de água vai se encontrar com vocês.
Sigam esse homem até a casa onde ele entrar e digam ao dono dela: “O Mestre
mandou perguntar a você onde fica a sala em que ele e os seus discípulos vão
comer o jantar da Páscoa.” Então ele mostrará a vocês uma grande sala
mobiliada, no andar de cima. Preparem ali o jantar. Os dois discípulos foram até
a cidade e encontraram tudo como Jesus tinha dito. Então prepararam o jantar da
Páscoa. Quando chegou a hora, Jesus sentou-se à mesa com os apóstolos e lhes
disse: – Como tenho desejado comer este jantar da Páscoa com vocês, antes do
meu sofrimento! Pois eu digo a vocês que nunca comerei este jantar até que eu
coma o verdadeiro jantar que haverá no Reino de Deus. Então Jesus pegou o
cálice de vinho, deu graças a Deus e disse: – Peguem isto e repartam entre
vocês. Pois eu afirmo a vocês que nunca mais beberei deste vinho até que chegue
o Reino de Deus. Depois pegou o pão e deu graças a Deus. Em seguida partiu o
pão e o deu aos apóstolos, dizendo: – Isto é o meu corpo que é entregue em
favor de vocês. Façam isto em memória de mim. Depois do jantar, do mesmo modo
deu a eles o cálice de vinho, dizendo: – Este cálice é a nova aliança feita por
Deus com o seu povo, aliança que é garantida pelo meu sangue, derramado em
favor de vocês. Lucas 22.7-20.
E
os textos de apoio são Mateus 26.17-25, Marcos 14.12-21 e João 13.21-30.
1. O que é o Pessach?
O
Pessach é a celebração judaica que recorda a morte dos primogênitos no Egito, a
fuga da escravidão e o êxodo dos israelitas para a terra prometida. A palavra Pessach
significa “passagem”, “travessia”, e Êxodo 12.12-14 Deus conta o que faria.
Podemos dizer que o Pessach judaico é a festa da libertação do Egito e a
conquista da liberdade em Canãa.
O
nome Pessach, Páscoa, foi adaptado pelos cristãos, e como, muito possivelmente,
Jesus morreu no dia 14 de Nissan, que é o dia do início de Pessach, se acredita
que a última Ceia de Jesus foi um Seder de Pessach, ou seja, um jantar, uma
ceia de Páscoa.
2. A ceia pascal de 14 Nissan
Uma
leitura singela da ceia do Pessach. Durante a ceia judaica da páscoa, Jesus
disse fazei isto para se lembrarem de mim. A celebração da Páscoa judaica, para
nós cristãos, passou a ser o aniversário da crucificação de Jesus. O pão
partido durante a ceia é o seu corpo. E o vinho no cálice é a benção do resgate
através de seu sangue. Fazer isso, partir o pão, comer a ceia de Páscoa, e
beber o vinho do cálice, simboliza a redenção da nova aliança. E devemos
celebrar essa ceia em memória dele.
Portanto, é necessário lembrar, que a centralidade dessa ceia pascal é a
morte do Messias.
A
ordem do serviço da Páscoa judaica começa com uma oração, a bênção do cálice de
vinho. E o cálice circula entre os convivas. Em seguida são servidas ervas
amargas em água salgada. O chefe da família, que lidera este momento da ceia,
apresenta um pão sem fermento, o parte e, em seguida, coloca um pedaço de lado.
O participante mais jovem pergunta o que torna essa noite diferente de todas as
outras noites? A resposta é dada pela história da primeira Páscoa. Canta-se os
Salmos 113 e 114 antes de encher o segundo cálice de vinho.
Antes
da refeição, os convivas lavam suas mãos. A ceia começa com bocados de ervas
mergulhados em um molho. E há um momento especial, quando um cordeiro assado é
repartido entre os comensais. A ceia termina com o canto dos salmos 115 a 118 e
do salmo 136, quando se bebe a última taça de vinho.
O
memorial da última ceia do Messias, simbolicamente, traz à cena a ceia do
Pessach, que prefigura em certa medida as idéias de aliança e redenção. Mas o
Pessach judaico nos fala de libertação da escravidão no Egito, da libertação de
um reino de opressão e o caminhar em direção à terra prometida. Aponta para o
passado e situa todo o acontecimento num espaço geográfico definido. É uma
lição para as novas gerações.
A
páscoa do Senhor toma os símbolos do Pessach e aponta para o futuro. É,
sobretudo, não espacial e não temporal, e aponta para o sacrifício vicário do
Senhor Jesus, para a nova aliança feita em cima de seu sangue derramado e para
a promessa de sua volta, quando o Senhor instalará um novo Reino de alegria,
justiça e paz, eternas. É uma páscoa que nasce nos corações e se projeta na
eternidade.
A
"páscoa do Senhor", celebrada por Jesus, é diferente da "festa
dos pães ázimos" (Levítico 23.6, Lucas. 22.1).
·
É sacrifício
vicário (“o que faz às vezes de outro”) de Jesus, conforme ... Depois pegou o pão e deu graças a Deus. Em seguida partiu o
pão e o deu aos apóstolos, dizendo: – Isto é o meu corpo que é entregue em
favor de vocês. Façam isto em memória de mim.
· Lucas 22.19.
*
É nova aliança de Deus com seu povo, conforme ... Depois
do jantar, do mesmo modo deu a eles o cálice de vinho, dizendo: – Este cálice é
a nova aliança feita por Deus com o seu povo, aliança que é garantida pelo meu
sangue, derramado em favor de vocês. Lucas
22.20.
* É promessa da sua volta, conforme ... Pois eu digo a vocês que nunca comerei este jantar até que eu
coma o verdadeiro jantar que haverá no Reino de Deus. Lucas 22.16.
3. O
banquete da páscoa
Ela
virou e respondeu em hebraico: Meu mestre!
[De Montpellier, França] -- Na sala, o notebook toca música brasileira. Eu, Naira e
Paloma convidamos quatro jovens para o almoço de páscoa: Andreas, alemão, que
estuda engenharia; Georgine, de Barcelona, que estuda economia; Térèse, alemã,
que estuda Teologia; e Serge, de Barcelona, que veio passar uma semana em
Montpellier. Jovens cujas famílias estão longe, cristãos na diáspora acadêmica.
Enquanto eles conversam, Djavan canta
que amar é um deserto e seus temores, e a vida vai na
cela dessas dores. Lá
fora, junto ao pinheiro, companheiro da janela da sala, a primavera chega a
passos largos. Eu preparo coelho a caçadora e Naira manchon
de canard. Essas serão
as carnes do almoço. O almoço é a francesa, com toda a liturgia que isso
implica. E os Paralamas do sucesso dizem que o
calibre do perigo é não saber de onde vem o tiro.
Como vocês notaram estamos em pleno
domingo de páscoa. E quando se fala de páscoa, se fala de morte, já que não
haveria ressurreição se não houvesse morte. Donde, procedem os temores de
Djavan e dos Paralamas. E isso me leva à teologia, através de um velho amigo
dos últimos anos, Paul Tillich.
Ele conta em sua autobiografia, “Minha
busca pelo Absoluto”,
que a primeira Guerra Mundial colocou um ponto final em sua formação, pois sua
geração foi chacoalhada de tal maneira pela guerra, que deixou para trás sua
existência individualista e predominantemente teórica.
Tillich serviu como capelão do exército
alemão de setembro de 1914 a setembro de 1918. Ele conta que “antes
que as primeiras semanas tivessem passado, meu entusiasmo original desapareceu,
e depois de alguns meses me convenci de que a guerra duraria indefinidamente e
arruinaria toda a Europa. Acima de tudo, vi que a unidade das primeiras semanas
era uma ilusão, que a nação estava fendida em classes, e que as massas
industriais consideravam a Igreja como um aliado incontestado dos grupos
governantes. Esta situação se tornava mais clara conforme se aproximava o fim
da guerra. Produziu a revolução que fez desmoronar a Alemanha imperial. O modo
como tal situação deu origem ao movimento socialista religioso na Alemanha já
foi descrito. Porém, eu quero acrescentar algumas reflexões”.
Revela que apoiou o movimento socialista
que fez a revolução de 1918 na Alemanha, revolução que foi morta pela fraqueza
dos próprios socialistas, por seus erros políticos, como a utilização do
Exército na repressão aos comunistas; por razões econômicas, como a inflação
galopante; e pela volta das forças reacionárias que cresceram nos anos vinte. “Minha
empatia com os problemas sociais da revolução alemã teve raízes em minha
infância (...). Talvez fosse uma gota do sangue que induziu minha avó a
construir barricadas na revolução de 1848, talvez a impressão deixada pelas
palavras dos profetas hebreus contra injustiça e pelas palavras de Jesus contra
os ricos, estas palavras eu aprendi de cor quando menino”.
E Tillich constata que essa empatia
aumentou com o passar dos anos e se transformou em militância socialista
religiosa que, depois da segunda Guerra Mundial definhou em resignação e amargura
por ver o mundo dividido em dois grupos todo-poderosos, que esmagaram as sobras
de um socialismo democrático e religioso. Mas, confiante no futuro, afirma: “se a
mensagem profética é verdadeira não há nada além do socialismo religioso”.
Quando Tillich fala de socialismo, fala
da necessidade incondicional de justiça, presente no coração humano, e que deve
fundamentar toda ação política. E isso só é possível se o amor ágape fecundar a
política e produzir frutos de justiça. Por isso, socialismo verdadeiro é aquele
socialismo que está pleno de sentido último [ultimate
concern] e
transcendência. Se isso não se der, o socialismo se transformará em
quase-religião, idolatria que violenta e oprime o ser humano.
Ao falar de páscoa, ao nos lembrarmos da
ressurreição, nos vem à mente os dois dias e meio de silêncio e tristeza, que
marcaram a pós-morte de Jesus. Por que esses quase três dias? Na verdade, eles
fazem parte de uma pedagogia que transcende. Através desses quase três dias de
silêncio e tristeza, Deus possibilitou aos discípulos a aprendizagem da unidade
do corpo. Em meio ao silêncio daqueles que fogem e se escondem, em meio ao
silêncio da dor da separação daquele que é querido, e da tristeza diante
daquele que está morto, mas devia estar vivo, os discípulos se uniram,
abandonaram velhas brigas e juntos oraram pela misericórdia daquele que é amor.
A unidade foi selada por condições tão
adversas. E Jesus levantou-se para dizer que o que separava não separa mais.
Agora, ao invés de silêncio temos louvores; ao invés de tristeza, alegria; ao
invés de morte, vida.
E assim, como a primavera que cobre de
flores o jardim em frente de minha casa, que faz algumas semanas estava seco, a
páscoa possibilita o encontro. Estamos reunidos ao redor de uma mesa, brasileiros,
espanhóis, alemães. Oramos em francês, mas falamos também em português,
espanhol, alemão.
Quero dizer a Djavan que de fato há o
momento do deserto, do temor e da dor, mas já não pode durar para sempre. Quero
dizer aos Paralamas que já sabemos de onde vem o tiro, por isso o perigo pode
ser enfrentado. A mensagem é verdadeira e por isso o mundo será coberto pela
justiça. O Cristo ressurreto nos une, e o mundo conhecerá sua glória e o amor
que tem por nós.
O banquete da páscoa estava delicioso, porque
foi multiplicado, porque foi ágape de paz, amor e justiça.
Jesus
disse: Não me segure, pois ainda não subi para o meu Pai. Vá se
encontrar com os meus irmãos e diga a eles que eu vou subir para aquele que é
meu Pai e o Pai deles, o meu Deus e o Deus deles. [João 20.16-17].
4. Então, o que é a Páscoa do Senhor?
* É sacrifício do Primogênito de Deus para nossa
libertação do pecado
* É aliança eterna que começa aqui e se projeta na
eternidade
* É a Sua volta, quando celebraremos com Ele a festa
eterna da Páscoa, que é libertação pecado, mas também celebração da vida
eterna!
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