samedi 11 février 2012

O jovem Hegel

A dialética do amor
Por Jorge Pinheiro 

São Paulo – Alguns companheiros, não-marxistas e marxistas, sempre me perguntam: Jorge explica esse seu movimento em direção ao cristianismo. Será que isso tem alguma lógica? Então, porque continuo militante, resolvi falar de alguns amigos que influenciaram esse meu encontro com a cultura ocidental cristã. E sou obrigado a começar por George Wilhelm Friedrich Hegel, hoje um velho companheiro que me foi apresentado por outro amigo, Karl Marx.

Bem, comecemos a leitura de Hegel com um texto do apóstolo Paulo: “Estou plenamente certo de que aquele que começou a boa obra em vós há de completá-la até ao dia de Cristo Jesus. E também faço esta oração: que o vosso amor aumente mais e mais em pleno conhecimento e toda a percepção”. (Filipenses 1.6,9). Aparentemente, o Espírito começou a boa obra. O Espírito estaria, então, presente no mundo para convencer o ser humano da justiça. E deve, também, terminar a obra. Há no texto uma promessa de que tal obra não ficará incompleta. E, por isso, a oração de Paulo pelos filipenses é para que cresçam mais no amor, no conhecimento e na percepção.

Há aqui uma imagem da trindade. Deus é a fonte do amor, o Logos é o conhecimento, e este conhecimento vem através da palavra. Ao falar de crescimento no amor e no conhecimento da palavra, Paulo fala de percepção, ou seja, de compreensão, de discernimento. O Espírito é quem dá a percepção e o discernimento, aquilo que está além do que o olho pode ver. Tudo isso vem através da vida. A pessoa cresce vivendo, não somente através de um processo intelectual, mas na comunhão com Deus e com a comunidade.

Hegel, quando jovem, escreveu sobre teologia e religião. Mas sua grande contribuição para a teoria do conhecimento, que até aquele momento partia de Aristóteles, foi a reconstrução da dialética. A lógica de Aristóteles que influenciou o mundo até Hegel era a lógica formal. A lógica é sempre uma relação entre o sujeito e o objeto do conhecimento. Aristóteles começou a trabalhar com a lógica a partir de formas. Dizia que ser é aquele que é, e não ser é aquele que não é. Ou seja, uma cadeira é uma cadeira e não mesa. Isso foi muito importante e o mundo aprendeu a pensar logicamente com Aristóteles. A metafísica de Tomás de Aquino utilizou a fundo a lógica aristotélica. Mas Hegel, antes de elaborar seus estudos sobre a lógica, tinha um problema: não conseguia pela lógica formal explicar os fenômenos que escapavam à matemática. Não conseguia explicar, por exemplo, a revolução francesa, nem determinados conceitos teológicos. Então, partindo da trindade,[1] criou outra lógica que recebeu o nome de dialética, porque trabalha com opostos.

Acontece que a dialética já existia entre os gregos, mas não da maneira que Hegel vai desenvolver. Hegel vê um Deus que é exclusivamente Espírito. Por ser puro Espírito não pode se revelar plenamente ao ser humano. Há, então, outra pessoa de Deus que se torna Deus/humano e se realiza como Deus e como ser humano. Cristo continua sendo Deus, mas é ser humano. Mas, isso ainda não resolve o problema. Cristo é Deus e é ser humano, mas não é Deus em toda a humanidade. Assim, se na dialética hegeliana, Deus é a tese e Jesus Cristo é antítese, o relacionamento dos dois deve gerar uma síntese: o Espírito, que vindo de parte do Pai e do Filho, se faz presente na humanidade. O que Hegel quer dizer na dialética não é o mesmo que Aristóteles. O filósofo grego disse que ser é aquele que é. Hegel vai dizer que ser é aquele que é e aquele que não é. E é exatamente isso que faz com que nada seja estático. Ele trabalha dois conceitos a partir dessa dialética: o conceito de estrutura e o conceito de gênese ou movimento. Ele conseguiu uma lógica que explica os processos sociais, assim como os processos de desenvolvimento dos organismos vivos. Uma semente de roseira é aquilo que ela é: semente, mas também é aquilo que não é: roseira e rosa. É esta a compreensão: uma estrutura num momento é apenas semente, mas passa a ter um movimento que a leva a ser alguma coisa que não é. E esse processo é permanente. Não se tem processo dialético estático, imóvel. Hegel faz a teoria do conhecimento dar um salto, pois a partir dele se pode definir para onde vai a realidade. Ele apresenta um modo de explicar o que vai acontecer desde que se conheçam as tendências do momento presente. Conhecendo-se isso, sabe-se para onde vai.

O amor e o caminho da dialética

A porta de entrada para o pensamento hegeliano é o amor,[2] já que é a partir daí que descobre o caráter dialético da realidade.

“A religião é um com o amor. O amado não é oposto a nós, é um com o nosso ser. Às vezes, vemos somente a nós mesmos, nele, e logo, de repente, é algo diferente de nós: um milagre que não podemos compreender”. [3]

O ponto de partida é a auto-alienação na realização do amor: o amor esquecendo-se de si próprio sai da existência amorosa e vive no outro. No amor há ainda o separado, não como separado, mas como unidade. Hegel estava olhando para a trindade. Como filósofo da religião considera que a antítese de Deus é Cristo e Cristo é o amor auto-alienado de Deus.

“No momento da universalidade, na esfera do pensamento puro, ou no elemento abstrato da essência, é, pois, o espírito absoluto que é inicialmente o que é pressuposto. Todavia, não permanece incluso em si, mas como poder (potência) substancial é, na determinação reflexiva da causalidade, o Criador do céu e da terra que, nessa esfera eterna engendra-se ele mesmo como seu próprio filho, e permanece numa identidade originária com essa diferença, enquanto essa determinação, de ser distinto da Essência universal”. [4]

Na dialética do amor realiza-se a vida. O amor é o movimento da vida. A vida em sua essência também é dialética. É una em sua essência, mas divide-se na multiplicidade dos seres para, finalmente, reencontrar-se na unidade. A comunidade de fé é o corpo de Cristo e quem a dirige é o Espírito. É uma volta à unidade, mas em um nível diferente em relação ao ponto de partida. Assim, Hegel viu a dialética: há estrutura e gênese, trabalha com opostos e cria um movimento permanente. Para Hegel, o divino é pura vida e por isso Deus também tem sua dialeticidade. Deus é uma totalidade e tudo o que existe está ligado a ele. Não se pode dizer que tudo está na totalidade divina, a não ser no panteísmo, mas sim na realidade. Nesse sentido, nada está fora de Deus. Ou, conforme argumentou Paulo com os atenienses, “nele vivemos, nos movemos e existimos” (Atos 17.28). Tudo está sob a unidade que é Deus. O Filho é humano, que se desenvolve em estado de separação no seu eu finito, no meio do mundo das determinações.

“Mas no momento da particularidade, do julgamento, a essência concreta eterna é pressuposto e seu movimento é a criação do fenômeno, a desagregação do momento eterno da mediação, do filho único, na oposição independente, de um lado, do céu e da terra, da natureza elementar e concreta, de outro, do espírito enquanto relação com eles, logo do espírito finito, o qual, extremo na negatividade em si”. [5]

E o Espírito traduz a condição do humano que superou o estado de alienação e fez o retorno consciente à realidade da redenção.

“E essa consciência imediatamente idêntica à essência, a esse filho do domínio eterno transferido na temporalidade, e no qual o mal é afastado em si, mas em seguida, apresenta-se essa exigência imediata e, portanto, sensível do concreto absoluto pondo-se na divisão (julgamento) e agozinando na dor da negatividade, na qual, subjetividade infinita, idêntica a si mesma, tornou-se, dela emergindo, retorno absoluto e unidade universal (individual) para si mesmo. É a idéia do espírito eterno, mas vivo e presente no mundo”. [6]

Daí surgem os três momentos de sua dialética: a concepção da realidade uma, as realidades separadas e a realidade outra vez unificada. Toda a realidade é somente uma, o mundo é somente um, a humanidade também. A realidade é uma, mas está separada: o que é e o que não é estão juntos, a realidade unificada. Para o jovem Hegel, a espiritualidade reconcilia a reflexão e o amor, unindo-os no pensamento. A vida espiritual, que é a vida do amor, realiza a exigência da filosofia cristã de reconciliar as oposições do finito e infinito. Ou seja, Hegel substitui espiritualidade por cristianismo. O cristianismo reconcilia a reflexão e o amor unindo-os no pensamento, ou na percepção, usando a linguagem de Paulo. O objetivo racional de Hegel é sempre a reconciliação dos contrários: o cristianismo privatizado e o cristianismo social, liberdade e necessidade, finito e infinito. Já maduro Hegel definiria a tarefa do conhecimento como a construção do absoluto pela consciência, que superando oposições produz o processo dialético.

O finito não pode ser pensado sem pensar o infinito, pois não é um conceito isolado e sem conteúdo próprio. O finito consiste em ser um momento do infinito. O finito é atingido pela negação, mas não é simples negação, uma vez que é limitado por outro que não é ele mesmo. O finito, portanto, é uma negação do infinito, no sentido que é uma particularidade, um momento, uma determinação. Sempre que se determina, se nega. Por exemplo, se numa sala de aula, um professor chama um aluno pelo nome, naquele momento ele está negando todos os demais alunos e determinando um único apenas. Por isso, devemos negar a negação e afirmar que o finito é mais que o finito, ou seja, que é o momento da vida do infinito.

O processo que resolve a oposição é o processo dialético: finito e infinito não são dois mundos separados. Sempre que se tem o final do processo se tem a identidade, porque contém todas as diferenças. O conhecimento para Hegel é um processo que nunca se dá no início, mas no final, por isso o conhecimento é sempre histórico. Como se conhece a roseira? Vendo-a crescer. Para Hegel, o conhecimento está a dar-se na vida.

Assim, podemos dizer que o tema da filosofia de Hegel é o infinito e suas relações com o finito, relação de unificação de ambos os termos no princípio absoluto. A identidade, contendo dentro de si as diferenças e a harmonia, acontece no fim do processo dialético. O absoluto é o pensamento que se pensa a si mesmo, o que equivale dizer que o absoluto é espírito, sujeito autoconsciente.

O amor e a trindade

Hegel considera que o próprio Deus ao se finitizar entra na história. No final do século vinte alguns filósofos disseram que a história tinha acabado, mas para Hegel a história não acaba, é permanente. Mesmo na plenitude do Reino, já que existirá a vida, existirá também a história e, por extensão, o conhecimento. Deus construiu o humano para relacionamentos em processos conscientes e livres. Homem e mulher têm liberdade de escolha e consciência para relacionar-se com Deus. Um dia toda a humanidade irá relacionar-se de forma plena com Deus e a partir de tal momento haverá um relacionamento novo, que Deus não tinha antes com os seres humanos. Isso é revelação, um dia Deus será compreensível, mas não totalmente, porque tal processo é permanente. E se a há conhecimento, há processo histórico. Hegel está tentando entender o processo dentro da trindade. Para ele, se esse processo é dialético, há um conhecimento dentro da Trindade, não necessariamente de forma, mas um conhecimento intrínseco.

Aqui a filosofia cristã se vê obrigada a levantar questões: quando Jesus pregado na cruz declarou “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?”, aquele foi um momento de ruptura? Mas pode haver ruptura entre o Pai e o Filho? E como se dá a superação dessa relação dialética? Depois da ruptura, o amor é maior ou igual? Outra questão: tendo em vista que o Espírito é a pessoa da trindade presente na comunidade de fé, quando a história presente terminar, na plenitude do Reino, haverá na trindade um conhecimento maior sobre a experiência vivida pelo Espírito? A partir de Hegel, poderíamos dizer que a trindade se relaciona, mas não tem uma comunicação redundante: conversa de louco, onde se sabe de antemão o que será dito ou de coisas que não se entende. A base do conhecimento intratrinitário seria o amor e o amor cresceria à medida que as Pessoas se amam e vivem o amor. Esse seria o sentido do conhecimento na trindade. E esse amor, segundo Hegel, apontaria para o Reino de Deus.

No Reino de Deus o que é comum a todos é a vida em Deus. Este não é um caráter comum expresso em conceito, mas é amor, um viver que une os crentes, um sentimento no qual todas as oposições, quer inimizades, quer direitos, ou ainda aquelas unidades que subsistem como oposições, são anuladas. [7]

Hegel examina também o aspecto fenomênico do cristianismo: sentimento, intuição, representação. A primeira forma de espiritualidade seria sempre imediatização da relação Deus/ humano, própria do sentimento. O sentimento é individual, acidental e mutável. A intuição que se tem na arte é o momento mais elevado dessa imediatização. Há uma dualidade de contrários entre o sujeito intuinte e o objeto intuído, entre a unidade da consciência cristã e seu objeto. A contradição resolve-se à medida que o cristianismo se transforma em verdadeiro saber. E a este saber o ser humano só chega pela fé. Hegel considerava que o momento mais alto do conhecimento espiritual é o cristianismo e que a espiritualidade de Israel era uma imediatização da relação Deus/humano.

A espiritualidade, enquanto fé, sentimento e intuição ingênua, consiste no saber e consciência imediatos. Imediato, para Hegel é sempre o que não se conhece. Ao vermos uma pessoa temos uma percepção imediata, que é falsa. Quando a pessoa passa da primeira percepção e vive o cristianismo há um desenvolvimento da fé e o abandono do imediato. Ou seja, a primeira percepção é emocional, mas a última deve ser a fé, ou a percepção concreta da espiritualidade.

Que é a fé? É o momento em que não se precisa mais de elementos imediatos para a relação com Deus. Não se precisa de templo, sacerdócio, etc. Por isso, o cristianismo situa-se no nível pensante e não só do sentimento. Reduzir o conteúdo divino, a revelação de Deus, a relação ser humano com Deus, a existência de Deus para o ser humano a mero sentimento significaria limitar-se ao ponto de vista da subjetividade particular, ao arbítrio.

Hegel fez a crítica do cristianismo oficial e hegemônico, que em sua época, no mundo germânico, se expressava como catolicismo e luteranismo. Isto porque para ele a doutrina sobre Deus só poderia ser compreendida como doutrina sobre a espiritualidade cristã. Por espiritualidade entendia a relação do sujeito, da consciência subjetiva, com Deus. Assim, o cristianismo seria ação da consciência humana que brota da ação originária de Deus.

Donde, ação divina e ação humana encontram-se na redenção da espécie humana. Ou seja, o ser humano está condenado a produzir a sua essência no tempo, e é o único animal histórico porque é o único que, além de ser natureza, é consciência, a negação da natureza.[8] Antes de Hegel, movimentos cristãos radicais chegaram a conclusões semelhantes no que tange a relação entre soberania divina e liberdade humana, enquanto síntese do projeto divino de redenção dos seres humanos.

17/11/2009
Fonte: ViaPolítica/O autor

Notas:

[1] George Wilhelm Friedrich Hegel, “The Religious Teaching of Jesus”, in Early Theological Writings, G. W. F. Hegel, trad. T. M. Knox, com “Introdução e Fragmentos” de Richard Kroner, Philadelphia, University of Pennsylvania Press, 1981, p. 273.
[2] George Wilhelm Friedrich Hegel, “Love”, in Early Theological Writings, idem, op. cit., pp. 302-308.
[3] Georg Wilhelm Friedrich Hegel, “Esbozos sobre Religión y Amor”, in Hegel, Escritos de Juventud, México, Fondo de Cultura Econômica, 1998, p. 243.
[4] Georg Wilhelm Friedrich Hegel, Enciclopédia das Ciências Filosóficas em Epítome, Lisboa, Edições 70, 1988, vol. I, parágrafo 567.
[5] Georg Wilhelm Friedrich Hegel, Enciclopédia das Ciências Filosóficas em Epítome, idem, op. cit., parágrafo 568.
[6] Georg Wilhelm Friedrich Hegel, Enciclopédia das Ciências Filosóficas em Epítome, ibidem, op. cit., parágrafo 569.
[7] George Wilhelm Friedrich Hegel, “The Religious Teaching of Jesus”, in Early Theological Writings, idem, op. cit., p. 278.
[8] Roland Corbisier, Hegel, Textos Escolhidos, Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1991, pp. 16-17.




vendredi 10 février 2012

Os corpos entendem de solidões


Um, dois, três...
Na contramão
com Aristófanes
.
Por Jorge Pinheiro, de São Paulo

Os corpos entendem as solidões, as loucuras dos desejos, os abismos do prazer. Se após a união dos corpos, a solidão é parceira, o corpo é este pedaço de mim nunca completado.

O texto hebraico das Origens conta que o Eterno disse não é bom que o cara viva sozinho, vou construir para ele alguém que o ajude a ir em frente. Isso a gente sabe, todos num estado de tranquilidade, e cientes dos desejos do coração, desejam amar e ser amado.

Ou seja, num momento de sinceridade, amamos ter alguém em quem confiar, e se possível a ponto de podermos revelar nosso lado íntimo. É, acho que gostaríamos muito poder confiar àqueles que gozam de nossa intimidade alguns dos sentimentos que guardamos lá dentro. Talvez, por isso, nos sentimos atraídos por grupos de relacionamentos como facebook, twitter e outros. É isso mesmo, no raso e no fundo, queremos amar e ser amados.

Às vezes no silêncio da noite/ Eu fico imaginando nós dois/ Eu fico ali sonhando acordado/ Juntando o antes, o agora e o depois (“Sozinho”, de Caetano Veloso e Peninha).

Por isso, a pergunta procede: o que nos impede de abrir o coração e amar? Tememos riscos? Que riscos?

Vamos pensar sobre isso com o poeta Aristófanes, lá no Banquetede Platão. Ele disse que antigamente a natureza não era como é hoje. Nossos ancestrais eram duplos, mas tinham uma unidade perfeita. Cada homem constituía um todo, de forma esférica, com costas e flancos arredondados. Tinham quatro mãos, o mesmo número de pernas, dois rostos idênticos num pescoço redondo, mas uma cabeça única para o conjunto desses dois rostos opostos um ao outro. Tinham quatro orelhas e dois órgãos sexuais.

Por que você me deixa tão solto?/ Por que você não cola em mim?/ Tô me sentindo muito sozinho

Essa dualidade genital explica por que não havia dois e sim três gêneros na espécie humana: os machos, que tinham dois sexos de homem, as fêmeas, que tinham dois sexos de mulher e os andróginos, que tinham ambos os sexos.

O macho, conta o poeta, era filho do Sol, a fêmea filha da Terra, a espécie mista da Lua, que participa do Sol e da Terra. Todos tinham uma força impressionante, e, por isso, tentaram escalar o céu e combater os deuses. Para puni-los, Zeus decidiu cortá-los em dois, de cima a baixo, como se corta uma laranja. Então se acabou a completitude, a unidade, a felicidade! A partir de então cada um é obrigado a buscar o outro pedaço.

Não sou nem quero ser o seu dono/ É que um carinho às vezes cai bem/ Eu tenho meus desejos e planos secretos/ Só abro pra você mais ninguém

Agora, estamos separados de nós mesmos. Esse desejo de busca é o que Aristófanes chamava amor, e, quando satisfeito, é a condição da felicidade. Somente o amor reconstrói a natureza, ao fundir dois seres num só. Por isso, para o poeta uma pessoa seria homoafetiva, heteroafetiva ou andrógina, conforme a unidade perdida.

Assim, a partir do mito, Aristófanes considera que quando uma pessoa -- tenha ela inclinação por homens ou mulheres – encontra a sua metade, transforma-se num prodígio de amor e ternura.

Por que você me esquece e some?/ E se eu me interessar por alguém?/ E se ela, de repente, me ganha? 

Essa é a definição do amor fusional de Aristófanes, que faria voltar à unidade da natureza primeira, que libertaria da solidão, e que seria, tanto nesta vida como na outra, a maior felicidade a ser alcançada.

Mas, por necessitar duas pessoas tal fusão, hoje, é sempre um momento e, por isso, longe de abolir a solidão, a confirma. Se as almas pudessem se fundir seria outra coisa, mas são os corpos que se fundem, por um momento.

Caetano nos dá a trilha 
http://www.youtube.com/watch?v=wb4RauhteFA

Daí o fracasso. Todos querem ser um só, mas eis todos mais do que nunca sendo dois, sempre. Por isso, os romanos diziam que post coitum omne animal triste. Mas se o amor não nasce dessa fusão de corpos, nasce o prazer. Ou, podemos dizer, os corpos entendem mais de Eros do que os especialistas. Os corpos entendem as solidões, as loucuras dos desejos, os abismos do prazer. Se após a união dos corpos, a solidão é parceira, o corpo é este pedaço de mim nunca completado.

Detalhe: Platão detestava Aristófanes. E o relato hebreu, que mergulha nas profundezas da existência, não deixa por menos, somos dois mesmos, sempre. E é do diferente, do divergente, que deve nascer a unidade. Ou como disse o homem de Nazaré, e ambos serão uma só carne. E se isso é bênção ou maldição, acho que depende de cada dois.

Ou você me engana/ Ou não está madura/ Onde está você agora? 
(“Sozinho”, de Caetano Veloso e Peninha).

6/11/2010

Fonte: ViaPolítica/O autor 

mardi 7 février 2012

Um sermão necessário

A Realidade da Graça
Ler: Evangelho de Lucas 4.14-30 

Introdução

A graça é algo intocável, que está além de nós, que vem do Eterno. Mas, através da presença de Jesus, que vive em nós, essa graça intangível se transforma em vida, em realidade visível e palpável.

A graça do Eterno vai além de nós, é independente de nós, mas ao ser vivida, nós faz portadores dela. Eu e vocês sabemos que a fé vem pelo ouvir, porque assim nos diz a Palavra do Eterno. Essa Palavra maravilhosa vem do Eterno, para nós. Ao ser vivida por nós continua sendo transcendente, mas também passa a ser imanente, passa a ser realidade divina vivida por nós.

Assim surge a fé, enquanto poder que transforma e leva graça aos homens e mulheres deste mundo. Essa notícia tão especial, esse Evangelho da graça, muda as vidas e as comunidades. É a Palavra que veio do Eterno, que invadiu nossas vidas, que podemos recebê-la, pronunciá-la e deixar que transforme tudo que está ao nosso redor.

A realidade da graça, ao ser vivida e pregada, vai transformando a o mundo e sua história. E é isso que aprendemos com Jesus, que ao inaugurar seu ministério terreno, apresentou àquela pequena comunidade da Galiléia seu programa de ação. O programa do Evangelho de Jesus Cristo.

A primeira parte da missão de Jesus (4.14–9.50) é toda situada na Galiléia (cf. 23.5; At 10.37). Ao contrário de Mateus (15.21; 16.13) e Marcos (7.24-31; 8.27), Lucas abre a comissão de Jesus com a cena da pregação na sinagoga de Nazaré (4.16-30), que descortina toda a seqüência do evangelho: o anúncio da salvação fundamentado nas promessas do Antigo Testamento e inspirado pelo Espírito, a salvação dos não judeus, a rejeição de seus compatriotas e a tentativa de assassinato.

No texto, Lucas descreve duas questões centrais: em primeiro lugar o programa de Jesus e, em segundo lugar, o destinatário da mensagem. Assim, os versículos 18 e 19 apresentam o programa e os versículos 23-27 seu público, os gentios.

O programa

Jesus foi ungido, escolhido pelo Eterno, e sob a ação do Espírito – ação esta que caracteriza o verdadeiro profeta – tem como missão proclamar e libertar. Seu programa é formado por quatro pontos:

[A] anunciar a boa nova aos pobres. 
[B] proclamar a libertação aos cativos.
[C] dar vista aos cegos. 
[D] por em liberdade os oprimidos.

O programa destaca duas idéias a de anunciar/proclamar/pregar e a de libertar/salvar.
  
Anunciar/ proclamar

A idéia de proclamar está presente no Antigo Testamento, já que a missão profética era, sobretudo, proclamatória. De Samuel a Jeremias – incluídos nesse período de ouro homens como Samuel, Natã, Gade, Azarias, Elias, Eliseu, Joel, Miquéias, Micaías, Isaías e Jeremias -- esses anunciadores da vontade de Deus falaram aos reis e ao povo. Advertiam, repreendiam, encorajavam. Falavam de julgamentos e de promessas espetaculares. Traduziam grandeza de caráter e força moral.

E assim também foi o último período da profecia hebraica, de Ezequiel a Malaquias. No período helênico, graças às reuniões nas casas de oração, sinagogas, a proclamação se generalizou. As Escrituras eram lidas e interpretadas.

João, o batista, foi um anunciador da chegada do reino. E Jesus, ali na sinagoga de Nazaré, colocou em seu programa a tarefa da proclamação.

Libertar/ salvar

O conceito de libertação no Antigo Testamento parte da idéia de livramento e de segurança. A pessoa de um libertador no AT traduz sempre a imagem do libertador como alguém que arrebata um povo da destruição (Jz 18.28).  E no Novo Testamento, o libertador era aquele que soltava os israelitas da escravidão (At 7.35), ou que arrancaria a nação da impiedade (Rm 11.26).

Para todo o judeu, na época de Jesus, o ato mais característico de libertação ocorreu sob a liderança de Moisés, quando Deus salvou seu povo da escravidão aos egípcios e o libertou no deserto do Sinai (Ex 12.31—14. 31).

É fundamental entender que a libertação da escravidão egípcia definiu para os judeus do período helênico o paradigma da libertação como um ato de Deus que não visava apenas o alívio de uma situação desastrosa. Mas, e aí está a chave do conceito de aliança, para que livres possam servi-lo. Essa idéia fundamenta o conceito de aliança e da espiritualidade judaica até o primeiro século.

O texto usado por Jesus é a leitura de Isaías 61.1-2. Ao ler o texto e dizer que ele próprio é o cumprimento da profecia, Jesus cria uma nova hermenêutica, que será amplamente utilizada por todos os escritores do Novo Testamento. Ele é o intérprete inspirado, ungido, no cumprimento do que foi anunciado e que está presente nesse kairós para o desenlace dos últimos tempos – proclamar o ano aceitável do Senhor. Partindo dessa hermenêutica, os escritores do NT, e Lucas entre eles, lerão o Antigo Testamento à luz do fato Jesus. [Um jubileu na era da pos-modernidade, Sandra Mansilla, in Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana no 33, p. 150, São Paulo, Vozes, 1999].

Uma questão atual

Em nenhum lugar das Escrituras Sagradas vamos encontrar uma fórmula ou proposta acabada de governo. A busca de um ideal divino de governo é uma herança da filosofia grega. O que encontramos nas Escrituras são exigências normativas quanto à justiça. [Walter Elwell, Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, vol. II pp. 209-210, São Paulo, EVN, 1990].

Um estado moderno é bem diferente dos impérios antigos, embora alguns dos problemas humanos como a fome, a opressão e as guerras aparentemente sigam antigos padrões. Por isso, se por um lado devemos olhar as diferenças, por outro é necessário analisar semelhanças que possibilitam definir respostas éticas para as sociedades. De todas as maneiras, devemos avaliar de modo crítico nossas tradições políticas e ideológicas à luz da compreensão bíblica do conceito de justiça.

Hoje, um quinto da humanidade não têm condições mínimas de sobrevivência e milhares morrem de fome todos os dias. Milhões de pessoas não têm onde morar, não têm roupas, nem água limpa, nem cuidados médicos. Não têm oportunidades na área de educação e emprego e estão condenadas a levar uma existência miserável, sem qualquer possibilidade de promoção pessoal para si próprias e para suas famílias. Essas pessoas são oprimidas pela desigualdade econômica brutal de que são vítimas e pelos diversos sistemas econômicos que provocam e perpetuam essa situação.

Outras sofrem opressão política. São-lhes negados os direitos humanos básicos, através de regimes autoritários, muitas vezes religiosos. Quando protestam são presas sem julgamento, torturadas e mortas.

Uma ilustração: Indonésia, ano 2000. Igrejas e milhares de casas dos cristãos foram incendiadas. Em algumas aldeias houve cristãos assassinados. Os ataques aconteciam aos domingos durante os cultos. No dia 11 de março mais de 30 pessoas foram mortas. As aldeias Buhobuho, Wewemo, Sangowo e Sakita foram "limpas" da presença cristã. O Pr. Marthinus Banyo da aldeia Sakita levou os cristãos às selvas, fugindo durante sete dias.

Outras pessoas, ainda, são vítimas da discriminação por causa de sua raça ou gênero. E aqui transcrevemos uma carta, de uma missionária que estava na Alemanha e trabalhou com refugiados do Kosovo. "Um ano depois de iniciados os 78 dias de bombardeios da Otan em Kosovo, completado neste mês de março, a vida de milhares de fugitivos está longe de voltar ao normal. Dos 900 mil kosovares albaneses que deixaram suas casas, 70 mil continuam longe delas. Sobretudo mulheres sofrem os traumas da guerra e da violência sexual praticada pelos sérvios. Isabela Stock, da organização Medica Mondiale, de Colônia, na Alemanha, conta que pelo menos cem bebês nascidos em Pristina e nas redondezas foram abandonados pelas mães por terem sido gerados em estupros".

Mas também nós, todos nós, somos oprimidos por problemas universais que parecem não ter solução, como a exploração irracional das fontes de energia não renováveis, a destruição do meio ambiente, a violência nos grandes conglomerados urbanos, etc.

Todas essas condições têm suas raízes na alienação humana e exige de nós uma radical resposta de amor. Somente o Evangelho pode revolucionar o coração da pessoa. Nada pode tornar uma pessoa mais humana do que a presença do evangelho. Mas não podemos nos restringir à proclamação verbal. Além da evangelização mundial, o povo de Deus deve se comprometer com a ação social, o auxílio, o desenvolvimento e a busca da justiça social e da paz. [Evangelização e Responsabilidade Social, relatório da Consulta Internacional realizada em Grand Rapids sob a presidência de John Stott, São Paulo, ABU, pp. 15 e 16].

Embora a reconciliação da pessoa com a pessoa, de um povo com outro povo, não seja reconciliação com Deus, nem a ação social evangelizadora, nem a libertação política salvação, evangelização e envolvimento sócio-político são parte do dever cristão. Ambos são necessárias expressões de nossas doutrinas acerca de Deus e da pessoa, de nosso amor para com o próximo e da nossa obediência a Jesus Cristo.

A mensagem da libertação é também uma mensagem de juízo sobre toda forma de alienação, de opressão e de discriminação, e não devemos ter medo de denunciar o mal e a injustiça onde quer que existam. Quando alguém recebe a Cristo nasce no reinar do Eterno e, conseqüentemente, deve buscar não somente manifestar como também divulgar a sua justiça em meio a um mundo ímpio. A salvação que alegamos possuir deve transformar a totalidade de nossas responsabilidades pessoais e sociais. [Responsabilidade Social Cristã in Pacto de Lausanne, parágrafo 5].

Considerações

Movido por seu espírito missionário, o evangelista Lucas destaca no texto que estamos analisando os tempos do Messias e os tempos da comunidade cristã, deixando claro para seus leitores que o ano do Senhor teve início naquele kairós pronunciado na sinagoga de Nazaré.

Para nós, o kairós de Jesus significa o nascimento de um novo estar, um estar que se caracteriza pelo anúncio de uma novidade. Mas como anunciar esta a novidade quando, aparentemente, fazemos parte de uma geração alienada apática?

Quando comparamos o texto acima com dois outros de Lucas (At. 2.42-47 e 4.32-35), que fala da comunidade cristã nascente, vemos que os cristãos de Jerusalém entendiam que a ecclesia devia ser construída sob um estado de convivência que possibilitasse vida plena a todos.

É aqui que as águas se dividem e somos chamados a romper com a indiferença que congela os corações e paralisa as ações. Homens e mulheres em todo o planeta têm a urgência de um recém-nascido, reclamam vida e vida em abundância. Somos chamados a nos deixar despertar pelo choro e pelo clamor dos despossuídos, oprimidos por ordens sociais corruptas, por dependências e por adversários da vida.

É tempo de anunciar a boa notícia a despossuídos de bens e oportunidades. É tempo de  libertar escravos. É tempo de fazer cegos verem. É tempo de salvar oprimidos.

A boa nova de Cristo liberta os pobres (Ef 1.3). A graça de Cristo liberta os cativos (Gl 5.1,13). Cristo, a luz da vida, dá vista aos cegos (Jo 1.9; 8.12). O jugo de Cristo liberta os oprimidos (Mt 11.29-30; 1Pe 5.7).

É tempo de anunciar o hoje do Senhor Jesus.

Naquele sábado, na sinagoga de Nazaré, Jesus expôs o programa de seu ministério, que é o programa da comunidade cristã. A graça do Senhor deve ser noticiada a todos e todas, seu público é o mundo. A ressurreição deu o imprimatur do Eterno a este programa e à igreja cabe, no poder do Espírito, levá-lo até os confins da terra.

Cremos realmente nisso? Façamos um exame de consciência. Depois, então, sejamos coerentes com o que cremos e façamos do Programa de Jesus o nosso programa.


lundi 6 février 2012

Estudo Interreligioso

PROGRAMA
Filmagens de cultos em quatro províncias diferentes em Moçambique: Maputo, Gaza, Manica e Sofala. Abril a Junho de 2009. Duas no sul e duas no norte.
A alegria no louvor a Deus!
Fevereiro/ Março 

A existência de Deus e os argumentos cosmológico, teleológico, axiológico e suas avaliações.

Abril

A coerência do teismo: necessidade, onipresença, onisciência, onipotência e suas avaliações. 

Maio/ Junho 

O problema do mal e as doutrinas cristãs: Trindade, encarnação e o particularismo cristão e suas avaliações. 

BIBLIOGRAFIA BÁSICA 

BECKWITH, Francis J., CRAIG, William L., e MORELAND, J. P., Ensaios Apologéticos, São Paulo, Hagnos, 2006. 

GOUVEA, Ricardo Quadros, org., vv.aa., O que eles estão falando da igreja, São Paulo, Fonte Editorial, 2011. 

PINHEIRO, Jorge, Teologia Bíblica e Sistemática, o ultimato da práxis protestante, São Paulo, Fonte Editorial, 2012. 

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

PINHEIRO, Jorge “Matei porque me pisou” e “Sobre o não-ser para viver o ser” in Teologia humana pra lá de humana, São Paulo, Fonte Editorial, 2010.

______________, “A doutrina da eleição – calvinismo, arminianismo e o equilíbrio da doutrina batista” in Revista Teológica, São Paulo, Ano 4, no. 5, 2008.

ROCHA, Alessandro, org., vv.aa., Ecumenismo para o século XXI, Paulo, Fonte Editorial, 2011

SANTO ANSELMO, Livre arbítrio e predestinação, uma conciliação entre a presciência e a graça divina, São Paulo, Fonte Editorial, 2006.

samedi 4 février 2012

Filosofia II

PROGRAMA
Fevereiro/ Março
O círculo teológico. Teologia e filosofia – resposta e resposta

O círculo em que se situa o teólogo é diferente daquele do filósofo. Ele acrescenta aos “a priori do mistério” o critério da mensagem cristã. Enquanto o filósofo procura permanecer geral e abstrato em seus conceitos, o teólogo é intencionalmente específico. O teólogo entra no círculo teológico com um compromisso concreto, como membro da igreja cristã para cumprir suas funções essenciais, sua interpretação teológica da revelação e da realidade. A filosofia e a teologia formulam a pergunta pelo ser. Mas elas o fazem de perspectivas diferentes. A filosofia lida com a estrutura do ser em si mesmo; a teologia lida com o sentido do ser para nós. Dessa diferença surgem tendências convergentes e divergentes entre teologia e filosofia.

Textos:
Tillich, Paul, Teologia Sistemática, São Leopoldo, Sinodal, 2005, Introdução, B 3-7.
Pinheiro, Jorge, Deus é brasileiro, as brasilidades e o Reino de Deus, São Paulo, Fonte Editorial, 2008, Introdução e capítulo 1.

Abril/ Maio
A razão e a pergunta pela revelação
Quando falamos de razão podemos trabalhar com dois conceitos, um ontológico e outro técnico. O primeiro predomina na tradição clássica e o segundo principalmente a partir do empirismo inglês. Mas como estes conceitos nos levam à pergunta pela revelação? 

Textos
Tillich, op. cit., parte 1, item 1A-C.
Pinheiro, op. cit., capítulo 2.

Maio/ Junho
A vida e suas ambiguidades
O conceito ontológico de vida e sua aplicação universal nos levam aos dois tipos de considerações, a essencialista e a existencialista. Essas considerações, em última instância, falam da unidade multidimensional da vida. O que nos leva aos processos e ambigüidades existenciais da vida e a perguntar pela vida sem ambigüidades, a vida eterna.

Textos
Tillich, op. cit., parte 4, item 4A-C.
Pinheiro, op. cit., capítulo 3.

BIBLIOGRAFIA
TILLICH, Paul, Teologia Sistemática, São Leopoldo, Sinodal, 2005.
PINHEIRO, Jorge, Deus é brasileiro, as brasilidades e o Reino de Deus, São Paulo, Fonte Editorial, 2008.

BIBLIOGRAFIA AUXILIAR
Severino, Antonio Joaquim, Filosofia, São Paulo, São Paulo, Cortez, 1992.
Pinheiro, Jorge, Teologia Bíblica e Sistemática, o ultimato da praxis protestante, São Paulo, Fonte Editorial, 2012. 
Chauí, Marilena e outros, Primeira filosofia: lições introdutórias, São Paulo, Brasiliense, 1984.

DICIONÁRIOS DE FILOSOFIA
Japiassu, Hilton e Marcondes, Danilo, Dicionário Básico de Filosofia, Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1989.
Abbagnano, Nicola, Dicionário de Filosofia, São Paulo, Mestre Jou, 1970.

Teologia Prática V -- Culto e Adoração

Programa

CONTEÚDO

Compreensão de termos: culto, liturgia, louvor e adoração cristãs (breve observação do culto e liturgia em outras tradições religiosas). O que há de errado/certo com “nossos” cultos? Fundamentação bíblico-teológica do Culto e Liturgia -- cruz, graça, esperança memória. Por que cultuar -- liturgia do serviço e gratidão. Como se faz o Culto? Elementos Fundamentais -- liturgia da palavra e liberdade: corpo, criatividade, cultura, emoção e razão. Quando se faz o Culto? Liturgia do tempo: calendário e ano litúrgicos. Quem participa do Culto? Liturgia do povo: inclusão; culto para a crianças ou com crianças? Onde se faz o Culto? Liturgia do lugar: presença de Cristo e santificação do espaço. Diversidade litúrgica e tendências de Culto no Brasil e no mundo: relevância do Culto e Liturgia para a o mundo/comunidade, igreja local, família e vida da pessoa. 


BIBLIOGRAFIA BÁSICA 
PINHEIRO, Jorge, Teologia Bíblica e Sistemática, o ultimato da práxis protestante, São Paulo, Fonte Editorial, 2012.
SCHNEIDER-HARPPRECHT, C. (org.), Teologia Prática no contexto da América Latina. São Paulo/ São Leopoldo: ASTE/ Sinodal, 1998. 
VON ALLMEN, J.J., O Culto Cristão: Teologia e Prática. 2ª ed. São Paulo: Aste, 2006. 

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR 
ALLEN, R., BORROR, G., Teologia da Adoração. São Paulo: Edições Vida Nova, 2002. 
PORTO, Humberto. Liturgia Judaica e Liturgia Cristã. São Paulo: Paulinas, 1977. 
SHEDD, R.P. Adoração Bíblica. São Paulo: Edições Vida Nova, 1987. 
WHITE, James F., Introdução ao Culto Cristão. São Leopoldo: Sinodal: 1990. 



vendredi 3 février 2012

Realidade Brasileira Programa


Primeiro semestre 2012 Programa

Fevereiro - Março
As brasilidades e o princípio protestante
O processo civilizatório -- Povos germinais / O barroco e o gótico / Atualização histórica


Abril
Protestantes, pentecostais e ecumênicos. O campo religioso brasileiro e seus personagens

Maio - Junho
Classe e poder/ distância social/ classe e raça. O destino nacional. As dores do parto / confrontos

BIBLIOGRAFIA BÁSICA

MENDONÇA, Antonio Gouvêa, Protestantes, pentecostais e ecumênicos, o campo religioso e seus personagens, São Bernardo do Campo, UMESP, 2008.
PINHEIRO, Jorge, Deus é brasileiro, as brasilidades e o Reino de Deus, São Paulo, Fonte Editorial, 2008.
RIBEIRO, Darcy, O povo brasileiro, a formação e o sentido do Brasil, São Paulo, Companhia das Letras, 2002.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

FREYRE, Gilberto, Casa Grande & Senzala, São Paulo, Global Editora, 2003.
LERY, Jean de, Viagem à terra do Brasil, ler capítulos VIII, XV e XVII disponíveis no site da UFRGS, http://www.ufrgs.br/proin/versao_1/viagem/index.html
_____________ & SANTOS, Marcelo, Manual de História da Igreja e do Pensamento Cristão, São Paulo, Fonte Editorial, 2011.

Teologia Sistemática II Programa


Programa Primeiro Semestre 2012

Fevereiro/ Março

Angelologia, Antropologia e a Doutrina do pecado
Angelologia -- Quem são os anjos: a tradição mítica dos povos do antigo Oriente Médio e os relatos bíblicos. Antropologia -- O ser humano real: biológico, psicológico, sociológico, moral, filosófico, teológico. Os dois sentidos da imagem de Deus e a analogia relationisAlienação e pecado -- A natureza da hamartia. A terminologia bíblica a respeito da hamartia no Antigo Testamento e no Novo Testamento. O problema da solidariedade na alienação: reino do mal, a explicação dialética e a polêmica Pelágio/ agostiniana.

Abril/ Junho

Trindade e Cristologia
A Trindade e as suas três compreensões clássicas: a católica oriental, a católica ocidental e a protestante reformada. Jesus, o Cristo, uma identidade construída. O Cristo da fé e o Jesus histórico. Jesus num mundo de exclusão, ontem e hoje. A cruz de Cristo na Soteriologia. A cruz e suas realizações.

BIBLIOGRAFIA BÁSICA

Texto principal
PINHEIRO, Jorge, Teologia Bíblica e Sistemática, o ultimato da práxis protestante
São Paulo, Fonte Editorial, 2012

Ferreira, Julio Andrade, Antologia Teológica, Sao Paulo, Fonte Editorial, 2008.
MCGRATH, Alister E., Teologia sistemática, histórica e filosófica, São Paulo, Shedd Publlicações, 2005.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

Braaten, Carl e Jenson, Robert, Dogmática Cristã, São Leopoldo, Sinodal, 2005.
CULLMANN, Oscar, Cristologia do Novo Testamento, São Paulo: Hagnos, 2008.
PINHEIRO, Jorge, Deus é brasileiro, as brasilidades e o Reino de Deus, São Paulo, Fonte Editorial, 2008.

samedi 28 janvier 2012

Omissão e consentimento


A pergunta que faço e esta é uma questão teológica é como se transforma nossa concepção do mal quando o abordamos em toda a sua banalidade. A primeira coisa que me ocorre é que o bem será sempre um movimento de vida, com total ausência do consentimento da alienação.  

Donde, seguindo a trilha de Aurelio Artera (Mal consentido, la cumplicidade del espectador indiferente, Madri, Alianza Editorial, 2010), o mal banal desconstrói a substância ontológica da alienação, exatamente porque ao analisá-lo em sua estrutura microfísica aparentemente perde sua pretensão metafísica. Mas este é o caminho que a teologia deve fazer, despojar o mal da auréola que herdou da tradição escolástica, desnudá-lo de sua roupagem de festa luciferina e estudá-lo como encarnação de pessoas normais. Quando fazemos assim vemos que diante do mal social, o comum é limitar suas dimensões ao mal cometido e ao mal sofrido. Ou seja, tudo se resume à dualidade agressor/vitima.

No Brasil, não temos muita intimidade com a filosofia basca, por isso vou pensar esta questão transversalmente com Artera, que fornece a nós teólogos reflexões magistrais: A compaixão, apologia de uma virtude sob suspeita (1996) e Mal consentido, a que me referi acima. Ele trabalha outras questões referentes a ética e política,  cujos textos vou deixar de lado nessas meditações portenhas.

Partindo da compreensão, como o faz Artera e também o apóstolo Tiago, de que erra aquele que sabe fazer o bem e não o faz, todo mal consentido em relação ao cometido não deixa de ser um mal e um mal tão real como o que se comete e o que se padece, temos um paradoxo: na omissão a deficiência se torna eficaz, a ausência se faz presente e a passividade extremamente ativa.

Quando falamos em consentimento ou omissão estamos falando de ação social.  Ou seja, há uma fazer alienante, um fazer mal que nasce de nosso consentimento ou de nossa omissão, em relação ao um e a todos. Mas do que ato passivo, o mal consentido, o mal por omissão é ativo e tão destruidor como aquele do agressor. Nenhum de nós quer ser definido como agressor de seu próximo ou como sofredores de violência, mas o mal consentido transformou-se numa maneira de não-vida social.

A Naira faz fotos. E eu poso, passeando entre livros na segunda mais linda livraria do mundo, El Ateneo de Buenos Aires. A primeira, segundo o jornal The Guardian, é a Selexys Dominicanen Boekhandel em Maastricht.

Mas voltemos à questão da alienação cotidiana ou o mal perpretado por cada um, por todos, socialmente, nos consentimentos e omissões da não-vida diária. O apóstolo  Paulo nos diz que quem realiza o mal, seja quem for, paga  por ele. Ou seja, consentimento e omissão são ações degeneradoras e destruidoras. Atinge ao que consente, ao omisso e a todos. O mal banal, que de fato nunca é banal, quebra o movimento da vida, cria a trombada. Produz um choque de nossas existências. E essa construção do mal consentido e omisso não acontece de uma hora para outra. São necessários alguns milhares de segundos, tijolo por tijolo, argamassa e muita falta de imaginação. E a falta de imaginação é trilha assassina. 

Paro aqui com uma frase do profeta Ezequiel: se uma pessoa de coração deixar de fazer o bem e começar a fazer o mal cotidiano será que ele vai viver? Conclua você. Beijos.

mardi 24 janvier 2012

O menino e o rifle


 

Gaviões e Passarinhos, filme de Pier Paolo Pasolini

Fomos chamados à liberdade. O que significa isso? Bem, talvez falar de corvos, gaviões e passarinhos ajude... 

Em 1965, Pier Paolo Pasolini, um dos gênios do cinema italiano, filmou Gaviões e passarinhos, história que vi como metáfora sobre liberdade e consciência política. Numa estrada vazia, um senhor (Totó) e seu filho (Ninetto Davoli) encontram um corvo que fala. O corvo os transforma em dois monges franciscanos e eles são obrigados a pregar para gaviões e passarinhos. O próprio Pasolini diria: 

Nunca criei um filme tão desarmado, frágil e delicado como esse. Ele não se parece com meus filmes anteriores e não se parece com nenhum outro filme... Seu surrealismo tem pouco a ver com o surrealismo histórico, mas fundamentalmente com o surrealismo das fábulas”. 

O filme é uma parábola sobre a crise do socialismo, representada pelo corvo, na Itália dos anos 1950. “Totó e Ninetto representam os italianos inocentes, que não se envolvem na história, que conquistam a primeira noção de consciência ao encontrar o marxismo no semblante do corvo”, afirmou Pasolini. 

Ter vivido parte da infância em fazenda, no sul de Minas, foi um privilégio que marcou minha vida, não somente fornecendo memórias para a velhice, mas plasmando conteúdo que amo e defendo: a liberdade. 

Talvez seja essa compreensão telúrica da liberdade, que fez de mim, já na alta maturidade, batista, e me permitiu construir uma ponte entre o pensamento liberal inglês e o socialismo religioso de Paul Tillich. 

Voltemos à minha infância. Meu tio Ary tinha uma Winchester 44 na casa da fazenda. E eu olhava para aquela arma com respeito e paixão. Eu e milhares de pessoas mundo afora. 

Os rifles Winchester 44, conhecidos como papo amarelo, foram populares no interior do Brasil e nos Estados Unidos: símbolo de uma época, como a pistola Colt e os cavalos quarto de milha. 

Conta-se que Lampião, quando começou sua vida guerrilheira, usava uma Winchester 44, que os sertanejos chamavam de cruzeta. Segundo o historiador Frederico Pernambucano de Mello: 

"Lampião tinha uma paixão pelo rifle cruzeta, não somente por ser arma de estréia, mas também por ter permitido criar um processo de aceleração de tiros. Ele conseguiu transformar a arma em um modelo automático. A transformação permitia que o rifle, quando usado, produzisse um clarão que, segundo os sertanejos, alumiava como um lampião". 

A Winchester era mágica e eu amava ver meu tio usando-a contra alvos imóveis: latas velhas e garrafas. Mas, certa tarde, um gavião começou a piar e a fazer círculos no céu. O gavião, accipiter nisus, é uma ave de rapina pequena, de cauda comprida e vôo certeiro. Pia forte, assustando suas presas, geralmente pequenos pássaros e pintos soltos na pastagem. 

E era isso mesmo que aquele gavião estava planejando: atacar os pintinhos que, juntos com a galinha, corriam de um lado para o outro, em pânico. 

Meu tio pegou a Winchester, que reinava numa das paredes da sala, e me chamou. Fomos para a varanda e ele começou a seguir os círculos do gavião. Esperou. Quando o gavião mergulhou em direção aos pintos ele atirou. 

E eu vi o gavião explodir em penas. 

Onde nos leva a liberdade quando não temos consciência do que ela significa? A vida em liberdade significa a aceitação da exigência incondicional de realizar a verdade e fazer o bem. 

Ao reconhecer a existência de uma situação-limite, de ameaça à vida e à existência, devemos entender que: 

(1) não podemos virar as costas ao mundo; (2) aquilo que é eterno deve ser expresso em relação à situação presente; (3) a realidade da graça deve ser expressa com ousadia e risco; (4) e o poder transformador do Evangelho deve expressar uma fé não superficial, que vai à raiz. 

Por isso, como na parábola de Pasolini, somos chamados a pregar para gaviões e passarinhos. Somos livres em Cristo: chamados a viver o desafio incondicional de realizar a verdade e fazer o bem. 

lundi 23 janvier 2012

A mãe e a hora de Jesus

Casamento judeu no Marrocos, por Eugène Delacroix (1798-1863) 

Sermão vespertino de 22 de janeiro de 2012
Pr. Jorge Pinheiro


Versículo-chave
Deste modo, em Caná da Galileia, Jesus realizou o primeiro dos seus sinais. Assim manifestou a sua glória e os seus discípulos creram nele”. (João 12.11)

No terceiro dia (depois do encontro com Felipe e Natanael), houve um casamento em Caná da Galileia. A mãe de Jesus estava lá. 2 Jesus e os seus discípulos também foram convidados. 3 A certa altura da boda faltou vinho. Então a mãe de Jesus disse-lhe: "Já não há vinho!" 4 Jesus respondeu: "E que temos tu e eu a ver com isso, mulher? A minha hora ainda não chegou". 5 Ela então disse aos criados de mesa: "Façam tudo o que ele disser". 6 Havia ali seis vasilhas de pedra das que os judeus utilizavam para as suas cerimônias de purificação. Cada uma levava uns cem litros de água. 7 Jesus mandou aos criados: "Encham de água essas vasilhas". Eles encheram-nas até acima. 8 Depois disse-lhes: "Tirem agora um pouco e levem ao mestre de cerimônias para ele provar". Eles assim fizeram. 9 O mestre de cerimônias provou a água transformada em vinho. Não sabia o que tinha acontecido, pois só os criados é que estavam ao corrente do fato. Mandou então chamar o noivo 10 e observou-lhe: "É costume nas bodas servir primeiro o vinho melhor e só depois de os convidados terem bebido bem é que se serve o menos bom. Mas tu guardaste o melhor até agora!" 11 Deste modo, em Caná da Galileia, Jesus realizou o primeiro dos seus sinais. Assim manifestou a sua glória e os seus discípulos creram nele. 12 Depois disto, Jesus desceu até Cafarnaum, com a sua mãe, os seus irmãos e os discípulos, e ficaram lá alguns dias”. (João 12.1-12)

1. Um estranho diálogo
A certa altura da boda faltou vinho. Então a mãe de Jesus disse-lhe: Já não há vinho! “E que temos tu e eu a ver com isso, mulher? A minha hora ainda não chegou” (João 2.3-4). 

O que há entre nós” era uma expressão judaica, que aparece tanto no Antigo (Jz 11.12; 2Sm 16.10; 1Rs 17.18) como no Novo Testamento (Mt 8.29; Mc 1.24; Lc 4.34). 

Maria, presente na festa de casamento, pediu para que Jesus manifestasse a sua glória. Aqui temos um diálogo aparentemente estranho. Há uma pedido de Maria e há uma resposta algo seca, como se Jesus quisesse fugir ao pedido. Assim começa a história do primeiro milagre público de Jesus. Mas, mãe e filho se conheciam muito bem.

Maria era uma mãe judia piedosa. Mas o que era uma mãe judia piedosa? A família judia, nas tradições antigas, recitava na entrada do shabat o último capítulo de Provérbios, como referência e tributo a esposa e mãe ideal. Esposa e mãe eram vistas como pessoas alegres, compreensivas, reverentes. Ela dava o tom espiritual cotidiano da família. Reunia os filhos em torno de si, quando pronunciava a benção das luzes, preparava a casa para as festas. E, importante, era a conselheira de toda a família. Aquela mãe piedosa conhecia o seu filho. E o filho conhecia a sua mãe. Assim, naquele diálogo não houve discussão, Maria expôs o problema e se dirigiu aos empregados da casa: "Façam tudo o que ele disser". É... ela conhecia o seu filho.

Mas o clamor de Maria remete ao clamor humano diante das limitações, do fim da alegria e da felicidade que trombam com a perda de sentido, com a morte. O vinho acabou. Na caminhada humana, o vinho sempre acaba, permanece diante de nós a alienação, o atravessar errantes o deserto não escolhido. A frase de Maria é de todos nós humanos... o vinho acabou! 

2. A hora de Jesus

A minha hora ainda não chegou” (João 2.4).

Mas, qual era a hora de Jesus? Era a hora da manifestação da sua glória. E essa hora se aproximava, dirá mais tarde o apóstolo João (7.30; 8.20; 12.23-27). O pedido de Maria transformou-se assim numa antecipação simbólica da manifestação da glória, que teve seu anticlímax, seu momento de terror e tristeza, na cruz, e seu clímax, seu momento maior, na ressurreição. Como Moisés (Ex 4.1-9), Jesus deveria realizar sinais para mostrar que tinha sido enviado pelo Pai. Esses sinais e maravilhas deveriam chamar seus discípulos à fé.

Ele disse à mãe que ainda não chegara o momento da manifestação maior de sua glória. Não do seu ministério, que já iniciara com seu batismo, tentação no deserto e escolha dos primeiros discípulos. Por isso, João se refere ao casamento de Caná como o terceiro dia a partir da escolha de André, irmão de Pedro, Filipe e Natanael.

Dias depois, numa discussão no templo de Jerusalém, “os chefes dos judeus perguntaram-lhe: "Que sinal nos mostras para poderes fazer isto?" Jesus respondeu: "Destruam este santuário e eu em três dias o hei-de levantar”. (João 2.18-19).

A transformação de água em vinho apresentou-se, então, como uma antecipação da ressurreição, fim definitivo do clamor humano, da perda de sentido, das lágrimas... A ressurreição de Jesus foi e é a manifestação de sua glória. E, por isso, o apóstolo Paulo clamará: “se não há ressurreição, comamos e bebamos, porque amanhã morremos” (1Coríntios 15.32)

Deste modo, em Caná da Galileia, Jesus realizou o primeiro dos seus sinais. Assim manifestou a sua glória e os seus discípulos creram nele” (João 12.11). 

3. Para meditarmos juntos: Eu, você e a hora de Jesus

Como os discípulos, eu e você vimos a glória de Jesus. Ele fez esses sinais para que eu e você crêssemos. Cremos que Jesus é o rei da glória?

Cristo ressuscitou dos mortos e é a garantia de ressurreição para os que morreram. Assim, se por meio de um homem começou a morte no mundo, por outro homem começou a ressurreição dos mortos. Deste modo, unidos a Adão todos estão sujeitos à morte e unidos a Cristo todos voltarão a receber a vida” (1Coríntios 15.20-22).

AMÉM



samedi 21 janvier 2012

A teologia brasileira de Selton Mello

"O Palhaço é um filme analógico", diz Selton Mello

A busca de identidade é um tema fundante da teologia. Está presente nos onze primeiros capítulos do livro de Gênesis e depois renasce em personagens matriciais, como por exemplo, Jó, Jonas, Davi, entre outros. Mas é também o fundo da história do filme O Palhaço dirigido por Selton Mello, que também atua, ao lado de Paulo José. 


"É uma época de filmes muito tecnológicos. 'O palhaço' é um filme analógico. São tantos efeitos visuais, truques e criaturas criadas por computador no cinema de hoje que acho que as crianças vão acabar estranhando os personagens do Circo Esperança. esses personagens parecem seres de outro planeta, porque elas nem imaginam que existe esse mundo do circo", disse em entrevista a Paulo Tiefenthaler no Festival de Cinema de Paulínia.

Se o filme fosse em branco e preto seria um cult, já que foca a crise de identidade que fere o palhaço Benjamin, que trabalha no circo do pai. No meio das estradas desse mundão besta, vemos a perdidez de Benjamin em relação ao caminho, ao destino, que movem o fado de sua vida -- fazer os outros rirem.

"Quando Benjamim segue em direção da cidade de Passos, que é um centro urbano, tive medo do filme afundar. Era um perigo que eu corria. O fato de eu ter escalado Ferrugem, Loredo e Moacyr para esse núcleo da cidade mantém o caráter circense do filme. Porque eles são espécies de palhaços ou arquétipos disso. Além disso, são referências para mim. Quis homenageá-los", comenta.

O tema é bíblico, humano, universal. Todos encaramos dúvidas e destino. As alegorias circenses são espelhos do vazio de identidade do palhaço Benjamin, que acaba por ser salvo por circunstâncias laterais, como acontece na vida. Fica porém uma frase emblemática, nas palavras do pai e do filho, que às transversas, nos remete à leitura popular, cheia de mineirice, do velho Calvino:

"o gado bebe leite
o rato come queijo
e eu sou palhaço"

jeudi 19 janvier 2012

Às margens do Garonne

Eu estava hospedado no Hotel de France e dividia o apartamento com Jean Richard, naquela época diretor da Faculdade de Ciências da Religião na Universidade Laval, em Quebec, no Canadá. O hotel era e é confortável, mas sem luxo. Fica na Rue d´Austerlitz, ao lado da praça Wilson, florida e cheia de restaurantes com mesas nas calçadas. Ótimo lugar para ler despreocupado, comer devagar e ver o movimento. 

Tirei aqueles dias da viagem para estudar mais uma vez a carta de Paulo aos Romanos. Usei o texto francês da Bíblia de Jerusalém e o comentário de Guy Lafon, do Instituto Católico do Paris. 

Na abertura do Colóquio Internacional da Associação Paul Tillich em Língua Francesa, Jean Richard falou sobre “Doutrina social, teologia da libertação e socialismo religioso”. Ele é um especialista em Paul Tillich. Foi também um dos responsáveis pela tradução para o francês das obras do período alemão de Tillich. Dessas, três devem ser citadas por sua importância para a Teologia da Cultura: “Christianisme et socialisme”, “Écrits contre les nazis” e “La dimension religieuse de la culture”. 

Para Richard, conforme expôs em sua Comunicação, “o horizonte filosófico e teológico de Tillich, nos anos 1920, tem uma amplidão surpreendente. Desde 1919, ele dirigiu seus estudos sobre a questão do socialismo religioso, a partir da idéia de uma teologia da cultura e do princípio protestante”. 

Segundo a interpretação que Tillich faz, explica Jean Richard, é o princípio protestante que permite superar a dicotomia do profano e do sagrado, do natural e do sobrenatural. Isto porque a justificação pela graça significa que a graça da salvação opera independentemente das condições religiosas: tanto na ordem do profano como na ordem do religioso”. 

É neste sentido que Tillich vai interpretar a expressão socialismo religioso. O socialismo religioso não é o socialismo da Igreja; nem um socialismo consagrado pela religião, um socialismo absolutizado. É um movimento plenamente profano, mas que na sua profanidade se abre para a transcendência do Incondicionado”. 

Tal conceito aparece junto com a elaboração filosófica e teológica do socialismo religioso que Tillich situa no quadro de uma teologia da cultura. Fica evidente que Tillich, desde o início de seus estudos, sobrepõe a oposição entre libertação sociopolítica e salvação cristã, oposição que não é, no fundo, mais que uma figura da dicotomia entre natural e sobrenatural, profano e sagrado”, afirmou o professor canadense. 

Curti o Garonne, rio limpo e azulado que banha a cidade. Ao lado de sua margem direita, perto dos jardins da praça Saint Pierre, há um bar agradável com internet. Dele escrevi e-mails de amor para Naira. Nos dias ensolarados que tive a bênção de viver lá, o azul suave do rio se confundia com o céu e fazia contraste com o rosa da cidade. 

Jean Richard

Eu e Jean Richard trocamos umas quantas idéias sobre o socialismo religioso de Tillich, que entendemos como uma crítica a toda forma de socialismo, ou de política, que quer se absolutizar, que se coloca acima do Incondicionado. 

O socialismo que queremos, disse Tillich, é aquele que coloca na teoria e na prática a questão da possibilidade de que a vida tenha sentido para todos os indivíduos da sociedade e que se esforce para responder a esta questão no plano da realidade e do pensamento”. 

“Tal socialismo não é apenas um movimento político, é mais que um movimento proletário. É um movimento que procura apreender cada aspecto da vida e cada grupo da sociedade”. [Christianisme et Socialisme, Écrits socialistes allemands (1919-1931), Les Éditions du Cerf, Éditions Labor et Fides, Les Presses de l’Université Laval, 1992, p. 346]. 

Toda estrutura política pressupõe poder e, consequentemente, um grupo que o assuma. E como todo grupo de poder é também um conglomerado de interesses opostos a outras unidades de interesses, sempre necessita correção. 

Assim, quando no poder, todo grupo, seja socialista ou não, necessita de correção. É o que justifica a democracia e a faz necessária enquanto sistema que incorpora correções contra o uso errôneo da autoridade política. [Paul Tillich, Teologia de la cultura y otros ensayos, "Entre la heteronomia y la autonomia", Buenos Aires, Amorrortu Editores, 1974, pp. 239-240]. 

Toulouse é um centro intelectual da ordem dominicana. E nós, a convite, usamos para nossas palestras e debates as dependências da Faculdade de Teologia do Instituto Católico. A universidade católica de Toulouse nasceu em 1229. Foi gostoso estar lá. Aquele antigo convento medieval, cheio de histórias, convida ao silêncio e à reflexão. 

Entrei numa velha igreja dominicana, de arquitetura normanda, com linhas curvas e elegantes, sem imagens, apenas com uma cruz limpa ao fundo. Uma jovem tocava música renascentista no órgão de tubos. A igreja, vazia, parecia que ia levantar vôo. 

Orei em Romanos, “quem poderá nos separar do amor de Cristo...” e deixei que o Espírito falasse ao meu espírito.