vendredi 24 août 2007

O Espírito Santo na Igreja Ortodoxa, a partir de Paul Evdokimov

O desconhecimento da Teologia Ortodoxa oriental é uma realidade em nossas faculdades de Teologia e seminários. Tal desconhecimento afeta o conjunto da Igreja Cristã brasileira, principalmente no que tange à doutrina da Trindade e ao conhecimento do Espírito Santo. Para nossa Igreja e, em especial, para o movimento pentecostal brasileiro é da maior importância, pois apresenta bases diferentes da que herdamos da Igreja cristã ocidental, sem nenhuma dúvida pouco pneumatológica. Assim, na seqüência estudaremos um texto de Paul Evdokímov, O Espírito Santo na Igreja Ortodoxa, (São Paulo, Ed. Ave Maria, 1996), mais especificamente os capítulos 1, 4 e 5. Recomendo ainda uma visita aos seguintes sites: Igreja Ortodoxa. WEB: http://www.fatheralexander.org/booklets/portuguese/igreja_ortodoxa_1.htm, principalmente na questão do Cisma, que discute o filioque. E o site: Sofia, que apresenta algumas das obras de Paul Evdokimov. WEB: http://www.sophia.bem-vindo.net/tiki-index.php?page=Paul+Evdokimov

Paul Evdokimov nasceu no dia 2 de agosto de 1901 em Petrogrado, numa família da aristocracia. Chegou a Paris em 1923 e estudou no Instituto São Sérgio. Casou-se em 1927 com jovem francesa de origem russa. Ficou viúvo em 1945, e se casou novamente em 1954 com uma moça japonesa. Entre suas obras, escreveu A mulher e a salvação do mundo (1958), Gogol e Dostoievsky ou a descida aos infiernos (1961), O sacramento do amor (1962), e Teología da Beleza (1970). Morreu em setembro de 1970.

As premissas orientais da teologia patrística

Nos seus ensinamentos sobre o conhecimento de Deus, os Pais orientais salientam antes de tudo que o projeto divino da criação do homem já traz em germe a Encarnação futura do Verbo. Criação e Encarnação já estão co-implicadas, uma completa a outra. É por esse motivo que para o Oriente, a Encarnação realizar-se-ia mesmo fora da queda original (pecado), como expressão do amor divino e termo último da comunhão entre Deus e o homem. O ícone da Théotokos tendo nos seus braços o Menino Jesus é justamente o ícone da Encarnação, a: "Eléousa", ternura inefável entre o divino e o humano. Também é a concepção eucarística da eclesiologia que aprofunda o mesmo mistério Encarnação-Comunhão e mostra na Igreja o lugar da união substancial entre Deus e o homem.
Para pressentir esse mistério, "o homem", diz São Gregório de Nissa, "leva em si uma certa medida de conhecimento de Deus”, 4 e para responder ao desejo divino, nota São Máximo Confessor, "Deus depositou no coração humano o desejo de Deus". 5 É, pois na sua própria natureza, criada à imagem de Deus, que o homem está predestinado ao conhecimento de Deus. Qual é o órgão desse conhecimento?
O Oriente distingue entre a razão e a sua diferenciação discursiva ao infinito, voltada para o múltiplo e o contrário e, por outro lado, a inteligência, o ultrapassar dos opostos e a integração intuitiva até a unidade e o uno. Evagrio sublinha a diferença de nível: "A inteligência reside no coração, o pensamento no cérebro".6 É um princípio saído das Escrituras, pois os judeus do Antigo Testamento pensavam com o coração, coração no sentido bíblico, centro metafísico do ser humano, sede da inteligência e do noús. Isso é a negação do pensamento discursivo, mas a ciência dos seus limites que postula a sua integração na "inteligência renovada em Cristo" de que fala São Paulo. O Oriente nunca cultivou a autonomia da razão natural- Lumen naturalis rationis. Deus na sua Revelação, ao dirigir-se ao homem, opera uma transfiguração do seu espírito. O conhecimento de Deus, mesmo "natural" é sempre carismático. Segundo Orígenes, a graça theoria eleva todo homem acima dele mesmo.7 Os eslavófilos chamam isso "o conhecimento vivo", conhecimento-vida, conhecimento-amor e comunhão.
Eles seguem a patrística oriental, que ignora a distinção entre uma "via do amor" e uma "via do conhecimento". Normativamente, o verdadeiro conhecimento é sempre caritativo e o amor é sempre intelectivo. Eis por que o grande princípio do hesicasmo convida a fazer descer a inteligência no coração para que a totalidade das faculdades do espírito humano, super-elevada e iluminada pela graça, efetue um face-a-face com os mistérios de Deus, o que significa a exclusão de todo conceito ou imagem mental suscetível de se interpor entre o "coração espírito" ou o "olho do coração" e o Criador.
O pecado original antes de tudo separou a razão do coração, a gnoseologia da axiologia, o que falseou a faculdade do discernimento e da apreciação. Este estado de perversão ontológica reclama um ato de profunda reviravolta do ser - metanoia - que é justamente o ato de fé. É necessário sublinhar fortemente o seu aspecto existencial e experimental, o qual explica por que a fé no Oriente nunca se define em termos de adesão intelectual, mas pertence à reviravolta de tudo no ser humano pela "evidência" ou a "certeza" de Pascal vividas numa certa "experiência do Transcendente". São Máximo nota o seguinte: "Eu chamo experiência o próprio saber em ato que advém para além de todo o conceito..., a participação ao objeto, que se revela para além de qualquer pensamento”.8 É um semelhante conhecimento contemplativo por participação que constitui, segundo os Pais, uma verdadeira théognosia. Teologizar é traduzir em termos teológicos a comunhão com Deus, é relatar o seu conteúdo. A teologia, com certeza, possui um elemento doutrinal, o kerigma, a didaskália e a catequese; mas, mais profundamente, a Igreja cultiva a própria seiva do conhecimento ao escutar os seus santos e os seus Pais, alimentando-se da sua experiência do Espírito Santo, do seu colóquio com o Verbo, e ela o oferece a todos na sua liturgia.
Como o mostra o título do tratado do Pseudo Dionísio Areopagita Peri mystikês theologias (Sobre a teologia mística), teologia mística significa, ao contrário de qualquer conhecimento cerebral, teologia do Mistério que nós conhecemos apenas pela revelação do lado de Deus e pela participação receptiva do lado do homem. A transcendência de Deus ensina-nos que nunca o podemos conhecer do exterior, que nunca podemos ir a Deus senão partindo dele, senão encontrando-nos já nele e sendo tocados pela sua proximidade, atingidos pelas suas energias deificantes.
As lutas dogmáticas pela Verdade, na época dos concílios ecumênicos, não defendiam nenhum conhecimento formal desligado da economia da salvação, mas procuravam esclarecer a via salvadora altamente prática, respondendo às questões de vida ou de morte. Uma teologia semelhante, comportando embora uma propedêutica do ensino e uma cultura, aparece antes de tudo e na sua própria aspiração: via experimental da união com Deus. Compreende-se melhor sob esta perspectiva, a definição orante que dá Evagro9 da teologia: "Se rezas verdadeiramente, tu és teólogo, e se tu és teólogo, rezarás em verdade". É uma contemplativa, geradora de unidade e que se aparenta na sua natureza ao mistério eucarístico, consumação eucarística da Palavra.
Assim no espírito dos Pais, a teologia erige-se em ministério carismático, pois "ninguém pode conhecer a Deus, se não é o próprio Deus que o ensina" - "não há outro meio de conhecer a Deus que de viver nele". “Falar de Deus é uma grande coisa, mas ainda é preferível purificar-nos para Deus", diz São Gregório de Nazianzo.10 O tropário de Noa diz isso à sua maneira: "Entre os dois ladrões, a tua cruz surgiu como uma balança de justiça, um mergulhando no inferno sob o peso da blasfêmia, o outro aliviando-se dos seus pecados para conhecer a verdadeira teologia". O bom ladrão é teólogo, tem a experiência imediata de Deus, reconheceu-o e dirigiu-lhe a sua oração.
A vocação teológica convida a ultrapassar a suficiência de uma ciência puramente enciclopédica, pois ela não é a tarefa da razão natural, mas enraíza-se na luz do Verbo. Na sua iniciação, os Pais mostram a ascese como a preliminar da arte teológica e a oração como um estado - katastasis - da inteligência, uma receptividade orante aberta às Revelações fulgurantes do Transcendente.

As dimensões catafática e apofática da teologia dos Pais


Na sua dimensão apofática, a teologia é a negação de toda definição humana. Definir é limitar; ora Deus é ilimitado e incomparável no sentido absoluto, não existe nenhuma escala de comparação, nenhum nome é capaz de o exprimir adequadamente. Adonai é o sinal do inefável, Javé é o Nome que não pode ser dito. Ao dizermos Deus ou Criador ou Salvador, nunca é Deus em si mesmo que nós designamos, mas a sua face voltada para o mundo, o que está "ao redor de Deus".
A teologia catafática, positiva, é chamada pelos Pais "simbólica", pois ela apenas se aplica aos atributos revelados, às manifestações de Deus no mundo. Esse conhecimento de Deus nos seus atos traduz as suas "fanias" através do modo inteligível, apresenta uma expressão calculada, simbólica, pois a realidade de Deus é absolutamente original, irredutível a qualquer sistema de pensamento. Assim Evagrio aconselha: "Aproximai-vos do Imaterial de uma maneira imaterial". Da mesma forma, por exemplo, para São João Crisóstomo, a expressão "à direita do Pai" nada tem de especial, mas exprime a identidade da glória do Cristo com a do Pai. A teologia positiva assim não é desvalorizada, mas determinada quanto à sua dimensão própria e aos seus limites.
Em compensação a teologia negativa habitua à intransponível e salvadora distância. "Os conceitos criam os ídolos de Deus", diz São Gregório de Nissa, "só a admiração apreende qualquer coisa". 11 "OS mistérios simples revelam-se para além de qualquer conhecimento, para além mesmo de qualquer ignorância, nas trevas mais que luminosas do silêncio." 12 É uma aproximação das trevas, franja da inacessível luz divina, mas que se encontra ao oposto do agnosticismo, pois graças a esta própria ignorância, através de uma "intuição primordial e simples", conhecemos para além de qualquer inteligência. A teologia negativa realiza um ultrapassar, mas que nunca se desliga da sua base, a teologia positiva da Revelação bíblica. Quanto mais alta é construída a vertical celeste, tanto mais ela se encontra enraizada na horizontal terrestre da história.
Não se trata apenas da simples impotência natural do homem, mas da profundidade indizível, radicalmente transcendente da essência divina. Deus é misterioso, incognoscível pela sua própria natureza. Porém a via negativa, sublinha profundamente o Pe. de Lubac, não é negadora, "negatividade não é negação". 13 Ela constitui o único remédio para a insuficiência obrigando a transcender-se. Eis por que ela não é um simples corretivo nem um apelo à prudência, mas uma teologia autônoma. Os seus termos "hiper-bom" ou "hiper-existente" são negações-afirmações e levam uma certa descrição do Inconcebível situada na experiência geradora da unidade.
Quanto mais Deus é incognoscível na transcendência da sua Sobressência mais ele é experimentável na sua proximidade imanente enquanto Existente.
Quando o homem procura Deus, é ele que é encontrado por Deus; quando ele procura a verdade divina, é ela que o apreende e o transporta ao seu nível. "Encontrar Deus consiste em procurá-Lo sem cessar... é verdadeiramente ver Deus sem nunca estar saciado de o desejar".15 Ele é "o eternamente procurado" o zêtoumenos. Como método, a apofase ensina a atitude correta de todo teólogo: o homem não especula, mas transforma-se. É nesse estado de mudança contínua, de "deificação" progressiva que o homem contempla pelos olhos da Pomba a Mônada una e trina ao mesmo tempo e que "permanece escondida na sua própria epifania". 15

As particularidades da Teologia dos Pais Orientais

A teologia dos Pais no século IV é urna teologia trinitária por excelência. Ela elaborou as definições dogmáticas e fixou, ao mesmo tempo a unidade e a diversidade das Pessoas em Deus. Já o próprio termo de homoousios consubstancial, co-essencial, idêntico em essência, permitiu exprimir o mistério de Deus, ao mesmo tempo Mônada e Tríade.
No Evangelho segundo São João, o Logos era “pros ton Theon”, era mais "para Deus" que "junto de Deus" ou "com Deus", fórmula que designa a geração eterna do Filho - que não é o Pai. Da mesma forma um "outro Consolador" é outro que o Filho e outro que o Pai. Todas as Pessoas são iguais em dignidade, idênticas em substância e diversificam-se pelas suas relações internas. É aqui que é necessário realçar uma diferença de visão entre o Oriente e o Ocidente. Para o Oriente, as relações entre as Pessoas da Trindade não são de oposição nem de separação, mas de diversidade, de reciprocidade, de revelação recíproca e de comunhão no Pai.
Os atributos que se referem à natureza comum, tais como sabedoria, vontade, amor, santidade, eternidade, são inerentes aos Três sem diferenciação. A Pessoa na sua qualidade de Única é evocada na sua relação à Fonte que é o Pai. A inascibilidade do Pai, a geração do Filho e a processão do Espírito são as relações que melhor permitem distingui-las. E pela fraqueza natural do nosso pensamento que nós as evocamos de maneira negativa: o Pai não gerado não é nem o Filho, nem o Espírito; o Filho gerado não é nem o Pai nem o Espírito; o Espírito espirado não é nem o Pai nem o Filho.
Para o Oriente, essas relações de origem não são o único fundamento das Hipóstases, que as constituiria e as esgotaria do seu conteúdo. São João Damasceno o diz: "Cada uma das Pessoas contém a Unidade pela sua relação às outras, não menos que pela sua relação a si mesma".34 Elas designam somente por excelência a diversidade hipostática. Não diferenciam a natureza em Pessoas, mas exprimem a identidade e a diversidade do Deus Uno e Trino.
O mais importante para compreender a teologia trinitária do Oriente é o caráter sempre ternário ou triplo das relações. Ternárias, elas são ao mesmo tempo triúnicas e é por esse motivo que em cada relação de uma Pessoa as outras estão presentes. O Filho e o Espírito referem-se ao Pai simultaneamente, a inascibilidade, a geração e a processão implicam-se reciprocamente, uma nunca está sem as outras. Esse caráter ternário das relações suprime qualquer possibilidade de as reduzir à dualidade, à formação de díades no seio da Trindade, o que colocaria a idéia racional de oposição em vez da visão meta-racional de uma diversidade - unidade trinitária.
Com efeito, apenas se podem opor dois princípios; ora nós temos três princípios, eis por que o Oriente recusa o sistema de oposição de relações ou de relações de oposição que são as relações causais. A relação ativa do Filho e do Espírito ao Pai é uma relação de comunhão, de revelação, de manifestação, da mesma maneira a relação ativa entre o Filho e o Espírito não é a relação de origem. A relação de origem é uma negação: o Pai não é o Filho, etc., e deve ser entendida num sentido apofático que transcende qualquer lógica de relações e não define, mas descreve. "O modo da geração e o modo da processão são incompreensíveis"; 35 inefáveis e ao mesmo tempo concretos, eles são suficientes para diferenciar as Pessoas numa simultaneidade eterna, pois toda relação é tripla: o Espírito procede do Pai conjuntamente e em relação com o Filho no qual ele repousa; o Filho é gerado pelo Pai conjuntamente e em relação com o Espírito que o manifesta.
Na vida intradivina dos Três, a Mônada fechada é excluída tanto quanto a Díade porque justamente o número dois implica oposição e limitação recíprocas. O ultrapassar opera-se nos Três e para além de qualquer conumeração lógica. Simplesmente e de repente abre-se o infinito do Deus vivo: "A divindade não é partilhada nos partilhantes", diz São Gregório Nazianzeno,36 "nos Três Sóis que se compenetram, única é a Luz". 37 Assim a Trindade não é o resultado de um processo, de uma teogonia, mas de um dado primordial da existência divina. Ela não é uma obra de vontade hipostática nem de necessidade de natureza; Deus é eternamente, sem começo, o Pai, o Filho e o Espírito Santo, reciprocidade eterna de seu Amor.
O dogma trinitário é absolutamente alheio a qualquer especulação metafísica. Não há nenhuma teogonia no ato da criação do mundo que é um ato de vontade, em compensação a processão das Hipóstases divinas é um ato do Ser divino, do Existente absoluto, para além de qualquer dialética de tipo hegeliano, por exemplo.
A teologia apofática contempla o mistério que nenhuma inteligência pode atingir. É unicamente porque se dirige aos filósofos que São Gregório Nazianzeno utiliza a linguagem deles e diz: "A mônada é posta em movimento em virtude da sua riqueza; a díade é ultrapassada e a tríade encerra-se na sua perfeição absoluta..." 38Assim Deus não é solitário, judaico, nem múltiplo, politeísta. Ele é a Trindade para além de qualquer dedução, razão ou necessidade. Tudo o que se pode dizer é que mônada é solitária, que dois é o número que separa um do outro e os opõe, e que o número que ultrapassa a separação e desemboca no infinito é o três. É na Trindade que se encontram de certa forma reunidos e circunscritos o uno e o múltiplo. Os Pais não procuram justificar pela razão o número Três; ofuscados eles mesmos pela Luz, eles deixam simplesmente contemplar a plenitude superabundante da Triunidade divina. Mas até esta contemplação é apenas a "sombra pálida da Trindade" pois os Três em Deus transcendem qualquer número matemático. São Basílio afirma isso no seu Tratado do Santo Espírito: "Nós não contamos indo do um ao múltiplo pela adição, dizendo um, dois, três ou o primeiro, o segundo e o terceiro. Ao confessarmos as três hipóstases sem dividir a natureza em multidão, nós permanecemos na Monarquia". Vemo-lo bem: o número em Deus não é uma quantidade, mas exprime a ordem inefável: três igual a um. A Tríade das Hipóstases "unidas pela distinção e distinção pela união" designa uma diferença que não opõe, mas se coloca colocando as outras.
A consciência dogmática da Igreja defendeu com veemência o mistério trinitário contra as tendências naturais da razão que oscila fatalmente entre o um e o múltiplo, entre por um lado a essência dos filósofos e os três modos das suas manifestações e isso é o modalismo sabeliano, e, por outro lado, a divisão em três seres distintos e desiguais e isso é a heresia de Àrio. Igualmente em Plotino, o Uno, a Inteligência e a Alma do mundo apresentam uma hierarquia decrescente das pessoas por emanação.
Diante de todos esses desvios da razão natural, era necessária uma metanoia, uma reviravolta radical da inteligência posta em Cristo, para se elevar acima dos conceitos filosóficos e para receber a Revelação de Deus na sua pureza intacta. Era necessário suprimir o germinar do unitarismo monoteísta e o triteísmo politeísta.
Essa reviravolta comporta dois métodos diferentes na sua compreensão do Mistério trinitário e marca assim a diferença das posições teológicas do Oriente e do Ocidente. O Pe. Régnon, nos seus Études de théoiogie positive sur ia Sainte Trinité, nota isso claramente: "A filosofia latina encara em primeiro lugar a natureza em si mesma e prossegue até o subordinado (a Pessoa); a filosofia grega encara em primeiro lugar o subordinado e aí penetra depois para encontrar a natureza. O latino considera a personalidade como um modo da natureza, o grego considera a natureza como o conteúdo da pessoa. Assim o Ocidente parte da natureza una para considerar em seguida as Três Pessoas; o Oriente parte das Três Pessoas para considerar em seguida a natureza una".39 São Basílio, por exemplo, seguia esse método conscientemente porque ele partia do concreto, em conformidade com a Escritura e com a fórmula batismal que nomeia o Pai, o Filho e o Santo Espírito.
O Oriente vê o perigo quando não é a Monarquia do Pai, mas a natureza una que se erige em princípio da unidade na Trindade. Nesse caso, as relações de origem identificam se com as Hipóstases e as exprimem totalmente. Se se afirma com São Tomás que "o nome de pessoa significa a relação", 40 é lógico deduzir que são as relações internas. Da essência que a diversificam. Ora, para os gregos, o princípio de unidade não é a natureza, mas o Pai que estabelece relações de origem em relação a Ele mesmo, como a única Fonte de qualquer relação. Santo Atanásio declara: "Há um só princípio da divindade e conseqüentemente existe a monarquia da maneira mais absoluta: um só Deus porque um só Pai". Esta afirmação lapidar torna-se o adágio de todos os Pais orientais. Para eles, confessar a unidade trinitária é reconhecer o Pai como a única fonte das Hipóstases que simultaneamente recebem dele a mesma e única natureza. É porque as relações se referem ao Pai que elas significam ao mesmo tempo a unidade e a diversidade. As Pessoas e a natureza são apresentadas simultaneamente sem que uma preceda logicamente as outras.
"O grego considera a natureza como o conteúdo da pessoa", o que significa que cada Hipóstase é a maneira pessoal de se apropriar a mesma natureza e, por conseguinte cada Hipóstase na sua realidade única ultrapassa as simples relações de origem. São Gregório Nazianzeno diz: "A natureza una nos Três - é Deus; quanto à união hênosis - é o Pai, de quem os Outros procedem e para o qual eles se dirigem sem se confundirem nem se separarem, mas coexistindo com ele".41 É o Pai que distingue as Hipóstases, mas esta distinção ultrapassa o simples plano das origens, pois segundo São Máximo o Pai os distingue "num movimento eterno de amor" 42. Os Pais distinguem a substância hipostática e a ação manifestadora. No "movimento eterno de amor", o Filho e o Espírito Santo são inseparáveis na sua ação manifestadora do Pai e eles são inefavelmente distintos como duas Pessoas procedendo do mesmo Pai. "O Santo Espírito, diz São Basílio, por um lado está ligado ao Filho com o qual ele é concebido inseparavelmente, e por outro lado o seu Ser está suspendido ao Pai, do qual ele procede... Ele subsiste procedendo do Pai e é manifestado conjuntamente com o Filho". 43 Em todos os Pais constatamos a afirmação da única Fonte Hipostática do Pai e ao mesmo tempo uma relação íntima entre o Filho e o Espírito inseparavelmente concebidos e unidos: o Espírito repousa eternamente sobre o Filho e o manifesta.
Os orientais sempre acentuam fortemente o caráter inefável, apofático da processão dos Dois do único Pai, contra uma noção mais racional que situava o comum da natureza acima do pessoal. Eles nunca consideraram o Espírito Santo como um vínculo (nexus amo ris) entre o Pai e o Filho unidos na mesma natureza e constituindo um único Princípio de espiração. Nesse caso, já não são mais duas Hipóstases distintas, mas a substância impessoal que "espira". Ora a unidade é a unidade dos Três.
Podemos nos interrogar se a Monarquia oriental não favorece o subordinacionismo no interior da Trindade? São Gregório Nazianzeno responde: "A glória do Princípio não consiste no abaixamento daqueles que procedem dele... Deus é os Três considerados em conjunto; cada um é Deus por causa da consubstancialidade; os Três são Deus por causa da Monarquia". 44
Régnon chama a atenção sobre o perigo oposto no Ocidente: "Parece que o dogma da Unidade divina tenha como que absorvido o dogma da Trindade de que fala apenas por lembrança". E o risco do primado da essência filosófica sobre o concreto escriturístico das Pessoas. Já não se voltam mais para as Pessoas da Trindade, mas ao "Santo Deus" que não se sabe exatamente quem é. Por outro lado, várias formas de piedade popular são voltadas exclusivamente para o Cristo, ligando-se forçosamente à sua humanidade e é um cristocentrismo excessivo. Em compensação o teocentrismo sem precisão conduz à mística do "abismo divino", a Gottheit de Mestre Eckhart, anterior à Trindade.
A acentuação muito marcada sobre a natureza condiciona a noção da beatitude do século futuro como visão da essência divina. Ora, para o Oriente a beatitude designa o infinito da deificação, participação da vida divina e visão da glória trinitária através da humanidade glorificada do Cristo, "luzeiro de cristal", a essência de Deus sendo transcendente para sempre.
Numa figura, podemos representar a triadologia sob a forma de um ângulo no qual o sopé designa o Pai e os dois pontos onde terminam os lados, o Filho e o Espírito. Esse esquema exprime a igualdade dos dois, mas não diz nada sobre as suas relações recíprocas salvo a sua relação à única origem que é o Pai. Segundo o Pe. Serge Boulgakov, o esquema mais correto é um triângulo inscrito num círculo: o movimento é circular, parte do Pai e volta para ele. O Pai é a fonte da Verdade, o Filho é o princípio de revelação da Verdade do Pai, o Espírito Santo é o princípio da sua manifestação dinâmica e vivificante, ele é a Vida da Verdade, o seu Espírito. A relação entre o Filho e o Espírito não é causal: mas é uma relação de interdependência e de condição, pois qualquer relação intradivina é sempre tripla na circum-incessão eterna do Amor divino. Veremos toda a importância do termo de condição, avançado pelo teólogo russo Bolotov, e que é bastante esclarecedor em relação ao problema do Filioque.

Teólogos Ortodoxos Contemporâneos: Vladimir Lossky
(1903-1958)

Nació e1 8 de Junio de 1903, lunes de Pentecostés. Después de sus estudios en Petrogrado, llega a Paris en 1924. Pronto, una fuerte amistad lo une a Eugraf Kovalevsky y entra en la Cofradia San Focio, con vistas a una ortodoxia universal, capaz de revivificar las tradiciones ortodoxas de la Francia de los once primeros siglos. Casado en 1938, tuvo cuatro niños. En 1945 enseña teología en el Instituto Ortodoxo San Dionisio para formar a los presbíteros de la iglesia Ortodoxa de Francia.
Escribe obras esenciales: Teologia Mística de la iglesia de Oriente (1944); A la Imagen y Semejanza de Dios (1967);etc. Muere el 7 de febrero de 1958.
El pecado original
El origen del mal reposa en la libertad del hombre. Por eso el mal es inexcusable, pues sólo tiene origen en la libertad del ser que lo realiza: el hombre da lugar al mal en su voluntad y lo introduce en el mundo.[...] Pero la actitud de Lucifer nos revela la raíz de todo pecado: el orgullo como rebelión contra Dios. El primero que fue llamado a la deificación por la gracia quiso ser dios por sí mismo. Seréis como Dios, dice la serpiente, y así no engaña totalmente al hombre, también llamado a la deificación. Pero aquí, "como" significa la igualdad del resentimiento: dios autónomo contra Dios, dios sin Dios. Cuando Dios llama a Adán (el Hombre) , éste, en lugar de acercarse a su Hacedor, acusa a la mujer que Tú pusiste cerca de mi. El hombre rehúsa su responsabilidad y la proyecta sobre la mujer y sobre Dios mismo.[...)
Desde ese momento, el hombre se separa de Dios y su naturaleza se hace no natural, se vuelve contra su naturaleza: el espíritu humano se invierte.[...] El espíritu debía vivir de Dios; el alma, del espíritu; y el cuerpo, del alma. Pero el espíritu empieza a parasitar el alma al nutrirse de valores no divino. El alma parasita el cuerpo y las pasiones se alzan. El cuerpo finalmente parasita el universo terrestre.[...] Pero Dios introduce una cierta pedagogía para evitar una total desintegración por el mal: más vale morir, es decir, ser excluído del "Arbol de Vida", que vivir eternamente en el pecado (morir de muerte, o la desintegración del pecado).
Mas el mundo verdadero, la verdadera naturaleza se afirmarán por la Gracia. El pecado inicia el drama de la salvación. El Cristo, segundo Adán, elegirá a Dios allí donde el primer Adán se había elegido a sí mismo. Satán ofrecerá al Cristo la misma tentación, mas tres veces la tentación se quebrará contra las voluntades unidas de Dios y del hombre. [...]
La obra del Espíritu Santo en la iglesia
La Encarnación y la obra salvadora del Cristo, tomadas aparte de la economía del Espíritu Santo, no pueden justificar la multiplicidad personal de la Iglesia, tan necesaria como su unidad natural en el Cristo. El misterio de Pentecostés es tan importante como el de la Salvación. La obra salvadora es una condición indispensable de la obra deificante del Espíritu Santo. [... ] El Hijo Se hizo semejante a nosotros por la Encarnación y nos hacemos semejantes a El por la deificación, participando de la divinidad en el Espíritu Santo que la comunica a cada persona humana. La obra redentora del Hijo concierne a nuestra naturaleza y la obra deificante del Espíritu Santo se dirige a nuestras personas. Las dos obras son inseparables: es la "economía" de la Santa Trinidad, cumplida por las dos Personas divinas que - el Padre envía al mundo.
Desde el punto de vista de nuestro estado de decadencia, la meta de la economía divina se llama redención o salvación: es el aspecto negativo en relación con el pecado. Desde el ponto de vista de nuestra vocación última, es la deificación: es el aspecto positivo del mismo misterio que se cumple en cada persona humana en la Iglesia y que se revelará plenamente en el mundo venidero, cuando, después de haber reunido todo en el Cristo, "Dios será todo en todo" .

Vladimir Lossky
TEOLOGÍA Y MÍSTICA EN LA TRADICIÓN DE LA IGLESIA DE ORIENTE
Introducción a "Teología mística de la Iglesia de Oriente", Barcelona, Herder, 1982.
Nos proponemos estudiar aquí algunos aspectos de la espiritualidad oriental en relación con los temas fundamentales de la tradición dogmática ortodoxa. Con la expresión "teología mística" no se designa, pues, aquí sino una espiritualidad que expresa una actitud doctrinal.
En cierto sentido, toda teología es mística, en la medida en que manifiesta el misterio divino, los elementos procedentes de la revelación. Por otra parte se opone a menudo la mística a la teología, como un campo inaccesible al conocimiento, como el misterio inexpresable, un fondo oculto que puede ser vivido más bien que conocido, entregándose a una experiencia específica que sobrepasa nuestras facultades de entendimiento, antes que a una aprehensión cualquiera de nuestros sentidos o de nuestra inteligencia. Si se adoptara sin reserva este ultimo concepto, oponiendo resueltamente la mística a la teología, se llegaría finalmente a la tesis de Bergson, quien distingue, en Deux saurces, la "religión estática" de las iglesias, religión social y conservadora, y la "religión dinámica" de los místicos, religión personal y renovadora. ¿En qué medida tenía razón Bergson al afirmar esta oposición? La cuestión es difícil de resolver, tanto más difícil cuanto que para Bergson los dos términos que él opone en el terreno religioso se fundan en los dos polos de su visión filosófica del universo: la naturaleza y el impulso vital. Pero, con independencia de la actitud bergsoniana, se expresa a menudo la opinión que quiere ver en la mística un campo reservado a unos pocos, una excepción a la regla común, un privilegio concedido a unas cuantas almas que gozan de la experiencia de la verdad, mientras que los demás tienen que contentarse con una sumisión más o menos ciega al dogma que se impone exteriormente como una autoridad coercitiva. Acentuando esta oposición, se va a veces demasiado lejos, sobre todo si se fuerza un tanto la realidad histórica; se llega, así, a poner en conflicto a los místicos y los teólogos, los espirituales y los prelados, los santos y la Iglesia. Basta recordar varios pasajes de Harnack, "La vie de sa¡nt François" de Paul Sabatier, y otras obras, debidas las más de las veces a historiadores protestantes.
La tradición oriental jamás ha distinguido netamente entre mística y teología, entre la experiencia personal de los misterios divinos y el dogma afirmado por la Iglesia. Las palabras que, hace un siglo, dijo un gran teólogo ortodoxo, el metropolitano Filareto de Moscú, expresan perfectamente esta actitud: "Ninguno de los misterios de la más secreta sabiduría de Dios debe parecernos ajeno o totalmente trascendente, sino que, con toda humildad, debemos adaptar nuestro espíritu a la contemplación de las cosas divinas". Dicho de otro modo, al expresar el dogma una verdad revelada que nos aparece como un misterio insondable, debemos vivirlo en un proceso durante el cual, en vez de asimilar el misterio a nuestro modo de entendimiento, será preciso, por el contrario, que cuidemos de un cambio profundo, de una transformación interior de nuestra mente, a fin de hacernos aptos para la experiencia mística. Lejos de oponerse, la teología y la mística se sostienen y se complementan mutuamente. La una es imposible sin la otra: si la experiencia mística es una fructificación personal del contenido de la fe común, la teología es una expresión, para la utilidad de todos, de lo que puede ser experimentado por cada cual. Fuera de la verdad guardada por el conjunto de la Iglesia, la experiencia personal estaría privada de toda certidumbre, de toda objetividad; sería una mezcla de lo verdadero y de lo falso, de la realidad y de la ilusión: el "misticismo" en el sentido peyorativo de la palabra. Por otra parte, la enseñanza de la Iglesia no tendría ninguna influencia sobre las almas si no expresara en cierto modo una experiencia íntima de la verdad dada, en diferente medida, a cada uno de los fieles. No hay, pues, mística cristiana sin teología, pero sobre todo no hay teología sin mística. No es casualidad que la tradición de la Iglesia de Oriente haya reservado especialmente el nombre de "teólogos" a tres escritores sagrados, el primero de los cuales es san Juan, el más "místico" de los cuatro evangelistas; el segundo, san Gregorio Nacianceno, autor de poemas contemplativos; y el tercero, san Simeón, llamado "el nuevo teólogo", cantor de la unión con Dios. La mística es, pues, considerada aquí como la perfección, la cumbre de toda teología; como una teología por excelencia.
Contrariamente a la gnosis, en la que el conocimiento en sí constituye la meta del gnóstico, la teología cristiana es siempre, en último lugar, un medio, un conjunto de conocimientos que deben servir a un fin que excede a todo conocimiento. Este fin último es la unión con Dios, o deificación, la "Theosis" de los Pais griegos. Se llega así a una conclusión que puede parecer harto paradójica: la teoría cristiana tendrá un sentido eminentemente práctico, y ello con tanto mayor motivo cuanto que es más mística y apunta más directamente al supremo fin de la unión con Dios.
Todo el desarrollo de las luchas dogmáticas sostenidas por la Iglesia en el transcurso de los siglos, si se enfoca desde el punto de vista puramente espiritual, nos aparece dominado por la preocupación constante que la Iglesia ha tenido de salvar, en cada momento de su historia, la posibilidad de que los cristianos alcancen la plenitud de la unión mística. En efecto, la Iglesia lucha contra los gnósticos para defender la idea misma de la deificación como fin universal: "Dios se hizo hombre para que los hombres puedan volverse dioses". Afirma, contra los arrianos, el dogma de la Trinidad consubstancial, porque es el Verbo, el Logos, quien nos abre el camino hacia la unión con la divinidad, y si el Verbo encarnado no tiene la misma substancia con el Padre, si no es el verdadero Dios, nuestra deificación es imposible. La Iglesia condena el nestorianismo, para abatir la barrera con la cual, en el propio Cristo, se ha querido separar al hombre de Dios. Se alza contra el apolinarismo y el monofisismo, para mostrar que, al haber asumido el Verbo la plenitud de la verdadera naturaleza humana, nuestra naturaleza entera debe entrar en unión con Dios. Combate a los monotelitas porque fuera de la unión de las dos voluntades, divina y humana, no se podría alcanzar la deificación: "Dios creó al hombre por su sola voluntad, pero no puede salvarlo sin el concurso de la voluntad humana". La Iglesia triunfa en la lucha por las imágenes, al afirmar la posibilidad de expresar las realidades divinas en la materia, símbolo y garantía de nuestra santificación. En las cuestiones que se plantean sucesivamente sobre el Espíritu Santo, sobre la gracia, sobre la propia Iglesia -cuestión dogmática de la época en que vivimos-, la preocupación central, el envite de la lucha es siempre la posibilidad, el modo o los medios de la unión con Dios. Toda la historia del dogma cristiano se desarrolla alrededor del mismo núcleo místico, defendido con armas diferentes contra adversarios múltiples en el transcurso de las épocas sucesivas.
Las doctrinas teológicas elaboradas en el transcurso de esas luchas pueden tratarse en su más directa relación con el fin vital que debían ayudar a alcanzar: la unión con Dios. Se presentarán entonces como bases de la espiritualidad cristiana. Así lo entendemos cuando queremos hablar de "teología mística". No se trata de la mística propiamente dicha: experiencias personales de los diferentes maestros de vida espiritual. Por otra parte, estas experiencias nos resultan, las más de las veces, inaccesibles, incluso cuando encuentran una expresión verbal. ¿Qué se puede decir, en efecto, acerca de la experiencia mística de san Pablo?: "Conozco a un hombre en Cristo que fue, hace catorce años, arrebatado hasta el tercer cielo (si fue en su cuerpo, no lo sé, si fuera de su cuerpo, no lo sé, Dios lo sabe). Y sé que este hombre (si fue en su cuerpo o sin su cuerpo no lo sé, Dios lo sabe) fue arrebatado al paraíso y oyó palabras inefables que no le es concedido a un hombre expresar: (2 Cor 12,2-4)". Para arriesgarse a emitir un juicio cualquiera respecto a la naturaleza de esta experiencia, habría que saber más de ella que san Pablo, que reconoce su ignorancia ("no lo sé, Dios lo sabe"). Dejamos a un lado deliberadamente toda cuestión de psicología mística. No son tampoco las doctrinas teológicas como tales lo que tenemos intención de exponer aquí, sino tan sólo los elementos de teología indispensables para comprender una espiritualidad; dogmas que constituyen la base de una mística. Ésta es la primera definición y limitación de nuestro tema, que es la teología mística de la Iglesia de Oriente.
La segunda determinación de nuestro tema se circunscribe, por decirlo así, en el espacio: el campo de nuestros estudios sobre la teología mística será el Oriente cristiano o, más precisamente, la Iglesia ortodoxa de Oriente. Hay que reconocer que esta limitación es un tanto artificial. En efecto, al no datar la ruptura entre el Oriente y el Occidente cristianos más que de mediados del siglo XI, todo lo anterior a esa fecha constituye un tesoro común, inseparable de ambas partes desunidas. La Iglesia ortodoxa no sería lo que es si no tuviera a san Cipriano, san Agustín o san Gregorio Magno; como la Iglesia católica romana no podría prescindir de san Atanasio, de san Basilio o de san Cirilo de Alejandría. Por consiguiente, cuando se quiere hablar de teología mística de Oriente o de Occidente, se coloca en el cauce de una de las dos tradiciones que, hasta cierto momento, siguen siendo dos tradiciones locales de la Iglesia una, que dan testimonio de una sola verdad cristiana, pero que se separan a continuación y dan lugar a dos actitudes dogmáticas diferentes, inconciliables en varios puntos. ¿Se puede juzgar ambas tradiciones colocándose en un terreno neutral, tan ajeno a una como a otra? Sería juzgar el cristianismo como no cristiano, es decir, resistirse por anticipado a entender cualquier cosa del objeto que se tiene intención de estudiar. Porque la objetividad no consiste de ningún modo en colocarse fuera del objeto, sino, por el contrario, en considerar el objeto en sí mismo y por si mismo. Hay terrenos en donde lo que comúnmente se llama "objetividad" no es más que indiferencia y en donde indiferencia significa incomprensión. En el estado actual de oposición dogmática entre Oriente y Occidente es preciso, pues, si se quiere estudiar la teología mística de la Iglesia de Oriente, elegir entre dos actitudes posibles: colocarse en el terreno dogmático occidental y examinar la tradición oriental a través de la de Occidente, es decir, criticándola; o bien presentar dicha tradición bajo el aspecto dogmático de la Iglesia de Oriente. Esta última actitud es para nosotros la única posible.
Se nos objetará, quizá, que la disensión dogmática entre Oriente y Occidente no fue más que accidental, que no desempeñó un papel decisivo, que se trataba más bien de dos mundos históricos diferentes que tarde o temprano debían separarse para seguir cada uno su propio camino; que la disputa dogmática no fue más que un pretexto para romper definitivamente la unidad eclesiástica, la cual, de hecho, hacía mucho tiempo que no existía ya. Tales afirmaciones, que se dejan oír muy frecuentemente tanto en Oriente como en Occidente, son debidas a una mentalidad puramente laica, a la costumbre general de tratar la historia de la Iglesia según los métodos que prescinden de la naturaleza religiosa de la Iglesia. Para un "historiador de la Iglesia", el factor religioso desaparece, encontrándose reemplazado por otros, como el juego de los intereses políticos y sociales; o el papel de las condiciones étnicas o culturales, consideradas como fuerzas determinantes en la vida de la Iglesia. Se cree más listo, más al día, invocando estos factores como las verdaderas razones dirigentes de la historia eclesiástica. Un historiador cristiano, aunque reconoce la importancia de estas condiciones, apenas puede resignarse a considerarlas diferentemente que exteriores al ser mismo de la Iglesia; no puede renunciar a ver en la Iglesia un cuerpo autónomo, sometido a una ley distinta de la del determinismo de este mundo. Si se considera la cuestión dogmática sobre la procesión del Espíritu Santo, que dividió a Oriente y Occidente, no se la puede tratar como un fenómeno fortuito en la historia de la Iglesia, considerada como tal. Desde el punto de vista religioso, es el único motivo que cuenta en la concatenación de los hechos que condujeron a la separación. Aunque condicionada, quizá, por varios factores, esta determinación dogmática fue, para unos como para otros, un compromiso espiritual, una toma de partido consciente en materia de fe.
Si frecuentemente se está inclinado a quitarle importancia al hecho dogmático que determinó todo el desarrollo ulterior de ambas tradiciones, es debido a una cierta insensibilidad con respecto al dogma, considerado como algo exterior y abstracto. La espiritualidad es lo que cuenta, dicen; la diferencia dogmática nada cambia. Sin embargo, espiritualidad y dogma, mística y teología, están inseparablemente ligados en la vida de la Iglesia. Por lo que se refiere a la Iglesia de Oriente, como hemos dicho, no establece una distinción bien nítida entre la teología y la mística, entre el terreno de la fe común y el de la experiencia personal. De ahí que, si queremos hablar de la teología mística de la tradición oriental, no podremos tratar dicho tema de otro modo que dentro de los límites dogmáticos de la Iglesia ortodoxa.
Antes de abordar nuestro tema, es necesario que digamos unas cuantas palabras sobre la Iglesia ortodoxa, poco conocida hasta hoy en Occidente. El libro del padre Congar, "Chrétiens désunis", notabilísimo en muchos aspectos, en las páginas consagradas a la ortodoxia, pese a todas sus preocupaciones por la objetividad, no deja de estar sometido a ciertas opiniones preconcebidas respecto a la Iglesia ortodoxa. "Donde Occidente -dice-, sobre la base, a la vez desarrollada y limitada, de la ideología agustiniana, reivindicará para la Iglesia la autonomía de una vida y de una organización propias y fijará en ese sentido las líneas maestras de una eclesiología muy positiva, Oriente admitirá prácticamente, e incluso a veces teóricamente, para la realidad social y humana de la Iglesia, un principio de unidad político, no religioso; parcial, no verdaderamente universal". Para el padre Congar, como para la mayor parte de los autores católicos o protestantes que se han expresado al respecto, la Ortodoxia se presenta bajo el aspecto de una federación de iglesias nacionales, que tienen como base un principio político: la Iglesia de un Estado.
Hay que ignorar tanto los fundamentos canónicos como la historia de la Iglesia de Oriente para arriesgarse a semejantes generalizaciones. La opinión que quiere fundar la unidad de una iglesia local en un principio político, étnico o cultural está reputada por la Iglesia ortodoxa como herejía especialmente designada por el nombre de filetismo. Es el territorio eclesiástico, la tierra consagrada por la tradición más o menos antigua del cristianismo, lo que constituye la base de una provincia metropolitana, administrada por un arzobispo o metropolitano, con obispos para cada diócesis, que se reúnen en sínodo de cuando en cuando. Si bien las provincias metropolitanas se congregan en grupos y forman iglesias locales bajo la jurisdicción de un obispo que lleva a menudo el título de patriarca, es la propia comunidad de tradición local y de destino histórico, así como la comodidad para convocar un concilio de varias provincias, lo que dirige la formación de esos grandes círculos jurisdiccionales, cuyo territorio no corresponde necesariamente a los limites políticos de un Estado.
El Patriarca de Constantinopla goza de cierta primacía de honor, haciéndose a veces árbitro en las diferencias, sin ejercer una jurisdicción sobre el conjunto de la Iglesia ecuménica. Las iglesias locales de Oriente tenían más o menos la misma actitud con respecto al patriarcado apostólico de Roma, primera sede de la Iglesia antes de la separación, símbolo de su unidad. La ortodoxia no admite un jefe visible de la Iglesia. La unidad de ésta se expresa mediante la comunión de los jefes de las iglesias locales, por el acuerdo de todas las iglesias respecto a un concilio local y que adquiere, por eso mismo, un valor universal; por último, en casos excepcionales, puede manifestarse por un concilio general. La catolicidad de la Iglesia, lejos de ser privilegio de una sede o centro determinado, se realiza más bien en la riqueza y multiplicidad de las tradiciones locales, que dan testimonio unánime de una sola verdad: lo que es guardado siempre, en todo lugar y por todos. Siendo católica la Iglesia en todas sus partes, cada uno de sus miembros -no solamente el clero, sino también cada laico- es llamado a confesar y defender la verdad de la tradición, oponiéndose aun a los obispos si caen en la herejía. Un cristiano que haya recibido el don del Espíritu Santo en el sacramento del santo crisma no puede ser inconsciente en su fe; para la Iglesia es siempre responsable. De ahí el carácter agitado y a veces turbado de la vida eclesiástica en Bizancio, en Rusia y en otros países del mundo ortodoxo. Pero ése es el precio de una vitalidad religiosa, de una intensidad de vida espiritual que penetra al pueblo de los creyentes, unido por la conciencia de formar un solo cuerpo con la jerarquía de la Iglesia. De ahí también esa fuerza invencible que permite a la Ortodoxia atravesar todas las adversidades, todos los cataclismos y trastornos adaptándose siempre a la nueva realidad histórica, mostrándose más fuerte que las condiciones exteriores. Las persecuciones contra la fe en Rusia, cuya furia metódica no ha podido destruir a la Iglesia, son el mejor testimonio de esa fuerza que no es de este mundo.
La Iglesia ortodoxa, aunque es llamada comúnmente la Iglesia de Oriente, no deja de considerarse sin embargo como la Iglesia ecuménica. Y esto es verdad en el sentido de que no está limitada por un tipo de cultura determinada, por la herencia de una civilización, helenística u otra, por formas culturales estrictamente orientales. Por otra parte, "oriental" quiere decir demasiadas cosas a la vez: El Oriente es menos homogéneo, desde el punto de vista cultural, que Occidente. ¿Qué hay de común entre el helenismo y la cultura rusa, a pesar de los orígenes bizantinos del cristianismo en Rusia? La Ortodoxia ha sido la levadura de demasiadas culturas diferentes, para ser considerada como una forma cultural del cristianismo oriental: estas formas son diversas, la fe es una. A las culturas nacionales no ha opuesto jamás una cultura que se repute de específicamente ortodoxa. Por eso la obra de la misión pudo desarrollarse tan prodigiosamente : la cristianización de Rusia en los siglos X y XI y, más tarde, la predicación del Evangelio a través de toda el Asia. Hacia el fin del siglo XVIII la misión ortodoxa llegó a las islas Aleutianas y Alaska, pasó a continuación a América del Norte, creando nuevas diócesis de la Iglesia rusa fuera de Rusia, propagándose en la China y en el Japón. Las variedades antropológicas y culturales, desde Grecia basta las extremidades del Asia, desde Egipto hasta el océano Glacial, no destruyen el carácter homogéneo de esta familia de espiritualidad, muy diferente de la del Occidente cristiano.
La vida espiritual en la Ortodoxia conoce una gran riqueza de formas, de entre las cuales el monacato permanece la más clásica. Sin embargo, contrariamente al monacato occidental, el de Oriente no comprende una multiplicidad de diferentes órdenes. Esto se explica por el concepto mismo de la vida monástica, cuyo fin no puede ser sino la unión con Dios en el renunciamiento total a la vida de este siglo. Si el clero secular (sacerdotes y diáconos casados) o las cofradías de laicos pueden ocuparse de obras sociales o dedicarse a otras actividades exteriores, ocurre de otro modo con los monjes. Toman el hábito ante todo para consagrarse a la oración, la obra interior, en un claustro o un eremitorio. Entre un monasterio de vida común y la soledad del anacoreta que continúa las tradiciones de los Pais del desierto, hay varios tipos intermedios de instituciones monásticas. Se podría decir, en general, que el monacato oriental es exclusivamente contemplativo, si la distinción entre las dos vías, contemplativa y activa, tuviese el mismo sentido en Oriente que en Occidente. En realidad, ambas vías son inseparables para los espirituales orientales: la una no puede ejercerse sin la otra, puesto que la maestría ascética, la escuela de la oración interior, reciben el nombre de actividad espiritual. Si bien los monjes ejercen a veces trabajos físicos, es sobre todo con un fin ascético, para mejor conseguir romper la naturaleza rebelde; también para evitar la ociosidad, enemiga de la vida espiritual. Para alcanzar la unión con Dios, en la medida en que ésta es realizable aquí abajo, es preciso un esfuerzo continuo o, más precisamente, velar incesantemente por que la integridad del hombre interior, "la unión del corazón y el espíritu" (para emplear la expresión ascética ortodoxa) resista todos los embates del enemigo, todos los movimientos no razonados de la naturaleza caída. La naturaleza humana debe cambiar, debe ser transfigurada cada vez más por la gracia, en el camino de la santificación que tiene un alcance no solamente espiritual sino también corporal y, de este modo, cósmico. La obra espiritual de un cenobita o de un anacoreta que vive retirado del mundo, aun cuando quede inadvertida para todos, conserva todo su valor para el universo entero. Por eso las instituciones monásticas han gozado siempre de una gran veneración en todos los países del mundo ortodoxo.
El papel de los grandes focos de espiritualidad fue muy considerable no solamente en la vida eclesiástica, sino también en el terreno cultural y político. Los monasterios del monte Sinaí; de Studion, cerca de Constantinopla; la "república monástica" del monte Athos, que reunía a los religiosos de todas las naciones (incluidos monjes latinos antes de la separación); otros grandes centros fuera del Imperio como el monasterio de Tirnovo en Bulgaria y las grandes abadías (lavra) de Rusia -Pechen, en Kiev, Santísima Trinidad, cerca de Moscú- fueron ciudadelas de la Ortodoxia, escuelas de vida espiritual cuya influencia religiosa y moral fue de primerísimo orden en la formación cristiana de los pueblos nuevos. Pero si el ideal del monacato tenía tan grande influencia en las almas, no era, sin embargo, la única forma de vida espiritual que la Iglesia proponía a los fieles. La vía de la unión con Dios puede seguirse fuera de los claustros, en todas las condiciones de la vida humana. Las formas exteriores pueden cambiar, los monasterios pueden desaparecer, como han desaparecido hoy en Rusia, pero la vida espiritual continúa con la misma intensidad encontrando nuevos modos de expresión.
La hagiografía oriental, sumamente rica, muestra junto a los santos monjes varios ejemplos de perfección espiritual adquirida en el mundo por simples laicos, por personas casadas. Conoce también vías de santificación extrañas e insólitas, como la de los "locos en Cristo" que cometían actos extravagantes para ocultar sus dones espirituales a la otra gente, bajo la apariencia horrenda de la locura, o mejor dicho para liberarse de los lazos de este mundo en su expresión más íntima y más molesta para el espíritu, la de nuestro "yo" social. La unión con Dios se manifiesta algunas veces por los dones carismáticos, como por ejemplo el de la dirección espiritual ejercida por los startzy o "ancianos". La mayor parte de las veces son monjes que han pasado muchos años de su vida en oración, cerrados a todo contacto con el mundo y que, al final de su vida, abren ampliamente las puertas de su celda a todos. Poseen el don de penetrar en las profundidades insondables de las conciencias; revelar los pecados y dificultades interiores que, las más de las veces, nos son todavía desconocidos; enderezar las almas abrumadas; dirigir a los hombres no solamente en su vía espiritual, sino también en todas las peripecias de su vida en el siglo.
La experiencia individual de los grandes místicos de la Iglesia ortodoxa nos sigue siendo desconocida las más de las veces. Salvo algunas raras excepciones, la literatura espiritual del Oriente cristiano apenas posee relatos autobiográficos en lo que toca a la vida interior, como los de santa Angela de Foligno, Enrique Suso, o como "La historia de un alma" de santa Teresa de Lisieux. La vida de la unión mística es casi siempre un secreto de Dios y del alma, que no se confía al exterior si no es al confesor o a algunos discípulos. Lo que se hace público son los frutos de la unión: la sabiduría, el conocimiento de los misterios divinos que se expresa en una enseñanza teológica o moral, en consejos que deben edificar a los hermanos. En cuanto al lado íntimo y personal de la experiencia mística, permanece oculto de la vista de todos. Hay que reconocer que el individualismo místico aparece en la literatura occidental bastante tarde, hacia el siglo XIII. San Bernardo no habla directamente de su experiencia personal sino muy raramente, una sola vez en los "Sermones sobre el Cantar de los Cantares", y aún así con una especie de pudor, a ejemplo de san Pablo. Hizo falta que se produjera una cierta escisión entre la experiencia personal y la fe común, entre la vía indirecta y la vía de la Iglesia para que la espiritualidad y el dogma, la mística y la teología se hicieran dos terrenos distintos, para que las almas, al no encontrar ya alimento suficiente en las sumas teológicas, se pusieran a buscar con avidez los relatos de las experiencias místicas individuales, a fin de introducirse de nuevo en una atmósfera de espiritualidad. El individualismo místico permaneció ajeno a la espiritualidad de la Iglesia de Oriente.
Congar tiene razón cuando dice: "Nos hemos vuelto hombres diferentes. Tenemos el mismo Dios, pero somos ante él hombres diferentes y no podemos convenir en la naturaleza de la relación entre nosotros y Él". Pero para juzgar bien esta diferencia espiritual habría que examinarla en sus más perfectas expresiones, en los tipos diferentes de los santos de Occidente y de Oriente después de la separación. Podríamos entonces darnos cuenta del estrecho vínculo que existe siempre entre el dogma confesado por la Iglesia y los frutos espirituales que produce, porque la experiencia interior de un cristiano se lleva a cabo en el círculo trazado por la enseñanza de la Iglesia, encuadrado en el dogma que modela su persona. Si ya una doctrina política profesada por los miembros de un partido puede formar las mentalidades, hasta producir tipos de hombres que se distinguen de los demás por ciertos signos morales y psíquicos, con mayor razón el dogma religioso logra transformar la mente misma de los que lo confiesan: son hombres diferentes de los demás, de los que han sido formados por otro concepto dogmático. Nunca se comprendería una espiritualidad si no se tuviera en cuenta el dogma que está en su base. Hay que aceptar las cosas tal como son y no tratar de explicar la diferencia entre las espiritualidades de Occidente y Oriente por causas de orden étnico o cultural, cuando una causa mayor, una causa dogmática, está en juego. Tampoco hay que decirse que la cuestión de la procesión del Espíritu Santo o de la naturaleza de la gracia carecen de gran importancia en el conjunto de la doctrina cristiana, que sigue siendo más o menos idéntica en los católicos romanos y los ortodoxos. En los dogmas tan fundamentales, este "más o menos" es lo importante, porque presta un acento diferente a toda la doctrina, la presenta bajo otra apariencia, es decir, da lugar a otra espiritualidad.
No queremos hacer "teología comparada" ni, menos aún, resucitar las polémicas confesionales. Nos limitamos aquí a hacer constar el hecho de una diferencia dogmática entre el Oriente y el Occidente cristianos, antes de examinar algunos elementos de teología que están en la base de la espiritualidad oriental. Corresponderá a nuestros lectores juzgar en qué medida estos aspectos teológicos de la mística ortodoxa pueden ser útiles para la comprensión de una espiritualidad ajena a la cristiandad occidental. Si permaneciendo fieles a nuestras actitudes dogmáticas pudiésemos llegar a conocernos mutuamente -y de especial manera en lo que nos hace diferentes-, sería con certeza una vía hacia la unión, más segura que aquella que hiciese poco caso de las diferencias. Porque, por citar la frase de Karl Barth, "la unión de las iglesias no se hace, sino que se descubre".
Fonte: www.geocities.com/origo_es/lossky.htm

jeudi 23 août 2007

Breve leitura da formação da nacionalidade brasileira: Indígenas

Primeiros habitantes

A ocupação humana do território que depois se tornaria o Brasil começou numa data que os especialistas calculam atualmente entre 12 mil e 30 mil anos atrás. De acordo com as hipóteses mais aceitas sobre os caminhos de ocupação, duas rotas teriam sido usadas: ao norte, pela Amazônia, e a oeste pelo Pacífico. As controvérsias entre estudiosos, no entanto, não permitem traçar com segurança as formas de povoamento da região. O que se sabe com certeza é que todo ele estava ocupado havia mais de cinco milênios.
O emprego de uma única palavra, índios, para designar o enorme conjunto de habitantes do atual território brasileiro, na época da chagada dos portugueses, já é indicativo de quão pouco os recém-chegados aprenderam com os povos que aqui viviam. Só nas últimas décadas do século 20 é que se começou a ter uma idéia, ainda precária, da dimensão cultural, social, econômica e tecnológica dessas civilizações - de sua importância na formação do Brasil. Pesquisas científicas recentes revelam um universo muito mais complexo do que se pensava.
Um dos motivos desse desconhecimento foi a devastação ocasionada pelo contato entre europeus e índios. Segundo algumas estimativas, por volta de 1500, cerca de 8,5 milhões de pessoas viviam no atual território nacional, ao passo que na Independência, em 1822, a população brasileira não passava de 4 milhões de pessoas. Só na segunda metade do século 19, com a chegada de imigrantes, a população voltou aos níveis do século 16.
Nesse período de destruição, perdeu-se a dimensão do que estava desaparecendo. Os índios formavam um grande conjunto de nações, algumas com as dimensões e a população dos países europeus da época - e de costumes, línguas e hábitos tão variados como estes países. Só no fim do século 20, quando restam cerca de 500 mil índios sobreviventes do massacre, esta diversidade começa a ser estudada, demarcada e estabelecida. A dimensão original de variedade ainda não foi totalmente recuperada. Ainda se pensa no universo social e cultural pré-cabralino como um conjunto único, algo distante da realidade.
Tupis e guaranis
Os tupis acabaram sendo os índios brasileiros mais conhecidos, sobretudo porque, foram os primeiros a entrar em contato com os europeus. Por volta do ano de 1500, havia tribos tupi e guarani, que falavam línguas aparentadas, em praticamente todo o litoral brasileiro. A variedade era imensa. Ao todo, dez famílias lingüísticas e cerca de cinqüenta línguas diferentes.
Como o contato entre europeus e tupis foi maior, em torno destes construiu-se a imagem popular que se tem dos primeiros ocupantes do Brasil. Motivos não faltaram: descrições de padres e viajantes, apresentando seus costumes como sendo de todos os índios e o uso da língua tupi pelos europeus para compilação de uma gramática (depois ensinada até mesmo a outros povos). Entre as tribos tupi mais conhecidas estão os tupinambás, guaranis, apiacás, cintas-largas e gaviões. De todos os tupis existentes em 1500, restaram poucas tribos aqui e ali. Além deles, sobreviveram grupos guaranis na bacia do Paraná e em outros pontos isolados.
A grande população indígena original apresentava algumas características comuns. Em milhares de anos de contato com as florestas e os cerrados, os índios aprenderam a conviver com a natureza tropical. Domesticaram plantas e espécies animais. Descobriram um método para o preparo da mandioca. Praticaram a cultura do algodão, produziram pigmentos e usaram ervas medicinais. Cada grupo desenvolveu a seu modo técnicas de sobrevivência adaptadas à natureza comum que o cercava.
Técnicas nativas

No decorrer do tempo, a vida na floresta tropical acabou tendo, para os índios, um sentido diverso do que animava a vida dos europeus. Na Idade Média, a fome era uma constante na Europa, e a existência de seus habitantes organizava-se segundo um ritmo determinado pelas estações. Era preciso plantar e colher, guardando o máximo para enfrentar o duro inverno.
Na floresta tropical havia uma imensa variedade de espécies e dificuldade para cultivos uniformes e conservação da colheita. Observar a natureza, conhecer os hábitos dos animais e as características da plantas era mais importante que guardar comida por um longo tempo. Dessas observações saía o conhecimento para se obter o grosso dos alimentos. Somente algumas espécies eram cultivadas em maior escala. Mais que um estabelecimento sólido, era preciso seguir os ditames da natureza: mudar-se quando diminuía a fertilidade do solo (o que acontecia em poucos anos nas áreas cultiváveis abertas pro queimadas), buscar novos territórios de caça, colocar as armadilhas no lugar certo. Do cruzamento dessas informações vinham decisões que afetavam a tribo.
Nesse cenário de muita flexibilidade, pouco adiantava construir habitações permanentes. Melhor era fazer aquelas que se pudesse abandonar sem problemas. Também não havia porque se concentrar esforços acumulando bens. Quase todos os índios tinham muito tempo livre, que empregavam em seus ricos rituais. Um modo de usar o tempo adequado a uma região onde era mais prudente seguir o ritmo da natureza do que lutar contra ele.
O preparo da mandioca, ou Manihot utilíssima (pelo superlativo já se depreende sua importância), é uma grande conquista tecnológica. A raiz da planta, venenosa quando crua, tornou-se a base alimentar de todos os territórios na vertente oriental dos Andes, sobretudo pela facilidade de conservação. A raiz era utilizada entre seis e dezoito meses após o plantio e sua farinha também dura muito tempo.
Vários mitos explicam o cultivo da mandioca. Um deles, originário da América Central, dizia que Sumé ou Tumé, um homem branco e poderoso que andava sobre as águas e deixava rastros em pedras, certa vez partiu seu bastão e enterrou um pedaço dele, dando assim origem à planta - a mandioca não é semeada, e seu cultivo se faz enfiando na terra um pedaço de seu talo.
Um outro mito, da tradição tupi, diz que a filha de um chefe engravidou ainda virgem; nasceu uma menina, chamada Mani, que morreu após um ano; de seu túmulo surgiu um arbusto desconhecido e, um pouco depois a terra se abriu, deixando à mostra as raízes da mandioca, cujo nome viria de Manioca, a casa de Mani.
O principal produto da mandioca era a farinha seca, farinha de guerra, farinha de pau, “uí-atã”, para os tupis. Usado ainda hoje, o processo assemelha-se àquele referido pela tradição: a mandioca era descascada e ralada, com o auxílio de instrumentos feitos de espinhos, dentes de animais, cascas de ostras; a massa, ainda úmida, era espremida com o auxílio do tipiti (um tipo de prensa de palha), extraindo-se desse modo todo o caldo, o venenoso ácido cianídrico. A massa seca era em seguida levada ao fogo, em grandes vasilhas rasas e redondas. Depois disso, ficava pronta a farinha. Outros produtos feitos a partir da mandioca eram a tapioca, o beiju, a manipueira etc.
A base cultural

As técnicas comuns de sobrevivência forneceram uma base cultural similar a muitas tribos.A construção de casas e canoas, a fabricação de armas, de instrumentos de caça e pesca, e até mesmo os padrões usados nas pinturas corporais eram parecidas em muitos grupos.
O nível de conhecimento tecnológico também era similar: nenhuma tribo dominava a metalurgia e a maioria praticava regularmente a agricultura, ou seja, encontravam-se todas no estágio neolítico.
Embora os portugueses dissessem que os índios andavam nus, nada mais estranho para estes que tal idéia. Não sentiam necessidade de cobrir o corpo, mas as pinturas corporais funcionavam como um código social: casa uma delas indicava uma situação específica (guerra, nascimento de filhos, ritos, lutos etc.). Para os que conheciam o código, a pintura informava mais sobre seu estado e sua condição do que as roupas européias. Além disso, também facilitava a comunicação entre tribos que não falavam a mesma língua. Isso porque os índios não se pintavam aleatoriamente, mas sempre usavam motivos baseados na natureza. Padrões representando a espinha do peixe, a casca de jabuti, os rastros da cobra, do veado e da onça eram comuns a muitas tribos.
Medicina indígena

Nas Aldeias Indígenas, em geral, o tratamento e a cura das doenças é feita pelos médicos-pajés, através das práticas-mágicas. Esses poderes podem ser usados para curar doenças como também para provocá-las, razão pela qual é comum atribuir a causa de doenças a feitiço. Os processos de cura e de entrar em contato com o sobrenatural variam entre os grupos indígenas. Os Xamãs, por exemplo, são uma categoria especial de médico-pajé, que podem entrar em êxtase. Nesse estado, segundo os índios, a alma vai para longe do corpo, percorrendo lugares distantes ou encarnando um espírito estranho.
Muitos vegetais usados pelos indígenas como medicamentos, apresentam resultados surpreendentes, o que vem motivando a procura dessa matéria-prima por parte de estrangeiros. Os conhecimentos técnicos, muitas vezes complexos, dos índios brasileiros estão presentes tanto no combate às doenças, quanto na caça -(venenos de caça), na pesca - (venenos de pesca), na ecologia, na astronomia, na fabricação de sal, de objetos de borracha, de tecidos e na guerra (uso de gases asfixiantes).
Relação com o sagrado

Os índios viviam, de maneira geral, em grupos autônomos que migravam de tempos em tempos. Esses grupos tinham uma identidade própria, transmitida de geração a outra por meio de histórias sobre a origem do mundo, o cultivo das plantas e as regras sociais.
O momento em que se contavam essas histórias era uma ocasião especial, preparada com muito cuidado e na qual se reunia toda a tribo. Os relatos explicavam desde o surgimento das plantas até o motivo de o casco do jabuti parecer remendado. Essas histórias aproximavam os membros do grupo e consolidavam seu conhecimento do mundo.
As reuniões em que se relatavam os mitos aconteciam sobretudo em ocasiões determinadas pelos ciclos naturais: estação de chuvas ou de seca, tempo de plantio ou colheita, época de caça abundante ou ressaca. Eram momentos sagrados. Para se ouvir os mitos, era preciso que a audiência saísse do âmbito cotidiano. Usavam-se vestimentas especiais (mantos, penas coladas ao corpo, máscaras de madeira e palha), algumas restritas a determinados membros da tribo.
Também os alimentos eram outros: tomavam-se bebidas alcoólicas e infusões, e fumavam-se ervas. Suspensos os afazeres normais, o tempo era regulado pela música, invocações e danças coletivas. Assim agradecia-se pelas boas colheitas, pedia-se por melhoras no clima, espantavam-se maus espíritos, saudavam-se divindades e ancestrais - e todos contribuíam para a manutenção da cultura da tribo.

Fontes
Este material foi montado a partir de textos produzidos para o site Brasil 500 (www.internetional.com.br/brasil) e de textos de autores que têm seus artigos e livros citados no corpo do material.

A Santa Trindade de Deus


Dois Credos

“Cremos em um Deus Pai todo poderoso, criador de todas as coisas visíveis e invisíveis. E em um Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus, gerado como o Unigênito do Pai, isto é, da substância do Pai, Deus em Deus, luz de luz. Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não feito, consubstancial com o Pai, mediante o qual todas as coisas foram feitas, tanto as que estão nos céus, como as que estão na terra, que para nós humanos e para nossa salvação desceu e se fez carne, se fez homem, e sofreu, e ressuscitou ao terceiro dia, e virá para julgar os vivos e os mortos. E no Espírito Santo. Aos que dizem, pois, que houve [um tempo] quando o Filho de Deus não existia e que antes de ser concebido não existia, e que foi feito das coisas que não são ou que foi formado de outra substância ou essência, ou que é uma criatura, ou que é mutável ou variável, a estes a igreja católica [universal] anatematiza”.
[Credo de Nicéia (325 AD) in J. L. González, Uma História do Cristianismo, 2:97; em português contemporâneo por JP].

“Fiéis aos santos pais, todos nós, perfeitamente unânimes, ensinamos que se deve confessar um só e mesmo Filho, nosso Senhor Jesus Cristo, perfeito quanto à divindade, e perfeito quanto à humanidade, verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, constando de alma racional e de corpo: consubstancial [homoosious] segundo a divindade, e consubstancial [homoousios] a nós segundo a humanidade, ‘em todas as coisas semelhante a nós, excetuando o pecado’, gerado segundo a divindade antes dos séculos pelo Pai e, segundo a humanidade, por nós e para nossa salvação, gerado da virgem Maria, mãe de Deus [theotókos]. Um só e mesmo Cristo, Filho, Senhor, Unigênito, que se deve confessar, em duas naturezas, inconfundíveis e imutáveis, conseparáveis e indivisíveis. A distinção de naturezas de modo algum é anulada pela união, mas, pelo contrário, as propriedades de cada natureza permanecem intactas, concorrendo para formar um só pessoa [prosopon] e subsistência [hypostasis]: não dividido ou separado em duas pessoas [prosopa]. Mas um só e mesmo Filho Unigênito, Deus Verbo, Jesus Cristo Senhor, conforme os profetas outrora a seu respeito testemunharam, e o mesmo Jesus Cristo nos ensinou e o credo dos pais nos transmitiu”. [Credo de Calcedônia (415 AD), Concílio de Calcedônia, Actio V, Mansi, VIII, 116s, in H. Bettenson, Documentos da Igreja Cristã, 1967, p.86, em português contemporâneo por JP].

Base doutrinária
A doutrina cristã da Trindade designa um só Deus em três pessoas. Embora não aparece nas Escrituras o termo Trindade, a maioria quase absoluta da igreja cristã considera uma designação correta para o único Deus que se revelou nas Escrituras como Pai, Filho e Espírito Santo. Tal designação significa que dentro de uma única essência da Divindade temos que distinguir três Pessoas que não são três deuses, nem três partes, nem três modos de Deus se revelar, mas coiguais e coeternamente Deus.
Assim, podemos falar de
a) Unidade de Ser: Há no Ser divino apenas uma essência indivisível. Deus é um em sua natureza constitucional. Não há separação entre suas características. Ele é tudo que Ele é e em tudo que Ele faz (Dt 6.4; Is. 43.40; Tg 2.19; 1Tm 2.5). A unidade da divindade é ensinada nas palavras de Jesus: Eu e o Pai somos um. (Jo.10:30). Jesus está falando da unidade da essência e não de unidade de propósito. (Jo.17:11,21-23, IJo.5:7).
b) Trindade de Personalidade: Há três Pessoas no Ser divino: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. (Mc.10:9;12:29; ICo.8:5,6; ITm.2:5; Tg.2:19; Jo.17:3; Gl.3:20; Ef.4:6).
c) Há distinção de Pessoas na Divindade: Algumas passagens mostram uma das Pessoas divinas se referindo à outra (Gn.19:24; Os.1:7; Zc.3:1,2; IITm.1:18; Sl.110:1; Hb.1:9).
Polemizando com Jerônimo sobre a auto-existência de Deus. Jerônimo disse que “Deus é a origem de Si mesmo e a causa de Sua própria substância”. Jerônimo estava errado, pois Deus não tem causa de existência, pois não criou a Si mesmo e não foi causado por outra coisa ou por Si mesmo. Ele nunca teve início. Ele é o Eterno Eu Sou (Ex.3:14), portanto Deus é absolutamente independente de tudo fora de Si mesmo para a continuidade e perpetuidade de Seu Ser. Deus é a razão de sua própria existência (Jo.5:26; At.17:24-28; ITm.6:15,16).


Relendo duas tradições, a oriental e a ocidental


A teologia dos Pais orientais da igreja cristã é uma teologia trinitária por excelência, elaboradora das definições dogmáticas e da unidade e diversidade das Pessoas em Deus. O termo homoousios permitiu exprimir o mistério de Deus. Assim, as relações entre as Pessoas da Trindade não são de oposição, nem de separação, mas de diversidade, de reciprocidade, de revelação recíproca e de comunhão no Pai. A forma ocidental de uma certa maneira contribuiu para realçar as relações de oposição e de separação.
Os atributos que se referem à natureza comum são inerentes às Três Pessoas sem diferenciações. Sendo a unicidade evocada na sua relação com à Fonte que é o Pai. A inascibilidade do Pai, a geração do Filho e a processão do Espírito são as relações que melhor permitem distinguí-las.
As relações de origem não são o único fundamento das hipóstases, que as constituiria e as esgotaria do seu conteúdo. A teologia do Oriente reserva um caráter sempre ternário ou triplo das relações, suprimindo qualquer possibilidade de as reduzir à dualidade, à formação de díades no seio da Trindade.
Na Trindade encontram-se reunidos e circunscritos o uno e o múltiplo, no entanto, os Pais não procuravam justificar pela razão o número Três. A própria ciência matemática não justifica o um absoluto, sendo assim a unidade composta de Deus, não pode ser explicada através de pensamentos ditos “lógicos”, se a própria ciência não reconhece o um absoluto.
A filosofia latina encara em primeiro lugar a natureza em si mesma e prossegue até o subordinado (a Pessoa); a filosofia grega encara em primeiro lugar o subordinado e aí penetra depois para encontrar a natureza. Este ponto explica justamente a facilidade de entendimento e compreensão do método ortodoxo para o ocidental, partindo das três pessoas como Jesus fez na “Grande Comissão”, chega-se unidade de Deus. Nós atrelados ao pensamento ocidental partimos de Deus para explicar a diversidade de Pessoas nele. O problema aqui não é o método ser certo ou errado, mas a facilidade que o pensamento ortodoxo fornece na compreensão da trindade é inegável.
O Oriente vê o perigo quando não é a Monarquia do Pai, mas a natureza una que se erige em princípio da unidade na Trindade. O princípio de unidade não é a natureza, mas o Pai que estabelece relações de origem em relação a Ele mesmo, como a única Fonte de qualquer relação.
Para os Pais Orientais confessar a unidade trinitária é reconhecer o Pai como a única fonte das Hipóstases que simultaneamente recebem dele a mesma e única natureza. A Hipóstase é a maneira pessoal de se apropriar a mesma natureza, sendo que cada uma delas na sua realidade única ultrapassa as simples relações de origem. Todos os Pais afirmam a única Fonte Hipostática do Pai e ao mesmo tempo uma relação íntima entre o Filho e o Espírito inseparavelmente concebidos e unidos. A processão do Filho e do Espírito Santo do único Pai foi sempre acentuada fortemente pelos Pais Orientais.
A beatitude designa, para o Oriente, o infinito da deificação, participação da vida divina e visão da glória trinitária através da humanidade glorificada do Cristo.
O Pai é a fonte da Verdade, o Filho é o princípio de revelação da Verdade do Pai, o Espírito Santo é o princípio da sua manifestação dinâmica e vivificante, ele é a Vida da Verdade, o seu Espírito.

A Trindade no Antigo e no Novo Testamento

A principal contribuição do Antigo Testamento para a doutrina da Trindade é enfatizar a unidade de Deus. Deus é singular e único, cf. Dt 6.4 [“O Senhor nosso deus é o único Senhor”]. Deus exige a exclusão de todos os falsos deuses, descartando qualquer possibilidade de triteísmo (Dt 5.7-11).
Mas, sem dúvida, também no Antigo encontramos textos claramente trinitários. Vejamos, por exemplo, Isaías 48.16, mas há um profundamente interessante; Provérbios 8.22-31, sobre a personificação da Sabedoria. Apesar dos problemas de tradução, estes, devidamente solucionados (qanah, significa possuir, dirigir e é diferente de bara, criar,permitem uma impressionante leitura trinitária do texto.
No Novo Testamento a evidência trinitariana é esmagadora. Deus continua sendo pregado como Deus único (Gl 3.20), Jesus porém proclama sua própria divindade (Jo 8.58) e aceita a adoração de seus discípulos (Mt 16.16; Jo 20.28). É equiparado a Deus (Jo 1.1), associado a Deus nas cartas de Paulo (1Co 1.3, etc.). Mas o Consolador, o Espírito de Deus é incluído no mesmo relacionamento (2Co 13.14).
O apóstolo Pedro destaca a eleição pelo Pai, a santificação através do Espírito e a aspersão do sangue de Jesus Cristo (1Pe 1.2) em relação à salvação dos crentes. No batismo de Jesus, as três Pessoas são mencionadas (Mt 3.16-17). Os discípulos são chamados a batizar em nome das três Pessoas (Mt 28.19) e a benção de Paulo, completa, inclui o amor de Deus, a graça do Filho e a comunhão do Espírito Santo (2Co 13.14).

1.A divindade de Deus Pai

De todas as pessoas da Trindade muito possivelmente Deus Pai é o menos conhecido. Mas o fato de que o Pai é Deus é indiscutível. Jo 6.27; Ef 4.6.
O nome hebraico Abba aparece no AT (Dt 32.6; 2Sm 7.14; 1Cr 17.13; 22.10; 28.6; Sl 68.5; 89.26; Is 63.16; 64.8; Jr 3.4,19; 31.19; Ml 1.6; 2.10). Literalmente, abba significa papai.
Ele é o Pai de Cristo – Mt 3.17; 11.27; Mc 14.36.
de Israel – Ex 4.22,23; Dt 32.6;
dos crentes – Rm 8.14-17; Gl 3.20; Ef 4.6
dos anjos – Jó 1.6; 38.7
E sendo “Pai da glória” (Ef 1.17), “Pai das luzes” (Tg 1.17) e “Pai de todos” (Ef 4.6), o título indica que a Primeira Pessoa da Trindade é a fonte da procedência de todas as coisas.

Atividades

Autor do decreto e da eleição – Sl 2.7-9; Ef 1.3-11; cf. Is 64.8. Criador de todos, através do Verbo e do Espírito Santo (Ef 3.14s; Hb 12.9).Paternoster ou paterfamilias: é quem estabelece a família de Deus, administrando tanto herança como disciplina aos seus filhos – Gl 4.4-7; Hb 12.9.
É ele Aquele que ama o mundo – Jo 3.16.A Ele tudo irá voltar – 1Co 15.24-28.

2.A divindade do Filho, Jesus Cristo

Divergências de ontem e de hoje

“Houve um tempo quando Jesus não era”. Ário, sacerdote do século quarto que deu origem ao arianismo, heresia unitarista que afirmava ter sido Cristo criado por Deus, negando assim a Trindade.
“O Evangelho que Jesus proclamou só tem a ver com o Pai, e nada com o Filho”. A von Harnack (1851-1930), teólogo e historiador alemão (What is Christianity, al. 1900, ingl. 1912, pp. 146-147).
“Um homem escolhido por Deus para um cargo especial no propósito divino; (...) as idéias mais tardias de sobre Jesus como Deus encarnado, como a Segunda Pessoa da Santa Trindade vivendo uma vida humana, procedem de uma maneira mitológica ou poética de expressar o seu significado para nós”. John Hick, teólogo liberal contemporâneo, (The Myth os God Incarnate, 1977, p. ix).

O testemunho dos Evangelhos

Jo 8.58 – “Eu Sou”, cf. LXX, Ex 3.14s.
Jo 10.30 – “Eu e o Pai somos um”. Gênero neutro em grego, indicando um em essência].
Jo 1.1-3 – O Verbo era Deus (...) sem Ele nada do que feito se fez”.

O testemunho de Atos e das cartas

At 20.28 – a igreja que Deus comprou “com o seu próprio sangue”.
Rm 9.5 – “Cristo ... Deus bendito para todo o sempre”.
Fp 2.5-8 – Ele “subsistindo em forma,[morfé]de Deus”.
Dificuldades exegéticas/teológicas a respeito da divindade de Cristo
Gr. protótokos, “o primogênito”: aparece nove vezes no NT, sendo que sete se referem a Cristo, cf. Lc. 2.7, Rm 8.29, Cl 1.15, 18, Hb 1.6, Ap 1.5. Em que sentido Jesus Cristo é o primogênito?
Gr. arké, princípio. Em que sentido Jesus Cristo é “o princípio da criação de Deus”? [Ap 3.14].

O Espírito Santo é Deus
É pessoal e distinto do Pai:
1Co 2.10-13 -- Ele tem inteligência própria.
Ef. 4.30 – Ele possui emoções [e mais: Mt. 12.31; Jo 14.26; At 5.3-9; Rm 8.16].
Ele é divino -- Mt 28.19 [e mais: AT. 5.3, 4, 9; 2Co 3.17-18; Is 48.16; Is. 40.13-18; 2Sm 23.2-3].
Atributos divinos: Onisciência -- Is 40.13-14,28; 1Co 2.10-11. Onipotência – Is 40.13-17. Onipresença – Sl 139.7-9. Santidade – Ef 4.30. Verdade – Jo 14.17; 15.26; 16.13. Vida – Rm 8.2. Espírito de graça – Hb 10.29. Glória – 1Pe 4.14.
“Todos os atributos específicos de Deus são atribuídos a Ele [o Espírito Santo], assim como ao Filho” (Calvino). Assim, resistir (At 7.51), apagar (1Ts 5.19), entristecer (Ef 4.30) ou ultrajar (Hb 10.29) o Espírito Santo é fazê-lo contra Deus.
Obras específicas do Espírito Santo: A geração de Jesus – Mt. 1.20; Lc 1.35. A criação do universo – Gn 1.2; Is 40.12; Sl 33.6. A inspiração das Escrituras – 2Tm 3.16; 2Pe 1.20,21; 1Co 2.12-16.
Ministério do Espírito Santo junto aos eleitos: regeneração / novo nascimento – Jo 3.5-7; batismo -- 1 Co 12.13; selo – Ef 4.30; habitação – 1Co 6.19. Somos filhos legítimos de Deus – 1Jo 3.9-10; templo de Deus – 1Co 3.16; confortados pelo Espírito Santo – At 9.31; que intercede por nós – Rm 8.14, nos dá dons espirituais – 1Co 12.7; e nos ressuscita – Rm 8.11.

BATISMO E PLENITUDE DO ESPÍRITO SANTO
Uma leitura a partir de John Stott

Quando falamos de batismo (mergulhar, imergir em grego) no Espírito Santo estamos nos referindo a uma benção recebida no início de nossa vida cristã, que não acontece tempos depois e que é concedida a todos os cristãos, conforme I Co 12:13, At 1:5 e Ef 4:5. Já a plenitude (plhvroma, estar completo, estar cheio em grego) do Espírito Santo é uma condição que deveria ser contínua, mas que para acontecer precisamos apropriar-nos continuamente desse dom, conforme Ef 5:18, Gl 5:16, I Ts 5:19, Ef 4:30. A conclusão é que o batismo, como acontecimento inicial, não pode ser repetido, nem pode ser perdido, mas o ato de ser enchido pode e, no mínimo, precisa ser conservado.
Stott divide o ser enchido em três grupos. Primeiro, como característica dos cristãos dedicados. Os sete homens que foram escolhidos para cuidar das viúvas da igreja de Jerusalém precisavam ser “cheios do Espírito”, assim como de boa reputação, cheios de sabedoria e cheios de fé (At 6:3-5). Barnabé também é descrito como um “homem cheio do Espírito Santo e de fé” (At 11:24). E os recém convertidos de Antioquia da Pisídia, “transbordavam de alegria e do Espírito Santo” (At 13:52). Em segundo lugar, a expressão indica uma capacitação para um ministério ou cargo especial. Assim, João Batista seria “cheio do Espírito, já do ventre materno”, como preparo para seu ministério profético (Lc 1:15-17). Da mesma maneira, Ananias fala a Saulo que ele seria “cheio do Espírito Santo”, referindo-se a sua indicação como apóstolo (At 9:17, 22:12-15 e 26:16-23).
Finalmente, temos aquelas ocasiões em que o Espírito Santo foi concedido para equipar para uma tarefa imediata, especialmente numa emergência. Zacarias foi enchido antes de profetizar, embora fosse sacerdote e não profeta. E também sua mulher, Isabel (Lc 1:5-8, 41 e 67). A mesma coisa aconteceu com Pedro, antes de falar no Sinédrio, com Estevão antes de ser martirizado, e com Paulo, antes de repreender o mago Elimas. Todos ficaram “cheios do Espírito Santo”, que os capacitou a enfrentarem situações desafiadoras (At 4:8 e 31, 7:55 e 13:9).
Em Efésios 5:18-21 Paulo fala sobre as características de uma pessoa cheia do Espírito Santo. Mostra que a principal é moral e não miraculosa. Reside no fruto do Espírito e não nos dons do Espírito. E o primeiro sinal desse fruto do Espírito é o amor, que se traduz em comunhão. É comunhão espiritual, que se expressa em culto conjunto. O segundo sinal é a glorificação do Senhor Jesus, que acontece através do coração. O terceiro sinal é o dar graças a Deus por todas as coisas, não importa o momento ou as circunstâncias. Sempre que um crente está cheio do Espírito, ele agradece ao Pai celeste. O quarto sinal, assim como o primeiro, está relacionado ao nosso irmão: a submissão, como afirma Stott, é a marca registrada no cristão cheio do Espírito Santo. Diz ele, “não é a auto-afirmação, mas a auto-submissão”.
“Deixai-vos encher” é uma ordem. A plenitude do Espírito Santo não é uma opção, mas uma obrigação de todo cristão. Em grego o verbo está no plural, ou seja, é uma ordem dirigida a toda a comunidade cristã, sem exceção. E está, também, na voz passiva: “sede enchidos” ou “deixai-vos encher”. A condição implícita na construção grega é o entregar-se sem reservas ao Espírito Santo, o que não implica numa atitude passiva, mas numa submissão consciente. E por fim, o verbo está no presente, o que significa uma ação presente e contínua, que começa agora.
Para mostrar que esta ação não deve ser estática, mas dinâmica, Stott dá o exemplo de um bebê recém-nascido, de três quilos, e de um homem adulto, de 1,80 m e 75 quilos de peso. Ambos estão “cheios de ar”, mas a capacidade de seus pulmões são diferentes. Da mesma maneira, o cristão maduro espiritualmente terá uma plenitude do Espírito Santo maior do que o crente recém nascido em Cristo.
É importante notar que um baixo nível de vida cristã é encontrado em todos os grupos cristãos. O fracasso acontece não no momento de sua conversão, mas no desenvolvimento de sua vida cristã, mesmo após terem vivido experiências excepcionais, ao rebaixarem suas responsabilidades morais, sua honestidade, pureza e altruísmo. E Stott agrega que “a derrota e a vida medíocre de muitos cristãos não são evidências de que necessitam ser batizados com o Espírito Santos, mas de que precisam recuperar a plenitude do Espírito”.
Uma parte das chamadas experiências pentecostais são demoníacas. E isso não deveria nos deixar boquiabertos, pois Jesus nos alertou que o demônio tentaria enganar os próprios escolhidos. A busca descontrolada, no mundo atual, por coisas ocultas pode levar muitos cristãos ao engano. Em segundo lugar, uma grande parte dessas experiências são psicológicas. Isto significa que têm origem na psiquê e não no Espírito de Deus. Exemplo disso são as formas de glossolalia, bem conhecida em círculos hindus, muçulmanos e em determinados casos clínicos. O que os cristãos envolvidos com fenômenos desse tipo devem se perguntar é até que ponto isso ajuda à edificação da igreja, promove a justiça e glorifica a Cristo. Mas, sem dúvida, existem experiências reais de conversão que envolvem experiências não previsíveis, mas que mesmo excepcionais estão dentro dos padrões bíblicos.
Exatamente porque existem experiências reais e verdadeiras não previsíveis, devemos levar em conta o alerta que faz Scott Horrell, de não criticarmos a experiência cristã de ninguém. É claro, porém, que devemos ajudar crentes fiéis a entenderem a fé a partir das categorias bíblicas e do esclarecimento doutrinário que o Novo Testamento nos oferece.

O que os primeiros cristãos pensavam sobre
a Santa Trindade e as três Pessoas de Deus

"E mais, meus irmãos: se o Senhor [Jesus] suportou sofrer por nós, embora fosse o Senhor do mundo inteiro, a quem Deus disse desde a criação do mundo: 'façamos o homem à nossa imagem e semelhança', como pode ele suportar sofrer pela mão dos homens?" (Autor desconhecido, ano 74, Carta de Barnabé 5,5).
"No que diz respeito ao Batismo, batizai em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo em água corrente. Se não houver água corrente, batizai em outra água; se não puder batizar em água fria, façai com água quente. Na falta de uma ou outra, derramai três vezes água sobre a cabeça, em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo" (Autor desconhecido, ano 90, Didaquê 7,1-3).
"Um Deus, um Cristo, um Espírito de graça" (Clemente de Roma, ano 96, Carta aos Coríntios 46,6).
"Como Deus vive, assim vive o Senhor e o Espírito Santo" (Clemente de Roma, ano 96, Carta aos Coríntios 58,2).
"Vós sois as pedras do templo do Pai, elevado para o alto pelo guindaste de Jesus Cristo, que é a sua cruz, com o Espírito Santo como corda" (Inácio de Antioquia, ano 107, Carta aos Efésios 9,1).
"Procurai manter-vos firmes nos ensinamentos do Senhor e dos apóstolos, para que prospere tudo o que fizerdes na carne e no espírito, na fé e no amor, no Filho, no Pai e no Espírito, no princípio e no fim, unidos ao vosso digníssimo bispo e à preciosa coroa espiritual formada pelos vossos presbíteros e diáconos segundo Deus. Sejam submissos ao bispo e também uns aos outros, assim como Jesus Cristo se submeteu, na carne, ao Pai, e os apóstolos se submeteram a Cristo, ao Pai e ao Espírito, a fim de que haja união, tanto física como espiritual" (Inácio de Antioquia, ano 107, Carta aos Magnésios 13,1-2).
"Por isso vos peço que estejais dispostos a fazer todas as coisas na concórdia de Deus, sob a presidência do bispo, que ocupa o lugar de Deus, dos presbíteros, que representam o colégio dos apóstolos, e dos diáconos, que são muito caros para mim, aos quais foi confiado o serviço de Jesus Cristo, que antes dos séculos estava junto do Pai e por fim se manifestou. [...] Correi todos juntos como ao único templo de Deus, ao redor do único altar, em torno do único Jesus Cristo, que saiu do único Pai e que era único em si e para ele voltou. [...] Existe um só Deus, que se manifestou por meio de Jesus Cristo seu Filho, que é o seu Verbo saído do silêncio, e que em todas as coisas se tornou agradável àquele que o tinha enviado" (Inácio de Antioquia, ano 110, Carta aos Magnésios 6,1; 7,2; 8,2).
"Que não somos ateus, quem estiver em são juízo não o dirá, pois cultuamos o Criador deste universo, do qual dizemos, conforme nos ensinaram, que não tem necessidade de sangue, libações ou incenso. [...] Em seguida, demonstramos que, com razão, honramos também Jesus Cristo, que foi nosso Mestre nessas coisas e para isso nasceu, o mesmo que foi crucificado sob Pôncio Pilatos, procurador na Judéia no tempo de Tibério César. Aprendemos que ele é o Filho do próprio Deus verdadeiro, e o colocamos em segundo lugar, assim como o Espírito profético, que pomos no terceiro. De fato, tacham-nos de loucos, dizendo que damos o segundo lugar a um homem crucificado, depois do Deus imutável, aquele que existe desde sempre e criou o universo. É que ignoram o mistério que existe nisso e, por isso, vos exortamos que presteis atenção quando o expomos" (Justino Mártir, ano 151, I Apologia 13,1.3-6).
"Os que são batizados por nós são levados para um lugar onde haja água e são regenerados da mesma forma como nós o fomos. É em nome do Pai de todos e Senhor Deus, e de Nosso Senhor Jesus Cristo, e do Espírito Santo que recebem a loção na água. Este rito foi-nos entregue pelos apóstolos" (Justino Mártir, ano 151, I Apologia 61).
"Amigos, foi do mesmo modo que a Palavra de Deus se expressou pela boca de Moisés ao indicar-nos que o Deus que se manifestou a nós falou a mesma coisa na criação do homem, dizendo estas palavras: 'Façamos o homem à nossa imagem e semelhança'. [...] Citar-vos-ei agora outras palavras do mesmo Moisés. Através delas, sem nenhuma discussão possível, temos de reconhecer que Deus conversou com alguém que era numericamente distinto e igualmente racional. [...] Mas esse gerado, emitido realmente pelo Pai, estava com ele antes de todas as criaturas e com ele o Pai conversa, como nos manifestou a palavra por meio de Salomão. (Justino Mártir, ano 155, Diálogo com o Judeu Trifão 62,1-2.4).
"Por isso e por todas as outras coisas, eu te louvo, te bendigo, te glorifico, pelo eterno e celestial sacerdote Jesus Cristo, teu Filho amado, pelo qual seja dada glória a ti, com Ele e o Espírito, agora e pelos séculos futuros. Amém. (Policarpo de Esmirna, ano 155, Martírio de Policarpo 14,3).
"Eu te louvo, Deus da Verdade, te bendigo, te glorifico por teu Filho Jesus Cristo, nosso eterno e Sumo Sacerdote no céu; por Ele, com Ele e o Espírito Santo, glória seja dada a ti, agora e nos séculos futuros! Amém." (Policarpo, ano 156, Martírio de Policarpo 14,1-3).
"[O Pai] enviou o Verbo como graça, para que se manifestasse ao mundo. [...] Desde o princípio, ele apareceu como novo e era antigo, e agora sempre se torna novo nos corações dos fiéis. Ele é desde sempre, e hoje é reconhecido como Filho" (Quadrato, ano 160, Carta a Diogneto 11,3-4).
"De fato, reconhecemos também um Filho de Deus. E que ninguém considere ridículo que, para mim, Deus tenha um Filho. Com efeito, nós não pensamos sobre Deus, e também Pai, e sobre seu Filho como fantasiavam vossos poetas, mostrando-nos deuses que não são em nada melhores do que os homens, mas que o Filho de Deus é o Verbo do Pai em idéia e operação, pois conforme a ele e por seu intermédio tudo foi feito, sendo o Pai e o Filho um só. Estando o Filho no Pai e o Pai no Filho por unidade e poder do Espírito, o Filho de Deus é inteligência e Verbo do Pai. Se, por causa da eminência de vossa inteligência, vos ocorre perguntar o que quer dizer "Filho", eu o direi livremente: o Filho é o primeiro broto do Pai, não como feito, pois desde o princípio Deus, que é inteligência eterna, tinha o Verbo em si mesmo; sendo eternamente racional, mas como procedendo de Deus, quando todas as coisas materiais eram natureza informe e terra inerte e estavam misturadas as coisas mais pesadas com as mais leves, para ser sobre elas idéia e operação" (Atenágoras de Atenas, ano 177, Súplica pelos Cristãos, 10,2-4).
"Como não se admiraria alguém de ouvir chamar ateus os que admitem um Deus Pai, um Deus Filho e o Espírito Santo, ensinando que o seu poder é único e que sua distinção é apenas distinção de ordens?" (Atenágoras de Atenas, ano 177, Súplica pelos Cristãos 10).
"Igualmente os três dias que precedem a criação dos luzeiros são símbolo da Trindade: de Deus [=Pai], de seu Verbo [=Filho] e de sua Sabedoria [=Espírito Santo]" (Teófilo de Antioquia, ano 181, Segundo Livro a Autólico 15,3).
"Com efeito, a Igreja espalhada pelo mundo inteiro até os confins da terra recebeu dos apóstolos e seus discípulos a fé em um só Deus, Pai onipotente, que fez o céu e a terra, o mar e tudo quanto nele existe; em um só Jesus Cristo, Filho de Deus, encarnado para nossa salvação; e no Espírito Santo que, pelos profetas, anunciou a economia de Deus..." Irineu de Lião, 130-200, pai grego da igreja primitiva (Contra as Heresias, ano 189, I,10,1).
“O Filho, que sempre coexiste com o Pai desde o princípio, revela o Pai aos anjos, arcanjos, poderes, virtudes e todos a quem Deus quer Se revelar”. “Deus sempre tem com Ele seu Verbo e a sua Sabedoria, o Filho e o Espírito”. (Irineu, Contra as Heresias, II, 30; IV, 20, 21).
"Já temos mostrado que o Verbo, isto é, o Filho esteve sempre com o Pai. Mas também a Sabedoria, o Espírito estava igualmente junto dele antes de toda a criação" (Irineu,, Contra as Heresias IV,20,4).
"Portanto, não foram os anjos que nos plasmaram -- os anjos não poderiam fazer uma imagem de Deus -- nem outro qualquer que não fosse o Deus verdadeiro, nem uma Potência que estivesse afastada do Pai de todas as coisas. Nem Deus precisava deles para fazer o que em si mesmo já tinha decretado fazer, como se ele não tivesse suas próprias mãos! Desde sempre, de fato, ele tem junto de si o Verbo e a Sabedoria, o Filho e o Espírito. É por meio deles e neles que fez todas as coisas, soberanamente e com toda a liberdade, e é a eles que se dirige quando diz: 'Façamos o homem à nossa imagem e semelhança'" (Irineu de Lião, ano 189, Contra as Heresias IV,20,1).
"Foi estabelecida a lei de batizar e prescrita a fórmula: 'Ide, ensinai os povos batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo'" (Tertuliano, ano 210, Do Batismo 13).
“Existe então uma Trindade, santa e completa, que confessamos como Deus em [as pessoas do} Pai, Filho e Espírito Santo, o qual não contém nada estranho ou externo mesclado consigo mesmo, nem é composto de um que cria e outro que foi criado, pois todos são criadores. Possui uma só essência em sua natureza indivisível, sendo sua atividade uma. O Pai faz tudo através do Verbo [e] no Espírito. Logo, a unidade do Santo Triúno é preservada. Assim, um só Deus é pregado na igreja, ‘o qual é sobre todos (Ef 4.6), age por meio de todos e está em todos, (...) sobre tudo’ como o Pai, como princípio, como fonte, ‘por meio de todos’, através do Verbo [Logos], ‘em todos’, no Espírito Santo. É uma Trindade não apenas no nome e na maneira de falar, mas em verdade e realidade”. Atanásio (296-373), bispo de Alexandria, opositor da heresia ariana e o maior teólogo de seu tempo (Epistolae ad Serapion, 1.15.137).
"Anatematizamos todos aqueles que seguem o erro de Sabélio, os quais dizem que o Pai e o Filho são a mesma Pessoa" (Concílio de Roma, ano 382, Tomo de Dâmaso, cânon 2).
“Ele (Jesus) deve ser tornar um homem para sofrer, e continuar necessariamente sendo Deus para que possa sofrer suficientemente por todo o mundo... Consequentemente, desde que Ele mesmo é Deus, o Filho de Deus, Ele ofereceu-se a Si mesmo por sua própria honra para Si mesmo, assim como o fez ao Pai e ao Espírito. Isto é, Ele ofereceu sua humanidade à sua divindade, a qual é em si mesma uma das três pessoas”. Anselmo,1033-1109, arcebispo de Cantuária e um dos maiores teólogos medievais (Cur Deus Homo, p. 18).

Outras Fontes:Hermas: (ano 80) O Pastor 12.
Tertuliano: (ano 216) Contra Praxéas 2; 9; 25.
Orígenes: (ano 225) Doutrinas Fundamentais IV,4,1.
Hipólito de Roma: (ano 228) Refutação de Todas as Heresias 9,7; 10,29.
Novaciano: (ano 235) Tratado sobre a Trindade 11; 26.
Dionísio: (ano 262) Carta a Dionísio de Alexandria 1; 2; 3.
Gregório Taumaturgo: (ano 265) Declaração de Fé.
Metódio: (ano 305) Prece ao Salmo 5.
Atanásio: (ano 359) Cartas a Serapião 1,28; (ano 360) Discurso contra os Arianos 3,4.
Sechnall de Irlanda: (ano 444) Hino a São Patrício 22.
Patrício: (ano 447) O Peitoral de São Patrício 1; (ano 452) Confissão de São Patrício 4.
Fulgêncio de Ruspe: (ano 513) A Trindade 4,1.

As objeções racionalistas à Trindade falham ao insistirem em interpretar o Criador em termos de criatura. Ou seja, ao ver a unidade de Deus em termos de unidade matemática. Somos chamados a conhecer Deus conforme Se revelou nas Escrituras e nelas o Deus único Se apresenta a nós como Pai, Filho e Espírito Santo. Portanto, entendendo a primazia da fé em nossa caminhada, reconhecemos a glória da Trindade eterna.

Textos recomendados

Robert Jensen, “O Deus triúno” in Dogmática Cristã, Braaten e Jensen, São Leopoldo, Sinodal, pp.99-202.
Millard Erickson, “A triunidade de Deus”, in Teologia Sistemática, São Paulo, EVN, pp.127-139.
J. Scott Horrell, “O Deus Trino que se dá, a imago Dei e a natureza da igreja local”, São Paulo, Vox Scripturae, vol. VI, no 2, dezembro de 1996.
Ricardo Barbosa de Souza, “A Trindade, o pessoal e o social na espiritualidade cristã”, São Paulo, Vox Scripturae, vol. V, no 1, março de 1995.

O Espírito Santo, uma leitura ortodoxa oriental a partir de Paul Evdokímov

Os teólogos cristãos ortodoxos orientais foram os que mais se debruçaram sobre os estudos da teologia do Espírito Santo. Desde o século VII, em virtude do debate com a Igreja Romana ocidental e posterior afastamento dela, produziram uma teologia rica e sofisticada sobre o Espírito Santo, infelizmente pouco conhecida em nossos seminários e faculdades de Teologia. Nesse texto, o professor Marcelo Da Silva Ferreira, mestrando em Teologia e História na Faculdade Teológica Batista de São Paulo (2004) nos apresenta uma leitura necessária da doutrina do Espírito Santo a partir do livro do teólogo ortodoxo oriental Paul Evdokímov, “O Espírito Santo na Igreja Oriental”, publicado em 1996, em São Paulo, pela Editora Ave Maria. Sem dúvida, é um estudo pertinente para a igreja evangélica. [Jorge Pinheiro].

As premissas orientais da teologia patrística


Os ensinamentos dos pais orientais sobre o conhecimento de Deus salientam que o projeto divino da criação do homem está ligado a promessa de Encarnação do Verbo divino, pois estas duas doutrinas complementam-se. O Oriente sustenta que a Encarnação seria realizada mesmo fora da queda, como a expressão do amor divino e termo último da comunhão entre Deus e o homem.

Essa idéia demonstra o aprendizado de Deus dentro de uma natureza a qual ele havia criado, mas não havia experimentado e na humanidade de Cristo, Deus pode compartilhar de experiências que ele conhecia, mas como divino não havia passado. A concepção da eucaristia na Igreja demonstra o lugar da união substancial entre Deus e o homem, esse aspecto nos leva a refletir dentro da ótica ortodoxa que a ordenança da ceia do Senhor além de lembrar do sacrifício de Cristo e de sua iminente volta, nos faz pensar que tudo isso foi possível graças a Encarnação do Verbo divino entre nós.

Esse ponto muitas vezes é esquecido por nós que nos concentramos no aspecto do sacrifício e de sua volta, o que é importante. No entanto, a idéia da Encarnação sendo evocada na ministração da Ceia é de grande valia.

O homem, como portador de uma certa medida de conhecimento de Deus é capaz de pressentir este mistério e responder ao desejo divino depositado por Ele no coração humano. A idéia de predestinação, diferente do calvinismo, repousa no fato de que todo homem pode responder positivamente ao chamado divino, porque ele carrega o sopro de vida divino e é justamente isso que o impele a uma resposta positiva.

Para o Oriente existe uma distinção entre a razão (cérebro) e a inteligência (coração). No entanto, o verdadeiro conhecimento é sempre caritativo e o amor é sempre intelectivo. Na verdade, o conhecimento sem amor é puro intelectualismo vazio, inócuo e sem vida, o amor sem intelecto é paixão cega, sem o alicerce da razão.

O pecado original separou a razão do coração, falseando a faculdade do discernimento e da apreciação. Essa condição de perversão reclama um ato de fé (metanóia). Para o Oriente, a fé é uma reviravolta de tudo no ser humano na sua experiência do transcendente.

Podemos dizer que aqui há uma certa semelhança da teologia ortodoxa com a teologia pentecostal no que diz respeito a uma experiência transcendente. No entanto, os ortodoxos, evocam uma experiência com o transcendente sem desligar-se de sua base: a teologia bíblica, o que difere nos grupos neopentecostais mais novos que geralmente têm nas suas experiências com o transcendente um desligamento do alicerce teológico.

De qualquer forma, seja pentecostal, ortodoxo ou histórico, a experiência com o transcendente é necessária justamente para vivenciar aquilo que se lê, caso contrário, estaremos vivendo uma fé puramente intelectual e nossos cultos repletos de tédio e marasmo. O culto verdadeiro compreende uma experiência com o sobrenatural de Deus e com a revelação sobrenatural da teologia bíblica que é o nosso alicerce. Teologizar é a tradução dos termos teológicos a comunhão com Deus, relatando o seu conteúdo.

O kerigma, a didaskália e a catequese fazem parte elemento doutrinal da teologia, no entanto, a Igreja cultiva a seiva do conhecimento escutando os santos, os Pais, da experiência com o Espírito Santo e do colóquio com o Verbo, oferecendo a todos na liturgia.

A teologia mística é mais do que conhecimento cerebral é o conhecimento pela revelação de Deus e pela participação receptiva do lado do homem. Todo conhecimento de Deus deve partir dele e de sua proximidade.

Os Concílios Ecumênicos sempre tiveram como objetivo esclarecer a via salvadora de forma prática, respondendo às questões de vida ou de morte. A teologia segundo os Pais da Igreja erige-se em ministério carismático, pois o conhecimento de Deus é obtido pelo que ele mesmo se dá a conhecer. Longe de uma experiência puramente enciclopédica, os Pais da Igreja enfatizam a necessidade de uma receptividade aberta às revelações fulgurantes do Transcendente.

As dimensões positiva e negativa da teologia dos Pais


A dimensão apofática (negação), constituiu o lado negativo da teologia no sentido de negar toda a tentativa de definição de Deus, justamente pelo fato de que todas as nossas definições não exprimem a totalidade daquilo que é Deus em si mesmo. Ela realiza um ultrapassar, sem nunca se desligar de sua base, a teologia da Revelação Bíblica. Esse aspecto negativo constitui o único remédio para a insuficiência obrigando a transcender-se, por isso, o lado negativo não é um simples corretivo, mas uma teologia autônoma. O método apofático ensina a atitude correta de todo teólogo: o homem não especula, mas transforma-se, podendo contemplar pelos olhos da Pomba a Mônada una e trina escondida na epifania.

A dimensão catafática (positiva), constitui por sua vez, o lado positivo da teologia e tem um caráter simbólico, segundo os Pais Orientais, sendo aplicada apenas aos atributos revelados, às manifestações de Deus no mundo. Ela se constitui num modo inteligível do conhecimento de Deus, que está acima de qualquer sistema de pensamento. Essa teologia tem seu valor e suas dimensões próprias e aos seus limites.

Deus é misterioso, incognoscível pela sua própria natureza. Quando o homem procura a Deus, é ele que é encontrado por Deus.

As particularidades da Teologia dos Pais Orientais


A teologia dos Pais é uma teologia trinitária, elaboradora das definições dogmáticas e da unidade e diversidade das Pessoas em Deus. O termo homoousios permitiu exprimir o mistério de Deus.

O Oriente acredita que as relações entre as Pessoas da Trindade não são de oposição, nem de separação, mas de diversidade, de reciprocidade, de revelação recíproca e de comunhão no Pai. A forma ocidental de uma certa maneira contribuiu para realçar as relações de oposição e de separação.

Os atributos que se referem à natureza comum são inerentes aos Três sem diferenciações. Sendo a Pessoa Única quando evocada na sua relação com à Fonte que é o Pai. A inascibilidade do Pai, a geração do Filho e a processão do Espírito são as relações que melhor permitem distinguí-las.

As relações de origem não são o único fundamento das Hipóstases, que as constituiria e as esgotaria do seu conteúdo.

A teologia do Oriente reserva um caráter sempre ternário ou triplo das relações, suprimindo qualquer possibilidade de as reduzir à dualidade, à formação de díades no seio da Trindade.

Na Trindade encontram-se reunidos e circunscritos o uno e o múltiplo, no entanto, os Pais não procuram justificar pela razão o número Três. A própria ciência matemática, não justifica o um absoluto, sendo assim a unidade composta de Deus, não pode ser explicada através de pensamentos ditos “lógicos”, se a própria ciência não reconhece o um absoluto.

A filosofia latina encara em primeiro lugar a natureza em si mesma e prossegue até o subordinado (a Pessoa); a filosofia grega encara em primeiro lugar o subordinado e aí penetra depois para encontrar a natureza. Este ponto explica justamente a facilidade de entendimento e compreensão do método ortodoxo para o ocidental, partindo das três pessoas como Jesus fez na “Grande Comissão”, chega-se unidade de Deus. Nós atrelados ao pensamento ocidental partimos de Deus para explicar a diversidade de Pessoas nele. O problema aqui não é o método ser certo ou errado, mas a facilidade que o pensamento ortodoxo fornece na compreensão da trindade é inegável.

O Oriente vê o perigo quando não é a Monarquia do Pai, mas a natureza una que se erige em princípio da unidade na Trindade. O princípio de unidade não é a natureza, mas o Pai que estabelece relações de origem em relação a Ele mesmo, como a única Fonte de qualquer relação.

Para os Pais Orientais confessar a unidade trinitária é reconhecer o Pai como a única fonte das Hipóstases que simultaneamente recebem dele a mesma e única natureza.

A Hipóstase é a maneira pessoal de se apropriar a mesma natureza, sendo que cada uma delas na sua realidade única ultrapassa as simples relações de origem. Todos os Pais afirmam a única Fonte Hipostática do Pai e ao mesmo tempo uma relação íntima entre o Filho e o Espírito inseparavelmente concebidos e unidos. A processão do Filho e do Espírito Santo do único Pai foi sempre acentuada fortemente pelos Pais Orientais.

A beatitude designa, para o Oriente, o infinito da deificação, participação da vida divina e visão da glória trinitária através da humanidade glorificada do Cristo.

O Pai é a fonte da Verdade, o Filho é o princípio de revelação da Verdade do Pai, o Espírito Santo é o princípio da sua manifestação dinâmica e vivificante, ele é a Vida da Verdade, o seu Espírito.

Programa de Teologia Sistemática III

Objetivo
O estudo da Teologia Sistemática III é essencial porque não se pode pensar em um pastor ou teólogo que não seja solicitado a refletir sobre temas como Pneumatologia, Soteriologia e Escatologia. Isso significa que todos os profissionais da teologia têm, ou deveriam ter, uma concepção da ação do Espírito Santo, da salvação e do futuro espiritual das pessoas e do mundo. A pesquisa da Teologia nesses campos oferece condições teóricas para a superação da consciência ingênua e possibilita o desenvolvimento de uma consciência crítica que permite compreender a riqueza dos fenômenos vividos pela igreja e pelos fiéis, o que possibilita a construção de um conhecimento a respeito da experiência de fé da Igreja cristã.
Abordagem
Optamos por uma abordagem temática dos assuntos, sem descuidar da referência necessária à história dessas áreas da teologia, que permita estabelecer o fio condutor da exposição dos temas. Isto porque fazer teologia não deve ser visto como atividade solitária, mas que se faz através do diálogo entre pensadores, igreja e fiéis quando expõem suas diferenças.
Avaliação
Os alunos serão avaliados por sua participação em classe (peso 3), pelos seminários apresentados (peso 4) e por uma prova final (peso 3).

PROGRAMA DA DISCIPLINA

1. A teologia do Espírito Santo
O Espírito na história da Igreja: no Antigo Testamento, no Intertestamento e no Novo Testamento. A teologia do Espírito nas igrejas dos primeiros séculos. A Trindade e Espírito Santo. Agostinho e a teologia do amor. A teologia do Espírito Santo e o cisma oriental. Filioque e o Espírito enquanto expiração e conceito predicamental. Os aportes de Bulgakov e Lossky. A teologia reformada do Espírito Santo e o desafio pentecostal
Bibliografia
Carl E. Braaten e Robert W. Jenson, Dogmática Cristã, volume I, São Leopoldo, Sinodal, 1987, Locus 8, pp. 117-189.
Júlio Andrade Ferreira, Antologia Teológica, São Paulo, Fonte Editorial, 2007.

A Teologia da salvação.
Concepções de soteriologia. Predestinação e liberdade de escolha: diferentes interpretações. Aspectos objetivos e subjetivos da salvação.
Bibliografia
Braaten e Jenson, op. cit, Locus 11, pp. 401-472.
Júlio Andrade Ferreira, Antologia Teológica, São Paulo, Fonte Editorial, 2007.

A questão escatológica.
Estado Intermediário. Morte, céu, inferno. Teorias milenaristas. Tribulação. Estado final.
Bibliografia
Braaten e Jenson, op. cit, Locus 12, pp. 477-588.
Júlio Andrade Ferreira, Antologia Teológica, São Paulo, Fonte Editorial, 2007.

BIBLIOGRAFIA
Carl E. Braaten e Robert W. Jenson, Dogmática Cristã, volumes I e II, São Leopoldo, Sinodal, 1987.
Júlio Andrade Ferreira, Antologia Teológica, São Paulo, Fonte Editorial, 2007.

mercredi 22 août 2007

O ser humano e a cultura

Façamos o ser humano segundo a nossa imagem, semelhante a nós (Gênesis 1.26). Toda a criação de Deus é o cosmo do ser humano. Assim afirmam os dois relatos da criação e o Salmo 8. Mas em que sentido o ser humano é a imagem de Deus? Como Deus confere ao ser humano essa correspondência? A partir da antropologia bíblica podemos ver que:
[α] Em primeiro lugar o ser humano é fruto de uma intervenção de Deus. Há uma concessão de encargo que diferencia o ser humano do resto da criação. Ele é apresentado como um momento sublime, especial, como um ser que coroa toda a ação criadora de Deus (Salmo 8.6). Ele recebe responsabilidade (Gênesis 2.15-17) e poder de decisão (2.18-23).
O que significa isto? Imagem pode ser entendido como a constituição do humano como ser racional e ser moralmente responsável, e semelhança como harmonia com a vontade de Deus. Mas, no hebraico não há a partícula “e”, de modo que os termos se reforçam: imagem semelhança.
A alienação embaçou essa imagem semelhança, que pode ser restaurada pela comunhão com o Senhor. Imagem/semelhança é transcrição do eterno na existência, mas inclui algo que é comum a Deus e a nós: a liberdade de escolha.
Aqui é importante entender a relação entre alienação e consciência. Em Romanos 5.12, Paulo afirma que a hamartia entrou no cosmo pelo humano e com a hamartia a morte. Ora, hamartia era uma expressão militar dos gregos, que se referia ao ato do arqueiro errar o alvo, quer no treinamento, quer na batalha. Paulo utiliza a expressão no sentido de que a humanidade vive num estado em que errar o alvo caracteriza a existência humana. Por isso, uma tradução possível para hamartia é alienação, já que implica em distanciamento do objeto.
Errar o alvo, ou seja, a alienação, enquanto estado da existência, leva à conseqüências. Paulo privilegia uma delas, a consciência da morte. Para o apóstolo, o estado de alienação da existência produz uma consciência matricial, a consciência da morte. A partir da consciência da morte temos a consciência do divino e a consciência da diversidade, já que não somos bichos e, por extensão, não somos natureza, temos a consciência de que coisas e ações podem ser boas ou não. Dessa maneira, hamartia implica em conseqüências: necessidades diante da lei, daquilo que é ou está frente à existência e possibilidades diante da liberdade, daquilo que não existe, mas pode ser criado.
Assim, errar o alvo, no distanciamento, na alienação estão necessidades e lei e possibilidades e liberdade, que não se excluem: estão correlacionadas na existência humana, fazem parte do estado da existência.
[β] Em segundo lugar, Deus deixa claro a finalidade da decisão de criar um ser pessoal, segundo sua imagem. Tal ser deverá ter uma relação especial com o restante da criação (1.26). Deus cria e entrega ao ser humano sua criação. Este ser pessoal deverá estar sobre ela, numa relação de trabalho, produção e administração (2.15,16,19). O ser humano relaciona-se com a criação e através do uso e de suas descobertas em relação a ela, mantém uma permanente relação com Deus.
E como ele consegue isso? Através da cultura, enquanto processo social e objetivo de sujeição da natureza, e através dessa necessidade de expansão e domínio, pessoal e subjetivo, que é peculiar a todo homem e mulher livres.
Para Rubem Alves, a cultura é um jeito particular de ser gente, e por isso para falar da graça de Deus temos de responder a pergunta: quem é o ser humano? (Salmo 8:4)
Voltemos ao início. Gênesis 1:26, 27 - Também disse Deus: “Façamos o ser humano à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; (...) Criou Deus, pois, o ser humano à sua imagem, à imagem de Deus o criou”. Esse texto marca uma mudança de ritmo e de forma na criação: até então Deus falava e tudo vinha à existência, na criação do ser humano temos, antecedendo-a, uma declaração de intenção e uma descrição. Façamos o ser humano...
O ser humano, imagem e semelhança de Deus, é um ser coletivo. Quando Deus chamava, Adão!, macho e fêmea se voltavam para falar com Ele. E em Gênesis 2.24, Deus instrui macho e fêmea a tornarem-se uma unidade humana, indicando que as duas pessoas deveriam formar uma unidade harmônica.
Após ter comunicado aos humanos a relação de domínio que teriam sobre o cosmo, Deus os colocou numa floresta. E por que? Porque o domínio e, por extensão, o destino humano não pode se dar pela submissão, mas pela integração, como a floresta tropical, que é o resultado de uma ecossistema integrado. O humano, então, deveria ser jardineiro, cuja responsabilidade consistiria em administrar com habilidade a floresta, sua comunidade, seu mundo.
A aproximação à cultura tem de partir de uma perspectiva positiva: a unidade na diversidade. E o primeiro sentido dessa unidade na diversidade é a contextualização da espiritualidade humana, que se expressa enquanto presença do divino nas culturas, respeitando as peculiaridades da imagem de Deus em cada grupo humano. Ou seja, a partir dessa leitura podemos a compreender as culturas e suas complexidades.
[γ] Em terceiro lugar, a imagem de Deus é traduzida na relação que mantém com as criaturas, já que é uma relação de domínio. Ele reina sobre o universo produzido pelo poder criador de Deus. Mas aqui há um detalhe sutil: este direito de domínio não lhe é próprio, ele reina enquanto imagem de Deus. Ele não é proprietário, nem tem autonomia irrestrita sobre a criação. Aqui um elemento importante é a solidariedade. Uma vez compreendida a ação de Deus no despertar da consciência de justiça, os cristãos devem envolver-se em causas pró emancipação do ser humano, tornando-se parceiros dos que estão sendo despertados para mitigar o sofrimento humano.
E se toda a criação de Deus é o mundo do ser humano, há a total desmitização da natureza. Não há astros divinos, terra divina, animais divinos. Todo o universo pode tornar-se o ambiente do ser humano, seu espaço, que ele pode adaptar às suas necessidades e administrar. E tal postura nos leva à responsabilidade ecológica. Os cristãos devem posicionar-se na luta ecológica, no sentido de mitigar o sofrimento imposto à natureza, seguindo o modelo da floresta tropical.
[δ] Mas imagem de Deus traduz abertura à transcendência. Aqui estão dados os elementos que nos permitem entender porque faz parte da humanidade o abrir-se à transcendência e viver com ela. Há um deslumbramento permanente diante do absoluto, do sobrenatural e do mistério. Estamos diante de um ser que pode pensar o que não está aqui e agora, e que pode refletir sobre o que vai além da realidade factual. E é por poder pensar tais realidades que não podem ser vistas, que o ser humano enquanto imagem de Deus pode refletir sobre a eternidade e relacionar-se com o transcendente. Assim, ao ser feito imagem de Deus, o próprio Deus transfere à humanidade a capacidade de relacionar-se com Ele.
[ε] Esse ser humano de que fala Gênesis 1.26, que é imagem de Deus, não é uma pessoa em particular, pois a continuação do texto fala que eles dominem. Assim, estamos diante da criação da humanidade e o domínio do universo não é dado a uma pessoa, mas a comunidade dos homens. Assim, ninguém pode ser excluído da autoridade de domínio dada por Deus à humanidade.
Da mesma maneira, em Gênesis 1.27 temos uma outra característica fundamental dessa mesma humanidade: ela é formada por homens e mulheres. Para alguns teólogos, como Karl Barth1, tal explicação de Gênesis 1.27b, de uma humanidade formada por dois sexos, é apresentada por Deus “quase à maneira de definição”.
Logicamente, há uma intenção para que o texto bíblico aprofunde-se em tais minúcias. É a de apresentar como o universo criado deveria ser administrado: através da convivência de seres que se completam e se amam. Ou seja, esse ser plural só poderia exercer o domínio através da comunidade, completando-se como ser humano e mulher.
Vejam, macho e fêmea os criou (Gênesis 1.27). Por acaso são duas criações? Então, formou o Senhor Deus ao ser humano do pó da terra e lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o ser humano passou a ser alma vivente” (Gênesis 2:7).
Então, o Senhor Deus fez cair pesado sono sobre o ser humano, e este adormeceu; tomou uma das suas costelas e fechou o lugar com carne. E a costela que o Senhor Deus tomara ao ser humano, transformou-a numa mulher e apresentou a ele (Gênesis 2:21-22). Macho e fêmea são uma criação só, pois, o barro e o sopro só aparecem uma vez. A fêmea não é uma segunda criação, é uma duplicação, onde estão realçadas características recessivas no primeiro.
Esta é a lista dos descendentes de Adão. Quando criou os seres humanos, Deus os fez parecidos com ele. Deus os criou homem e mulher, e os abençoou e lhes deu o nome de humanidade (Gênesis 5:1-2)
Duas pessoas com um mesmo nome: humano. E a mulher ganha nome diferenciado, Eva, no processo de alienação: o primeiro humano pôs na sua mulher o nome de Eva por ser ela a mãe de todos os humanos (Gênesis 3:20). E por que? Porque, como fruto da alienação, o macho cresce a partir das dependências femininas: as limitações da gravidez e do parto. E, por isso, ela não se emancipa e é subjugada por ele (Gênesis 3:16).
A verdadeira imagem
A alienação rompe com a possibilidade da humanidade ser imagem de Deus viva e eficaz. O errar o alvo é um estado da existência e o mal se faz presente como opção ao seu ato livre. Assim, o ser humano lançou-se ao domínio de seus iguais, inclusive através do derramamento de sangue; suprimiu o equilíbrio e a mútua solidariedade, humildade e amor, entre macho e fêmea; mitificou a ciência e a técnica; e lançou-se à destruição da própria natureza.
Mas Cristo é “a verdadeira imagem do Deus invisível” (Colossenses 1.15 cf. 2Co 4.4) e a Ele cabe fazer, ao nível escatológico, aquilo que à humanidade tornou-se impossível. “Foi-me dado todo o poder no céu e na terra, por isso, indo, fazei discípulos em todas as nações...” (Mateus 28.18.).