vendredi 23 février 2018

A existência a partir da tradução

A existência a partir da tradução

Ou, “há que ler o desejo: sem terra, sem pátria e sem objeto, ele vaga por um deserto, cujas trilhas conduzem o leitor à experiência limite mais-além do que aparece na imagem”.

Prof. Dr. Jorge Pinheiro

O fazer da existência vale a pena. A eternidade aprecia esse bem-fazer humano, que tem seu próprio tempo, que integra a existência de cada ser na história dos fazeres humanos. É por isso que Bereshit, o primeiro texto na Torá, apresenta um ponto zero. O tempo zero vai do entardecer à meia-noite. É quando o sol desilumina o nosso espaço de forma gradual. O tempo do não-ser não é uma fratura do tempo, é tempo da história. Qoh não contempla a passagem do tempo, mas a vinda do tempo. O tempo significa nada ou pouco para o eterno, mas há um sentido de tempo para o humano. A conclusão de Qoh é que temos de ser no tempo para dar valor à eternidade que brota do nada do não-ser. E a partir de Qoh vamos a Paulo de Tarso.

Pede-se ser levantado

 “Você está falando de bens materiais, de coisa frágil. Se você tem certeza de que esses bens ficarão sempre com você, fique com eles sem partilhar com ninguém. Mas se você não é o senhor absoluto deles, se tudo que você tem depende mais da sorte do que de você mesmo, por que este apego a eles?”.[1]

Fuks conta que Freud, um dia depois do sepultamento do pai, sonhou com um cartaz onde estava escrito: “Pede-se fechar os olhos”. Mais tarde, em carta a Fliess, o pai da psicanálise falou dos sentidos subjetivos da frase: “era parte da minha auto-análise, minha reação diante da morte de meu pai, vale dizer, diante da perda mais terrível na vida de um homem”.[2]

Não vou entrar nos detalhes das leituras que o próprio Freud fez da frase que apareceu em seu sonho. Diria ao leitor que vale a pena ler Freud e a Judeidade. Pretendo aqui levantar uma proposta de Fuks: “há que ler o desejo: sem terra, sem pátria e sem objeto, ele vaga por um deserto, cujas trilhas conduzem o leitor à experiência limite mais-além do que aparece na imagem”. É a partir dessa hermenêutica, que vamos ler trechos do final da primeira carta de Paulo aos Coríntios.

“... Foi sepultado e foi despertado do sono no terceiro dia, de acordo com o escrito”.

A frase acima, e a continuação do texto, é uma das mais importantes sobre a egeiro e anástasis, duas expressões gregas não substancialmente diferentes, que sintetizam a teologia da anástase dos cristãos do primeiro século. As traduções posteriores, e creio que dificilmente poderiam ser diferentes, criaram um padrão de imagem que dificultam a experiência do ir além. Por isso, fomos obrigados antes da tradução transversa fazer a desconstrução histórico-filosófica da anástase.

As leituras da anástasis e egeiró remontam a Homero e ao grego antigo e com seus sentidos correlatos axanástasis, anhistémi e anazaó, que podem ser traduzidas por “ficar de pé”, “ser levantado” e “voltar à vida”, foram fundamentais para a construção do conceito anástase, amplamente utilizado pelas ciências do espírito. Mas é com Platão, na literatura filosófica, que vamos encontrar um debate fundamental para a teologia da anástase, quando apresenta a alma enquanto semelhança do divino e o corpo enquanto semelhança do que é físico e temporário.

Platão, em Fédon[3], num diálogo entre Sócrates e seus amigos defendeu a idéia da imortalidade da alma. Sócrates foi condenado à morte por envenenamento, mas não teve medo, por crer ser a alma imortal. Para Platão, as almas possuem semelhanças com as formas, que são realidades eternas por trás do mundo físico, natural. Nesse sentido, para Platão, o corpo morre, mas a alma não. Ele parte do padrão cíclico da natureza, frio/ quente/ frio, noite/ dia/ noite. Assim, os mortos despertam numa nova vida depois da morte: caso contrário, a vida desapareceria.

E dirá através de Sócrates em Fédon: “(...) perguntemos a nós mesmos se acreditamos que a morte seja alguma coisa? (...) Que não será senão a separação entre a alma e o corpo? Morrer, então, consistirá em apartar-se da alma o corpo, ficando este reduzido a si mesmo e, por outro lado, em libertar-se do corpo a alma e isolar-se em si mesma? Ou será a morte outra coisa? (...) Considera agora, meu caro, se pensas como eu. Estou certo de que desse modo ficaremos conhecendo melhor o que nos propomos investigar. És de opinião que seja próprio do filósofo esforçar-se para a aquisição dos pretensos prazeres, tal como comer e beber?”

Paulo conhecia a discussão filosófica grega acerca da anástase, já que isso se evidencia em seus escritos, principalmente no trecho que estamos analisando, mas é certo que construiu seu conceito também levando em conta a tradição judaica, acrescentando novidades ao debate teológico. Existem referências ao ser trazido de volta à vida nas escrituras hebraico-judaicas. Mas a preocupação judaica era existencial, como vimos em Qohélet. Mais do que remeter a um futuro distante, embora tais leituras estejam presentes na teologia de alguns profetas, as histórias de anástase relacionadas aos profetas Elias e Eliseu falam do aqui e agora. Aliás, este último, mesmo de depois de morto, trouxe à vida um defunto que foi jogado sobre sua ossada. Ao tocar os ossos de Eliseu, o morto ficou vivo de novo e se levantou. Esse caminho será a novidade da compreensão cristã/ helênica da anástase.

“Somos arautos de que o ungido foi levantado do meio dos mortos: como alguns podem dizer que não há o ser erguido dos mortos? E, se não há o despertar do sono da morte, também o ungido não foi levantado. E se o ungido não foi levantado, é inútil o que falamos e também inútil a nossa crença. Somos então testemunhas falsas, porque anunciamos que Deus ergueu o ungido. Mas se ele não foi levantado, os mortos também não são erguidos. E se os mortos não são erguidos, o ungido também não o foi. E, se o ungido não foi erguido, a nossa crença é inútil e vocês continuam a vagar sem destino. E os que foram colocados para dormir no ungido estão destruídos”.

Outras fontes de Paulo foram o profeta Daniel e outras literaturas intertestamentárias, que trabalharam com a idéia de “despertar subitamente do sono”. Chifflot e De Vaux[4] situam o livro de Daniel no período helênico por entender que é uma edição de antigos fragmentos do período babilônico, compilados, organizados e contextualizados ao momento histórico descrito no capítulo onze. Nesse capítulo, as guerras entre lágidas e selêucidas, assim como as investidas de Antíoco IV Epífanes contra Jerusalém e o templo são narradas com riquezas de detalhes. Ao contrário do que acontece nos livros proféticos anteriores, aqui o autor cita fatos aparentemente insignificantes, querendo demonstrar que é uma testemunha ocular da história. Dessa maneira, a edição que conhecemos do livro de Daniel deve ser situada no período da grande perseguição de Antíoco IV Epífanes, possivelmente entre os anos de 167 e 164 a.C., segundo Chifflot e De Vaux, já citados. A partir desse enquadramento, os capítulos 7 a 12 de Daniel, enquanto edição são chamados de “vaticinia ex eventu”, dado que o texto é contemporâneo aos acontecimentos descritos. Esses capítulos expressam a reação contra a helenização da Judéia e das perseguições em curso, mas, paradoxalmente, uma forma de pensamento afetado pela civilização helênica.

A partir da segunda metade do livro, o autor trabalha sobre dois temas registrados na primeira metade: que o judeu deve ser fiel a Deus em meio à tentação e à provação; e que Deus defende o servo leal que prefere morrer a violar os mandamentos. Nos seis capítulos finais, o sábio (ou grupo de sábios, cujos escritos foram compilados por um redator) retoma o conteúdo das visões que teve em relação à profanação do templo, em 167 a.C., e o erguimento da “abominação desoladora”.

Durante o período helênico idéias novas afloraram em meio à vida judaica, entre elas a esperança da recompensa escatolõgica apresentada pelas profecias apocalípticas, como em 2Macabeus 7, Daniel 12:2-3 e o Escrito de Damasco 4:4, que se traduzem concretamente na anástase.

Assim, os elementos novos da compreensão paulina da anástase já aparecem delineados no profeta Daniel: “Muitos dos que dormem no pó da terra despertarão, uns para a vida eterna, e outros para vergonha e horror eterno. Os que forem sábios, pois, resplandecerão como o fulgor do firmamento; e os que a muitos conduzirem à justiça, como as estrelas, sempre e eternamente”. Paulo, porém, somará um componente existencial à compreensão de Daniel, dirá que a morte, o maior de todos os odiados pela espécie humana, será privada de força.

“Caso o ungido só sirva para esta vida, somos as pessoas mais dignas de lástima. Mas o ungido foi levantado dentre os mortos e foi o primeiro fruto dos que foram colocados para dormir. Porque se a morte chegou pela humanidade, também o ungido dará à luz nova vida. Como morre a espécie, no ungido ela recebe vida. E isso acontece numa ordem: o ungido é o primeiro fruto, depois os que pertencem ao ungido, quando ele aparecer. E veremos o limite, quando o ungido entregar o reino a Deus e Pai, e tornar inoperante o império, os poderes e os exércitos. Convém que seja rei até derrubar os odiados por terra. O último odiado a ser privado de força é a morte, porque o resto já foi colocado debaixo de seus pés”.

É interessante que Paulo em seu texto sobre a anástase cita o dramaturgo, filósofo e poeta grego Menandro (342-291 a.C.), que num verso disse: “as más companhias corrompem os bons costumes”. E voltando ao Misantropo: “insisto que, enquanto você é dono deles, você deve usá-los como um homem de bem, ajudando os outros, fazendo felizes tantas pessoas quantas você puder! Isto é que não morre, e se um dia você for golpeado pela má sorte você receberá de volta o mesmo que tiver dado. Um amigo certo é muito melhor que riquezas incertas, que você mantém enterradas”. Tudo indica que Paulo gostava de teatro e de comédias.

Que Paulo recorreu à tradição profética fica claro quando cita o profeta Oséias literalmente: “eu os remirei do poder do inferno e os resgatarei da morte? Onde estão ó morte as tuas pragas? Onde está ó morte a tua destruição?”. Mas há uma correlação entre Platão e a tradição hebraico-judaica, que pode ser lida nesta carta de Paulo. Isto porque, como afirma Fuks, o leitor desconstrói, pois ler não é repetir o texto: é um modo de criação e de transformação. Por isso, digo que ler é um ato de anástase. E Paulo trabalhou de forma brilhante o termo, tanto nas suas leituras e estudos, como na reconstrução do próprio conceito.

“Que farão os que se batizam pelos mortos, se os mortos não são chamados de volta à vida? Por que se batizam então pelos mortos? Por que estamos a cada hora em perigo? Protesto contra a morte de cada dia. Eu me glorio por vocês, no ungido Iesous a quem pertencemos. Combati em Éfeso contra animais ferozes, mas o que significa isso, se os mortos não podem ressurgir? Comamos e bebamos, porque amanhã morreremos. Mas não vamos nos enganar: as más companhias corrompem os bons costumes”.

Na sequência da tradição hebraico-judaica, ou como diz Fuks, “os antigos hebreus não estavam trabalhados, como nós, pela necessidade de abstração, de síntese e de precisão na análise conceitual do real, herança dos gregos”, Paulo está preocupado com o corpo, com a vida.

“Mas alguém pode perguntar: como os mortos são trazidos à vida? E com que corpo? Estúpido! O que se semeia não tem vida, está morto. E, quando se semeia, não é semeado o corpo que há de nascer, mas o grão, como de trigo ou qualquer outra semente. Deus dá o corpo como quiser, e a cada semente o corpo que deve ter. Nem toda a carne é uma mesma carne, há carne humana, de animais terrestres, de peixes, de aves. E há corpos celestes e corpos terrestres, uma é a dignidade dos celestes e outra a dos terrestres. Diferente é o esplendor do sol do esplendor da lua e das estrelas. Porque uma estrela difere em brilho de outra estrela. Assim também o ser levantado dentre os mortos. Semeia-se o corpo perecível; levantará sem corrupção. Semeia-se na desgraça, será levantado em excelência. Semeia-se em debilidade, será erguido vigoroso. Semeia-se corpo controlado pela psiquê, ressuscitará corpo espiritual. Se há corpo controlado pela psiquê , também há corpo espiritual”.

Para Paulo, anástase leva à uma teologia da vida que nasce do corpo. Mas, não é simplesmente ter de volta a vida do corpo material, tanto que em certo momento Paulus diz que “deveremos ser a imagem do homem do céu”.

“Assim também está escrito: o primeiro ser humano, terrestre, foi feito ser-que-deseja, o futuro humano será um espírito-cheio-de-vida. Mas o que não é espiritual vem primeiro, é o natural, depois vem o espiritual. O primeiro ser humano, da terra, é terreno; o segundo humano, a quem pertencemos, é celestial. Como é o da terra, assim são os terrestres. E como é o celeste, assim são os celestiais. E, como somos a imagem do terreno, assim seremos também a imagem do celestial”.

O pensamento grego, platônico, está presente na anástase paulina, já que a eternidade não é construída em cima da carne e do sangue. Vemos aqui a dualidade entre a realidade física e o mundo das formas. O dualismo metafísico de Paulo admite aqui duas substâncias que regem o ser humano, no mundo natural, a psiquê, e no mundo pós-anástase, o pneuma. E dois princípios, nesse sentido bem próximo a Platão, o bem e o mal.

“E agora digo que a carne e o sangue não podem herdar o reino de Deus, nem a corrupção herdar a eternidade. Digo um mistério: nem todos vamos adormecer, mas seremos transformados. Num momento, num abrir e fechar de olhos, ante a última trombeta, porque a trombeta soará, os mortos serão levantados incorruptíveis, e seremos transformados. Convém que o corrompido seja tornado eterno, e o que é mortal seja tornado imortal. E, quando o que é corruptível se vestir de eternidade, e o que é mortal for transformado em imortal, então será cumprida a palavra que está escrita: a morte foi conquistada definitivamente. Onde está, ó morte, a tua picada? Onde está, ó inferno, a tua vitória? Ora, a picada da morte é o desviar-se do caminho da honra e da justiça, e a força do erro é a lei. Mas a alegria que Deus dá é a vitória por Iesous, o ungido, a quem pertencemos. Sejam firmes e persistentes, abundantes no serviço daquele a quem pertencemos, conscientes de que o trabalho árduo e duro não é desprezado por aquele a quem pertencemos”. [Ver texto na Vulgata].

Caso voltemos à análise do conceito anástase no capítulo 15 da primeira carta aos Coríntios, tomando como ponto de partida o desafio de Fuks: “há que ler o desejo: sem terra, sem pátria e sem objeto, ele vaga por um deserto, cujas trilhas conduzem o leitor à experiência limite mais-além do que aparece na imagem”, vemos que Paulo traduziu para as novas gerações o desejo judaico-helênico, humano, da anástase: “Pede-se ser levantado”.

Vulgata -- 1Coríntios 15
[50] Hoc autem dico, fratres: quia caro et sanguis regnum Dei possidere non possunt: neque corruptio incorruptelam possidebit.

[51] Ecce mysterium vobis dico: omnes quidem resurgemus, sed non omnes immutabimur. [52] In momento, in ictu oculi, in novissima tuba: canet enim tuba, et mortui resurgent incorrupti: et nos immutabimur. [53] Oportet enim corruptibile hoc induere incorruptionem: et mortale hoc induere immortalitatem. [54] Cum autem mortale hoc induerit immortalitatem, tunc fiet sermo, qui scriptus est: Absorpta est mors in victoria. [55] Ubi est mors victoria tua? ubi est mors stimulus tuus?

[56] Stimulus autem mortis peccatum est: virtus vero peccati lex. [57] Deo autem gratias, qui dedit nobis victoriam per Dominum nostrum Jesum Christum. [58] Itaque fratres mei dilecti, stabiles estote, et immobiles: abundantes in opere Domini semper, scientes quod labor vester non est inanis in Domino.

Bibliografia recomendada

Andrés Torres Queiruga, Repensar a ressurreição, São Paulo, Paulinas 2010.
Jonas Machado, Morte e ressurreição de Jesus, São Paulo, Paulinas, 2009.
Marko Ivan Rupnik, Ainda que Tenha Morrido, Viverá/ Ensaio Sobre a Ressurreição dos Corpos, São Paulo, Paulinas, 2010.








[1] Menandro, O Misantropo. Site: Oficina de teatro. WEB: www.oficinadeteatro.com
[2] Betty Fuks, Freud e a Judeidade, a vocação do exílio, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 2000, pp. 127-133.
[3] Platão, Fédon, Coleção Os Pensadores, São Paulo, Nova Cultural, 1987.
[4] Th.-G Chifflot e R. De Vaux, La Sainte Bible, Les Editions Du Cerf, Paris, 1973. Tradução: A Bíblia de Jerusalém, Ed. Paulinas, São Paulo, 1985, p. 1347.

samedi 17 février 2018

Prof. Jorge Pinheiro, introdução ao pensamento grego, parte 1

Prof. Jorge Pinheiro, introdução ao pensamento grego, parte 2

Letture tilichiane per il Brasile dall'era post-PT

Etica solidale e cristianesimo sociale
- Letture tilichiane per il Brasile dall'era post-PT

Jorge Pinheiro, PhD


Il fondamento dell'unità spirituale è la religione. Il frazionamento spirituale che avviene in certi periodi traduce il frazionamento economico, lo shock e la distanza tra le classi. E nei momenti in cui abbiamo un processo culturale di unità, abbiamo anche una nuova base di unità e solidarietà sociale ed economica.

Quindi, nella storia spirituale, le rotture spirituali sono associate a rotture economiche, proprio come i processi di unità spirituale sono associati ai processi di unità economica.

In questo senso, c'è un processo di sviluppo che si svolge in modo non equo nella storia, ma che mette in relazione i cambiamenti spirituali e le trasformazioni economiche e sociali. Date queste circostanze, il cristianesimo è eticamente obbligato a fare una scelta: o partecipare al processo, stimolante e di agire a favore di questo sviluppo, o si ritrae ed entra processo di scadenza, ad allontanarsi dalla vita reale delle comunità in cui inserito.

Qualunque sia l'opinione sulla relazione etica tra cristianesimo e capitalismo, un dato deve essere sottolineato: è necessario e possibile per il cristianesimo mantenere una relazione con tutte le formazioni economiche e sociali, specialmente quelle che chiedono l'uguaglianza di diritti e possibilità per l'intera popolazione, poiché il rifiuto del principio dell'uguaglianza sociale dei diritti e delle possibilità nel nome del cristianesimo ferisce l'universalità del cristianesimo.

E se il cristianesimo non solo deve, ma può mantenere un rapporto con le economie e le politiche di sostegno, dobbiamo chiederci se il contrario della premessa è vero: essi possono e devono governi che cercano tali cambiamenti hanno un rapporto costruttivo con il cristianesimo?

Per molte concezioni non cristiane spesso materialista, negano la possibilità di questo approccio, ma se ci rendiamo conto che anche in Marx, il fatto di punti di vista politici di sinistra non sono materialista, ma economica, vediamo che tali opinioni mostrano una relazione causale tra fondazione economica e organizzazione spirituale della cultura. Al contrario, una tale fondazione conferisce alle scienze dello spirito una possibilità metodologica estremamente feconda, che non ha nulla a che fare con l'ateismo o il materialismo.

Per quanto riguarda le organizzazioni di sinistra, sia socialiste che no, è necessario vedere il diverso atteggiamento che hanno verso il cristianesimo e le strutture gerarchiche della chiesa. La storia delle chiese cristiane nel passato, e spesso nel presente, è aperta alle critiche. Le loro alleanze e opzioni li hanno fatti allontanare e ostacolare i loro rapporti con la popolazione esclusa di beni e possibilità. Tale situazione facilita e migliora la predicazione del materialismo.

Ma, al contrario di ciò che può sembrare, non possiamo dire che il materialismo è un fenomeno costitutivo del socialismo. Piuttosto, è un retaggio di cultura borghese scettica e critica. Questo patrimonio è stato adottato dalle correnti militanti proletari e socialismo sulla convinzione che aiutano estirpare l'idea di oppressione e aprirebbe la strada alla costruzione di un mondo nuovo, più dignitoso e giusto.

Anche se, ci sono ragioni storiche per criticare i movimenti ecclesiali creste ei partiti politici socialisti sono sbagliato quando negano l'esistenza della Comunità e la base della solidarietà dell'ideale cristiano, come si può vedere nella predicazione di Gesù presentato nei Vangeli. Vale a dire, ci sono ancora settori dei movimenti e partiti politici socialisti un'ostilità contro il cristianesimo, un'ostilità che ferisce l'etica sociale, così vicina a quelle proposte dalle comunità cristiane dei primi secoli.

Ma se le idee sociali dei movimenti e partiti proletari e socialisti non si traducono opposizione essenziale in linea di principio al cristianesimo e delle chiese che vivono il mandato Vangelo, i cristiani possono senza paura avere un atteggiamento positivo verso questi movimenti e partiti.


L'atteggiamento positivo dovrebbe essere inteso come la realizzazione del principio di solidarietà cristiana, che comprende la necessità di eliminare le condizioni che generano esclusione e sofferenza. Tale atteggiamento traduce l'urgenza di combattere i fondamenti dell'egoismo economico e delle azioni per la costruzione di un altro ordine sociale, sì globale, inclusi esclusi e periferici. Questo perché le trasformazioni sociali non sono solo i bisogni e le mansioni dei lavoratori e degli operai, ma un ideale etico che esprime le speranze e le aspirazioni dei più svariati settori della società.


dimanche 4 février 2018

A halakha

O caminho da espiritualidade e da liberdade
Professor Dr. Jorge Pinheiro



Há três perguntas que queimam o espírito daqueles que se debruçam sobre as coisas de Deus: por que eu existo? quem eu sou? tenho um destino? Vamos nos debruçar sobre o estudo destas questões a partir de um conceito judaico, a halakha (hebraico הלכה) utilizando a mística judaica, em especial o pensamento hassídico enquanto hermenêutica, mas depois caminhando em direção à revelação e à sabedoria cristãs. 

A guisa de introdução 

Na tradição judaica podemos falar de um entrelinhamento teológico formado pelas linhas-força das idéias de Eloim, ser humano, aliança, pecado, arrependimento, história e caminho. 

Embora não seja nossa intenção aqui fazer uma teologia das Escrituras hebraico-judaicas, podemos dizer que o conceito Eloim nas Escrituras é peculiar e alinha compreensões que, se não inéditas, mas por estarem correlacionadas, apresentam um Deus peculiar, já que ele é único, eterno, criador e pessoal. 

Do ser humano também podemos dizer que é valorizado, pois não surge por acaso, tem universalidade, liberdade para a construção de seu destino. Assim, na sequência desses dois conceitos, temos os conceitos de aliança, pecado e arrependimento. E, para a mística hassídica, os textos da Torá não afirmam que o ser humano é bom ou mal, mas que age a partir dessa polaridade. 

Isso parece claro no diálogo que Eloim tem com Qayn, quando diz que ele está inclinado para o mal, que está diante dele como um animal feroz, mas que Qayn deve dominá-lo. Essa conversa, de certa forma, apresenta um padrão humano, a tendência ao mal. Assim podemos compreender Gênesis 6.5; 8.21 e Deuteronômio 31.21. 

É interessante ver que nenhum desses textos fala do ser humano como essencialmente corrupto, mas inclinado ao mal. A própria palavra yetzer, que vem da raiz yzr, utilizada quando os textos falam de inclinação maligna, significa moldar, propor-se. A idéia é que somos dirigidos por nossas inclinações, nossas imaginações, sejam elas boas ou más. Nesse sentido, somos totalmente diferentes dos animais. E é exatamente yetzer que, combinado à liberdade humana, possibilita o arrependimento. Ou, conforme, nos diz Deuteronômio 11.26-28:b"Prestem atenção! Hoje estou pondo diante de vocês a bênção e a maldição. Vocês terão bênção, se obedecerem aos mandamentos do Senhor, o seu Deus, que hoje lhes estou dando; mas terão maldição, se desobedecerem aos mandamentos do Senhor, o seu Deus, e se afastarem do caminho que hoje lhes ordeno, para seguir deuses desconhecidos".

Como essas linhas se entrelaçam e formam uma teia, a idéia de história está presente nas Escrituras quando vê a vida humana e a realidade presente e futura como estruturas abertas, que nascem desse relacionamento e do diálogo entre o Eterno e o ser humano. É a dicotomia existencial, ser natureza e transcender a ela, que leva o ser humano à possibilidade da revolução, ou seja, à construção da História. Tal fato pode ser mais bem compreendido nos relatos da libertação do cativeiro egípcio. Essa libertação não é uma libertação nacional, que inclui apenas uma etnia, mas revolução social. 

Ora, é nesse momento que tem início a história de Israel, como ação de liberdade, como revolução e construção da História. Ou seja, o Eterno ouviu os gemidos e os clamores do povo hebreu debaixo da escravidão e viu a situação deles (Êx 2.23-25), o sofrimento deles, e resolveu ajudar. Biblicamente, a construção da história humana é sempre uma correlação entre o sofrimento e a coragem de optar pela liberdade. E este foi o desafio apresentado aos hebreus escravizados: construir a História e optar pelo caminho da liberdade, o que significava correr riscos, já que muitas vezes há segurança na escravidão. Bem, e qual é o papel do Eterno nessa proposta de construção da história de Israel?

Mostrar ao hebreu que o objetivo do ser humano é ser completamente humano, mostrar opções para as escolhas humanas. Eloim também discorda quando o hebreu toma o caminho errado, mas não o abandona, pois sua preocupação é com a liberdade pessoal e coletiva do hebreu, e por extensão do ser humano, pela construção de uma comunidade governada por amor, justiça e alegria.

Uma das linhas-força dessa teia de idéias teológicas presente nas Escrituras hebraico-judaicas é a de halakha, que se transformou em ramo da literatura rabínica. Ela trata das obrigações religiosas às quais devem se submeter os judeus em suas relações com o próximo e com o Eterno. Ela engloba todos os aspectos da existência. Mas nesta aula vamos utilizar halakha em seu sentido mais amplo, no sentido de caminho. 

Assim, a partir da halakha, mais do que propor uma adoração estática a Deus, as Escrituras nos falam de andar com ele. Daí a idéia de caminho. Assim, o ser humano é colocado a cada momento e a cada dia diante da exigência de exercer sua liberdade e escolher entre o bem e o mal, ou, como diz Deuteronômio 30.15: “Vejam que hoje ponho diante de vocês vida e prosperidade, ou morte e destruição”. 

A vida é o bem maior, o modelo de escolha, já que Eloim está vivo e nós também estamos vivos. A escolha correta então é esta: escolher a vida, caminho que fica entre o crescimento e a decadência. A linha-força do caminho da lei ou halakha é extensa e profunda nas Escrituras, e sem ela a teia estaria incompleta. E é a partir dessa teia teológica que estrutura o pensamento hebreu, e depois judaico, que desejamos estudar a teologia do caminho.  

O caminho

"A este povo dirás: Assim diz Iaveh: Eis que ponho diante de vós o caminho da vida e o caminho da morte". (Jeremias 21:8)

"Pois os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos são os meus caminhos, diz Iaveh". (Isaías 55:8)





Théodore Monod disse que não somos meio termo, mas complemento. Não somos cinza, mas cores do espectro. Na verdade, os escritos judaicos da Era Comum nos dizem que o Eterno construiu o ser humano e, em seguida, retirou-se para que este humano pudesse construir sua liberdade e o seu lugar. Dessa forma, o ser humano é potencialmente autônomo dentro dos limites da existência, constrói  livre-arbítrio e, portanto, responsabilidade. 

Os escritos judaicos, entregues no caminhar da diáspora, entendem que o Eterno aposta na construção permanente do ser humano. A criação, vista dessa forma, não está completa, o ser humano, enquanto pessoa e comunidade, continua a criação. Por isso, a construção da espiritualidade é a chave para o futuro humano. É o que leva à criação permanente. Textos do misticismo judaico, quando falam do acesso ao mundo do Espírito, perguntam: "Você se tornou o que você é?" 

O ser humano, enquanto pessoa e comunidade, é criador de si mesmo. Sua vida é uma viagem com a finalidade do tornar-se. Ele deve saltar do "conhece a ti mesmo" para "tornar-se quem ele é" e "descobrir para serve". É a viagem da existência humana, e a liberdade é uma viagem dentro de si mesmo, numa comunhão que engloba o cosmo, e deve ser realizada através do corte da pedra, símbolo do ser humano, do material em direção ao espiritual. 

Mas este caminhar na vida, coloca a própria vida como razão de nossa existência. Existimos para vida e esta vida deve ser vivida com intensidade e sentido. Ou numa expressão bem humorada do rabino Baal Shem Tov, "temor a Deus sem alegria não é temor, é depressão".

O macho e o suspiro

O relato da história de Caim e Abel mostra que a teologia do caminho está presente nas Escrituras desde seus começos. Ou seja, desde o surgimento do humano o desafio da halakha está colocado diante dele. Assim, o embate entre os dois irmãos traduzem dois modos de vida e personificam a fratura da imago Dei e a consequente alienação humana, em sua diversidade, ou seja, o distanciamento do Eterno, e as alienações psicológica, sociológica e inclusive ecológica.

"Adão teve relações com Eva, a sua mulher, e ela ficou grávida. Eva deu à luz um filho e disse: — Com a ajuda de Deus, o Senhor, tive um filho homem. E ela pôs nele o nome de Caim. Depois teve outro filho, chamado Abel, irmão de Caim. Abel era pastor de ovelhas, e Caim era agricultor. O tempo passou. Um dia Caim pegou alguns produtos da terra e os ofereceu a Deus, o Senhor. Abel, por sua vez, pegou o primeiro carneirinho nascido no seu rebanho, matou-o e ofereceu as melhores partes ao Senhor. O Senhor ficou contente com Abel e com a sua oferta, mas rejeitou Caim e a sua oferta. Caim ficou furioso e fechou a cara. Então o Senhor disse: — Por que você está com raiva? Por que anda carrancudo? Se tivesse feito o que é certo, você estaria sorrindo; mas você agiu mal, e por isso o pecado está na porta, à sua espera. Ele quer dominá-lo, mas você precisa vencê-lo. Aí Caim disse a Abel, o seu irmão: — Vamos até o campo. Quando os dois estavam no campo, Caim atacou Abel, o seu irmão, e o matou". (Gênesis 4:1-8)

Quando nasce Caim, Eva -- do hebraico חַוָּה, hawa, a-vida --, a Mãe, feliz diz: alcancei do Senhor um macho. Que é um trocadilho com o verbo qanah, adquirir, que vai dar a palavra Qayn, mas remete também ao membro viril do menino. Em relação a Abel, seu nome hevel (em hebraico הבל) significa sopro, suspiro, uma brisa leve, no sentido de que teve vida curta e não deixou filhos.

A história do choque entre os dois irmãos, entre duas espiritualidades, conta que o Eterno recebeu de bom grado a oferenda de Hevel porque ele "ofereceu as melhores partes ao Senhor". Enquanto Qayn "um dia pegou alguns produtos da terra", ou seja, ofereceu com descuido, o que não lhe deu trabalho, o que tinha de sobra. 

O Eterno valoriza a sinceridade dos sentimentos que gera a oferta e não o contrário, por isso ele disse: "odeio, eu detesto as suas festas religiosas; não tolero as suas reuniões solenes. Não aceito animais que são queimados em sacrifício, nem as ofertas de cereais, nem os animais gordos que vocês oferecem como sacrifícios de paz. Parem com o barulho das suas canções religiosas; não quero mais ouvir a música de harpas. Em vez disso, quero que haja tanta justiça como as águas de uma enchente e que a honestidade seja como um rio que não para de correr". (Amós 5:21-24).

Assim a história dos dois irmãos apresenta a metáfora da fratura psicológica, social, ecológica e espiritual da humanidade.

O caminhar sob missão

O caminhar com o Eterno não pode estar separado do colocar-se sob missão do Espírito, pois a construção da liberdade humana nasce da revolução do Espírito e confronta as solidões dos caminhos próprios. 

Duas noções fundamentais, a do ser e a do devir, estão intimamente ligadas às ideias da halakha e da revolução permanente do Espírito. Só o Eterno é único. Na tradição judaica, quando falamos "Ser" estamos a falar do Eterno. Mas os humanos caminham no sentido de se tornarem ser. Precisam caminhar sua viagem, simbólica, do material em direção ao espiritual, a fim de integrar, interiorizar a simplicidade sublime do Ser Eterno. É nesse sentido que o caminhar deve gerar harmonia, paz que leva à coexistência de progresso e tradição. 

Assim a história dos dois irmãos apresentam a metáfora da fratura psicológica, social, ecológica e espiritual da humanidade.

1. Ao nível psicológico, Qayn e Hevel apontem para o conflito entre o certo e o errado, entre o realizar os desejos na natureza humana e o viver a construção da liberdade humana no caminhar com o Eterno. E neste conflito, quando a natureza humana é vitoriosa o embate resulta em fracionamento, em cisão do humano que somos.

Ao matar Hevel, Qayn se torna um pária de si mesmo, um nômade marcado pela falta daquilo que constitui a vida plena, a personalidade livre da culpa. Passa a ser uma pessoa que sem norte andarilha distante de sua integralidade como ser humano. É ser dividido, fraturado.

2. Ao nível social, Qayn e Hevel simbolizam duas humanidades, divididas, que se confrontam no correr da história.

É conflito permanente entre uma humanidade, simbolizada por Qayn, que caminha no sentido contrário da vida, mata o irmão e através da violência assenhoreia-se da natureza, levando-a ao desequilíbrio e à destruição; e outra humanidade, simbolizada por Hevel, que procura a comunhão com o Criador, com seu irmão, e com a própria natureza.

3. Ao nível espiritual, e este é o principal centro do relato, Qayn e Hevel apontam para uma fratura na alma humana em sua forma de se relacionar com o Eterno. Uma dualidade que definiu dois tipos de busca -- uma formal, estereotipada em valores próprios, e outra de colocar-se sob missão à vontade do Eterno.

Espiritualmente, há uma divisão no âmago da alma humana no relato do conflito entre Qayn e Hevel. É uma parábola do ser humano que sacrifica uma parte de seu ser. Qayn de agricultor passa a andarilho para depois se tornar um construtor de cidades. E Hevel de pastor torna-se símbolo da fé sob missão  e, num contexto espiritual, de mártir da entrega ao Eterno.

Qayn é a metáfora de uma humanidade que mata dentro de si o Hevel da entrega e da vida plena em sintonia com a vontade do Eterno. E para não viver como andarilho, na solidão de si mesmo, Qayn funda uma cidade. É sua forma de dizer não à vontade de Eterno, que considera injusta.

A liberdade do partir do pão

A comunidade de fé, enquanto comunhão, não deve ser obstáculo para o caminhar espiritual. Ao contrário, compreendido o conceito de comunidade, de estar junto para repartir o pão, tal comunhão não deve desenvolver ambição, orgulho ou reflexo xenófobo, mas abertura para o humano. Seu significado não é excluir a fraternidade, mas estendê-la da comunidade em direção a todos os humanos. O objetivo é difícil, mas não há esperança se não perseveramos em direção ao sucesso.

Aprender a liberdade é o primeiro momento dessa construção, comemorada na Páscoa, enquanto caminhar em esperança. Caminhamos em direção ao outro e para cima. Esta tradição foi transmitida aos judeus pela Torá, e está presente nos mandamentos em que se baseiam a coesão da comunidade judaica. 

O caminhar associado a revolução permanente do Espírito deve levar a uma espiritualidade que voa acima de dogmas e formalizações. É um caminhar baseado na fraternidade universal. Donde, progresso e tradição podem fazer sentido na existência do humano, enquanto elo da cadeia da vida. 

Nesse caminhar descobrimos, conforme nos foi revelado, que o Eterno é impensável, incognoscível e impenetrável, mas presente no universo em todos os seus planos. O Eterno não pode ser nomeado. A única designação autêntica é precisamente a rejeição de qualquer definição, é "ein Sof", aquele que não tem fim, Eterno. Ein Sof ou ayn Sof, (hebraico אין סוף), na mística judaica, é entendido como Eloim antes de Sua automanifestação na produção de qualquer reino espiritual, provavelmente derivado do termo de Ibn Gabirol, "o único Infinito". O Espírito absoluto é essência por si só. O Eterno é o único, única manifestação visível do invisível. Mas a harmonia universal resulta na complementaridade dos opostos. A vida é um ponto na eternidade. 

Devemos ser, todos nós humanos, aqueles que esperam pelo mundo do Espírito. E o caminhar na liberdade do Espirito nos leva ao amor, que é chave para a comunhão. Pois, amar o outro é reconhecer que ele também foi criado para a liberdade do Espírito. E com ele caminhar em direção ao sentido pleno da vida. 

“Não devam nada a ninguém, a não ser o amor de uns pelos outros, pois aquele que ama seu próximo tem cumprido a Lei. Pois estes mandamentos: “Não adulterarás”, “Não matarás”, “Não furtarás”, “Não cobiçarás” e qualquer outro mandamento, todos se resumem neste preceito: “Ame o seu próximo como a si mesmo”. O amor não pratica o mal contra o próximo. Portanto, o amor é o cumprimento da Lei.” (Romanos 13:8-10)

O amor dá dignidade ao caminhar. Semeia as sementes da revolta contra a injustiça e a opressão, inclusive religiosa. Reconhece o fato de que o sofrimento é um desequilíbrio do mundo. Mas, a liberdade do Espírito nos dá consciência de que o amor não pode ser rebaixado a concepções que degradam a dignidade do ser humano. Ou seja, amar o outro não é fé, não é destino, é ato de construção do espírito e da liberdade com todos e todas.

E a halakha se constrói no caminhar

É por isso que dizemos: Abel, um humano sob missão, foi o primeiro mártir espiritual da humanidade -- aponta para Jesus,  o Cristo.

"Jesus foi com os discípulos para um lugar chamado Getsêmani e lhes disse: — Sentem-se aqui, enquanto eu vou ali orar. Então Jesus foi, levando consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu. Aí ele começou a sentir uma grande tristeza e aflição e disse a eles: — A tristeza que estou sentindo é tão grande, que é capaz de me matar. Fiquem aqui vigiando comigo. Ele foi um pouco mais adiante, ajoelhou-se, encostou o rosto no chão e orou: — Meu Pai, se é possível, afasta de mim este cálice de sofrimento! Porém que não seja feito o que eu quero, mas o que tu queres". (Mateus 26.36-39)

"Ele tinha a natureza de Deus, mas não tentou ficar igual a Deus. Pelo contrário, ele abriu mão de tudo o que era seu e tomou a natureza de servo, tornando-se assim igual aos seres humanos. E, vivendo a vida comum de um ser humano, ele foi humilde e obedeceu a Deus até a morte — morte de cruz" (Filipenses 2:6-8)

Eis o desafio da halakha, seguir o caminho aberto por Abel -- da humanidade sob missão à vontade do Eterno. 

Eis o desafio da halakha, caminhar com Jesus, o Cristo -- que ao abrir mão do aparente que se deteriora, nos ensinou a construir a espiritualidade e a liberdade que fazem de cada um de nós humanos de fato. E é este caminhar que nos leva a dizer: não se faça o que quero, mas o que Tu queres. 

Podemos dizer, então, que existo porque estou desafiado a caminhar a halakha da vida. Que não basta conhecer-me, devo construir aquilo que já sou. E que só ao fazer isso descobrirei meu destino, minha missão. E isso fazemos caminhando a halakha. Caminhando na halakha. E Ele, o Cristo, o Messias משיח é a halakha הלכה.  


E assim finalizamos esta aula com as palavras do meio-irmão do Messias: “Àquele que é poderoso para impedi-los de cair e para apresentá-los diante da sua glória sem mácula e com grande alegria, ao único Deus, nosso Salvador, sejam glória, majestade, poder e autoridade, mediante Jesus Cristo, nosso Senhor, antes de todos os tempos, agora e para todo o sempre! Amém.” (Judas 1:24-25)

mardi 23 janvier 2018

Jean de Léry, meu irmão

Venho, faz alguns anos, estudando os encontros e desencontros do pensamento calvinista com a cultura tupi-guarani nas ilhas de Laje e Sirigipe, na baía de Guanabara, costa do Rio de Janeiro, entre os anos de 1555 e 1560. Minha preocupação com a hermenêutica parte daí, já que na literatura produzida pelo pensamento religioso calvinista, mais precisamente por Jean de Léry, no século XVI, sobre a França Antártica e sobre a cultura e a religiosidade tupinambá, seus intérpretes analisaram tais produções a partir de estruturas e procedimentos ordenados. Frank Lestringant, estudioso de Léry e do projeto França Antártica, diz no prefácio à terceira edição de seu livro Le huguenot et le sauvage que “procurou mostrar como a controvérsia nascida do duplo fracasso da França Antártica no Brasil (1555-1560) e da Flórida huguenote (1562-1565) tiveram consequências de primeira importância sobre a metodologia da história e a visão europeia dos povos distantes. Tratava-se de retornar aos laços que uniram, pelos porta-vozes de Londres, de Paris e de Franckfurt, a Genebra protestante de Calvino e de Thédore de Bèze a uma América em projeto”.  Essa é a uma parte da questão. Porém, Léry, a França Antártica e os tupinambás nos apresentam relações tão complexas, tão novas na época, que nos obrigam a ir além das opções ideológicas de uma religião verdadeira, por um lado, e o encontro com o bom selvagem, por outro. Sem eliminar tais leituras, e numa abordagem que se distancia da busca do “corpus huguenot”, objeto de Lestringant em Le huguenot et le sauvage, consideramos que a tentativa de estabilizar os encontros/desencontros de huguenotes e tupinambás tornam as leituras do texto e da história incapazes de compreender o mundo imaginado e sonhado naquelas relações nem sempre tão cordiais.

Quando nos debruçamos sobre tais encontros e desencontros do pensamento calvinista com a cultura tupi-guarani, devemos levar em conta, numa leitura a partir da teologia da cultura, uma hermenêutica da complexidade e da correlação entre ideologia e utopia, construtora da imaginação social e, por extensão, presente na realidade social, que o protestantismo não era uma realidade estanque. Isso porque as raízes do pensamento protestante não eram apenas pensamentos, mas a expressão de seres políticos, de situações culturais, cuja eclosão situamos em 1517, com a exposição das 95 teses de Martinho Lutero e mais especificamente com a publicação das Instituições da Igreja Cristã de João Calvino em 1536. Não se pode entender o pensamento dos huguenotes quando se subestima as realidades sociais que deram origem a esse mesmo pensamento.

É bom dizer que nos remetemos a Paul Tillich, Edgar Morin e Paul Ricoeur como referenciais de coração, que são, antes de tudo, companheiros de viagem na construção desta crítica às hermenêuticas tradicionais no que se refere às leituras do texto de Léry e de sua experiência com os tupinambás. Esta tese busca, assim, a metodologia que discutimos em sala de aula, desconstruir as hermenêuticas modernas, a fim de propor novas leituras de Léry, em que somos chamados a uma viagem de mochileiro com destino em aberto.

A espiritualidade – e por extensão a religiosidade – é conhecimento humano, particular, mas também universal, que traduz maneira de busca do transcendente. A distância entre a fé e a cultura, nessa leitura hermenêutica, é estreitada e possibilita a compreensão de que no ser humano não é apenas o físico e material o padrão maior de civilização. Se dissermos o óbvio, huguenotes e tupinambás são seres humanos e criam seus próprios universos de significação; é em suas culturas, no caso calvinista e tupi-guarani, respectivamente, que vamos encontrar o ato e a forma de suas expressividades humanas como seres históricos. O primeiro momento desta reflexão teológica sobre as culturas calvinista e tupi-guarani, seus encontros e desencontros, consiste em ver que, seja no ato de surgimento, seja na forma de atuação, a unidade dessas culturas só pode ser pensada em oposição ao fluxo do tempo e à dispersão do espaço onde as experiências se situaram.

Por isso, as raízes do pensamento religioso – e aqui devemos nos referir aos huguenotes e tupinambás – não podem agir com uma força igual em todo momento e em toda comunidade. Um ou outro pode predominar, dependendo da situação social, das comunidades ou formas de dominação presentes, pois correlacionam as estruturas sociopsicológicas de interação com a situação social objetiva.

A unidade ontológica da cultura – e aqui estamos a nos referir a calvinistas e tupi-guaranis – reside na relação dialética que vigora entre a estrutura transcendental – de huguenotes e de tupinambás –, que se manifesta no ato de suas criações culturais, e a idealização transcendental de suas obras de cultura, manifestadas nas formas transtemporal e transespacial que lhes asseguram perenidade simbólica. Donde a espiritualidade – e, de novo, por extensão, a religiosidade – apresenta-se como paradigma da ontologia da cultura,  pois tematiza a transcendência do ato como interrogação sobre o que é, tanto no que se refere à idealidade da forma, como na objetividade do ser huguenote ou do ser tupinambá.  

A partir de Tillich, podemos dizer que as culturas e os valores compartilhados são essenciais para se fazer a leitura das religiosidades de calvinistas e tupinambás. Em condições dinâmicas, em que a vivência de Léry com os tupinambás e o texto foram construídos por múltiplas e variadas possibilidades, leituras monolíticas, ainda que polares, falharão na geração da criatividade necessária para atravessar as possibilidades que se abriram naqueles momentos. Por isso, as diversidades são importantes. O pensamento que não comporta multiplicidade pode ser um fator para a crise de parte das leituras realizadas sobre essas relações entre calvinistas e tupinambás no século XVI. A partir do próprio texto de Jean de Léry, Viagem à terra do Brasil, trabalharemos aqui com uma teologia da cultura, que procura correlacionar as complexidades do encontro, num caminho aberto, nunca completado.


Como alguns cosmógrafos e historiadores do nosso tempo já escreveram acerca das dimensões, formosura e fertilidade desta quarta parte do mundo, chamada América ou terra do Brasil, bem como a respeito das ilhas e terras adjacentes, inteiramente desconhecida dos antigos, e das várias navegações que para aí se fizeram nestes primeiros oitenta anos decorridos desde o seu descobrimento, não me deterei nessas generalidades; minha intenção e meu objetivo serão apenas contar o que pratiquei, vi ouvi e observei, quer no mar, na ida e na volta, quer entre os selvagens americanos com os quais convivi durante mais ou menos um ano. E a fim de que tudo se torne bem compreensível a todos, a começar pelo motivo que nos levou a empreender tão penosa e longínqua viagem, direi em poucas palavras como se originou ela.


Convém notar que a terra dos brasis estava em alta bem antes da chegada de Jean de Léry. Cinco anos antes da instalação da França Antártica, em 1550, quando o rei Henrique II e a rainha Catarina de Médicis fizeram sua entrada triunfal em Rouen, foi oferecida a eles uma festa brasileira, com trezentos figurantes, com brasis levados à França, marinheiros normandos e prostitutas, todo mundo nu do jeito brasil. Representaram cenas de amor, de caça, de guerra e de uma abordagem a um navio português. E ocas foram adornadas com bananas, e macacos e papagaios foram soltos nas árvores.  O Brasil era o jardim do Éden.

Nosso primeiro referencial é a pessoa. Nesse sentido, ao analisar essa relação entre o pensamento huguenote e a cultura tupi-guarani devemos partir de uma fenomenologia política que leve em conta questões como a origem do pensamento político e religioso calvinista, enquanto utopia do cristianismo reformado. É bom lembrar que a conversão de João Calvino (1509-1564) ao protestantismo se deu entre 1532 e 1533, quando tinha 23 ou 24 anos. Donde o protestantismo calvinista dos huguenotes, na baía de Guanabara dos anos 1555-1560, tinha a plasticidade de um pensamento político-religioso em construção. E é a partir daí, dessa plasticidade da utopia reformada em construção, que devemos trazer à tona os elementos não reflexivos desse pensamento  e analisar como ele se relacionou com uma cultura até aquele momento desconhecida.

E a questão da pessoa, aí imbricada, leva-nos a uma antropologia existencial. Ora, a questão existencial é traspassada aqui pela fé calvinista, de um lado, que era a dimensão de profundidade na vida do jovem huguenote e, de outro, por elementos da cultura tupi-guarani, que eram, também, dimensão de profundidade na vida dos brasis tupinambás. Ao resgatarmos a metáfora tillichiana – dimensão de profundidade –  estamos dizendo que a fé huguenote de Léry e a religiosidade tupi-guarani apontavam na direção daquilo que era incondicional para o francês e para os brasis, respectivamente. Assim, num sentido amplo, a fé de Léry era a preocupação fundante que se manifestou em todas as funções criativas de sua vida e relacionamentos, mas também a cultura tupi-guarani cumpria papel idêntico em relação à vida e relacionamentos dos tupinambás.

lundi 22 janvier 2018

Leccións na teopolítica

Leccións na teopolítica
Jorge Pinheiro


A teopolítica supón que o ser humano non é un ser solitario, ou só solidario entre humanos, senón que vive e vive con outro, máis grande, pero máis frecuentemente compañeiro e cómplice. Unha primeira referencia a este entendemento parte de Kierkegaard, pero descansa tamén sobre Karl Barth, cando nos remite ao outro. Deste xeito, a dimensión teolóxica do ser humano conduce a asentamentos e movementos aos que o ser protestante debe enfrontarse á conquista e ao desafío.

Polo tanto, ao ser a teoloxía protestante implica unha superposición política. Theopolitics anuncia a pluralidade diversificada, pero non necesariamente a explosión política do protestantismo. Teopolítica forma parte do ser protestante, basta ver que desde as súas orixes o protestantismo foi congenitamente poliglota e multinacional, distante do latín imperial, falou as traducións alemás de Lutero, o francés de Calvino eo inglés do rei James. A diferenza do grego koinés, este novo cristianismo, que aparece en Occidente no século XVI, comezou a falar todas as linguas de Europa, chegando aos diferentes dialectos do mundo globalizado.

Os teopolíticos protestantes deben ser estudados a partir de tres enfoques. A socioloxía das relixións, que describe, pero non é testemuña; o de socioloxías, protestantes ou non, o que nos mostra quen confía en Deus e que significa. E o da filosofía aberta á teoloxía que ten como obxectivo pensar e aclarar as cuestións intelectuais dese protestantismo que Paul Ricoeur dixo estar "preparado para discordancias razoables" [Ricoeur, 1995]. E, finalmente, como consecuencia, o do laboratorio de teoloxía ecuménica que desenvolve un consenso doctrinal en tensión con diferenzas fundamentais. Un cristianismo diversificado, ás veces alternativo, en referencia ás Escrituras xudeo-cristiás, vinculadas e relanzadas. Por iso, podemos dicir que tres eixes cruzan no tempo e no espazo, este punto de vista político do protestantismo: historia, social, diacrónico e secular; un aspecto relixioso e espiritual, sincrónico e contemporáneo; e unha visión teolóxica e interior, do tipo ecuménico prospectivo.

Para comprender a cuestión política inserida na teoloxía protestante, é bo trazar a historia da Reforma do século XVI. Temos árbores, un bosque real e non un tronco con diferentes ramas.

A Reforma dos anos 1520-1540, de Lutero a Calvino, separados por preto de vinte anos, foi precedida por reformas preliminares en toda Europa: de Pierre Valdo en Lyon e Francisco de Asís o século doce, a John Wyclif en Inglaterra e John Hus en Bohemia, no século XIV, de John Hus en Praga en 1415, a Savonarola en Florencia, queimouse a finais do mesmo século. Estes predicadores tiñan en común a demanda dun retorno da Igrexa Católica ao Evanxeo, o fin da grandeza eclesiástica romana á pobreza bíblica. As comunicacións entre estes homes eran reais e influíronse entre si, pasando dunha xeración ao seguinte esta expectativa conxunta dun mundo cristián diferente do coñecido. Cada un expresou o seu desexo de reforma e restauración no contexto cultural, lingüístico e político propio de cada un deles. E o latín, coñecido e estudado, permitiunos comprender.

As diferentes expectativas do pobo cristián, pero tamén de clérigos e príncipes, convertéronse en protestas cada vez máis desafiantes. A Reforma levou a un concerto de protestas. Creáronse novas comunidades cristiás: árbores de liberdade para Lutero, froitos de xustiza e santidade por Calvin. Estes movementos de reforma en Francia e Alemaña foron interactivos. Calvino, cuxo sucesor será Théodore de Bèze, un home de letras e humanista, renuncia á condena de Michel Servetus; e Lutero, apoiado polo seu amigo Philippe Melanchton, distanciouse do humanismo cristián de Erasmo. Para Lutero (1483-1546), teólogo da xustificación pola fe e campión da liberdade cristiá, "todo o que non está prohibido está permitido", mentres que para Calvino (1509-1564) "todo o que non está permitido está prohibido. Temos os dous polos nos debates sobre ética e moral, sobre as responsabilidades da conciencia e do pensamento libre, sobre as restricións e os límites impostos pola vida comunitaria.

Pero este pluralismo continental da Reforma alemá e francesa non pode facernos esquecer a historia da Igrexa en Inglaterra: xa non era romano mentres permanecía católico, e en Escocia, o movemento presbiteriano calvinista John Knox elaborara Igrexas próximas de Xenebra, de xeito que as As illas británicas foron un punto de partida importante para este novo cristianismo para o Novo Mundo. Os españois e os portugueses exportaron un catolicismo conquistando os canteiros, os ingleses e os holandeses traerán un protestantismo convencido aos predicadores.

Os descubrimentos coloniais e as empresas missionárias, para conquistar novas terras baixo o ceo eternos da verdadeira relixión, seguidas do exilio voluntario ou das deportacións transatlánticas do traballo, contribuirán, o século XVI estenderé a Reforma. América, entón, en África. A partir destes sermóns nestas novas terras resultarán dous tipos de comunidades: igrexas directamente das igrexas "nai", historicamente Presbiteriana europea, luterana, episcopal ou metodista, entón as igrexas máis novas, nacidos de reavivamentos relixiosos e revivais evanxélicos, batistas, pentecostais, revivalistas , pietists, todos os misioneros de John Wesley a Billy Graham. Mentres tanto, desde finais do século XIX, a Europa espertou ao cristianismo social por un compromiso imposto pola sociedade industrial e pola clase traballadora, un movemento ecuménico para remediar a separación das igrexas fixo insostíbel ao longo das nosas vidas. guerras nacionais. A cuestión negra: a opresión do negro foi e é un fenómeno global. 

E querer hoxe comprender a dinámica das mobilizacións e loitas dos pobos negros, nos distintos países, sen entender as razóns económicas e globais de tal opresión, é non só cometer un grave erro teórico, pero correr o risco de elaborar estratexias e tácticas equivocadas para a súa emancipação.Os marxistas sempre consideramos o negro, quere estar traballando nunha mina de Sudáfrica, nunha granxa do Sur dos Estados Unidos, nun bar na madrugada parisiense, nunha industria do ABC Paulista - só para usar algúns tópicos que referenciam noso imaxinario - ou como totalidade, como pobos que sufriron diásporas durante fases específicas do desenvolvemento do capitalismo. Neste sentido, non importa moito de que nación específica procede o negro, a non ser para el como persoa, por suposto, e si o feito de que foi parte da gran nación africana, dividida, massacrada e destruída polo sistema capitalista. Sen determinar este elemento - a existencia de pobos negros en diáspora - será practicamente imposible entender o papel que o negro cumpre en relación ao capitalismo, tanto nos primeiros séculos previos á Revolución Industrial, como actualmente na súa fase de globalidade imperial.

Abraham León, teórico marxista, asasinado en campo de concentración nazi, durante a segunda Guerra Mundial, desenvolveu un concepto sobre o pobo xudeu bastante interesante, e que nos pode axudar moito na caracterización correcta da pregunta negra. 

Para León, o xudeu - debido ao papel específico que cumpriu durante a aparición da capitalismo e tamén durante a súa fase de expansión, como un dos principais responsables da acumulación e control do capital financeiro - converteuse "pobo clase", representante directo da burguesía Pero algo parecido sucedeu co negro. Por mor do papel que desempeña o negro durante o ascenso do capitalismo, e ata agora, tamén se converteu nunha "xente de clase". Pero, a diferenza do xudeu, estreitamente ligado ao proletariado moderno. Estaba encima del, sobre todo, que o capitalismo fixera a súa colonización primitiva nas súas colonias. Nas metrópoleas este papel tamén pertencía ao campesiñado empobrecido, que serviu de materia prima para a formación do proletariado industrial moderno. Hoxe, máis que nunca, o negro segue sendo unha clase de persoas, porque é parte do gran exército de reservas do mundo. E o continente africano segue, centos de anos despois do remate do tráfico de escravos, a fornecer unha man de obra barata para os países avanzados, sobre todo na Europa.Esta cuestión teórica explica moitas cousas. Entre eles, porque o proceso de lumpenización é enorme entre os negros en todo o mundo capitalista: precisamente porque son parte do exército de reserva. E dános outra resposta teórica máis xeral e, esta si, fundamental: a cuestión racial é de feito unha cuestión nacional e non só democrática e relativa aos problemas específicos do día a día. É por isto que a necesidade da revolución socialista está intimamente ligada á solución dos problemas máis xerais dos pobos negros.

O capitalismo sempre vendeu unha mesma imaxe de África, a dun continente tribal, atrasado, cuxos habitantes vivían na Idade da Pedra. Que é unha gran mentira. 

Dúas lecturas focam historicamente o modo de produción de África nos séculos quince e dezaseis: unha delas sitúase gran parte do continente nunha variante do modo de produción asiático. E cita como exemplo, Ghana e Somalia. O outro, expresado por Nahuel Moreno, un antigo amigo marxista, é que deu ás nacións africanas xa capitalistas, máis precisamente mercantilistas. Aínda que esta discusión, sendo histórica, é difícil de avaliar, hai elementos que demostran o grao de tecnoloxía e desenvolvemento que alcanzan algunhas nacións africanas antes da chegada dos colonizadores. Podemos mencionar, por exemplo, a agricultura sedentaria, utilizando técnicas de plantación tropical, exército regular, pequenas industrias, principalmente téxtiles e a existencia de fundicións. Estes elementos explican os quilombos, non como os guetos negros, senón como repúblicas onde os oprimidos da época refuxiouse. Eran cidades de refuxio. 

A análise e caracterización que sacamos da etapa histórica A ica vivida polos negros en África explica, por exemplo, o modo de produción dos quilombos, que, sen dúbida, viviu do comercio coa propia colonia. É dicir, tiña como modo de produción un capitalismo mercantil, a pesar dos elementos de desigualdade existentes, como a lexislación típica da produción asiática, semellante ao código de Amurabi eo traballo escravo. Pero estas desigualdades explícanse pola propia situación contraditoria dos quilombos, en guerra coa colonia, pero á vez vivir do comercio con ela, ata ver escravos para estas mesmas colonias. Este comercio, malia o seu carácter moral, que se pode discutir, era capitalista e significou un elemento máis no proceso de acumulación primitiva destas nacións africanas. Esta contradición explícase a necesidade dunha lexislación férrea, que favorecía a centralización do poder, aínda que no seu aspecto máis xeral, de satisfacción das necesidades dos homes e mulleres que se refuxiaban aí, os quilombos fosen, de feito, estruturas de poder esencialmente democráticas. 

Desde o punto de vista económico-social tal acumulación foi profundamente contraditoria e, aliada á política colonialista dos europeos, de destrución consciente das forzas produtivas africanas, serviu - en última instancia - para debilitar o avance do iniciante capitalismo negro.

A partir de aí podemos entender mellor a posterior situación dos escravos negros durante os primeiros séculos do capitalismo mercantil en Brasil, por exemplo. Explican o nacionalismo negro, as contradicións dos propios negros, moitas veces determinadas polas relacións existentes en África entre diferentes nacións. Tamén explican feitos interesantes e pouco estudados, como as contribucións dos escravos negros ao desenvolvemento das forzas produtivas ao capitalismo mercantilista en Brasil. Entre eles podemos mencionar a construción de fundicións, ea introdución de técnicas de agricultura tropical, como o uso de mesetas para a plantación do café. 

Visto desde este punto de vista histórico, os quilombos non eran guetos negros, pero os prototipos das nacións africanas deixaron atrás. E, polas características desenvolvidas polos quilombos en Brasil, podemos dicir que eran comunas, onde se refuxiaban os oprimidos da época: os negros, indios, perseguidos políticos e os "criminais" comúns brancos. Todos atoparon iguais dereitos e deberes no quilombo. Da nosa análise da situación das nacións africanas no momento e da estrutura que os negros deron aos quilombos en Brasil, podemos dicir que o modo de produción destas pequenas repúblicas era capitalista. Máis precisamente mercantilista, vivindo coa propia Colonia. Por suposto, non estaban afrontando un modo de produción definido e rematado. Sen dúbida, os quilombos ofrecen excelentes leccións. En Brasil, foron a única forma de goberno dos explotados que sobreviviron por moito tempo, sen illarse da civilización da época, respondendo perfectamente á cuestión racial. É dicir, non como cuestión racial en si, pero como cuestión nacional.

II - Desde o inicio do século dezanove, as presións do imperialismo británico sobre Portugal, que pretendía controlar toda a comercialización da cana de azucre, así como ter a control da súa produción nas Antillas, levou a un proceso desigual na vida dos negros escravizados en Brasil. Hai que ver que no Imperio brasileiro os negros xa dominaban os pobos. A pesar dos pronunciamentos esporádicos, os quilombos xa desapareceron como unha forma alternativa de poder. E a única opción para a loita comeza a emerxer indirectamente, xa non a través dos movementos de liberación nacional, aínda que se expresou nalgúns movementos místicos como Canudos, pero na loita pola democracia. A contradición é que os propios negros non tiñan ningún líder ou corpo a través do cal mobilizar a todos os pobos negros para a loita racial democrática. Así, esta loita non se produciu a través da mobilización e organización das propias persoas negras. Foi levado por intelectuais afrobrasileños, a maioría republicanos, como Joaquim Nabuco entre outros, pero que non levaron á organización política do negro. A emancipación veu debido ás presións do imperialismo británico, a propaganda dos intelectuais e pola debilidade da Coroa brasileira ante o Imperio Británico. Non foi acompañado pola organización política dos pobos negros, nin xerou os seus propios líderes, o que levou a todo o negro á dispersión política e á falta de perspectiva social. Deste xeito, os negros non conquistaron a democracia racial. O esmagamento no que viviu profundou. Totalmente esmagado, os pobos negros víronse ante un feito consumado: tiveron a liberdade de saír das facendas e das casas grandes buscando emprego, tiveron a liberdade de buscar traballo, pero non o atopan. Tiñan a liberdade de vivir nos arredores das cidades, nos mocambos e nas favelas, e convertéronse en mforza de traballo desocupada. 

Así, logo da Lei de Ouro, en ningún momento sabían ou vivían a democracia racial. E por un motivo terrible: sen unha organización política adecuada e independente do poder burgués, os negros non poden conquistar a verdadeira liberdade de emprego, salarios vivos, educación e vivenda. Dispersado políticamente, o proceso de esmagamento de persoas negras aumenta violentamente. Esta situación empeorou coa Lei de Ouro. Sen función social definida, marxinado, atomizado culturalmente, o Brasil capitalista e negro, o século vinte leva á desintegración consciente e total do negro, como raza e nación. Abandonado ás leis do mercado capitalista, como exército de reserva, sen practicamente ningunha posibilidade de contestación frontal da situación social na que se atopa, cada negro de per se soña en ser asimilado. Esta é a gran desgraza da falta de organización independente fronte ás presións da sociedade capitalista brasileira. O negro perde o sentido da comunidade e da loita política. E acepta ser asimilado, cooptado individualmente. E así, aos poucos, vai sendo penetrado polos mitos da ideoloxía burguesa e branca: debe tratar embranquecer, debe acatar a súa condición de discriminado e inferioridade, e nalgúns casos debe manter a esperanza de algún día chegar a ser un xogador de fútbol ou sambista famoso. A culpa deste proceso, non obstante, non pode ser arroxada á industrialización, senón pola falta de organización política. 

Debemos afirmar claramente que a loita pola liberación dos escravos e, máis amplamente, pola democracia racial foi e é correcta. No momento da primeira loita, contra a escravitude, os pobos negros, como nación, deberían aliar a toda a sociedade explotada contra a oligarquía eo Imperio. Pero debería, como aconsellou Marx en relación vienenses, tras a revolución de 1848, formado súas organizacións políticas, definido o seu programa de loita, aliándose aos outros sectores explotados e oprimidos e, en ningún momento, confiado na democracia burguesa. Sen organizacións partidarias propias, sen independencia política, sen líderes, sobre todo a partir de 1930, a negra comeza a ser absorbida pola industrialización. Formará a maior parte do proletariado do país, tanto urbano como rural. Hoxe, despois de tantos anos, existe unha ideoloxía do problema negro. É común escoitar que non hai racismo en Brasil, que hai democracia racial e, peor aínda, que a raza non é un problema nacional. E a propia esquerda, na súa gran maioría, afirma exhaustivamente que todo se pode resolver mediante a alianza inmediata dos pobos negros coa clase obreira. Hai un erro de fondo aquí. Aínda que son aliados estratéxicos e, en definitiva, o negro é unha clase de persoas, a cuestión nacional non é sinónimo de cuestión social. Este é un vello debate entre Rosa Luxemburgo e Lenin. E Lenin tiña razón. 

Algúns problemas, como problemas nacionais e loxicamente raciais, a cuestión da liberación social das mulleres ea cuestión relixiosa non terminan coa toma do poder do proletariado. É lóxico que a posibilidade real de resolver eses problemas xorde, xa que no capitalismo - precisamente porque destrúe as forzas produtivas sociais - calquera solución máis xeral e profunda é imposible. Neste sentido, existe unha liña de transición programática para a loita dos pobos negros, comezando cos problemas específicos da vida cotiá, igual á demanda de todos os demais traballadores, cuxos todos os niveis e termina coa colocación máxima da cuestión nacional. 

III - O problema histórico dos pobos negros aínda non se resolveu. Cal é a dirección dos pobos negros neste capitalismo brasileiro? Como chegar a el? A cuestión da dirección, do camiño, do obxectivo pon a cuestión da unificación do movemento, da creación de organismos que interpretar o conxunto das reivindicacións, de acción e voz dos negros mobilizados. É dicir, estamos falando da política, xa que todas as actividades mobilizadas de xeito político sempre están determinadas por dous elementos, as condicións da propia realidade obxectiva, a situación sociocultural da sociedade; e as condicións subxectivas, é dicir, de mobilización do propio movemento, xa que a mobilización é formadora de conciencia e para que se chegue a conciencia da cuestión negra é necesario percorrer un camiño de construción desta conciencia teopolítica, que parte da loita polo dereito á A arte da militancia política está en saber combinar o xeneral da loita social cos detalles da loita nacional dos negros. O negro é o que máis sofre da represión policial, que a maioría morre a mans das organizacións represivas. Esta é unha loita xeral contra a represión ea violencia, pero tamén é unha loita específica dos pobos negros contra as accións racistas. Pero tamén é un desafío á axitación e á mobilización. Non se pode ver como unha mera propaganda. É o reto de est aire nas comunidades, de mobilización masiva. Significa combinar o específico co xeneral. Actuar, mobilizar, pero tamén amosar ao conxunto dos expropriados de bens e dereitos a realidade dos pobos negros no Brasil.

Mas, ao falar do programa de loita é necesario aclarar que as reivindicacións dos pobos negros non son diferentes ás da clase traballadora. O programa do pobo negro é o mesmo da clase traballadora de conxunto, engadido de todas as reivindicacións específicas á dunha nacionalidade oprimida. Pero de pouco adianta falar de programa e de loita pola súa realización plena como raza e como pobos, se non definimos o tema da organización independente.Se hoxe os pobos negros están esmagados como culturas, como raza e como nación, isto se debe á perda da súa independencia. O pico da súa loita e da súa democracia racial foi Palmares. Ao perder a tradición de loita independente, de organización política, os pobos negros en Brasil comezaron a perder todo o máis. Deste xeito, só mediante a construción dunha política nacional e nacional sobre a base da mobilización e organización, os negros do Brasil gradualmente poderán reconstruír a personalidade nacional que perderon, superando a loita pola diáspora imposta polo capitalismo. Nunha futura sociedade, dos traballadores e negros ser o mesmo. Pero neste momento, por certo motivo histórico, o punto de partida é diferente. Quizais un ou outro negro, por entender que o seu obxectivo máis xeral é a construción dunha sociedade socialista, entre a partido que a clase traballadora constrúe. Pero a gran maioría dos negros neste país non irán por este camiño. O sentimento de nacionalidade oprimida é máis forte e máis inmediato. Polo tanto, a gran tarefa dos negros conscientes deste país -a loita contra os ventos e as mareas dos prexuízos, a discriminación e mesmo os mitos ideolóxicos dos esquerdistas- é a construción dun partido negro nacional e unificado. Isto, para que o negro non continúe sendo taco de canón, nin teña que escoitar da boca de brancos que este país "non é racista". A democracia racial eo dereito á existencia nacional son logros, esixen moitas batallas, ás veces unha guerra.