lundi 10 septembre 2007

PARA LER PAUL TILLICH

INTRODUÇÃO
Nossa abordagem visa procurar inspiração e não tomar as idéias e argumentos de Paul Tillich como cânon. Entendemos que seus escritos foram elaborados sob condições especiais e refletem conjunturas e realidades peculiares à modernidade do século XX e por isso nos servem de roteiro para reflexão e não como palavra revelada.
Herdeiro do pensamento alemão do século XIX, Paul Tillich é devedor do idealismo alemão, em especial de Hegel e Schelling, mas é a partir de 1919, na Alemanha destruída pela I Guerra Mundial que começa a trabalhar sobre a idéia de uma teologia da cultura.
Para Tillich, cultura tem uma leitura diferente daquela que terá para a antropologia da segunda metade do século XIX, que inclui a produção humana em toda a sua riqueza e diversidade. Para ele, cultura é a produção da intelectualidade ilustrada européia.
E por baixo das manifestações culturais específicas se faz presente a religião. Assim, para Tillich, a religião expressa o Incondicionado, dando margem a manifestações especiais, que se apresentam enquanto cultura. Daí seu interesse em manter um permanente diálogo com artistas, escritores e com o mundo social-democrata da época.
Dessa maneira, durante toda sua vida Tillich será um teólogo da cultura e um filósofo da religião.
1.BREVE RESUMO HISTÓRICO
Paul Tillich nasceu na Prússia, na aldeia de Starzeddel, província de Brandeburgo, em1986, filho de pastor luterano. Morreu em 1965 nos Estados Unidos.
1910 -- Graduou-se doutor em Filosofia, em Breslau.
1912 – Licenciou-se em Teologia (Halle) e tornou-se capelão militar. Burguês liberal e idealista, nessa época, chegou à conclusão que as classes pobres eram exploradas pela aristocracia fundiária, pelo Exército, pela Igreja e pelo Estado.
1915 – A grande transformação
“A transformação ocorreu durante a batalha de Champagne, em 1915. Houve um ataque noturno. Durante toda a noite, não fiz outra coisa senão andar entre feridos e moribundos. Muitos deles eram meus amigos íntimos. Durante toda aquela longa e terrível noite, caminhei entre filas de gente que morria. Naquela noite, grande parte da minha filosofia clássica ruiu em pedaços; a convicção de que o homem fosse capaz de apossar-se da essência do seu ser, a doutrina da identidade entre essência e existência... Lembro-me que sentava entre as árvores das florestas francesas e lia Assim Falou Zaratustra, de Nietzsche, como faziam muitos outros soldados alemães, em contínuo estado de exaltação. Tratava-se da liberação definitiva da heteronomia. O niilismo europeu desfraldava o dito profético de Nietzsche, ‘Deus está morto’. Pois bem, o conceito tradicional de Deus estava mesmo morto”. Revista Time, 6/5/59, p. 47.
Para Tillich era preciso abandonar aquele Deus concebido pela teologia do século 19 e fazer o cristianismo responder aos problemas e às exigências contemporâneas.
1920 – Escreve Cristianismo e Socialismo.
Funda, então, na Alemanha, após a Primeira Grande Guerra, um movimento chamado Socialismo Religioso, que tinha por base a afirmação de que “sem fundamento religioso nenhuma sociedade pode salvar-se da destruição”. Apesar de seus esforços a classe operária alemã não adere ao movimento, como Tillich pretendia. O movimento fracassa.
1925 – Começa a escrever sua Teologia Sistemática, cujo primeiro volume só será publicado em 1952.
1933 – Escreve A Decisão Socialista, que é apreendida pela polícia nazista, levando-o a migrar para os Estados Unidos, nesse mesmo ano. Nos EUA, leciona primeiro no Union Theological Seminary, depois, já aposentado na Universidade de Harvard e no final de sua vida no Divinity School de Chicago, onde morre em 1965.
Paul Tillich sofreu influência da teologia dialética de Barth (mais tarde se tornarão adversários declarados) e do existencialismo de Heidegger. Mas, na verdade, sua reflexão terá dois direcionamentos: busca redefinir o conceito de religião (Filosofia da Religião, 1925) e mostrar a interdependência entre religião e cultura (Teologia da Cultura, 1959). Sua Teologia Sistemática está umbilicalmente ligada a essa preocupação.
“Caso perguntasse a uma pessoa que tivesse ficado impressionada com os mosaicos de Ravena ou com as pinturas da cúpula da Capela Sistina ou com os retratos do último Rembrandt, se sua experiência teria sido religiosa ou cultural, ela acharia difícil responder a tal pergunta. Poderia ser correto dizer que essa experiência é cultural na forma e religiosa na substância. É cultural porque não está vinculada a um ato ritual específico, mas é religiosa porque toca o problema do Absoluto e os limites da existência humana” [Sulla linea di confine, p.77].
2. TEOLOGIA
É considerado o maior pensador sistemático do século 20. Sua teologia pode ser situada como um meio caminho entre a teologia liberal e a neo-ortodoxia.
Harnack (razão)versus Barth (fideísmo).
Tillich – princípio da correlação.
Seu princípio hermenêutico é o princípio da correlação.
Princípio da Correlação
Os elementos relacionados só podem existir juntos. É impossível que um aniquile a existência do outro. Com o princípio da correlação a reflexão teológica desenvolve-se entre dois pólos: a verdade da mensagem cristã e a interpretação dessa verdade, que deve levar em conta a situação em que se encontra o destinatário da mensagem. E situação não diz respeito ao estado psicológico ou sociológico do destinatário, mas “as formas científicas e artísticas, econômicas, políticas e éticas, nas quais [os indivíduos e grupos] exprimem as suas interpretações da existência”.
Exemplos
O eu não pode existir sem o mundo, nem o mundo sem o eu.
A fé não pode existir sem a dúvida, nem a dúvida sem a fé.
Outros pensadores, como Platão, Aristóteles e Tomás de Aquino utilizaram o princípio da correlação, mas Tillich o transformou em princípio hermenêutico por excelência.
Para Tillich o fazer teologia deve partir de uma correlação epistemológica, que ele divide em três momentos: Razão/Revelação; Razão/fé; Filosofia/Teologia.
Sua Teologia Sistemática divide-se em cinco grandes blocos
Razão e Revelação. “A razão não resiste à revelação. Ela pergunta pela revelação. Pois revelação significa a reintegração da razão” [Teologia Sistemática, Sinodal, 1984, p. 85].
O Ser e Deus.É a finitude do ser que conduz à questão de Deus”. (Idem, p. 143).
A Existência e o Cristo. “... o termo ‘Novo Ser’, quando aplicado a Jesus como o Cristo, indica o poder que nele vence a alienação existencial ou, expresso em forma negativa, o poder de resistir às forças da alienação. Experimentar o Novo Ser em Jesus como o Cristo significa experimentar o poder que nele venceu a alienação existencial em si mesmo e em todos aqueles que têm parte com ele”. [Systematic Theology II, p. 125].
A Vida e o Espírito.
A História e o Reino de Deus.
3. TEXTOS PARA SE ENTENDER TILLICH
A dimensão religiosa na vida espiritual do homem
Paul Tillich, Teologia de la cultura y otros ensayos, A dimensão religiosa na vida espiritual do homem, Buenos Aires, Amorrortu Editores, 1974, pp. 16-17. (Este texto foi publicado originalmente em Man’s right to knowledge, Columbia University Press, 1954).
Em tais circunstâncias, desprovida de um lar, de um lugar onde estabelecer sua morada, a religião descobre logo que não é necessária tal morada, que não necessita procurar um lar. Seu lar está em todas partes, quer dizer, na profundeza de todas as funções da vida espiritual do homem.
A religião é a dimensão da profundidade em todas elas, é o espectro da profundidade na totalidade do espírito humano.
O que significa a metáfora profundidade? Significa que o aspecto religioso aponta em direção àquilo que, na vida espiritual do homem, é último, infinito e incondicional. No sentido mais amplo e fundamental do termo, religião é preocupação última. E a preocupação última se manifesta em absolutamente todas as funções criativas do espírito humano.
Manifesta-se na esfera moral com a seriedade incondicional do imperativo moral; donde, quando alguém rechaça a religião em nome da função moral do espírito humano, rechaça a religião em nome da própria religião.
Manifesta-se no reino do conhecimento como a busca apaixonada de uma realidade última; por isso, quando alguém rechaça a religião em nome da função cognitiva do espírito humano, rechaça a religião em nome da própria religião.
Manifesta-se na função estética do espírito humano como o anelo infinito de expressar um significado último; donde, quando alguém rechaça a religião em nome da função estética do espírito humano, rechaça a religião em nome da própria religião.
A religião constitui a substância, o fundamento e a profundidade da vida espiritual do homem. Eis o aspecto religioso do espírito humano.
Kairós
Paul Tillich, História do pensamento cristão, Kairós, São Paulo, ASTE, 2000, p. 24.
Segundo o apóstolo Paulo sem sempre existe a possibilidade de acontecer o que, por exemplo, aconteceu no aparecimento de Jesus, o Cristo. A vinda de Jesus se deu num momento especial da história em que tudo estava preparado. Vamos discutir agora essa “preparação”. Paulo fala de kairós, para descrever o sentimento de que o tempo estava pronto, maduro, ou preparado.
Esta palavra grega exemplifica a riqueza da língua grega em comparação com as línguas modernas. Só temos um vocábulo para “tempo”. Os gregos têm dois, chronos e kairos. Chronos é o tempo do relógio, que se pode medir, como aparece em palavras como cronologia e cronômetro.
Kairós não tem nada a ver com esse tempo quantitativo do relógio, mas se refere ao tempo qualitativo da ocasião, o tempo certo. Algumas histórias do Evangelho falam desse tempo. Determinados fatos acontecem quando o tempo certo, o kairós, chega.
Quando se fala em kairós se quer indicar que alguma coisa aconteceu tornando possíveis ou impossíveis certas ações. Todos nós experimentamos momentos em nossas vidas quando sentimos que agora é o tempo certo para agirmos, que já estamos suficientemente maduros, que podemos tomar decisões. Trata-se do kairós.
Foi nesse sentido que Paulo e a igreja primitiva falaram de kairós, o tempo certo para a vinda de Cristo. A igreja primitiva e Paulo até certo ponto tentaram mostrar por que esse tempo era o tempo certo, e de que maneira o seu aparecimento tinha sido possibilitado por uma constelação providencial de fatores.
A luta entre o tempo e o espaço
Paul Tillich, Teologia de la cultura y otros ensayos, A luta entre o tempo e o espaço, Buenos Aires, Amorrortu Editores, 1974, pp. 40-42.
O Deus do tempo é o Deus da história. Isso significa em primeiro lugar, que é o Deus que atua na história com destino a uma meta final. A história segue uma direção, algo novo há de criar-se nela e por intermédio dela.
Essa meta designa-se de várias maneiras: bem-aventurança universal, vitória sobre os poderes demoníacos representados pelas nações imperialistas, chegada do Reino de Deus na história e, mais além da história, transformação da forma do mundo, etc.
Os símbolos são muitos – alguns mais imanentes, como no profetismo antigo e no moderno protestantismo, outros mais transcendentes, como nas doutrinas apocalípticas posteriores e no cristianismo tradicional --, mas em todos os casos o tempo dirige, cria algo novo, uma “nova criatura”, como chama Paulo.
O trágico círculo do espaço foi superado. A história tem um princípio e um fim definidos.
No profetismo, a história é história universal. Negam-se as limitações espaciais, as fronteiras entre as nações. Para Abraão todas as nações serão benditas, todas poderão adorar a Deus no monte Sião, o sofrimento da nação escolhida tem o poder de salvar todas as demais. O milagre do Pentecostes supera as diferenças do idioma.
Em Cristo salva-se e une-se o cosmo, o universo. Em sua tentativa de criar uma consciência humana indivisa, as missões têm um caráter universal. O tempo alcança plenitude na história e a história a alcança no reino universal de Deus, o reinado da justiça e da paz.
Isso nos leva ao ponto decisivo da luta entre o tempo e o espaço. O monoteísmo profético é o monoteísmo da justiça. Os deuses do espaço suprimem, necessariamente, a justiça. O direito ilimitado de todo deus espacial choca inevitavelmente com o direito ilimitado de outro deus espacial. A vontade poder de um dos grupos não pode fazer justiça ao outro. Isso é válido para os grupos poderosos que operam dentro da nação e para as próprias nações.
O politeísmo, a religião do espaço, é forçosamente injusto. O direito ilimitado de todo deus do espaço anula o universalismo implícito na idéia de justiça.
Este é o único significado do monoteísmo profético. Deus é um porque a justiça é uma. A ameaça profética que pende sobre o povo eleito, de ser rechaçado por Deus, por causa da injustiça, é a verdadeira vitória sobre os deuses do espaço.
A interpretação da história que nos dá o dêutero-Isaías, segundo o qual Deus chama os demais povos para castigar o povo por Ele escolhido, devido à sua injustiça, confere a Deus um caráter universal.
A tragédia e a injustiça são próprias dos deuses do espaço; a realização histórica e a justiça o são de Deus que atua no tempo, e por seu intermédio, unindo no amor o vasto espaço de seu universo.
Entre a heteronomia e a autonomia
Paul Tillich, Teologia de la cultura y otros ensayos, Entre a heteronomia e a autonomia, Buenos Aires, Amorrortu Editores, 1974, pp. 239-240.
Todo sistema político requer autoridade, não só no sentido de possuir instrumentos de força, mais também em termos de consentimento mudo ou manifesto das pessoas. Tal consentimento só é possível se o grupo que está no poder representa uma idéia poderosa, que goze de significado para todos.
Existe, pois, na esfera política uma relação entre a autoridade e a autonomia, relação que em meu ensaio Der Start als erwartung und aufgabe (O Estado como promessa e como tarefa) caracterizei como segue:
“Toda estrutura política pressupõe poder e, conseqüentemente, um grupo que o assume. Posto que um grupo de poder é também um conglomerado de interesses opostos a outras unidades de interesses, sempre necessita uma correção. A democracia está justificada e é necessária na medida em que é um sistema que incorpora correções contra o uso errôneo da autoridade política. (...) Os sistemas ditatoriais carecem de correções contra o abuso da autoridade por parte do grupo de poder. O resultado é a escravidão da nação inteira e a corrupção da classe dirigente”.
O conflito de Lutero com os evangélicos radicais
Paul Tillich, História do pensamento cristão, O conflito de Lutero com os evangélicos radicais, São Paulo, ASTE, 2000, p. 238.
Em primeiro lugar, (os evangélicos radicais) atacavam a doutrina de Lutero a respeito da Escritura. Deus não falara apenas no passado, tornando-se mudo no presente. Sempre falou; fala nos corações ou nas profundezas de qualquer ser humano preparado para ouvi-lo por meio de sua própria cruz. O Espírito habita nas profundezas do coração, não o nosso, naturalmente, mas o de Deus. Thomas Münstzer, o mais criativo dos evangélicos radicais, acreditava que o Espírito podia sempre falar por meio dos indivíduos. No entanto, para se receber o Espírito era preciso participar da cruz.
“Lutero, dizia ele, prega um Cristo doce, um Cristo do perdão. Devemos também pregar o Cristo amargo, o Cristo que nos chama a carregar sua cruz.”
A cruz, diríamos, representava a situação limite. Era externa e interna. Surpreendentemente, Münstzer expressa esta idéia em termos existencialistas modernos. Quando percebemos a finidade humana, desgostamo-nos com a totalidade do mundo. E nos tornamos pobres de espírito. O homem é tomado pela ansiedade de sua existência de criatura e descobre que a coragem é impossível. Nesse momento Deus se manifesta e ele é transformado. Quando isso acontece, o homem pode receber revelações especiais. Pode ter visões pessoais não apenas a respeito de teologia como um todo, mas sobre assuntos de vida diária.
Entre o luteranismo e o socialismo
Paul Tillich, Teologia de la cultura y otros ensayos, Entre o luteranismo e o socialismo, Buenos Aires, Amorrortu Editores, 1974, pp. 259-263.
É relativamente simples chegar ao socialismo quando se parte do calvinismo, em especial em suas formas mais secularizadas da última época; o caminho está muito mais cheio de obstáculos quando passa pelo luteranismo.
Sou luterano de berço, educação, experiência religiosa e reflexão teológica. Nunca me situei no limite entre o luteranismo e o calvinismo, nem sequer depois de experimentar as desastrosas conseqüências da ética social luterana e de reconhecer o inestimável valor da idéia calvinista do Reino de Deus para a solução dos problemas sociais.
A essência de minha religião continua sendo luterana. Ela abarca uma consciência de corrupção do existir, o repúdio de todo tipo de Utopia social (incluindo a metafísica do progressismo), o percatamiento da natureza irracional e demoníaca da existência, o reconhecimento do elemento místico na religião, e o rechaço do legalismo puritano na vida privada e corporal.
Também meu pensamento filosófico expressa esse conteúdo singular. Até agora, só Jacob Bohéme, porta-voz filosófico do misticismo alemão, tentou uma elaboração especificamente filosófica do luteranismo. Através dele o misticismo luterano influenciou Schelling e o idealismo alemão, e através de Schelling, por sua vez, os filósofos irracionalistas e vitalistas que emergiram nos séculos XIX e XX.
Na medida em que grande parte da ideologia anti-socialista se baseou sobre estes últimos, o luteranismo atuou indiretamente através da filosofia e também diretamente como forma de controle sobre o socialismo.
A visão marxista da situação humana (alienação)
Paul Tillich, Perspectivas da Teologia Protestante nos séculos XIX e XX, A visão marxista da situação humana (alienação), São Paulo, ASTE, 1999, p. 194.
A descrição de Marx da sociedade moderna é muito importante. Se nós, na qualidade de teólogos, falamos de pecado original, por exemplo, sem perceber os problemas da alienação na situação social, não poderemos nos dirigir ao povo em sua situação real no cotidiano.
Segundo Marx, a alienação significa a desumanização presente na situação social. Ao falar da humanidade no futuro, fala de verdadeiro humanismo. Aguarda uma situação em que o verdadeiro humanismo não seja fruição de apenas alguns privilegiados; nem é o humanismo a posse de certos bens culturais. Busca o restabelecimento da verdadeira humanidade, capaz de substituir a desumanização da sociedade alienada.
O principal nessa idéia de desumanização é que o homem se transformou num dente da engrenagem no processo de produção e do consumo. No processo da produção o trabalhador individual se transformou numa coisa, num instrumento, ou numa mercadoria comprada e vendida no mercado. O indivíduo tem que se vender para sobreviver.
Suas descrições supõem que o homem seja essencialmente pessoa e não objeto. O homem é fim e alvo supremo e não mero instrumento. Não é uma mercadoria, mas o telos interior de tudo que faz. É o significado e o alvo interior.
A descrição de Marx da desumanização ou da forma particular de alienação existente na sociedade capitalista contradiz completamente sua herança clássica humanista. Não podia haver reconciliação.
Na realidade social existe apenas desumanização e alienação. Vinha daí o poder para a mudança da situação. Quando Marx, em seu Manifesto Comunista, se referia à libertação das massas de suas cadeias, essas cadeias eram os poderes desumanizadores produzidos pelas condições de trabalho da sociedade capitalista. Conseqüentemente, perdia-se o caráter essencial do homem nesse tipo de sociedade. O homem deformava-se nos dois lados do conflito pelas condições da existência. Só voltaremos, a saber, o que o homem realmente é quando essas condições forem superadas.
A teologia cristã afirma que podemos saber o que é essencialmente o homem, porque o homem essencial já apareceu nas condições da existência no Cristo.
A alienação não se refere apenas às relações humanas, caracterizadas pela separação entre as classes, mas também à relação do homem coma natureza. Retira-se do homem o Eros. A natureza passa a ser apenas matéria de onde se fazem instrumentos, para a manufatura dos bens de consumo.
A natureza deixa de ser um sujeito com o qual nós, também sujeitos, podemos nos unir em termos de Eros, daquele amor que vê na natureza o poder interior do ser, o fundamento do ser criativamente ativo por meio da natureza. Na sociedade industrial transformamos a natureza na matéria de onde fazemos as coisas para comprar e vender.
Prof. Dr. Jorge Pinheiro

mercredi 29 août 2007

A Teologia do Diálogo de Deus: roteiro de estudo

“O homem deve tomar a melhor e a mais incontestável das teorias humanas e usá-las como a jangada sobre a qual ele possa navegar, ainda que não sem risco, se é que ele não pode achar alguma palavra de Deus que possa conduzi-lo com mais certeza e segurança”. Platão, Phaedo, 85b.
“A Palavra é um leão. Deixe-a solta!” Martin Lutero.
1.
O DIÁLOGO DE DEUS é o ato da conversa iniciada por Deus com o ser humano. É Deus se comunicando e ouvindo o ser humano, é a resposta do ser humano, em obediência, à palavra de Deus para sua vida. O diálogo de Deus apresenta-se como geral e particular.
Diálogo de Deus em sua universalidade é a automanifestação de Deus a todos os seres humanos, em todos os lugares e em todos os tempos: é a natureza (Sl 19.1-6; Rm 1.19-20), a providência (Mt 5.45; At 17.24-28; Rm 8.28), a preservação do universo (Cl 1.17), a personalidade humana e a consciência moral (Gn 1.26; Rm 1.32-2.16).
Diálogo de Deus em sua particularidade é a automanifestação de Deus para certas pessoas, em tempos e lugares definidos, a fim de que tais pessoas entrem num relacionamento de intimidade com ele. A Palavra registrada nas Escrituras e o Logos encarnado são dois momentos do diálogo especial de Deus com o ser humano.
Assim, para santo Agostinho, são Tomás de Aquino, Lutero e Calvino, teologicamente, o diálogo de Deus é ensino proposicional; para Pannenberg e Moltmann é a própria História; para Schleiermacher, Ritschl, Theilhard de Chardin é uma experiência interna; para Barth e Bultmann é encontro um existencial; e para Karl Rahner e Leonardo Boff é uma nova consciência.
Na Modernidade, o racionalismo definiu como critério de verdade a lógica dedutiva, em especial a matemática. Spinoza, assim como Descartes, Leibniz e Kant descartaram a possibilidade do um diálogo especial de Deus com os seres humanos, quer através das Escrituras, quer através da fidelidade da Palavra. Esses filósofos abriram o caminho para o deísmo, mas foram muito importantes na elaboração da metodologia científica da Modernidade. Na seqüência, Hume e dos deístas ingleses aprofundaram o racionalismo e descartaram a possibilidade dos milagres. Já a teologia protestante do século dezenove procurou relacionar diálogo de Deus, cultura e a leituras das ciências modernas, em especial a História.
DIÁLOGO DE DEUS E CONHECIMENTO
Muita gente considera o conhecimento como algo meramente racional. Teologicamente, conhecimento é fé (Hb 11.1), assim quem considera o conhecimento de Deus como processo puramente racional, também vê a fé como puramente racional. Exclui a vontade, o afeto, a personalidade, a ação humana, as obras e as experiências de sua compreensão de fé.
Tal abordagem nos leva a três perguntas
1. Qual é a natureza da fé?
2. A fé vem antes ou depois do arrependimento?
3. A fé vem antes ou depois da regeneração?

Respondendo ao primeiro questionamento, consideramos que a fé depende de uma opção da pessoa e que é um estado do coração. Vejamos: tomando por base alguns textos (Rm 10.9-10; 1 Jo 5.1; Jo 5. 38-40, 42, 44; 2 Ts 2.10; At 8. 37) podemos dizer que a fé (1) é um dever e, portanto, a vontade está incluída; (2) é uma graça entregue pelo Espírito Santo (1 Co 13), e sendo graça não está limitada ao intelecto; (3) dá glória a Deus e não se dá glória a Deus só com a razão, pois envolve toda a personalidade humana; (4) expressa-se em termos de afeto (2Ts 2.10). Ora, receber inclui afeto, implica assim em engajamento de afetividades (Rm 10.9-10); (5) a falta de fé está ligada a uma disposição moral (Jo5; Jo 8.33+; Hb 3; Ef 4.17). A incredulidade é um estado do coração, não é um erro de abordagem meramente racional.
Em relação à segunda questão, consideramos que se não houver arrependimento não há fé verdadeira. João, pregava o banho do arrependimento. Ver o chamado de Jesus (Mc 1.15; Lc 24) e a experiência da jovem igreja cristã em At 2.37-38; 3.19; 5.31; 20 e 26.18.
Quanto ao terceiro questionamento consideramos que sem regeneração não há fé. Ver: 1Co 2.10-16, 1Co 12.3; a experiência de Nicodemos (Jo 3), e a firmação de Paulo (Rm 8.7).
Assim, a compreensão da fé e da realidade do diálogo de Deus com opção do coração, arrependimento e regeneração elimina idéia de que podemos conhecer exclusivamente através de processos racionais. Por isso, dizemos que o processo do diálogo de Deus está ligado à obediência que, em última instância, é disposição positiva do coração, enquanto totalidade da personalidade humana, arrependimento e regeneração de vida.
2. O registro do diálogo de Deus é a capacitação divina para que pessoas registrassem os diferentes momentos de sua conversa com os seres humanos. É uma capacitação (Pv 30.5,6; Mt 15.4; At 28.25; Hb 3.7) de pessoas (Lc 1.1-4; 1Co 7.25,26; 2Tm 4.9-13), que ouvem ou sensibilizam de diferentes maneiras o oráculo divino (Ex 17.14; Jr. 30.2; Mt 24.35; Ap 22.6,7, 18, 19).
Nesse sentido, o diálogo especial de Deus abrange toda a Escritura (2 Tm 3.16), e Deus é a fonte do processo (2 Tm 3.16), ou como afirma Pedro: “nunca jamais qualquer profecia foi dada por vontade humana, entretanto homens santos falaram da parte de Deus movidos pelo Espírito Santo”. 2Pe 1.19-21. E os apóstolos deram testemunho disso: 1Co 14.37; 1Ts 4.2; 2Pe 3.2; Ap 22.6-10, 18-20.
Para discutir: 1Co 7. 6, 10, 12, 25 e 40 apresentam opiniões pessoais de Paulo. Como você explica?
3. As Escrituras são fiéis e verdadeiras
A doutrina que apresenta as Escrituras como fiéis e verdadeiras foi reconhecida pelos pais da Igreja e pelos mais importantes teólogos da cristandade.
Santo Anselmo disse: “Além disso, este próprio Deus-homem estabeleceu o Novo Testamento e confirmou o Antigo. Por isso, assim como é necessário afirmar que Ele mesmo era verdadeiro, também ninguém pode negar a verdade de qualquer coisa incluída nestes Testamentos”. (Anselmo, Cur Deus Homo, bk2, ch22).
Santo Agostinho: “As conseqüências mais calamitosas devem seguir o acreditar que qualquer coisa falsa é achada nos livros sagrados, isto quer dizer, que os homens através de quem a Escritura foi dada em forma escrita colocaram nestes livros qualquer coisa falsa. Se, uma vez, tu permites nesse templo alto da autoridade uma declaração falsa, nenhuma sentença será deixada nesses livros”. (Epistulae, ep.28).
São Tomás de Aquino: “As Sagradas Escrituras, porém, devem manifestar a verdade de modo eficaz, sem erro de qualquer espécie”. (Suma Teológica, 1.1.10 ad. 1).
Martinho Lutero: “Tenho aprendido a dar esta honra, isto é, infabilidade, somente aos livros que são chamados de Cânon, a fim de que eu creia com confiança que nenhum dos seus autores errou”. (em M. Reu, Luther and the Scriptures, p. 24).
John Wesley: “Pois, se houvesse qualquer erro na Bíblia, poderia haver mil. Se houver um engano nesse livro, ele não veio do Deus da Verdade”. (Journal, VI:117).
Vaticano I; “Devemos dizer desta revelação divina que estas verdades (...) não têm qualquer mistura de erro”. (Dogmatic decress of the Vatican Council, p. 137).
Acordo de evangélicos e católicos romanos (1986) – “Todos nós concordamos que o que os autores humanos escreveram é o que Deus queria que fosse revelado, portanto, a Escritura existe sem erro”. (A Near Miracle, Time, 127:5, [fev.6, 1986]:42).
A evidência de veracidade e fidelidade
1. A natureza de Deus: Jo 17.3; Tg 1.17; Rm 3.4
2. O testemunho do texto: Mt 5.17,18 (cf. 24.25).
3. O testemunho do uso do texto: Mt 22.29-32 (Ex 3.36).
Não temos nenhum manuscrito original das Escrituras, mas, o que importa é o códice. Uma cópia perfeita tem o mesmo valor do original. A Bíblia fala de e usa cópias anteriores (Dt 10.2,4; 17.18; Jr 36.8; etc.). Os autores do NT não tinham os originais do AT, mas o próprio Jesus destacou a validade do códice do AT (Jo 10.35).
Atualmente, há mais de 5.000 manuscritos do NT, com 350 códices (Sinaiticus, Vaticanus, Alexandrinus), e 2.000 lecionários com mais de 86 mil citações bíblicas. O códice original não está perdido, está dentro dos manuscritos que temos.
Com respeito à fidelidade das Bíblias atuais, embora tenham algumas palavras discutíveis com respeito ao autógrafo original, são a palavra de Deus, inspirada, fiéis e verdadeiras.
Atenção, dificuldades não são erros!
1. Nem sempre as citações são exatas, às vezes são paráfrases.
2. Nem tudo que está escrito na Bíblia é aprovado pela Bíblia.
3. Um relatório parcial não é necessariamente um relatório falso.
4. Relatórios diferentes não são necessariamente contraditórios.
5. Palavras diferentes podem ter um significado igual e vice-versa.
6. Muitas vezes, a linguagem bíblica é fenomenológica (aparente).
7. Descrições inexatas não são necessariamente falsas.
8. Alguns problemas podem ser erros de copistas.

Um resumo em três versículos: Jo 17.3; 2Tm 3.16; Jo 17.17.
Se o diálogo de Deus é uma conversa entre Deus e o homem, é a partir desse diálogo que temos os elementos fundamentais para conhecer o ser humano. Nesse sentido, por mais decaído que esteja, ao ser humano ainda lhe resta a liberdade de consciência necessária para aceitar ou não esse diálogo proposto pelo Criador.
O pressuposto fundamental dessa reflexão é a imago Dei, que traduz a verdade de que a compreensão de Deus leva à compreensão do homem e sua razão de existir. Não se trata de conhecer o ser humano para conhecer a Deus, porque o ser humano não é Deus, mas o contrário.
A antropologia, enquanto instrumento hermenêutico, parte do diálogo de Deus. Não utilizamos o conceito tomista de analogia em seus dois sentidos, como se fosse possível ao ser humano conhecer a Deus a partir de si próprio, mas acreditamos que as necessidades e anseios do espírito humano apontam para aquilo que ele perdeu.
BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA
1. Paul R. Sponheim, "O conhecimento de Deus", in Carl E. Braaten e Robert W. Jenson, Dogmática Cristã, São Leopoldo, Sinodal, 1987, pp. 207-272.
2. Paul Tillich, Teologia Sistemática, São Paulo, Paulinas, 1984, pp. 67-137.
3. Jorge Pinheiro, História e religião de Israel, origens e crise do pensamento judaico, São Paulo, Editora Vida, 2007.

mardi 28 août 2007

Programa de Estudos da Realidade Brasleira

OBJETIVO
O estudo da Realidade Brasileira é essencial porque não se pode pensar hoje um cidadão brasileiro que não seja solicitado a refletir o momento político e social que o País vive. Isso significa que todos deveriam ter uma concepção da história de nossa formação enquanto povo e dos desafios a que somos chamados a responder. Tal concepção da multiculturalidade brasileira deve reforçar ou modificar maneiras de agir e pensar o tempo brasileiro. A história da formação e do sentido do Brasil permite reflexões para a superação da consciência ingênua e o desenvolvimento de uma consciência crítica, pela qual a experiência vivida é transformada em consciência compreendida da realidade brasileira.
ABORDAGEM
Optamos por uma abordagem temática dos assuntos, sem descuidar da referência necessária à história da formação e sentido do Brasil, que permita estabelecer o fio condutor da exposição dos temas. Isto porque fazer um estudo da história e formação do povo brasileiro implica em fazer antropologia do povo brasileiro e sociologia da cultura. Tais abordagens não podem ser encaradas como atividades solitárias, mas enquanto diálogo entre pensadores que expõem diferentes visões.
AVALIAÇÃO
Os alunos serão avaliados por sua participação em classe (peso 3), pelos seminários apresentados (peso 4) e por uma prova final (peso 3).
MATÉRIA
1. O processo civilizatório
Povos germinais / O barroco e o gótico / Atualização histórica
Darcy Ribeiro, O povo brasileiro, a formação e o sentido do Brasil, São Paulo, Companhia das Letras, 2002, pp.64-80.
2. Gestação étnica
Os brasilíndios / os afro-brasileiros / os neobrasileiros / os brasileiros / ser e consciência.
Darcy Ribeiro, O povo brasileiro, a formação e o sentido do Brasil, São Paulo, Companhia das Letras, 2002, pp.106-140.
Jorge Pinheiro, Somos a imagem de Deus, São Paulo, Ágape, 2000, pp. 94-104.
3. Processo sócio-cultural
Classe e poder / distância social / classe e raça
Darcy Ribeiro, O povo brasileiro, a formação e o sentido do Brasil, São Paulo, Companhia das Letras, 2002, pp.208-227.
Jorge Pinheiro, Somos a imagem de Deus, São Paulo, Ágape, 2000, pp. 107-167.
4. O destino nacional
As dores do parto / confrontos
Darcy Ribeiro, O povo brasileiro, a formação e o sentido do Brasil, São Paulo, Companhia das Letras, 2002, pp.447-456.
Jorge Pinheiro, Os batistas e os desafios da brasilidade, São Paulo, Igreja sem fronteiras, 2002.
___________, Somos a imagem de Deus, São Paulo, Ágape, 2000, pp. 169-172.
BIBLIOGRAFIA OBRIGATÓRIA
Darcy Ribeiro, O povo brasileiro, a formação e o sentido do Brasil, São Paulo, Companhia das Letras, 2002.
Sérgio Buarque de Holanda, Raízes do Brasil, São Paulo, Cia das Letras, 2007.
BIBLIOGRAFIA AUXILIAR
Antonio Gouvêa Mendonça, Protestantes, pentecostais e ecumênicos, o campo religioso e seus personagens, São Bernardo do Campo, UMESP, 1997. Ler capítulo 3, Protestantismo e Cultura.

Programa de Apologética Cristã

Objetivo
O estudo da Apologética Cristã é importante porque possibilita ao aluno correlacionar o cristianismo com outras leituras da realidade, sejam elas filosóficas ou religiosas. Isso permite aos futuros profissionais da teologia construir uma concepção de mundo que permita o diálogo com outras formas de pensar, mas ao mesmo tempo permite balizar teologicamente sua vida ministerial.
Abordagem
Optamos por uma abordagem temática, sem descuidar da referência necessária à história dessa área da Teologia, que permita estabelecer o fio condutor da exposição dos temas. Isto porque fazer Apologética não deve ser visto como atividade solitária, mas que se faz através do diálogo entre pensadores, igreja e fiéis quando expõem suas diferenças.
Avaliação
Os alunos serão avaliados por sua participação em classe (peso 3), pelos seminários apresentados (peso 4) e por uma prova final (peso 3).
PROGRAMA DA DISCIPLINA
O propósito básico da Apologética foi expresso por Pedro: “estando sempre preparados para responder a todo aquele que vos pedir razão da esperança que há em vós...” (I Pedro 3:15). A Apologética, então, é a resposta para perguntas e questões sobre a fé cristã, tanto as questões levantadas pelos próprios cristãos, como os questionamentos apresentados pela sociedade. Sendo assim, a Apologética envolve temas que incluem:
1. A natureza da revelação especial.
2. Evidências para a veracidade do evangelho.
3. O lugar do Espírito na criação da fé.
4. O estudo de outras religiões e cosmovisões.
5. A questão da fé versus razão.
6. A possibilidade do conhecimento de Deus através da natureza.
7. A natureza e a existência de milagres.
8. Provas racionais para a existência de Deus.
9. A natureza do conhecimento histórico.
10. O lado moral e espiritual da natureza humana.
11. A diferença entre o método científico e o método teológico.
12. A ciência e a fé.

Bibliografia
Lloyd Geering, Deus em um mundo novo, São Paulo, Fonte Editorial, 2005. (Leitura dos capítulos 15-21).
William L. Craig, A veracidade da fé cristã, uma apologética contemporânea, São Paulo, Ed. Vida Nova, 2004.

Cosmovisões: roteiro de estudo

Introdução às cosmovisões.
A. O que é cosmovisão? Realidade e estruturas conceituais. Consciência e omissão. A definição de Deus nos dá o elemento central de uma cosmovisão. Toda cosmologia leva a princípios e valores da vida.
B. Existe uma cosmovisão cristã? Qual é a sua base? Deus infinito (Sl.25:14; Is. 43:10; Sl. 90:2), pessoal (Ex.3:14-15; Is. 55:8-9; Sl.135:5-6), criador (Gn.1:1; Sl.148:3-5, 33:6-9; Hb. 11:3), sustentador do universo (Sl.14:20, 147:8-9; Ne. 9:6), amor (Lm.3:22-23; Jo.3:16; Rm 5:8) e santo (Hc.1:13; Sl. 5:4; Jr. 9:23-24). Único (Dt. 6:4-5; Is. 45:5-6) e plural (Mt.11:27; Jo.17:5; 15:26; At.1:8, 2:1-4).
C. A Trindade e a unidade/diversidade do universo. Deus criador: João 1:1-3; Rm.11:36; Cl.1:16-17, Hb. 1:2, 11:3; Tertuliano (Adversus Praxean), Zwinglio (Bromiley, G.W., Zwingli and Bullinger, Londres, SCM Press, 1953, p.249). Unidade/diversidade; determinismo/individualidade (Pieratt, Alan, “Pensando no Céu”, in Imortalidade, Shedd, R e Pieratt, A., São Paulo, Edições Vida Nova, 1992, p.231-245).
Bibliografia: Chapman, Colin, Cristianismo: A Melhor Resposta, Edições Vida Nova, págs. 15-23.
Horrel, J. Scott, Uma Cosmovisão Trinitariana, Vox Scripturae, volume IV, No 1, pág. 55-77.
Pieratt, Alan, Pensando no Céu, in Imortalidade, Shedd, R e Pieratt, A., São Paulo, Edições Vida Nova, 1992, pp.223-245.
Ateísmo
A. Quais as bases fundamentais do ateísmo e do agnosticismo radical? Deus não existe. É impossível saber.
B. Como um filósofo ou cientista ateu ou agnóstico radical responderia a estas três perguntas: (1) por que o universo existe? (2) por que o homem existe? (3) qual é o papel do indivíduo no universo? As opiniões de Friedrich Nietzsche e Jean Paul Sartre.
C. Comunismo, existencialismo e humanismo: respostas que deixam a desejar. Deus não existe? Que certeza é essa? Um novo panteão: utopias e angústias.
Bibliografia: Chapman, Colin, Cristianismo: A Melhor Resposta, Edições Vida Nova, págs. 39-43.
Panteísmo
A. O que é panteísmo? Infinitude e impessoalidade. Universo/aparência. Nada existe além do que se vê e toca (aparência). Só o presente existe.
B. Qual é a posição panteísta em relação ao universo, à vida espiritual e à morte?
C. Qual as características do panteísmo hindu? A fala de Bhahman no Bhagavad Gita. O panteísmo na filosofia européia (Spinoza / Deus é pensamento e extensão; Hegel / Deus é história e consciência). O panteísmo na teologia moderna (Tillich e John Robinson / Deus é profundeza; Teilhard de Chardin / Deus, através da evolução, estará em todos). A teologia da morte de Deus: T. Altizer e William Hamilton.
Bibliografia: Chapman, Colin, Cristianismo: A Melhor Resposta, Edições Vida Nova, págs. 45-58.
Teísmo
A. Quais os conceitos que norteiam o teísmo?
B. Por que não somos judeus, nem muçulmanos? Unitarianismo. Determinismo. Cabalismo (Sefer Ietzirá, in Guinsburg, J., Do Estudo e da Oração, São Paulo, Editora Perspectiva, 1968 págs. 563-566). Sufismo (Al-Junaíde).
C. Em que sentido o cristianismo trinitariano é superior ao teísmo judaico e muçulmano; ao deísmo/agnosticismo filosófico (Thomas Hobbes) e ao misticismo (hippies, Beatles, Nova Era)? Ex 33:18-23, 34:5-7; Is 6:1-5; Ez 1:26-28; Jr 9:23-24; Jo 1:18, 14:8-10; Ap 1:12-17; I Pe 1:8.
Bibliografia: Chapman, Colin, Cristianismo: A Melhor Resposta, Edições Vida Nova, pp. 25-30, 59-67.
Debate Apologético
A1. Mesa redonda entre os seis grupos formados. Moderador: Jorge Pinheiro.
A2. O grupo A deve fazer uma exposição sobre cosmovisão e suas implicações na vida humana. O grupo B sobre a cosmovisão cristã. O grupo C sobre Trindade e cosmovisão cristã, o grupo D sobre ateísmo, o grudo E sobre panteísmo, e o grupo F sobre teísmo e suas variantes. Cada grupo tem 5 minutos para exposição.
A3. Enquanto cada grupo expõe, os demais devem anotar os itens que foram mal desenvolvidos ou esquecidos.
B1. Depois das exposições abre-se o debate. Serão realizadas quatro rodadas. Cada grupo tem o direito de fazer uma pergunta por rodada a outro grupo. O direito de resposta é de um minuto. Nesta fase não há direito a réplica.
B2. Após as quatro primeiras rodadas abre-se uma última, com direito a réplica. O tempo de resposta é de um minuto e a réplica também.
B3. O moderador pode intervir, cortar a palavra e colocar novas questões no debate.
C1. A participação no debate é obrigatória para todos os alunos do curso. O não comparecimento implica em perda da nota. Durante o debate qualquer aluno pode ser questionado. Deve responder quem for perguntado. Caso não saiba a resposta, pode passar para um colega do mesmo grupo, mas o grupo perde ponto.
C2. Uma boa exposição equivale a cinco pontos. Cada pergunta bem respondida pelo grupo equivale a um ponto. Na última rodada, com direito a réplica, cada grupo deve fazer o melhor, pois é a última chance de recolocar-se, caso tenha vacilado anteriormente. Posicionando-se negativamente nessa última rodada o grupo perde um ponto do acumulado anteriormente.
C3. O debate será gravado em vídeo.
Bibliografia obrigatória
Chapman, Colin, Cristianismo: A Melhor Resposta, São Paulo, Ed. Vida Nova, 1985, parte um: Indagações sobre Deus, o homem e o universo... Págs. 9 - 67.
Sproul, R. C., Razão para Crer, SP, Mundo Cristão, 1991, capítulo 7, “Não Há Deus”, pág. 75; capítulo 6, “Não Preciso de Religião”, pág. 63; capítulo 4, “O Cristianismo É Uma Muleta Para os Fracos”, pág. 43.
Bibliografia recomendada
Green, Michael, Mundo em Fuga, SP, Vida Nova
Little, Paulo, Você Pode Explicar sua Fé?, SP, Mundo Cristão, 1972
Pinnock, Clark, Viva Agora, Amigo, Atibaia, Fiel
Stott, John R. W., Cristianismo Básico, SP, Vida Nova

vendredi 24 août 2007

Cristologia: o Jesus histórico e o Cristo da fé

Jesus, o Cristo, identidade construída. A etimologia da palavra. A palavra sobre Cristo ou pensamento ou fala sobre Cristo. Quanto a identidade: Cristo exprime uma identidade. Sem reconhecer essa identidade (pessoa), o Filho de Deus, mediante a fé, não há Cristologia, mas, um estudo sobre a pessoa histórica de Jesus de Nazaré. Através da fé, o Espírito Santo torna a pessoa de Cristo contemporânea, isto é, pessoal//relacional.

Fator histórico. Helenos e cristãos: O cristianismo deixa de ser judeu e palestino. Em um sentido amplo, helenismo refere-se à influência que a cultura grega (helênica, de Hellas, ou Grécia) passou a ter no Império Próximo (Mediterrâneo Oriental: Síria, Egito, Palestina, chegando até a Pérsia e Mesopotâmia) após a morte de Alexandre (323 a. C.) e em conseqüência de suas conquistas. Como um dos períodos em que se divide tradicionalmente a história da filosofia, o helenismo vai da morte de Aristóteles (322aC) ao fechamento das escolas pagãs de filosofia no Império do Oriente pelo imperador Justiniano (525dC). O período do helenismo é marcado na filosofia pelo desenvolvimento das escolas vinculadas a uma determinada tradição, destacando-se a Academia de Platão, a escola aristotélica, a escola epicurista e estóica, o ceticismo e o pitagorismo. Nessa época, houve uma tendência predominante ao ecletismo e muitos filósofos sofreram a influência de diferentes escolas. O principal centro de cultura do helenismo foi Alexandria no Egito. A partir dessa reflexão filosófica deu-se a Teologia. Implicações: escândalo para judeus – a questão da deidade de Jesus como heresia; conflito entre o conceito de messias político e o messias de amor.Perigo para os Romanos – ameaça a ideologia de Culto a César: perigo político.

A busca pela expansão: o cristianismo é de caráter missionário quanto à pregação. Aspectos da Pregação: destemida: “é honra morrer por Cristo”; arriscavam a vida e eram considerados heróis por serem leais a Cristo, desconsideravam a autoridade de César se caso se opusesse aos ensinos de Cristo. De 96 d.C. (Dominiciano) a 180 d. C. (Marco Aurélio) a prudência política dos romanos evitou mortes por razões humanitárias (Tertuliano: “o sangue é semente”). Após 235 d. C. (Morte de Alexandre Severo) houve perseguição acirrada e muitas conversões. Por volta de 300 a. C. , um terço da população do império já era cristã.

A vida divide-se em antes e depois dele. A cada 25 de dezembro, dois bilhões de pessoas celebram o nascimento de um palestino moreno, de cabelos longos, segundo alguns de olhos castanhos e nariz adunco, como sugerem as marcas de sangue e suor impressas num lençol de linho guardado como relíquia pelos católicos. Foi com esse possível biotipo que ele morreu, com cerca de 30 anos. Mesmo aqueles que nunca entraram para seu rebanho reconhecem a data. É a partir dela que dias, semanas, meses, anos, séculos e milênios são contados. Como a infinitude do tempo, esse homem de Nazaré se mantém vivo.
Nenhuma vida foi tão esmiuçada e tão cercada de mistérios. Proclamado filho de Deus, ele rompe o terceiro milênio cercado da fé, das dúvidas e da curiosidade de cristãos e não-cristãos. Como teria nascido? Como viveu? Quem foi ele? Bilhões de pessoas seguem extasiadas esse personagem inacabado, obra aberta a desafiar místicos, teólogos e cientistas. Mas não há explicação capaz de oferecer a versão definitiva, irrefutável, sobre o filho de Maria.
E no correr dos séculos foi transformado no símbolo de um dilema: ou os povos assimilam a convivência respeitosa num mundo marcado por diferenças -- daí os diálogos inter-religiosos que procuram reconciliar católicos, judeus e protestantes -- ou aprofundam os contrastes, raiz da proliferação do fundamentalismo. O mais estranho é que, na encruzilhada da civilização, cristãos e não-cristãos voltam ao começo de tudo.
Não restam dúvidas sobre sua passagem pelo planeta: Jesus viveu nesta Terra. Muitos estudiosos consideraram que em relação a tal fato existem mais fontes confiáveis do que em relação a Sócrates, cuja existência foi basicamente testemunhada por um único discípulo, Platão. Mas não é possível discorrer com a mesma segurança sobre a data de nascimento e a de morte de Jesus.
Um recenseamento promovido na Palestina por Herodes, interessado em regularizar a cobrança de impostos, forneceu evidências de que ele teria nascido cerca de seis anos antes do chamado ano zero. Teria morrido às vésperas da Páscoa judaica, numa sexta-feira. Conferindo calendários antigos, verifica-se que duas sextas-feiras coincidiram com a celebração naquele período: nos anos 30 e 33 da Era Cristã.

O Cristo da fé
Juntamente com a crença na Trindade, a teologia da encarnação ocupa uma posição central nos ensinamentos da igreja. Jesus é mais que um homem santo ou um mestre de moralidade. Ele é o Filho de Deus que se tornou Filho do Homem. A teologia da encarnação é uma expressão da experiência do Cristo na igreja. Nele, a divindade está unida à humanidade, sem a destruição de nenhuma dessas realidades. Jesus Cristo é verdadeiramente Deus, que tem em comum a mesma realidade igualmente com o Pai e o Espírito. Ele é verdadeiramente homem que compartilha com todos nós o que é humano. E como único Deus-homem, Jesus Cristo colocou a humanidade em comunhão com Deus.
Pela manifestação da Trindade, pelo ensinamento do significado da autêntica vida humana, e pela vitória sobre os poderes do pecado e da morte (I Co 15, Cl 1.19-20) através da ressurreição, Cristo é a expressão suprema do amor de Deus o Pai, por seu povo, tornado presente em cada época e em cada lugar pelo Espírito Santo através da vida da igreja. Os pais da igreja resumiram o ministério de Cristo nesta clara afirmação: "Deus tornou-se o que nós somos de tal maneira que nós podemos nos tornar o que Ele é."
É um risco separar Jesus e Cristo, ou ver a ação salvífica num e em outro não, ou teologicamente afirmar que há uma ação salvífica no Cristo em sua divindade, separada da humanidade do Cristo encarnado. É fundamental levar em conta, teologicamente, os dois aspectos complementares da cristologia. Ao dado da união das duas naturezas de Jesus, o Cristo, temos que compreender a questão da distinção, que nos alerta para o fato de que não há confusão entre essas duas naturezas. O monofisismo se apresenta entre nós, quando iniciamos uma caminhada em direção à predileção por uma das naturezas do Cristo, no caso, a tendência de absorção da natureza humana na divina. Mas há um monofisismo invertido, que é um outro risco, atualmente menos comum, que é o da absorção da natureza divina na humana, ocasionando uma redução da divindade da pessoa do Verbo.
A ação humana de Jesus é a ação do Cristo encarnado, mas há uma ação divina que permanece sempre distinta da humana. Assim, há uma ação contínua do Logos antes e depois da encarnação, mas sem que isto signifique a negação do evento cristológico como concentração insuperável da auto-revelação divina. Isto porque a economia do Cristo encarnado constitui a revelação de uma economia mais ampla, a do Cristo eterno de Deus.
A revelação de nosso Jesus, o Cristo, oferece à humanidade tudo o que é necessário para a salvação, não necessitando ser completada por qualquer outra ação ou processo, que não seja o arrependimento e a obediência. O evento Jesus, sem deixar de ser revelação universal da vontade de Deus, permanece particular em razão de sua historicidade. Significa que tal evento não diminui a potência salvífica de Deus, pois a ação universal do Cristo e do Espírito Santo não se circunscreve à humanidade de Jesus. Por isso não se pode reduzir Jesus a uma figura salvífica entre outras. A revelação operada em Jesus Cristo é definitiva e insuperável. Seria um erro absurdo entender a ação do Espírito Santo deslocada da economia salvífica universal do Cristo encarnado. Na historicidade da igreja, é fundamental insistir na conjunção da cristologia com a pneumatologia, a fim de preservar a centralidade do evento Cristo. Irineu, pai da igreja, utiliza uma metáfora para nos explicar essa conjunção – que logicamente como qualquer metáfora tem suas limitações. Ele fala das duas mãos de Deus que operam juntas economia da salvação: a mão do Cristo e a mão do Espírito Santo. Mãos que atuam unidas, mas são distintas e complementares. Assim, a presença do Espírito na obra do Cristo encarnado não põe um fim na atuação do Espírito Santo depois do evento-Cristo. O Espírito Santo estava presente e operante antes da glorificação do Cristo e continua presente hoje.
A revelação universal do Cristo não pode nos levar a considerar as religiões do mundo como caminhos complementares ao do corpo de Cristo. Quando muito a universalidade da revelação presente nessas religiões assumem um papel de preparação evangélica para a compreender no evento Cristo, não podendo ser consideradas caminhos de salvação. Ao longo da história cristã foram comuns injustiças e a perseguições aos grupos, denominações e religiões que discordavam do cristianismo hegemônico naquele momento. Ações essas que violentam a imago Dei, o livre-arbítrio e a compreensão da ação salvífica do Cristo. Grupos, denominações e mesmo religiões não-cristãs não se resumem à mera representação de uma busca humana de Deus, mas traduzem a revelação universal de Deus, através da qual Ele tem se automanifestado à humanidade. São parte do processo de envolvimento pessoal de Deus com a humanidade, que atravessa a história, tendo como centro salvífico o evento Cristo.
Jesus, o Cristo, é aquele que revela o Pai. Quando Deus dá-se a conhecer, de forma direta e especial, o faz através de seu Filho, em carne e osso. E é justamente essa verdade revelada em Cristo, que deve dirigir toda a nossa compreensão do ser humano e da igreja de Cristo. Jesus Cristo é Deus e homem, consubstancialmente perfeito e pleno. Nesse sentido, entendemos que o Cristo encarnado possibilita uma compreensão do que é a humanidade, traduzindo numa linguagem cheia de vida os conteúdos fundamentais daquilo que está dito em Gênesis sobre o homem, antes do pecado. O Cristo revelado é a dimensão mais profunda do humano, a dimensão que traduz aquilo que o cristão é: filho adotado do amor e da graça de Deus, criado para o louvor, honra e glória do Deus eterno.
Assim, o corpo de Cristo sobre a terra é uma nova vida com Cristo e em Cristo, dirigida pelo Espírito Santo. A luz da ressurreição de Cristo reina sobre a igreja (I Co 15.3-8) e a alegria da ressurreição, do triunfo sobre a morte, compenetra-se nela. O Senhor ressuscitado vive conosco e nossa vida é uma vida misteriosa em Cristo. Os cristãos levam este nome precisamente porque são de Cristo, vivem em Cristo e Cristo vive neles. A encarnação não é unicamente uma idéia ou uma teologia; é antes de tudo um fato que se produziu uma vez no tempo, mas que possui a força da eternidade. E esta encarnação perpetua, sem confusão, as duas naturezas: a natureza divina e a natureza humana. A igreja é o corpo de Cristo, enquanto unidade de vida com Ele. Expressa-se a mesma idéia quando se dá à igreja o nome de esposa de Cristo ou esposa do Verbo. A igreja, enquanto corpo de Cristo não é Cristo-Deus-homem, pois ela não é mais que sua humanidade; mas é a vida em Cristo e com Cristo, a vida de Cristo em nós: "Não sou mais eu quem vive, é Cristo que vive em mim" (Gl 2,20).
A igreja, em sua qualidade de corpo de Cristo, que vive da vida de Cristo, é por Ele mesmo o domínio, onde está presente e onde opera o Espírito Santo. Eis aqui, porque se pode definir a igreja como uma vida bendita no Espírito Santo. A igreja é obra da encarnação do Verbo, ela é encarnação: na igreja Deus se assimila à natureza humana e através da igreja o corpo se assimila à natureza divina. É a santificação, que os pais chamavam deificação (Zeosis) da natureza humana, conseqüência da união de duas naturezas em Cristo. Assim, a igreja é o corpo de Cristo: enquanto igreja participamos da vida divina da Trindade. Ela é a vida em Cristo, é o corpo de Cristo, que permanece unida à Trindade.

Jesus num mundo de exclusão
A primeira parte da missão de Jesus (4.14–9.50) é toda situada na Galiléia (cf. 23.5; At 10.37). Ao contrário de Mateus (15.21; 16.13) e Marcos (7.24-31; 8.27), Lucas abre a comissão de Jesus com a cena da pregação na sinagoga de Nazaré (4.16-30), que descortina toda a seqüência do evangelho: o anúncio da salvação fundamentado nas promessas do Antigo Testamento e inspirado pelo Espírito Santo, a salvação dos pagãos, a rejeição de seus compatriotas e a tentativa de assassinato. No texto, Lucas descreve duas questões centrais: em primeiro lugar o programa de Jesus e, em segundo lugar, o destinatário da mensagem. Assim, os versículos 18 e 19 apresentam o programa e os versículos 23-27 seu público, os gentios.
Jesus foi ungido, escolhido por Deus, e sob a ação do Espírito Santo – ação esta que caracteriza o verdadeiro profeta – tem como missão proclamar e libertar. Seu programa é formado por quatro pontos: anunciar a boa nova aos pobres, proclamar a libertação aos cativos, dar vista aos cegos, por em liberdade os oprimidos. O programa destaca duas idéias a de anunciar, proclamar, e a de libertar, salvar.
A idéia de proclamar está presente no Antigo Testamento, já que a missão profética era, sobretudo, proclamatória. De Samuel a Jeremias – incluídos nesse período de ouro homens como Samuel, Natã, Gade, Azarias, Elias, Eliseu, Joel, Miquéias, Micaías, Isaías e Jeremias -- esses anunciadores da vontade de Deus falaram aos reis e ao povo. Advertiam, repreendiam, encorajavam. Falavam de julgamentos e de promessas espetaculares. Traduziam grandeza de caráter e força moral. E assim também foi o último período da profecia hebraica, de Ezequiel a Malaquias. No período helênico, graças às reuniões nas casas de oração, sinagogas, a proclamação se generalizou. As Escrituras eram lidas e interpretadas. João, o batista, foi um anunciador da chegada do reino. E Jesus, ali na sinagoga de Nazaré, colocou em seu programa a tarefa da proclamação.
O conceito de libertação no Antigo Testamento parte da idéia de livramento e de segurança. A pessoa de um libertador no AT traduz sempre a imagem do libertador como alguém que arrebata um povo da destruição (Jz 18.28). E no Novo Testamento, o libertador era aquele que soltava os israelitas da escravidão (At 7.35), ou que arrancaria a nação da impiedade (Rm 11.26). Para todo o judeu, na época de Jesus, o ato mais característico de libertação ocorreu sob a liderança de Moisés, quando Deus salvou seu povo da escravidão aos egípcios e o libertou no deserto do Sinai (Ex 12.31—14. 31). É fundamental entender que a libertação da escravidão egípcia definiu para os judeus do período helênico o paradigma da libertação como um ato de Deus que não visava apenas o alívio de uma situação desastrosa. Mas, e aí está a chave do conceito de aliança, para que livres possam servi-lo. Essa idéia fundamenta o conceito de aliança e da espiritualidade judaica até o primeiro século.
O texto usado por Jesus é a leitura de Isaías 61.1-2. Ao ler o texto e dizer que ele próprio é o cumprimento da profecia, Jesus cria uma nova hermenêutica, que será amplamente utilizada por todos os escritores do Novo Testamento. Ele é o intérprete inspirado, ungido, no cumprimento do que foi anunciado e que está presente nesse kairós para o desenlace dos últimos tempos – proclamar o ano aceitável do Senhor. Partindo dessa hermenêutica, os escritores do NT, e Lucas entre eles, lerão o Antigo Testamento à luz do evento Jesus.
Uma característica marcante que se destaca na personalidade de Jesus é a sua liberdade. Liberdade policrômica e polifônica, que abrange os mais diversos registros de expressão e, talvez, seja a chave para explicar o fascínio exercido por ele sobre os que o rodeavam. Liberdade de iniciativa e de movimentos, como desenvoltura e franqueza para falar, com clareza quando toma alguma posição, instrui ou critica. Demonstra grande liberdade em face das classes dominantes (Lc 13:31-33, João 7:1-10, João 10:18). Liberdade para ensinar (Mc 1:22).
Liberdade para escolher seus discípulos entre pessoas mal vistas. A liberdade de Jesus vai abrindo caminho entre os conflitos sociais, sem renunciar um só momento ao sentido do outro, à preocupação pela pessoa de carne e osso dentro de cada situação concreta. Liberdade que visa suscitar condições humanas adequadas a uma vida pessoal criativa e libertadora dos grilhões que a prendem ao passado e lhe tolhem o futuro. A radicalidade da liberdade de Jesus consiste na plenitude de sua inserção no mundo do pobre. A liberdade de Jesus constitui-se assim no fato pessoal fundamental ligado à pregação do Reino. Antes de ser tema de sua pregação, a liberdade e a libertação encontram expressão concreta na própria pessoa, no seu dinamismo criador, na sua originalidade irredutível. Jesus se mostra profundamente livre e, por isso, tanto a sua palavra como seus atos suscitam liberdade ali onde se fazem presentes. Neste sentido, sua prática fundadora de liberdade. Jesus liberta para o Reino.

Mas, qual é a missão?
Em meio a todas as questões que se levantam, uma pergunta surge: O que quis e veio trazer afinal Jesus, o Cristo, com a sua pregação? De uma forma breve a melhor resposta é: ser em sua própria pessoa a resposta de Deus à condição humana. Mas para entender Jesus como resposta à condição humana, precisamos compreender quais são as questões que demandam esta resposta. De uma forma geral podemos dizer que elas são geradas por um princípio-esperança gerador de constantes utopias de superação de felicidade plena, que faz parte do humano, seja qual for a sua cultura ou civilização. É neste contexto, que de certa forma esta presente em toda história humana, que surge um homem de Nazaré anunciando a resposta de Deus: o romper da nova ordem está próximo e será trazido por Deus (cf. Mc 1:14, Mt 3:17, Lc 4:18s).
Jesus não começou pregando a si mesmo, mas o Reino de Deus, que é indiscutivelmente o centro de sua mensagem. Mas o que era Reino de Deus para os ouvintes de Jesus? A realização da esperança de superação de todas as alienações humanas, da destruição de todo mal, seja físico, seja moral, do pecado, do ódio, da divisão, da dor e da morte. Isto aconteceria não numa outra vida, no céu, ou pós-morte. Esta utopia, anseio de todos os povos, é o objeto da pregação de Jesus. A sua promessa é que não será mais utopia, mas realidade a ser introduzida por Deus (Lc 4:18-19, 21).
Jesus torna-se libertador porque prega e inaugura o Reino de Deus. Reino este, que é a transformação global e estrutural da realidade estabelecida do homem e do cosmos, purificados de todos os seus males. Não é ser um outro mundo, mas transformar o mundo em novo. Ele apresenta o Reino como graça, acima de todos os esquemas anteriores de possíveis virtudes e merecimentos.
Os zelotas procuravam alianças para realizar a sua revolta militar; os sacerdotes obtinham a ajuda dos grandes poderes do mundo para manter a ordem sacra estabelecida; os fariseus insistiam na pureza da lei que pode conservar os fiéis impolutos dentro deste mundo corrupto; e os apocalípticos queriam congregar os restantes escolhidos para o tempo de julgamento que estava próximo. Jesus escolhe como destinatários do seu reino os últimos do mundo. É ocumprimento de uma das grandes utopias do AT, expressas no ano sabático ou do jubileu, que jamais foram realizadas como ideais sociais de forma definitiva. Os milagres de Jesus vêm mostrar que o Reino já esta presente e fermentando no velho mundo. Jesus anuncia o ano de graça do Senhor que não conhecerá ocaso.
A libertação promovida por este Reino abarca tudo: humano, sociedade, mundo, a totalidade da realidade deve ser transformada por Deus, a partir do próprio ser humano. A pregação do Reino se realiza em dois tempos: no presente e no futuro. Por isto Jesus entusiasma as massas. Ele tem consciência de que com ele já se iniciou o fim deste velho mundo. Jesus vai entender o messianismo e as categorias apocalípticas como os meios mais adequados para comunicar sua mensagem libertadora. Com essa linguagem ele participa dos desejos fundamentais do coração humano, de libertação e de uma nova ordem. A sua moral tem sentido messiânico e se exprime na forma de ruptura. Suplantando os princípios do seu povo, ele acolhe à mesa e na amizade os perdidos, expulsos da aliança.
Apesar destes elementos, a pregação de Jesus destaca-se das expectativas messiânicas do povo. Ele não alimenta o nacionalismo judeu; não diz nenhuma palavra de rebelião contra os romanos, nem faz qualquer alusão à restauração do rei davídico. Neste ponto, decepciona a todos. O que mais se ressalta no Jesus, o Cristo, é a autoridade com que anuncia o reino e o torna presente por sinais e gestos inauditos. Em Jesus, irrompe o tempo da libertação. Uma vez entendendo qual era a sua missão, é preciso saber qual a sua estratégia. Já que Reino de Deus significa uma revolução total, global e estrutural da velha ordem, Jesus faz duas exigências fundamentais: exige conversão da pessoa e postula uma reestruturação do mundo da pessoa.
O Reino atinge primeiro as pessoas. Delas se exige conversão, no sentido de mudar o modo de pensar e agir no sentido de Deus, portanto revolucionar-se interiormente. É um novo modo de existir diante de Deus e diante da novidade anunciada por Jesus. Implica sempre numa ruptura (Lc 12:51-52). É um não à ordem vigente (Lc 13:3,5). Ruptura até mesmo de uma religião que gerava uma consciência oprimida. Afinal, na religião judaica, ao tempo no NT, tudo estava prescrito e determinado, tanto nas relações com Deus como entre os homens. A Lei era amanifestação da vontade de Deus. Com isso a consciência sente-se oprimida por um fardo insuportável de prescrições legais (Mt 23:4).
Jesus levanta um protesto contra a escravização do homem em nome da lei (Mc
2:27). A pregação ética de Jesus pode ser resumida em uma frase: não é a lei que salva, mas o amor. Em outras palavras ele desteologiza a concepção da lei. A vontade de Deus não se encontra só nas prescrições legais e nos livros santos, mas se manifesta principalmente nos sinais dos tempos (Lc12:54-57). Deve ficar claro que, se Jesus liberta o homem das leis, não o entrega a libertinagem ou a irresponsabilidade. Antes pelo contrário, cria laços e ligações ainda mais fortes que os da lei. Liberdade sim, frente a lei. Contudo só para o bem e não para a libertinagem. Desta forma, ele deseja libertar o homem das convenções e dos preconceitos sociais. No Reino de Deus deve haver liberdade e igualdade fraterna. Nesta concepção, justiça supera o conceito clássico de dar a cada um o que é seu. Jesus vem anunciar uma igualdade fundamental. Ele confronta toda a subordinação desumanizadora a um sistema, seja social ou religioso.
Um outro aspecto deste processo de libertação, passa pelo mundo das pessoas, como por exemplo a libertação do legalismo, das convenções sem fundamento, do autoritarismo e das forças e potentados que subjugam o homem. Estas forças eram representadas particularmente pelos escribas e fariseus, que viviam espalhados por todo Israel, comandavam as sinagogas, possuíam enorme influencia sobre o povo e para cada caso tinham uma solução que arrancavam pelos cabelos das tradições religiosas do passado e dos comentários da lei mosaica. Quanto a eles Jesus declara que dizem e nada fazem. Atam pesadas cargas de preceitos e leis e põem-nas nos ombros dos outros.
Jesus prega que para entrar no Reino não basta fazer o que a lei ordena. A presente ordem das coisas não pode salvar o homem da sua alienação fundamental. Ela é uma desordem. Urge uma mudança de vida e uma reviravolta nos fundamentos da velha situação. Por isso os marginalizados da ordem vigente estão mais próximos do Reino de Deus que os outros. Jesus vai além das fronteiras da lei, para o local onde habitam aqueles a quem o povo e os letrados consideram pecadores. Ele veio de forma provocativa.
Podia ter vindo de maneira mais interna, silenciosa, oculta. Podia ter se mostrado como um homem espiritual, prudente. Preferiu, no entanto, comportar-se escandalosamente: sentou à mesa com os pecadores, oficiais de seu povo (publicanos e prostitutas), convidando-os assim para o banquete novo de seu Reino. Ele rompe as convenções sociais da época, não se atém às convenções religiosas e não respeita as divisões de classes. Ele realiza sua ação no reverso da história.

A cruz de Cristo na soteriologia
Diante dessas questões que pontuam a fé que professamos, a cristologia. se coloca como centro da doutrina cristã, intimamente ligada à soterologia. E são essas duas que analisaremos neste texto.
1. O que é o evangelho?
São boas notícias, cf. I Ts 3.6. A mensagem do evangelho é a boa notícia de que o reino de Deus é chegado: Mc 1.14-15, Mt 4.23, Lc 4. 18; 7.22. Mas é também crescimento espiritual: Fp 2.12; I Pe 1. 5, 9.
É interessante lembrar que Orígenes, prenunciando uma teologia dialética da unicidade e universalidade da revelação, falou de um evangelium aeternum (De principiis IV, 1), através do qual Deus revela verdades aos seres humanos de todas as épocas, com a finalidade de integrar a revelação contida no evangelho histórico.
Qual é a relação do evangelho com a graça?
A graça, o amor incondicional de Deus oferecido gratuitamente, através da fé daquele que ouve a mensagem do evangelho, salva para a vida eterna. I co 15.1-5; Ef 1. 13; Rm 1.16; 15. 18-21; Gl 1.8-9; Mt 28.19.
Tomás de Aquino afirmou que a preparação do ser humano para a graça tem o livre-arbítrio como movimento e Deus como móvel. “Ela pode ser considerada sob dois aspectos: no primeiro, depende do livre-arbítrio e não implica a necessidade de obter a graça, porque o dom da graça excede qualquer preparação da virtude humana; no segundo aspecto, tem Deus como móbil e implica a necessidade de obter a graça, que é determinada por Deus, embora não se trate de uma necessidade proveniente da coação, mas da infabilidade, porquanto a intenção de Deus não pode deixar de ter efeito”. (Summa Theologiae, ed. Caramello, Torino, 1950, III, q. 112-113).
Luís de Molina, partindo de Tomás de Aquino, considerou dois tipos de graça: a suficiente, dada a todos os seres humanos como condição necessária à salvação; e a eficaz, que infalível segue a boa vontade humana. (Liberi arbitri cum gratiae donis, divina praescientia, providentia, praedestinatione et reprobatione concordia).
2. O que é a salvação?
De sotérion e soteria é o ato de saldar do poder e dos efeitos do pecado. O sentido geral, tanto no Antigo Testamento como no Novo, é o de livrar das opressões, materiais e espirituais: Ex 14.13, 15.2; Is. 46.13, 52.10-11; Os 1.7; Jó 30.15; Mt 14.30, Jo 12.27, Mt 9. 22, Lc 8.36, At 4.9; Rm 11.26-27.
3. Os tempos da soteriologia
Quando falamos em salvação, falamos nos tempos dessa salvação na vida humana em particular e na vida da humanidade. Assim, a salvação tem (1) um tempo pretérito, II Tm 1.8-9, que fala de perdão jurídico, Rm 5.9, Ef 1.7; (2) um tempo presente, Tg 1.21, I Pe 1.9, que fala de liberdade, Lc 9.23+, Rm 5.10, Gl 5. 16, 25; e (3) um tempo futuro, Rm 13.11, que fala da glorificação, Fp 3.20-21, Gl 1.4, I Pe 1.5, 3.20-21.

A cruz e suas realizações

1. Redenção.
Alforria, ato de comprar a liberdade. Daí, temos expressões como comprador, remidor, resgate. Rt 3-4, Os 3.1-5, Is 43.3,10-14, 44.6.
No Novo Testamento temos seis expressões gregas que traduzem a idéia de alforria e redenção: lutron, que podemos traduzir por “pagamento para livrar”: Mt 20.28, Mc 10.45; lutróo, comprar/libertar, Lc 24.21, Tt 2.14, I Pe 1.18-19; apolútrosis, alforria através de pagamento de um resgate, Rm 3.24, Ef 1.7, Hb 9.15. No nível escatológico, Rm 8.23, Ef. 4.30; agorazo, comprar, I Co 6.19-20, Ap 5.9; ekagorazo, comprar para libertar, Gl 3.13,Ef 5.16, Cl 4.5; peripoiéo, redimir, adquirir, At. 20.28.
Assim, quando estávamos sob a escravidão do pecado e a Satanás – Jo 8.34, II Co 4.3-4, Cristo pagou nossa alforria. II Pe 2.1. Ele nos tirou do pelourinho, Gl 3.13 (cf. Os 3.1-5), e nos deu plena liberdade, Mt 20.28.
Dentro da teologia reformada, a idéia de redenção nos leva a outros conceitos que enriquecem a soteriologia. Vejamos algumas delas:
2. Propiciação
O conceito propiciação (hilastérion) do verbo grego hilascomai traduz a idéia de satisfazer através do sangue. E não significa apenas expiar, no sentido de anular, mas dar uma satisfação plena. Nesse sentido, o conceito propiciação está intimamente ligado ao de justiça de Deus.
Propiciação está ligada à idéia de justiça porque Deus é o absoluto moral do universo. Por isso, Ele manifesta sua orgé e seu tumós, que traduzimos por ira, contra o pecado.
Segundo Lutero, “a ira é o justo juízo de Deus contra a injustiça”. Isto porque, com o pecado, Deus é o grande injustiçado, pois o pecado diz que Deus não é Deus, que Deus não é amor, que Deus não é justo. Diante dessa acusação injusta do pecador contra Deus, Deus deve ser desculpabilizado. Esse é o sentido da ira e da necessidade da propiciação.
No Antigo Testamento, essa ira de Deus contra o pecado é mencionada 585 vezes e está presente no Novo Testamento, cf. Jo 3.36, Rm 1.18+, 9.22, Ef 5.6, II Ts 1.7-9, Hb 10.27, 12.29.
3. Justificação
O conceito justificação que aparece no Novo Testamento como dikaióo, justificar, tratar como justo, dikaios, justo, honrado, reto, e dikaiosine, justiça, honestidade, integridade traduz a idéia ato de declarar alguém justo. Rm 3.19-26, II Co 5.21, At 13.39, Rm 5.9, 8.30-31, Ef 1.4, Tt 3.7, Jd 24. Ou seja, não fala de uma atitude de neutralidade de Deus para conosco, mas de uma condição que nos é imputada, enquanto dom jurídico de Deus que é apropriado pela fé. At 13.39, Rm 5.1, Gl 2.16-17, 3.11-14, Rm 3.21-16.
Teologicamente, o conceito de justificação dá lugar a duas alternativas: a demonstração de uma necessidade, ou seja, de que o ser humano não pode ser diferente daquilo que lê é, pecador; e o esclarecimento da possibilidade: o ser humano, em Cristo, pode ter nova determinação, diferente daquela do estado de necessidade.
Assim, somos justificados pela morte de Cristo na cruz, Rm 5.9, e por sua justiça, estamos em Cristo, somos membros do seu Corpo e Deus habita em nós, I Co 6.15-19.
4. Reconciliação
Katallasso e apokatallasso traduzem a idéia de fazer as pazes ou trocar a inimizade pela amizade, cf. Rm 5.10-11, II Co 5.18-21, Ef 1.10, 2.16, Cl 1.20-22., que nós comumente traduzimos por reconciliação.
Este conceito traduz dois aspectos. Ao morrer, propiciando a ira de Deus, Cristo nos coloca numa situação em que podemos fazer as pazes com Deus, ou como afirma Paulo, “Deus reconciliou consigo o mundo através de Cristo”, II Co 5.19. O segundo aspecto dessa reconciliação é que somente pela fé a paz pode ser completada. A graça e os benefícios da cruz de Cristo só se concretizam através da fé. Assim, o segundo aspecto da reconciliação é o relacionamento pessoal entre Deus e o ser humano que crê nele. Essa verdade aparece na parábola do filho pródigo e é o clamor que encontramos em Paulo, II Co 5. 19-20.
5. Substituição
Este conceito não é aceito por muitos teólogos, entre eles John Stott (vide A Cruz de Cristo, São Paulo, ed. Vida), porque aparece no Novo Testamento sempre através de preposição, como negativa, anti (em grego), ”no lugar de”, cf. Mt 20.28, Mc 10.45, I Tm 2.6, e como substitutiva hyper (em grego), “pelo benefício de” ou “no lugar de”, cf. II Co 5.15, 21, I Pe 2.21-24, Rm 5.6-8.
A idéia da substituição é mais abrangente do que dizer que Cristo morreu no lugar dos pecadores. Para os defensores da substituição, (1) o castigo é removido porque Cristo morreu no nosso lugar, (2) a justiça de Cristo nos é imputada, (3) porque Jesus Cristo é Deus e ser humano, sua morte na cruz tem um valor infinito para todos que crêem. Assim, conforme acreditavam os pais da Igreja, é a substituição que possibilita, no escaton, a nossa deificação.
Quando utilizamos o conceito escaton estamos nos referindo à teoria cristã do destino, onde os propósitos últimos de Deus para humanidade (morte, ressurreição, juízo final) e para mundo (a criação de novos céus e nova terra) são apresentados enquanto teologia dos últimos acontecimentos ou escatologia.
É interessante ver ainda que a substituição implica em disposição testamentária, quer dizer representação por Cristo. Mas, traduz também a idéia de troca de um corpo por outro corpo. Tem também uma leitura fideicomissária, onde Cristo, herdeiro e legatário, recebe a herança e o legado, para transmitir, por sua morte, àqueles que substituiu
6. Perdão dos pecados antes da Cruz
Os pecados dos seres humanos que sentiram a dor e tiveram consciência de sua miserabilidade, ou seja, arrependidos, foram perdoados através da cruz, porque o sistema de sacrifícios no mundo antigo (que é anterior a Israel) era um símbolo do sacrifício vicário do Filho de Deus. Rm 3.25, Hb 9.15, 10.1-14.
7. O fim da lei mosaica
Em Romanos 10.14 lemos que “o fim da lei é Cristo, para justiça de todo aquele que crê”. Quando relacionamos este versículo com outros (Rm 3.19-20, 27-28, 4.14-16, 8.2-4, II Co 3.6-11,Gl 5.1-25, Ef. 2.8-10, Fp 3.9, Cl 2.14), vemos que o propósito da lei era (1) revelar o caráter de Deus, (2) orientar o povo nas áreas sócio-culturais e morais, (3) levar a pessoa à santidade e (4) condenar o pecador, levando-o ao arrependimento e à dependência através da fé na graça de Deus.
Mas o que a lei não pode fazer é justificar o pecador (At 13.39, Rm 3.19-20). Assim, fora da cruz não há salvação. A lei mostra a necessidade de justificação, mas não tem a solução (Rm 8.2-4, Gl 3.22).
Por isso, em Cristo, há uma nova lei (Gl 6.2): “a lei do Espírito da vida em Cristo” (Rm 8.2, 13.8-10, II Co 3.17, I Jo 3.22-24) ou “a lei do amor” (Gl 5.6, 13-18). Essa lei é interna, vem do Espírito.
É importante notar que o espírito da lei antiga, ou seja, sua moralidade, é paralela à nova. Assim, nove dos dez mandamentos aparecem no Novo Testamento, mas como expressão da vida controlada pelo Espírito.
A lei do sábado, que não se repete no Novo Testamento, não existe mais, cf. Cl 2.16, 20-23, Rm 14.5-6, Gl 4.10, I Tm 4.3-4. Fica, portanto, o conceito moral do descanso. Mas, há uma polêmica que permanece: podemos dizer, a partir do Novo Testamento, que o dia do Senhor, assim chamado por causa da ressurreição, é o sábado cristão?
Diante de questões como essa, prefiro dizer que a nova lei do Espírito, embora seja a lei da liberdade cristã, exige de fato mais do crente, pois o Espírito age em cada pessoa dando convicção e direção. E aqui temos que entender a beleza da liberdade cristã: em alguns ele proíbe costumes como o café, vinho, rock, televisão (para citar poucos exemplos), em outros não. Devemos entender a proibição como uma forma de testemunho. Nesses casos, desobedecer é pecar.
8. Adoção como filhos
Esse é um conceito eminentemente paulino, e tem por base uma leitura hermenêutica da família romana. Para Paulo não somos apenas filhinhos (recém-nascidos, crianças) de Deus, mas através da cruz podemos chegar a herdeiros maduros, plenos, filhos provados e dignos, cf. Rm 8.14-17, Gl 3.23-26, 4.1-7.
Não podemos nos esquecer que tal perfilhamento implica em reconhecimento legal, do filho ilegítimo, por Deus, o que implica em termo de nascimento, por declaração vicária e testamentária.
9. A obra do Espírito
A pergunta que move o entendimento desta questão é: como pode o Espírito que é santo operar nas vidas dos pecadores? A resposta é: a cruz possibilitou a ação graciosa, e não meramente jurídica, do Espírito Santo na vida humana.
É a cruz que cria a base para a obra do Espírito na supressão do pecado no mundo (Rm 8.2-6): para o convencimento do pecado e da verdade em Cristo (Jo 16.8-11), para a regeneração – o novo nascimento e a vida eterna (Tt 3.5, Jo 3.1-7), para o batismo do Espírito (I Co 12.13, Rm 6.1-11), para o selo do Espírito (Ef 1.13+, 4.30) e para a habitação do Espírito (I Co 6.19).
10. A base da santificação
O Espírito Santo atua em cada um de nós, a partir da cruz e da nossa fé, separando-nos do pecado e aperfeiçoando-nos a cada dia à imagem de Cristo. Assim, podemos dizer que a santificação cobre três aspectos: (1) é posicional, enquanto estado do ser crente, cf. I Co 1.2, 6.11, Hb 10.10,14; (2) é experiencial, enquanto luta diária e permanente do fiel, cf. I Pe 1.15-16, I Ts 4.3; e (3) é futura, enquanto completude no escaton, cf. I Jo 3.1-2, Ef. 5.26-27, Jd 24-25, I Co 15.12.

Programa de Teologia Sistemática II

Objetivo
Os profissionais da teologia deveriam ter uma compreensão das características gerais do conhecimento trinitário e do Cristo. A pesquisa da Teologia nos campos das doutrinas da Trindade e do Cristo possibilita o desenvolvimento de uma consciência apta a compreender a riqueza dos fenômenos vividos pela fé cristã e, por extensão, construir um conhecimento a respeito da real experiência dos fiéis e da igreja.
Abordagem
Optamos por uma abordagem temática dos assuntos, sem descuidar da referência necessária à história dessas áreas da teologia, que permita estabelecer o fio condutor da exposição dos temas. Isto porque fazer teologia não deve ser visto como atividade solitária, mas que se faz através do diálogo entre pensadores, igreja e fiéis quando expõem suas diferenças.
Avaliação
Os alunos serão avaliados por sua participação em classe (peso 3), pelos seminários apresentados (peso 4) e por uma prova final (peso 3).

PROGRAMA DA DISCIPLINA
A Teologia da Trindade.
A formulação do dogma trinitário; a economia intratrinitária; paradoxo e dificuldades terminológicas. Posições em relação à Trindade.

A Cristologia.
Jesus, o Cristo, uma identidade construída. O Cristo da fé e o Jesus histórico. Jesus num mundo de exclusão, ontem e hoje. A cruz de Cristo na soteriologia. A cruz e suas realizações.

BIBLIOGRAFIA Obrigatória
Júlio Andrade Ferreira, Antologia Teológica, São Paulo, Fonte Editorial, 2003.
Bibliografia auxiliar
Carl E. Braaten e Robert W. Jenson, Dogmática Cristã, vol I, São Leopoldo, Sinodal, 1990.
McGrath, Alister E., Teologia sistemática, histórica e filosófica, São Paulo, Shedd. 2005.

A doutrina de Deus

“É preciso indagar de nós mesmos: qual é o alvo final e a razão de eu estar ocupando minha mente com essas coisas? O que eu pretendo fazer com o conhecimento de Deus que vou adquirir? Pois o fato que teremos de enfrentar é este: Se procurarmos obter conhecimentos teológicos como um fim em si mesmo, isso provavelmente nos irá prejudicar, tornando-nos orgulhosos e convencidos. A própria magnitude do assunto nos embriagará e chegaremos a pensar que somos bem melhores e superiores aos demais cristãos pelo nosso interesse no assunto e compreensão do mesmo, e olharemos com superioridade para aqueles cujas idéias teológicas nos parecem rudes e inadequadas, pondo-as de lado com desprezo. Isso se conforma às palavras de Paulo aos presunçosos cristãos de Corinto: ‘o saber ensoberbece... Se alguém julga saber alguma coisa, com efeito não aprendeu ainda como convém saber’ (1Co 8.1 e 2)”. J . I . Packer, O Conhecimento de Deus, São Paulo, Mundo Cristão, 1992, pp. 13 e 14.

A – A EXISTÊNCIA DE DEUS
Argumentos naturais a favor da existência de Deus. Pelo menos desde o tempo de Platão, filósofos têm oferecido argumentos racionais a favor da realidade de Deus. Tradicionalmente, estes argumentos dividem-se em cinco categorias:
1. Cosmológicos – de cosmos, mundo em grego – todo acontecimento ou fato possui uma causa e tudo que existe é resultado de uma causa principal e suficiente para criar o universo: Deus. John Locke ( 1632-1704) afirmou: “Eu existo, mas eu nem sempre tinha existência. Qualquer coisa que começa a existir deve ter uma causa. A causa deve ser suficiente, esta causa suficiente existe sem limitações: ela deve ser Deus”. Leia Hebreus 3.4; Platão, Leis, X; Aristóteles, Metafísica, VIII; Tomás de Aquino, Suma Teológica, Q2, Art. 3.
2. Teleológicos – de propósito, fim em grego – A organização do universo aponta para um planejador (Rm 1.18-20), pois há coisas na natureza que mostram propósito. W. Paley (1743-1805) disse: “Se alguém achasse um relógio no campo concluiria que o mesmo teria sido feito por um relojoeiro”. Até Kant e Voltaire se interessaram por este argumento. Leia Salmos 19.1-6; 139.14.
3. Antropológico – de homem em grego – Porque o ser humano é um ser moral; e intelectual, ele deve Ter um Criador que também é moral e inteligente (Atos 19.29). Este argumento tem variáveis: personalidade, sentimentos morais, consciência, tropismo religioso, raciocínio, dignidade, etc. Comparar com Gênesis 1.26 e Romanos 1.18-20. Alguns teólogos vêem o argumento moral como um argumento à parte.
4. Ontológico – de ser, existência em grego – Deus é perfeito. O argumento ontológico é dedutivo (a priori) em vez de indutivo (a posteriori). O ser humano busca a perfeição. Anselmo afirmou que cada ser humano possui o conceito do Ser Perfeito. Esta idéia inclui a necessidade da existência de Deus, pois caso contrário não seria perfeita a busca que o ser humano faz. Ainda hoje esse argumento atrai filósofos cristãos, como A. Platininga, por exemplo.
5. Unidade-Diversidade – Há outros argumentos menos tradicionais. Um deles é o argumento baseada na unidade e diversidade do Universo (Dooyeweerd e Van Til). Segundo tal argumento, a Trindade é a única perspectiva adequada para explicar o lugar do ser humano no Universo, sem cair no mecanismo ou determinismo, no caos ou incoerência completa.
Argumentos bíblicos para a existência de Deus – Os autores bíblicos consideram a existência divina uma realidade. Leia Gn 1.1 e Hb 11.3, 6.
B. OS NOMES DE DEUS
O que significa um nome? Jz 13.18; Ex 20.7; Sl 8.1,9.
Os principais nomes: Elohim, o poderoso, literalmente “os poderosos”, aparece cerca de 2.500 vezes. Em Gênesis 1.1-2.3 é usado 35 vezes. Elohim descreve Deus como criador, sustentador do mundo e do universo.  é a palavra mais comum para Deus no NT e traduz na Septuaginta e no NT Elohim.
Iaveh, YHWH, conhecido como o tetragrama, possivelmente da raiz de “ser, tornar-se”. Seu significado literal é obscuro, mas normalmente é traduzido por Senhor. Aparece 5.321 vezes no AT, e Iah, sozinho, aparece 50 vezes. Na LXX e no NT é geralmente traduzido por , Senhor.
Adonai, de Adon, meu Senhor, meu Mestre. Ex. 21.1-6; Js 5.15; Is 6.8-11; Sl 110.1. Freqüentemente é usado com Iaveh, o Senhor Deus, conforme em Is 61.1.
Outros nomes de Deus – El, o poderoso Deus, Deus, deus. É uma palavra básica em várias línguas semíticas. No AT aparece junto a outros títulos de Deus. Baali, meu Senhor, meu Marido (Os 2.16). O Juiz de toda a terra (Gn 18.25). O meu Pastor (Gn 48.15; 49.24). A Pedra, Rocha de Israel (Gn 49.24). O Santo, o Santíssimo (Is 1.4; 6.3; 43.3; 57.15. No NT, 1Tm 2.8, Ap. 16.5; At 2.27; 1Jo 2.20. O Rei (Ex 15.18; Dt 33.5; Sl 5.2; 44.4. No NT, 1Tm 2.8; Ap 15.3; 19.16. O Ancião de Dias (Dn 7.9). Abba, Pai (Rm 8.9; Gl 4.6). Mestre, Senhor,  (Lc 2.29; At 4.14, soberano Senhor, cf. Tt 2.9. Todo-poderoso, pantokravtor (Ap 1.8; 4.8; 11.17; 16.7).
Os nomes compostos.
El Elyon, o Altíssimo (Gn 14.18, Dt 32.8; Is 22.14). El Ro’i (literalmente, O poderoso que se vê (Gn 16.13). El Shadai, O Deus todo-poderoso (Gn 17.1-20). El Olam, o Eterno Deus (Gn 21.33; Is 40.28) El Betel, o Deus de Betel (Gn 31.13; 35.7) El Elohe Israel, Deus, o Deus de Israel (Gn 33.20). Iaveh Jireh, o Senhor proverá (Gn 22.14). Iaveh Nissi, o Senhor é minha bandeira (Ex 17.15). Iaveh Shalom, o Senhor é paz (Jz 6.24). Iaveh Tzabaot, o Senhor dos Exércitos (1Sm 1.3). Iaveh Macadeshem, o Senhor vos santifica (Ex 31.13); Iaveh Raah, o Senhor é meu Pastor (Sl 23.1); Iaveh Elohim Israel (Jz 5.3; Is 17.6).

I. DEFINIÇÕES DE DEUS
Definição Filosófica, a partir de Platão
Deus é o começo, o meio e o fim de todas as coisas. Ele é a mente ou razão suprema; a causa eficiente de todas as coisas; eterno, imutável, onisciente, onipotente; tudo permeia e tudo controla; é justo, santo, sábio e bom; o absolutamente perfeito, o começo de toda a verdade, a fonte de toda a lei e justiça, a origem de toda a ordem e beleza e, especialmente, a causa de todo o bem.
Definição do Catecismo Breve de Westminster
Deus é um Espírito, infinito, eterno e imutável em Seu Ser, sabedoria, poder, santidade, justiça, bondade e verdade.
Definição Combinada
Deus é um espírito infinito e perfeito em quem todas as coisas tem sua origem, sustentação e fim (Jo. 4.24; Ne. 9.6; Ap. l.8; Is. 48.12; Ap.1.17).
Definições Bíblicas
As expressões "Deus é Espírito" (Jo.4.24) e "Deus é Luz " (1Jo.1.5), são expressões da natureza essencial de Deus, enquanto que a expressão "Deus é amor" (1Jo.4.7) é expressão de Sua personalidade. (1Tm.6.16)

II. ESSÊNCIA OU NATUREZA DE DEUS
Quando falamos em essência de Deus, queremos significar tudo o que é substancial ao Seu Ser como Deus, isto é, substância e atributos.
Substância de Deus
Há duas substâncias: espírito e matéria . Deus é uma substância simples, não composta. A substância de Deus é puro Espírito, sem mistura com a matéria (Jo.4:24).
Atributos de Deus
“Um atributo de Deus é uma característica intrínseca à sua Pessoa e através da qual Ele é distinguido e identificado” (Ryrie). Sua substância é Espírito e Seus atributos são as qualidades ou propriedades dessa substância. Atributos é a manifestação do Ser de Deus.

III. CLASSIFICAÇÃO DOS ATRIBUTOS
Naturais e Morais
Também chamados de "intransitivos e transitivos", "incomunicáveis e comunicáveis", "absolutos e relativos", "negativos e positivos" ou "imanentes e emanentes".
Atributos Naturais
Vida
Deus é o fundamento da vida. Ele ouve, vê, sente e age. (Jo.10.10; Sl.94.9,l0; 2Cr.16.9; At.14.15; 1Ts.1.9). Quando a Bíblia fala do olho, do ouvido, da mão de Deus, etc., fala metaforicamente. A isto se dá o nome de antropomorfismo. Deus é vida (Jo.5.26; 14.26) e o princípio de vida (At.17.25,28).
Espiritualidade
Deus, sendo Espírito, é incorpóreo, invisível, sem substância material, sem partes ou paixões físicas e, portanto, é livre de todas as limitações espaço-temporais (Jo.4.24; Dt.4.15-19,23; Hb.12:9; Is.40.25; Lc.24.39; Cl.1.15; 1Tm.1:17; 2Co.3.17)
Personalidade
Existência dotada de autoconsciência e autodeterminação (Ex.3:14; Is.46:11).
a) Volição ou vontade = querer (Is.46:10; Ap.4:11).
b) Razão ou intelecto = pensar (Is.14:24; Sl.92:5; Is.55:8).
c) Emoção ou sensibilidade = sentir (Gn.6:6, 1Rs.11:9, Dt. 6:15; Pv. 6.16; Tg.4:5)
Trindade
a) Unidade de Ser: Há no Ser divino apenas uma essência indivisível. Deus é um em sua natureza constitucional. Não há separação entre suas características. Ele é tudo que Ele é e em tudo que Ele faz (Dt 6.4; Is. 43.40; Tg 2.19; 1Tm 2.5). A unidade da divindade é ensinada nas palavras de Jesus: Eu e o Pai somos um. (Jo.10.30). Jesus está falando da unidade da essência e não de unidade de propósito. (Jo.17.11,21-23, 1Jo.5.7).
b) Trindade de Personalidade: Há três Pessoas no Ser divino: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. (Mc 10.9;12.29; 1Co.8.5,6; 1Tm.2.5; Tg.2.19; Jo.17.3; Gl.3.20; Ef.4.6).
c) Há distinção de Pessoas na Divindade: Algumas passagens mostram uma das Pessoas divinas se referindo à outra (Gn.19:24; Os.1:7; Zc.3:1,2; 2Tm.1:18; Sl.110.1; Hb.1:9).
Auto-Existência: Jerônimo disse: “Deus é a origem de Si mesmo e a causa de Sua própria substância”. Jerônimo estava errado, pois Deus não tem causa de existência, pois não criou a Si mesmo e não foi causado por outra coisa ou por Si mesmo. Ele nunca teve início. Ele é o Eterno EU SOU (Ex.3.14), portanto Deus é absolutamente independente de tudo fora de Si mesmo para a continuidade e perpetuidade de Seu Ser. Deus é a razão de sua própria existência (Jo.5:26; At.17:24-28; 1Tm.6:15,16).
Infinidade ou Perfeição
É o atributo pelo qual Deus é isento de toda e qualquer limitação em seu Ser e em seus atributos (Jó.11:7-10; Mt 5:48). A infinidade de Deus se contrasta com o mundo finito em sua relação tempo-espaço.
Eternidade
A infinidade de Deus em relação ao tempo é denominada eternidade. Deus é Eterno (Sl.90:2; 102.12,24-27; Sl.93.2; Ap.1.8; Dt.33.27; Hb.1.12). A eternidade de Deus não significa apenas duração prolongada, para frente e para traz, mas sim que Deus transcende a todas as limitações temporais (2Pe 3:8) existentes em sucessões de tempo. Deus preenche o tempo. Nossa vida se divide em passado, presente e futuro. mas não há essa divisão na vida de Deus. Ele é o Eterno EU SOU. Deus é elevado acima de todos os limites temporais e de toda a sucessão de momentos, e tem a totalidade de sua existência num único presente indivisível (Is.57:15).
Imensidão
A infinidade de Deus em relação ao espaço é denominada imensidão ou imensidade. Deus é imenso (Grande ou Majestoso; Jó 36.5,26; Jó 37.22,23; Jr 22.18; Sl.145.3). Imensidão é a perfeição de Deus pela qual Ele transcende (ultrapassa) todas as limitações espaciais e, contudo está presente em todos os pontos do espaço com todo o seu Ser PESSOAL (não é panteísmo). A imensidão de Deus é intensiva e não extensiva, isto é, não significa extensão ilimitada no espaço, como no panteísmo. A imensidão de Deus é transcendente no espaço (intramundano ou imanente = dentro do mundo, Sl.139:7-12; Jr.23:23,24) e fora do espaço (supramundano = acima do mundo; extramundano = além do mundo; emanente = fora do mundo - 1Rs.8:27; Is.57:15).
Onipresença
É quase sinônimo de imensidão. A imensidade denota a transcendência no espaço enquanto que a onipresença denota a imanência no espaço. Deus é imanente em todas as Suas criaturas e em toda a criação. A imanência não deve ser confundida com o panteísmo (tudo é Deus) ou com o deísmo que ensina que Deus está presente no mundo apenas com seu poder (per portentiam) e não com a essência e natureza de ser Ser (per essentiam et naturam) e que age sobre o mundo à distância. Deus ocupa o espaço repletivamente porque preenche todo o espaço e não está ausente em nenhuma parte dele, mas tampouco está mais presente numa parte que noutra (Sl.139:11,12). Deus ocupa o espaço variavelmente porque Ele não habita na terra do mesmo modo que habita no céu, nem nos animais como habita nos homens, nem nos ímpios como habita nos piedosos, nem na igreja como habita em Cristo (Is.66.1; At.17.27,28; Compare Ef.1.23 com Cl.2.9).
Imutabilidade
É o atributo pelo qual não encontramos nenhuma mudança em Deus, em sua natureza, em seus atributos e em seu conselho.
a) A base para a imutabilidade de Deus: É Sua simplicidade, eternidade, auto-existência e perfeição. Simplicidade porque sendo Deus uma substância simples, indivisível, sem mistura, não está sujeito a variação (Tg.1.17). Eternidade porque Deus não está sujeito às variações e circunstâncias do tempo, por isso Ele não muda (Sl.102.26,27; Hb.1:12 e 13:8). Auto-existência porque uma vez que Deus não é causado, mas existe em Si mesmo, então Ele tem que existir da forma como existe, portanto sempre o mesmo (Ex.3.14). E perfeição porque toda mudança tem que ser para melhor ou pior e sendo Deus absolutamente perfeito jamais poderá ser mais sábio, mais santo, mais justo, mais misericordioso, e nem menos. Por isso Deus é imutável como a rocha (Dt.32.4).
b) Imutabilidade não significa imobilidade: Nosso Deus é um Deus de ação (Is.43.13).
c) Imutabilidade implica em não arrependimento: Alguns versículos falam de Deus como se Ele se arrependesse (Ex.32.14, 2Sm.24.16, Jr.18.8; Jl 2.13). Trata-se de antropomorfismo (Nm 23:19; Rm.11.29; 1Sm.15.29; Sl.110.4).
d) Imutabilidade de Deus em Sua natureza: Deus é perfeito em sua natureza por isso não muda nem para melhor nem para pior (Ml.3.6).
e) Imutabilidade de Deus em Seus atributos: Deus é imutável em suas promessas (1Rs.8:56; 2Co.1.20); em sua misericórdia (Sl.103.17; Is.54.10); em sua justiça (Ez 8.18); em seu amor (Gn.18:25,26).
f) Imutabilidade de Deus em Seu conselho: Deus planejou os fatos conforme a sua vontade e decretou que este plano seja concretizado. Nada poderá se opor à sua vontade. O próprio Deus jamais mudará de opinião, mas fará conforme seu plano predeterminado (Is.46.9,10; Sl.33.11; Hb.6.17).
Onisciência
Atributo pelo qual Deus, de maneira inteiramente única, conhece-se a Si próprio e a todas as coisas possíveis e reais num só ato eterno e simples. O conhecimento de Deus tem suas características:
a) É arquétipo: Deus conhece o universo como ele existe em Sua própria idéia anterior à sua existência como realidade finita no tempo e no espaço; e este conhecimento não é obtido de fora, como o nosso (Rm.11:33,34).
b) É inato e imediato: Não resulta de observação ou de processo de raciocínio (Jó.37:16)
c) É simultâneo: Não é sucessivo, pois Deus conhece as coisas de uma vez em sua totalidade, e não de forma fragmentada uma após outra (Is.40:28).
d) É completo: Deus não conhece apenas parcialmente, mas plenamente consciente (Sl.147:5).
e) Conhecimento necessário: Conhecimento que Deus tem de Si mesmo e de todas as coisas possíveis, um conhecimento que repousa na consciência de sua onipotência. É chamado necessário porque não é determinado por uma ação da vontade divina. (Por exemplo: O conhecimento do mal é um conhecimento necessário porque não é da vontade de Deus que o mal lhe seja conhecido (Hc.1:13) Deus não pode nem quer ver o mal, mas o conhece, não por experiência, que envolve uma ação de Sua vontade, mas sim por simples inteligência, por ser ato do intelecto divino (veja IICo.5:21 onde o termo grego  é usado).
f) Conhecimento livre: É aquele que Deus tem de todas as coisas reais, isto é, das coisas que existiram no passado, que existem no presente e existirão no futuro. É também chamado visionis, isto é, conhecimento de vista.
g) Presciência: Significa conhecimento prévio; conhecimento de antemão. Como Deus pode conhecer previamente as ações livres dos homens? Deus decretou todas as coisas, e as decretou com suas causas e condições na exata ordem em que ocorrem, portanto sua presciência de coisas contingentes (ISm.23:12; IIRs.13:19; Jr.38:17-20; Ez.3:6 e Mt.11:21) apoia-se em seu decreto. Deus não originou o mal mas o conheceu nas ações livres do homem (conhecimento necessário), o decretou e preconheceu os homens. Portanto a ordem é: conhecimento necessário, decreto, presciência. A presciência de Deus é muito mais do que saber o que vai acontecer no futuro, e seu uso no N.T. é empregado como na LXX que inclui Sua escolha efetiva (Nm.16:5; Jz.9:6; Am.3:2). Veja Rm.8:29; IPe.1:2; Gl.4:9. Como se processou o conhecimento necessário de Deus nas livres ações dos homens antes mesmo que Ele as decretasse? A liberdade humana não é uma coisa inteiramente indeterminada, solta no ar, que pende numa ou noutra direção, mas é determinada por nossas próprias considerações intelectuais e caráter (lubentia rationalis = autodeterminação racional). Liberdade não é arbitrariedade e em toda ação racional há um porquê, uma razão que decide a ação. Portanto o homem verdadeiramente livre não é o homem incerto e imprevisível, mas o homem seguro. A liberdade tem suas leis - leis espirituais - e a Mente Onisciente sabe quais são (Jo.2:24,25). Em resumo, a presciência é um conhecimento livre (scientia libera) e, logicamente procede do decreto, "segundo o decreto sua vontade" (Ef.1:11).
h) Sabedoria: A sabedoria de Deus é a Sua inteligência como manifestada na adaptação de meios e fins. Deus sempre busca os melhores fins e os melhores meios possíveis para a consecução dos seus propósitos. H.B. Smith define a sabedoria de Deus como o Seu atributo através do qual Ele produz os melhores resultados possíveis com os melhores meios possíveis. Uma definição ainda melhor há de incluir a glorificação de Deus: Sabedoria é a perfeição de Deus pela qual Ele aplica o seu conhecimento à consecução dos seus fins de um modo que o glorifica o máximo (Rm.ll:33-36; Ef.1:11,12; Cl.1:16). Encontramos a sabedoria de Deus na criação (Sl.19:1-7; Sl.104), na redenção (ICo.2:7; Ef.3:10) . A sabedoria é personificada na Pessoa do Senhor Jesus (Pv.8 e ICo.1:30; Jó.9:4; veja também Jó 12:13,16).
Onipotência
É o atributo pelo qual encontramos em Deus o poder ilimitado para fazer qualquer coisa que Ele queira. A onipotência de Deus não significa o exercício para fazer aquilo que é incoerente com a natureza das coisas, como, por exemplo, fazer que um fato do passado não tenha acontecido, ou traçar entre dois pontos uma linha mais curta do que uma reta. Deus possui todo o poder que é coerente com Sua perfeição infinita, todo o poder para fazer tudo aquilo que é digno dEle. O poder de Deus é distinguido de duas maneiras: Potentia Dei absoluta = absoluto poder de Deus e potentia Dei ordinata = poder ordenado de Deus. Hodge e Shedd definem o poder absoluto de Deus como a eficiência divina, exercida sem a intervenção de causas secundárias, e o poder ordenado como a eficiência de Deus, exercida pela ordenada operação de causas secundárias. Charnock [Discurso sobre a Existência e Atributos de Deus, 1682] define o poder absoluto como aquele pelo qual Deus é capaz de fazer o que Ele não fará, mas que tem possibilidade de ser feito, e o poder ordenado como o poder pelo qual Deus faz o que decretou fazer, isto é, o que Ele ordenou ou marcou para ser posto em exercício; os quais não são poderes distintos, mas um e o mesmo poder. O seu poder ordenado é parte do seu poder absoluto, pois se Ele não tivesse poder para fazer tudo que pudesse desejar, não teria poder para fazer tudo o que Ele deseja. Podemos, portanto, definir o poder ordenado de Deus como a perfeição pela qual Ele, mediante o simples exercício de Sua vontade, pode realizar tudo quanto está presente em Sua vontade ou conselho. E' óbvio, porém, que Deus pode realizar coisas que a Sua vontade não desejou realizar (Gn.18:14; Jr.32:27; Zc.8:6; Mt.3:9; Mt.26:53). Entretanto há muitas coisas que Deus não pode realizar. Ele não pode mentir, pecar, mudar ou negar-se a Si mesmo (Nm.23:19; ISm.15:29; IITm.2:13; Hb.6:18; Tg.1:13,17; Hb.1:13; Tt.1:3), isto porque não há poder absoluto em Deus, divorciado de Suas perfeições, e em virtude do qual Ele pudesse fazer todo tipo de coisas contraditórias entre Si (Jó.11:7). Deus faz somente aquilo que quer fazer (Sl.115:3; Sl.135:6).
a) El-Shaddai: A onipotência de Deus se expressa no nome hebraico El-Shaddai traduzido por Todo-Poderoso (Gn.17:1; Ex.6:3; Jó.37:23 etc.).
b) Em todas as coisas: A onipotência de Deus abrange todas as coisas (ICr.29:12), o domínio sobre a natureza (Sl.107:25-29; Na.1:5,6; Sl.33:6-9; Is.40:26; Mt.8:27; Jr.32:17; Rm.1:20), o domínio sobre a experiência humana (Sl.91:1; Dn.4:19-37; Ex.7:1-5; Tg.4:12-15; Pv.21:1; Jó.9:12; Mt.19:26; Lc.1:37), o domínio sobre as regiões celestiais (Dn.4:35; Hb.1:13,14; Jó.1:12; Jó 2:6).
c) Na criação, na providência e na redenção: Deus manifestou o seu poder na criação (Rm.4:17; Is.44:24), nas obras da providência (ICr.29:11,12) e na redenção (Rm.1:16; ICo.1:24).
Soberania ou Supremacia
Atributo pelo qual Deus possui completa autoridade sobre todas as coisas criadas, determinando-lhe o fim que desejar (Gn.14:19; Ne.9:6; Ex.18:11; Dt.10:14,17; ICr.29:11; IICr.20:6; Jr.27:5; At.17:24-26; Jd.4; Sl.22:28; 47:2,3,8; 50:10-12; 95:3-5; 135:5; 145:11-13; Ap.19:6).
a) Vontade ou autodeterminação: A perfeição de Deus pela qual Ele, num ato sumamente simples, dirige-se à Si mesmo como o Sumo Bem (deleita-se em Si mesmo como tal) e às Suas criaturas por amor do Seu nome (Is.48:9,11,14; Ez.20:9,14,22,44; Ez.36:21-23).
Vontade Preceptiva: Na qual Deus estabeleceu preceitos morais para reger a vida de Suas criaturas racionais. Esta vontade pode ser desobedecida com freqüência (At.13:22; IJo.2:17; Dt.8:20).
Vontade decretória: Pela qual Deus projeta ou decreta tudo o que virá a acontecer, quer pretenda realizá-lo causativamente, quer permita que venha a ocorrer por meio da livre ação de suas criaturas (At.2:23; Is.46:9-11). A vontade decretória é sempre obedecida.
A vontade decretória e a vontade preceptiva relacionam-se ao propósito em realizar algo.
Vontade de eudokia: Na qual Deus deleita-se com prazer em realizar um fato e com desejo de ver alguma coisa feita. Esta vontade, embora não se relacione com o propósito de fazer algo, mas sim com o prazer de fazer algo, contudo corresponde àquilo que será realizado com certeza, tal como acontece com a vontade decretória (Sl.115:3; Is.44:28; Is.55:11).
Vontade de eurestia: Na qual Deus deleita-se com prazer ao vê-la cumprida por Suas criaturas. Esta vontade abrange aquilo que a Deus apraz que Suas criaturas façam, mas que pode ser desobedecido, tal como acontece com a vontade preceptiva (Is.65:12).
A vontade de eudokia não se refere somente ao bem, e nela não está sempre presente o elemento de deleite (Mt.11:26). A vontade de eudokia e a vontade de eurestia relacionam-se ao prazer em realizar algo.
Vontade de beneplacitum: Também chamada Vontade Secreta. Abrange todo o conselho secreto e oculto de Deus. Quando esta vontade nos é revelada, ela torna-se na Vontade do Signum ou Vontade Revelada.
A distinção entre a vontade de beneplacitum e a vontade de signum encontra-se em Deuteronomio.29:29.
A vontade secreta é mencionada em Sl.115:3; Dn.4:17,25,32,35; Rm.9:18,19; Rm.11:33,34; Ef.1:5,9,11, enquanto que a vontade revelada é mencionada em Mt.7:21; Mt.12:50; Jo.4:34; Jo.7:17; Rm.12:2). Esta vontade está mui perto de nós (Dt.30:14; Rm.10:8).
A vontade secreta de Deus pertence a todas as coisas que Ele quer efetuar ou permitir, tal como acontece na vontade decretória, sendo portanto, absolutamente fixa e irrevogável.
b) Liberdade: A perfeição de Deus no exercício de Sua vontade. Deus age necessária e livremente. Assim como há conhecimento necessário e conhecimento livre, há também uma voluntas necessária = vontade necessária e uma voluntas libera = vontade livre. Na vontade necessária Deus não está sob nenhuma compulsão, mas age de acordo com a lei do Seu Ser, pois Ele necessariamente quer a Si próprio e quer a Sua natureza santa. Deus necessariamente se ama a Si próprio e Suas perfeições.
As Suas criaturas são objetos de Sua vontade livre, pois Deus determina voluntariamente o que e quem Ele criará; e os tempos, lugares e circunstâncias de suas vidas. Ele traça as veredas de todas as Suas criaturas, determina o seu destino e as utiliza para Seus propósitos (Jó.ll:10; Jó.23:13,14; Jó.33:13. Pv.16:4; Pv.21:1; Is.10:15; Is.29:16; Is.45:9; Mt.20:15; Ap.4:11;Rm.9:15-22; ICo.12:11).
Atributos Morais
Santidade
É a perfeição de Deus, em virtude da qual Ele eternamente quer manter e mantém a Sua excelência moral, aborrece o pecado, e exige pureza moral em suas criaturas. Ser Santo vem do hebraico kadosh que significa cortar ou separar. A santidade de Deus possui dois diferentes aspectos, podendo ser positiva ou negativa (Hb.1:9;Am.5:15; Rm.12:9).
a) Santidade Positiva: Expressa excelência moral de Deus na qual Ele é absolutamente perfeito, puro e íntegro em Sua natureza e Seu caráter (IJo.1:5; Is.57:15; IPe.1:15,16; Hc.1:13). A santidade positiva é amor ao bem.
b) Santidade Negativa: Significa que Deus é inteiramente separado de tudo quanto é mal e de tudo quanto o aborrece (Lv.11:43-45; Dt.23:14; Jó.34:10; Pv.15:9,26; Is.59:1,2; Lc.20:26; Hc. 1:13; Pv.6:16-19; Dt.25:16; Sl.5:4-6). A santidade negativa é ódio ao mal.
Além de possuir dois aspectos a santidade de Deus possui também duas maneiras diferentes de manifestar-se:
c) Retidão: Também chamada justiça absoluta, é a retidão da natureza divina, em virtude da qual Ele é infinitamente Reto em Si mesmo (santidade legislativa). Sl.145:17; Jr.12:1; Jo.17:25; Sl.116:5; Ed.9:15.
d) Justiça: Também chamada justiça relativa, é a execução da retidão ou a expressão da justiça absoluta (santidade judicial). Strong a chama de santidade transitiva. A retidão é a fonte da Santidade de Deus, a justiça é a demonstração de Sua santidade.
A justiça de Deus pode ser retributiva e remunerativa. A justiça retributiva se divide em punitiva e corretiva. A justiça punitiva é aquela pela qual Deus pune os pecadores pela transgressão de Suas leis. Esta justiça de Deus exige a execução das penalidades impostas por Suas leis (Sl.3:5;11:4-7 Dt.32:4; Dn.9:12,14; Ex.9:23-27;34:7). A justiça corretiva é aquela pela qual Deus "pune" Seus filhos para corrigi-los (Hb.12:6,7). Aqueles que não são Seus filhos, Deus pune como um Juiz Severo (Rm.11:22; Hb.10:31), mas aos Seus filhos, Deus "pune" (corrige) como um Pai Amoroso (Jr.10:24;30:11;46:28; Sl.89:30-33; ICr.21:13) A justiça remunerativa é aquela pela qual Deus recompensa, com Suas bênçãos, aos homens pela obediência de Suas leis (Hb.6:10; IITm.4:8; ICo.4:5;3:11-15; Rm.2:6-10; IIJo.8).
e) Ira: Esta deve ser considerada como um aspecto negativo da santidade de Deus, pois em Sua ira Deus aborrece o pecado e odeia tudo quanto contraria Sua santidade (Dt.32:39-41; Rm.11:22; Sl.95:11; Dt.1:34-37; Sl.95:11). Podemos, então, dizer que a ira é a manifestação da santidade negativa de Deus (Rm.1:18; IITs.1:5-10; Rm.5:9 etc.). A ira é também designada de severidade (Rm.11:22).
Bondade
É uma concepção genérica incluindo diversas variedades que se distinguem de acordo com os seus objetos. Bondade é perfeição absoluta e felicidade perfeita em Si mesmo (Mc.10:18; Lc.18:18,19; Sl.33:5; Sl.119:68; Sl.107:8; Na.1:7). A bondade implica na disposição de transmitir felicidade.
a) Benevolência: É a bondade de Deus para com Suas criaturas em geral. E' a perfeição de Deus que O leva a tratar benévola e generosamente todas as Suas criaturas (Sl.145:9,15,16; Sl.36:6;104:21; Mt.5:45;6:26; Lc.6:35; At.14:17). Thiessen define benevolência como “a afeição que Deus sente e manifesta para com Suas criaturas sensíveis e racionais”. Ela resulta do fato de que a criatura é obra Sua; Ele não pode odiar qualquer coisa que tenha feito (Jó.14:15) mas apenas àquilo que foi acrescentado à Sua obra, que é o pecado (Ec.7:29).
b) Beneficência: Enquanto que a benevolência é a bondade de Deus considerada em sua intenção ou disposição, a beneficência é a bondade em ação, quando seus atributos são conferidos.
c) Complacência: É a aprovação às boas ações ou disposições. É aquilo em Deus que aprova todas as Suas próprias perfeições como também aquilo que se conforma com Ele (Sl.35:27; Sl.51:6; Is.42:1; Mt.3:17; Hb.13:16).
d) Longanimidade ou Paciência: No hebraico erek'aph significa grande de rosto e daí também lento para a ira. No grego makrothymia significa longe da ira. Portanto longanimidade é o aspecto da bondade de Deus em virtude do qual Ele tolera os pecadores, a despeito de sua prolongada desobediência. A longanimidade revela-se no adiamento do merecido julgamento (Ex.34:6; Sl.86:15; Rm.2:4; Rm.9:22; IPe.3:20; IIPe.3:15)
e) Misericórdia: Também expressada pelos sinônimos compaixão, compassividade, piedade, benignidade, clemência e generosidade. É a bondade de Deus demonstrada para com os que se acham na miséria ou na desgraça, independentemente dos seus méritos (Dt.5:10; Sl.57:10; Sl.86:5; ICr.16:34; IICr.7:6; Sl.116:5; Sl.136; Ed.3:11; Sl.145:9; Ez.18:23,32; Ex.33:11; Lc.6:35; Sl.143:12; Jó 6:14).
A paciência difere da misericórdia apenas na consideração formal do objeto, pois a misericórdia considera a criatura como infeliz, a paciência considera a criatura como criminosa; a misericórdia tem pena do ser humano em sua infelicidade, a paciência tolera o pecado que gerou a infelicidade. A infelicidade e sofrimento deriva-se de um justo desagrado divino, portanto exercer misericórdia é o ato divino de livrar o pecador do sofrimento pelo qual ele justamente e merecidamente deveria passar, como conseqüência do desagrado divino.
f) Graça: É a bondade de Deus exercida em prol da pessoa indigna. Portanto graça é o ato divino de conceder ao pecador toda a bondade de Deus a qual ele não merece receber (Ex.33:19).
Na misericórdia Deus suspende o sofrimento merecido, na graça Deus concede bênçãos não merecidas. Todo pecador merece ir para o inferno; assim Deus exerce Sua misericórdia livrando o pecador da condenação. Nenhum pecador merece ir para o paraíso; assim Deus exerce a Sua graça doando ao pecador o privilégio de ir gratuitamente para o paraíso.
Essa diferença entre misericórdia e graça é notada em relação aos anjos que não caíram. Deus nunca exerceu misericórdia para com eles, posto que jamais tiveram necessidade dela, pois não pecaram, nem ficaram debaixo dos efeitos da maldição. Todavia eles são objetos da livre e soberana graça de Deus pela qual foram eleitos (ITm.5:21) e preservados eternamente de pecado e colocados em posição de honra (Dn.7:10; IPe.3:22).
g) Amor: A perfeição da natureza divina pela qual Ele é continuamente impelido a se comunicar. É, entretanto, não apenas um impulso emocional, mas uma afeição racional e voluntária, sendo fundamentada na verdade e santidade e no exercício da livre escolha. Este amor encontra seus objetos primários nas Pessoas da Trindade. Assim, o universo e o homem são desnecessários para o exercício do amor de Deus. Amor é, portanto, a perfeição de Deus pela qual Ele é movido eternamente à Sua própria comunicação. Ele ama a Si mesmo, Suas virtudes, Sua obra e Seus dons. E demonstra graça e misericórdia por Sua criação (Ef 2.4,5; 1Jo4.7-10).
Verdade
É a consonância daquilo que é asseverado com o que pensa a Pessoa que fez a asseveração. Neste sentido a verdade é um atributo exclusivamente divino, pois com freqüência os homens erram nos testemunhos que prestam, simplesmente por estarem equivocados a respeito dos fatos, ou então por pura incapacidade fracassam em promessas que fizeram com honestas intenções. Mas a onisciência de Deus impede que Ele chegue a cometer qualquer equívoco, e a Sua onipotência e imutabilidade asseguram o cumprimento de Suas intenções (Dt.32:4; Sl.119:142; Jo.8:26; Rm.3:4; Tt.1:2; Nm.23:19; Hb.6:18; Ap.3:7; Jo.17:3; IJo.5:20; Jr.10:10; Jo.3:33; ITs.1:9; Ap.6:10; Sl.31:5; Jr.5:3; Is.25:1). Ao exercê-la para com a criatura, a verdade de Deus é conhecida como sua veracidade e fidelidade.
a) Veracidade: Consiste nas declarações que Deus faz a respeito das coisas, conforme elas são, e se relaciona com o que Ele revelou sobre Si mesmo. A veracidade fundamenta-se na onisciência de Deus.
b) Fidelidade: Consiste no exato cumprimento de Suas promessas ou ameaças. A fidelidade fundamenta-se na Sua onipotência e imutabilidade (Dt.7:9; Sl.36:5; ICo.1:9; Hb.10:23; Dt.4:24; IITm.2:13; Sl.89:8; Lm.3:23; Sl.119:138; Sl.119:75; Sl.89:32,33; ITs.5:24; IPe.4:19; Hb.10:23).

Programa de Teologia Sistemática I

Objetivo
O estudo da Teologia Sistemática I é essencial porque não se pode pensar em um pastor ou teólogo que não seja solicitado a refletir sobre temas como as doutrinas da Revelação, de Deus e do ser humano. Isso significa que todos os profissionais da teologia deveriam ter uma compreensão de como Deus fala ao ser humano, quais são os atributos de Deus e sua importância, assim como o que é o ser humano. A pesquisa da Teologia nos campos dessas doutrinas possibilita o desenvolvimento de uma consciência apta a compreender a riqueza dos fenômenos vividos pela fé cristã e, por extensão, construir um conhecimento a respeito da real experiência dos fiéis e da igreja.

Abordagem
Optamos por uma abordagem temática dos assuntos, sem descuidar da referência necessária à história dessas áreas da teologia, que permita estabelecer o fio condutor da exposição dos temas. Isto porque fazer teologia não deve ser visto como atividade solitária, mas que se faz através do diálogo entre pensadores, igreja e fiéis quando expõem suas diferenças.

Avaliação
Os alunos serão avaliados por sua participação em classe (peso 3), pelos seminários apresentados (peso 4) e por uma prova final (peso 3).

PROGRAMA DA DISCIPLINA

A Palavra de Deus.
Palavra de Deus, Revelação, Inspiração. Roteiro para a vida, base da fé. A formulação do cânon e as quatro características das Escrituras: autoridade, clareza, necessidade e suficiência.

A Doutrina de Deus.
O caráter de acomodação do conhecimento de Deus. O caráter correlativo do conhecimento de Deus. O caráter existencial do conhecimento de Deus. O conceito bíblico de Deus: aspecto misterioso, revelação pessoal, soberania e auto-limitação, santidade amorável. Limitações da teodicéia filosófica.

A questão antropológica e o pecado.
O ser humano real: biológico, psicológico, sociológico, moral, filosófico, teológico. Os dois sentidos da imagem de Deus e a analogia relationis. A natureza do pecado. A terminologia bíblica a respeito do pecado, no AT e no NT. O problema da solidariedade no pecado: reino do pecado, a explicação dialética e a polêmica pelagiana-agostiniana.

BIBLIOGRAFIA OBRIGATÓRIA
Júlio Andrade Ferreira, Antologia Teológica, São Paulo, Fonte Editorial, 2007.

Bibliografia Auxiliar
Carl E. Braaten e Robert W. Jenson, Dogmática Cristã, vol I, São Leopoldo, Sinodal, 1990.
McGrath, Alister E., Teologia sistemática, histórica e filosófica, São Paulo, Shedd. 2005.