lundi 24 octobre 2011

Qual é a finalidade da vida?


Rabi Menachem Mendel Schneerson, em resposta a uma carta.

Bênçãos e saudações:
…O senhor escreve que encontra-se perplexo quanto às respostas à questões como: "Qual a finalidade da vida?" e "Qual o significado de um judeu?" – e que dúvidas e confusões afligem-no dolorosamente.
Como o senhor escreve que frequentou a universidade e estudou ciências, provavelmente está familiarizado com o tipo de equacionamento de um problema complicado. Se queremos comprovar um determinado sistema, quanto às leis e princípios nele prevalescentes, começamos pelas partes que se prestam mais facilmente à análise e à verificação. Quando tivermos comprovado a maior parte do sistema, passo por passo (ou progressivamente em complexidade), poderemos, então, depreender com segurança que, se a maior parte deste sistema se enquadra em certas leis específicas, o restante do mesmo, também é regido pelas mesmas leis.
O próprio bom-senso justifica a admissão de que, se uma determinada lei é válida numa vasta maioria de casos, isso também ocorrerá num caso particular em que não possa ser demonstrada com segurança.
Aplicando este método de enfoque ao Universo como um todo, estamos cada vez mais convencidos, ano após ano, da lei e ordem que regem a Natureza, incluindo a matéria inerte, até o átomo diminuto, e particulas ainda menores.
A Ciência Nuclear descobriu harmonia e ordem, jamais imaginadas antes, em aproximadamente cem elementos conhecidos até hoje. Num Universo de tamanha harmonia e organização, obviamente o homem também deve estar submetido à ordem e finalidade.
Indo um passo à frente, a conclusão inevitável é que, uma vez que existem tais leis e tal ordem no Universo, deve haver uma Autoridade Mais Elevada responsável pelas mesmas. A analogia é bem conhecida: Quando temos em nossas mãos um livro impresso, de centenas de páginas, contendo uma história concatenada ou uma filosofia, não podemos sequer, por qualquer rasgo de imaginação, admitir que uma garrafa de tinta foi derramada acidentalmente e produziu o livro. Da mesma forma, é muito menos admissível – infinitamente menos admissível – que o nosso universo, com o seu número infinito de átomos, moléculas e partículas, todas distribuídas em perfeita ordem e harmonia, existem por acidente.
Obviamente há um Criador e Arquiteto, o qual dispõe e relaciona todas as diversas partes do Universo em perfeita união e harmonia, em conformidade com o conjunto de leis que Ele cria e supervisiona. É claro que todo o sistema está além da nossa compreensão, uma vez que a nossa compreensão, bem como a nossa existência como um todo, é apenas uma parte infinitesimal de toda a ordem cósmica, e certamente não é, de forma alguma, comparável ao do próprio Criador. Evidentemente, é absurdo esperar poder compreender o Criador, e mais ilógico ainda, negar Sua existência, devido à nossa incapacidade em compreendê-lo. Pode uma unidade conter um número infinito de unidades? E aqui, pelo menos há alguma relação, pois tanto a unidade (Um), como um número infinito de unidades (Uns) são objetos idênticos – números, ao passo, que não há comunhão entre a criação e o Criador.
Aplicando a analogia da ciência, um passo adiante: na física, na química, etc., quando uma lei é deduzida de uma série de experiências e comprovada por diferentes pessoas, sob condições variáveis de pressão, temperatura, umidade, etc., eliminando desta forma a possibilidade de erro, efeitos colaterais, etc., esta lei é aceita e torna-se válida também para o futuro.
Esta "regra" científica é aplicável, também, a acontecimentos e fenômenos no passado. Quando um determinado acontecimento ou fenômeno é referido, admitido por muitos historiadores e reportado de maneira idêntica, não há "dúvida científica" de que o fato realmente ocorreu naquelas circunstâncias.
Exemplo de acontecimento histórico foi a Revelação no Monte Sinai relatada de maneira idêntica por milhões de homens, mulheres e crianças; pessoas de todos os níveis de vida e antecedentes que presenciaram-na pessoalmente e depois relataram-na fervorosamente a seus filhos, geração após geração, sem interrupção, até os dias de hoje.
Em tempo algum, mesmo durante os piores pogroms e massacres de judeus não houve menos do que milhões de judeus mantendo fervorosamente esta tradição. É bem sabido que jamais na História Judaica houve uma interrupção na cadeia de tradição judaica do Sinai até os dias atuais. Isto faz este acontecimento, o mais autêntico de todos os acontecimentos históricos da História Humana.
Isto significa que a Torá que temos e veneramos é dada por D’us e contém, não apenas a nossa maneira de viver, mas também a chave para a nossa existência em todos os tempos, uma vez que é eterna como o seu Doador. Não é um livro de teoria, filosofia ou especulação, e sim um guia prático para nossa vida diária, válida em todos os lugares e em qualquer época, incluindo a América do século XX. Aqui, na Torá, a Lei Escrita e Verbal, a finalidade da vida humana nesta terra está claramente indicada.

Resumindo-a:
É viver de acordo com a Torá, cumprindo seus preceitos (Mitsvot – Farás) e abstendo-se de suas proibições (Mitsvot – Não farás). A Torá também preveniu-se contra a natureza fraca do homem para as tentações e dilemas que ele, criatura de carne e osso, enfrenta na vida. É difícil, quase impossível para o homem, jamais falhar; e a Torá indicou que, caso isso aconteça, não há necessidade de se desesperar. Há sempre a possibilidade da Teshuvá – o retorno a D’us – e ao bom caminho; e o próprio fracasso pode se transformar em um trampolim para um salto à frente, e um avanço cada vez maior.
Pode-se perguntar: se tudo o que foi escrito acima é tão simples e lógico, como explicar o número comparativamente pequeno daqueles que observam a Torá e as mitsvot, enquanto que os transgressores são tão numerosos?
A resposta a esta pergunta também é bastante simples. Eu sinto-a na minha própria carne: quando alguém medita sobre sua própria conduta e suas realizações, particularmente em sua vida cotidiana [não em períodos de elevação espiritual especial, como nos dias de Yom Tov, etc.], não é difícil ver que um número muito grande dessas ações são motivadas por desejos e inclinações, e não pelo intelecto. Isto é particularmente verdadeiro quando o conflito não impõe a ameaça imediata de "represárias". Quanto mais remoto o perigo das sanções, mais fraca se torna a motivação intelectual e a conduta torna-se mais fortemente influenciada por desejo e emoção; e mais ainda, quando as sanções são de natureza "abstrata". Pois o medo das sanções físicas (multas, confinamentos, etc.) é mais eficaz do que a advertência por argumentação em nome da moral, justiça, humanismo, etc.
Há também um fator adicional da natureza humana. Quando o homem sucumbe à tentação e comete um "pecado", ele pode experimentar uma de duas espécies de reação: Se ele é honesto e corajoso ele reconhecerá seu ato pelo que representa, – um fracasso –, bem como uma quebra de sua própria vontade sincera e consciência. Reconhecendo o seu fracasso como um sinal de fraqueza, ele procurará suplantá-lo e agirá melhor na próxima vez; D’us terá compaixão e o perdoará se admitir seu erro e resolver corrigi-lo.
Aquele, porém, que teme enfrentar a verdade e suas consequências no caso de uma falha, começa a encontrar desculpas para si próprio e para justificar sua ação negativa. Mais ainda: como "uma transgressão acarreta outra em sequência", o complexo de culpa, a necessidade de auto-justificativa, tornar-se-ão cada vez mais persistentes e prementes, não só para acalmar sua própria consciência atormentada, como para se defender aos olhos dos outros.
O amor mascara todas as ofensas, principalmente o amor próprio, e o suborno cega os olhos, mesmo dos sábios. Ele se tornará, assim, parcial em seu próprio favor e em seu pensamento confuso. "Criará" uma filosofia pessoal, ou mesmo uma "weltanschauung" para adaptar-se à sua conduta, que não somente a justificará, como ainda transformará o vício em virtude.
 Desnecessário dizer que é difícil alongar-se nesses assuntos numa carta. Acredito, porém, que os pontos mencionados servirão como pontos de partida para que o senhor medite e compreenda que o mundo não é confusão, e que tudo e todos têm o seu lugar e a sua finalidade.
Se o senhor puder se considerar objetivamente liberto de preconceitos, influências ambientais, bem como outras coisas, o senhor descobrirá o seu próprio lugar, e a finalidade da vida, à luz do que foi dito acima…

Com bênção,
(assinatura do Rebe).


Fonte
Beit Chabad, a sua referência judaica na internet
http://www.chabad.org.br/


jeudi 20 octobre 2011

A comunhão na natureza

Uma catástrofe natural
a antevisão do Dia do Senhor

“Mensagem que o Eterno confiou a Joel, filho de Petuel. Devastação do país. Ouçam o que digo, ó responsáveis do povo, prestem atenção, habitantes deste país! Porventura aconteceu algo semelhante durante a vida de vocês ou durante a vida dos seus antepassados? Contem-no aos seus filhos, para que eles contem também aos filhos deles e à geração seguinte. O que as lagartas deixaram foi comido pelos gafanhotos; o que os gafanhotos deixaram foi comido pelos saltões, e o que os saltões deixaram foi comido pelos outros insetos Despertem, chorem e lamentem-se, ó gente bêbeda e viciada do vinho, porque vão ficar sem uvas para fazer mais vinho”. Joel 1:1-5.

Uma catástrofe religiosa
falta conhecimento ao povo

Ouçam a mensagem do Eterno, habitantes de Israel. O Eterno chama a tribunal os habitantes do país: "Não há lealdade, nem bondade, nem conhecimento do Eterno nesta terra. Amaldiçoa-se, atraiçoa-se, assassina-se e rouba-se; os adultérios multiplicam-se e os homicídios sucedem-se uns aos outros. Por isso a seca vai causar estragos no país: os seus habitantes vão morrer, juntamente com os animais do campo e as aves do céu; e até os peixes vão desaparecer." "Que ninguém acuse, nem repreenda, eu é que te vou acusar, ó sacerdote! Tu hás-de tropeçar, durante o dia, e o teu aliado, o profeta, há-de tropeçar de noite; a tua própria pátria ficará destruída. O meu povo está sendo destruído, porque lhe falta conhecimento. E o culpado és tu, que os impediste de me conhecerem. Também eu afastarei você de mim, e não serás mais meu sacerdote. Oseias 4:1-6.

A comunhão na natureza
Rascunhos para um sermão

Para início de conversa

As Escrituras judaico-cristãs descrevem a construção do céu e da terra, obra do Eterno, através da indicação “e o Espírito do Eterno se movia por cima da água” (Gn 1.2). Isto quer dizer que o Espírito é Pessoa e presença do Eterno, sendo a natureza uma realidade formatada por Ele. E é o Espírito que clama pela liberdade redentora da natureza escravizada.

“Um dia o próprio Universo ficará livre do poder destruidor que o mantém escravo e tomará partena gloriosa liberdade dos filhos do Eterno. Pois sabemos que até agora o Universo todo geme e sofre como uma mulher que está em trabalho de parto” (Rm 8.21-22).

Primeira parte
A natureza é ação do Eterno

O Espírito é poder atuante do Eterno e força de vida das criaturas. O Espírito é a fonte da vida. O que existe e vive manifesta a presença dele.Ele transforma a comunhão com Pai e Filho na comunhão da natureza, na qual todas as criaturas, cada qual a seu modo, se comunicam com o Eterno. A existência, a vida e os relacionamentos estão firmados no Espírito, “pois nele vivemos, nos movemos e existimos” (At 17.28).

A partir do relacionamento trinitário, o ser humano faz parte da natureza e é dependente dela. Vive dentro de um contexto de interdependência. Desde o iníciopresente e futuro estão ligados à terra, à água e ao ar. “Ó Senhor, tu tens feito tantas coisas e foi com sabedoria que as fizeste. A terra está cheia das tuas criaturas” (Sl 104.24). O Eterno nos coloca junto e com a natureza para trabalhar e gozar essa natureza (Gn 2.15). Não haverá falta (2.8-9) se soubermos administrar. Dependemos do solo e dele recebemos o sustento. Pertencemos a este mundo construído e é ele que fornecea base para a existência. A vida começa e se orienta sob o cuidado do Eterno.

“Todos esses animais dependem de ti, esperando que lhes dês alimento no tempo certo. Tu dása comida, e eles comem e ficam satisfeitos. Quando escondes o rosto, ficam com medo; se cortas a respiração que lhes dás, eles morrem e voltam ao pó de onde saíram. Porém, quando lhes dás o sopro de vida, eles nascem; e assim dás vida nova à terra” (Sl 104.27-30).

Só para lembrar -- Entre 2000 e 2005, o Brasil foi o país que mais perdeu áreas de florestas, conforme estudo da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos/ PNAS. Nesses anos foram desmatados 165 mil km² de florestas, o equivalente a 3,6% das perdas de florestas no mundo todo. O segundo país que mais perdeu florestas foi o Canadá, com o desmate de 160 mil km². A ação humana e desastres naturais são as principais causas da perda de florestas. No mundo todo, a cobertura vegetal diminuiu 3,1% entre 2000 e 2005. Foram 1,01 milhão de km² desmatados, o que sugere crescimento de 0,6% ao ano. O estudo se baseou em observações por satélite de pesquisadores das Universidades de Dakota do Sul e do Estado de Nova York. 

Pensamos que o Brasil é apenas objeto para exploração, em vez de construção para a glorificação do Eterno. Ignoramos as necessidades das outras formas de vida. Essa atitude utilitarista de ver e agir é alienação, é uma falta de respeito para com o Espírito do Eterno.

Segunda parte
O desafio do cuidado amoroso

O Eterno é quem dá e quem sustenta a vida de todo o universo. Sua preocupação por atender às nossas necessidades (beber, comer e vestir) não se restringe ao ser humano, mas se estende a toda a natureza, refletida nos pássaros e nas flores do campo.

“É o Eterno quem veste a erva do campo, que hoje dá flor e amanhã desaparece, queimada no forno. Então é claro que ele vestirá também vocês, que têm uma fé tão pequena!” (Mt 6.30).

O universo inteiro depende do cuidado amoroso do Eterno, que não descuida de nenhuma criatura. Os lírios, por exemplo, caracterizados por sua fragilidade e vida curta, são vestidos de tal modo que nem Salomão usava roupas tão bonitas como essas flores. (Mt 6,29).

Criação significa que tudo é completamente obra do Eterno. Ele é o autor de tudo, pessoal e salvífico, que se revelou como puro amor. Toda a realidade brota da pura iniciativa deste amor divino, puro dom gratuito.
Mas, o ser humano faz parte da natureza, depende dela e é seu cuidador. O ser humano, como o restante da natureza, foi criado “de acordo com a sua espécie” (Gn 1.24 e 25), só que à imagem e semelhança do Eterno (Gn 1.26-27). A imagem do Eterno é elaborada em termos do domínio administrativo que o ser humano teria sobre o resto da natureza. O ser humano foi criado à imagem do Eterno, não somente por sua liberdade e direito à escolha, mas também pela postura que assume diante da natureza, uma postura de soberania em amor e comunhão, que deve refletir a soberania do Eterno (Gn 1.26-28). O ser humano não foi criado apenas para realizar uma administração espiritual, mas foi criado para orientar a natureza.

“No entanto, fizeste o ser humano inferior somente a ti mesmo e lhe deste a glória e a honra de um rei. Tu lhe deste poder sobre tudo o que criaste; tu puseste todas as coisas debaixo do domínio dele: as ovelhas e o gado e os animais selvagens também; os pássaros e os peixes e todos os seres que vivem no mar” (Sl 8.5-6).

Só para lembrar -- O Brasil é um país privilegiado em matéria de água. Detém 12% da água doce de superfície do mundo, o rio de maior volume e um dos principais aqüíferos subterrâneos, além de ótimos índices de chuva. Mesmo assim, falta água no semi-árido e nas grandes capitais, porque a distribuição desse recurso é desigual. Cerca de 70% da reserva brasileira de água está no Norte, onde vivem menos de 10% da população. Em São Paulo, a maior metrópole do país, a ocupação irregular das margens de rios e represas, como a de Guarapiranga, que abastece 3,7 milhões de paulistanos, deveria ser preocupação permanente. Ao seu redor vivem 700 mil habitantes. Com o desmatamento das margens, sedimentos são arrastados para a represa, que perde capacidade de armazenamento e recebe esgoto de residências. O problema é semelhante na represa Billings, também responsável pelo abastecimento de São Paulo. Esse manancial tem sido o destino das águas poluídas que são bombeadas dos rios Tietê e Pinheiros.

A administração humana sobre a natureza nós chamamos de mandato cultural. Ser criado à imagem do Eterno é ser responsável pelo planeta e por todas as formas de vida!

A liberdade humana implica responsabilidade para preservar a ordem que o Eterno criou e promovera existência de todos os seus elementos. Tal soberania não implica em liberdade para roubar, matar e destruir. Os seres humanos são mordomos do Eterno, responsáveis diante dele e cuja primeira tarefa é assegurar a permanência e equilíbrio da natureza.

Terceira parte
Somos todos responsáveis

A preocupação divina com a salvação espiritual não é alheia da sua preocupação pelo bem-estar da sua criação material. A natureza é o primeiro dos atos salvadores do Eterno.

Só para lembrar -- O modelo agrícola brasileiro revela uma contradição -- bate recordes de produtividade, com cerca de 30% das exportações brasileiras, mas 40% da população brasileira sofre com a insegurança alimentar, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística/ IBGE. É um país desiguail, com uma das maiores concentrações de terras do mundo, e ocupa o posto de maior consumidor de agrotóxicos do planeta, superando os Estados Unidos, segundo dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária/ Anvisa. O avanço da tecnologia não reduziu o consumo de agrotóxicos, pelo contrário, a tecnologia dos transgênicos estimulou o consumo desses produtos, especialmente na soja, que teve uma variação negativa em sua área plantada (-2,55%) e uma variação positiva de 31,27% no consumo de agrotóxicos, entre os anos de 2004 a 2008.

“Mas tu, ó Eterno, tens sido o nosso Rei desde o princípio e nos salvaste muitas vezes. Com o teu grande poder, dividiste o Mar e esmagaste as cabeças dos monstros marinhos. Esmagaste as cabeças do monstro Leviatã e deste o seu corpo para os animais do deserto comerem. Fizeste com que corressem fontes e riachos e secaste grandes rios. Criaste o dia e a noite, puseste o sol, a lua e as estrelas nos seus lugares. Marcaste os limites da terra e fizeste o verão e o inverno” (Sl 74.12-17).

Por isso, não devemos conceber a participação do ser humano no Brasil como opcional, nem como secundária sua missão na salvação de vidas. Desde o início, a natureza fazia parte do plano salvador do Eterno. A conversão de seres humanos não é o último dos atos salvadores do Eterno, mas o estabelecimento de novos céus e nova terra, ou seja, uma nova natureza (Ap 21.1), a libertação da própria natureza em si (Rm 8.20-22).

Até o fim, a natureza fará parte do plano salvador do Eterno. A graça do Eterno que se manifestou em Cristo, também se manifestou na natureza.

“O Eterno falou muitas vezes e de muitas maneiras aos nossos antepassados, mas nestes últimos tempos ele nos falou por meio do seu Filho. Foi ele quem o Eterno escolheu para possuir todas as coisas e foi por meio dele que o Eterno criou o Universo. O Filho brilha com o brilho da glória do Eterno e é a perfeita semelhança do próprio Eterno. Ele sustenta o Universo com a sua palavra poderosa. E, depois de ter purificado os seres humanos dos seus pecados, sentou-se no céu, do lado direito do Eterno, o Todo-Poderoso” (Hb 1.1-3).

A graça do Eterno manifesta alcançará o seu propósito de submeter a Cristo todas as coisas.

“Por isso o Eterno deu a Jesus a mais alta honra e pôs nele o nome que é o mais importante de todos os nomes, para que, em homenagem ao nome de Jesus, todas as criaturas no céu, na terra e no mundo dos mortos, caiam de joelhos e declarem abertamente que Jesus Cristo é o Senhor, para a glória do Eterno, o Pai”. (Fp 2.9-11).

Você deve levar em conta

“As Escrituras Sagradas dizem: O Eterno pôs todas as coisas debaixo do domínio dele. É claro que dentro das palavras “todas as coisas” não está o próprio Eterno, que põe tudo debaixo do domínio de Cristo. Mas, quando tudo for dominado por Cristo, então o próprio Cristo, que é o Filho, se colocará debaixo do domínio do Eterno, que pôs todas as coisas debaixo do domínio dele. Então o Eterno reinará completamente sobre tudo” (1Co 15.27-28).

Só para lembrar -- O lixo atômico das usinas de Angra I e II, no Rio de Janeiro, material é guardado em depósitos provisórios. Há 25 anos, toneladas de lixo radioativo nem saem dos prédios. Fica mergulhado em piscinas.

Existe uma teologia bíblica da vida, que envolve o uso responsável e sustentável dos recursos da criação do Eterno e a transformação das dimensões culturais, econômicas, morais, intelectuais e políticas da existência. Isto inclui a recuperação de um sentido bíblico de mordomia, que implica em administração e cuidado responsável. Da mesma maneira, o conceito bíblico de descanso semanal recorda que se deve por limites às atividades de produção e ao consumo. Assim, devemos usar a riqueza e o poder no serviço dos demais. É um compromisso de trabalhar para libertar os ricos da escravidão ao dinheiro e ao poder, e possibilitar aos que têm menos obter acesso à dignidade e às oportunidades de desenvolvimento. A esperança de tesouros no céu nos livra da tirania de Mamon. E fazendo assim estaremos compreendendo o sentido maior do cuidado da natureza e da vida criada pelo Eterno.


mardi 18 octobre 2011

John Smyth para batista nenhum botar defeito


John Smyth (1570--1612) foi um dos primeiros pastores batistas da Inglaterra e um defensor do princípio da liberdade religiosa. Alguns historiadores o consideram como um dos fundadores da denominação batista. Smyth nasceu em Lincolnshire e estudou em Gainsborough.

Smyth foi ordenado sacerdote anglicano em 1594, e durante um certo tempo alinhou-se à tradição anglicana. Mas, com o tempo, seus pontos de vista mudaram. Começou a insistir que a adoração deveria ser do coração e que qualquer de leitura de um Livro de Orações na adoração era invenção humana. Esta rejeição da liturgia, mas tarde foi adotada por ele, nas congregações batistas, e permaneceu entre muitos batistas ainda hoje. Ele considerava que oração, cântico e pregação tinham que ser espontâneos. Foi tão longe que não permitia a leitura da Bíblia durante o culto, alegando que a tradução era obra humana e, portanto, não deveria ser trazida para a adoração a Deus. Tal idéia surgiu dp entendimento de que a adoração deveria ser ordenada pelo Espírito. E assim rompeu com a Igreja da Inglaterra e refugiou-se na Holanda, onde com sua pequena congregação aprofundou-se no estudo da Bíblia, com o auxílio de crentes menonitas. Em 1609, junto com seu grupo, veio a crer no batismo do crente, em oposição ao batismo infantil. Mas, com a aceitação do batismo de crente, uma preocupação surgiu. Tendo sido batizados quando crianças, todos eles perceberam que teriam que ser rebatizados. Como não havia outro pastor para administrar o batismo, Smyth batizou-se a si mesmo, razão pela qual passou a ser chamado "o primeiro batista". Depois, então, batizou seu rebanho.

John Clifford, citado no (General Baptist Magazine", Londres, julho de 1879, vol. 81), faz um relato um pouco diferente. Conta que em 24 de março de 1606, à meia-noite, o reverendo John Morton batizou John Smyth, vigário de Gainsborough, no rio Don. “Estava tão escuro que fomos obrigados a acender tochas. Elder Brewster orou, o senhor Smyth fez uma profunda confissão, caminhou até Epworth em suas roupas de frio, mas não vimos mais nada naquela distância de mais de duas milhas. Todos os nossos amigos, para a glória do Deus, trino estavam presentes"
.
Formaram, assim, a primeira igreja batista historicamente datada. E foi a partir de Smyth que os batistas passaram a acreditar que o batismo é testemunho de obediência (Mt. 28:19-20) e a imersão um símbolo da morte, sepultamento e ressurreição de Jesus.
Ao retornar à Inglaterra, Smyth introduziu na sua congregação a liderança eclesiástica de duas pontas, pastor e diácono, em contraste com a liderança reformada de três dobras, pastor, presbíteros e diáconos.
Antes de sua morte, Smyth se afastou do jovem movimento batista e procurou levar seu rebanho para a igreja menonita. Morreu antes que isso acontecesse, mas a maior parte de sua congregação se uniu aos menonitas depois de sua morte. A reaproximação de Smyth aos menonitas provocara, antes, uma separação entre ele e o grupo liderado por Thomas Helwys. As igrejas oriundas de Smyth e Helwys eram, naquele momento, batistas gerais, de corte arminiano. Entre as formulações teológicas de Smyth, duas marcaram essas primeiras congregações batistas: a rejeição do pecado original e a afirmação de que cada cristão tem o direito de expressar e realizar sua leitura religiosa. Sem dúvida, foi um batista!

Referências bibliográficas
DONIGER, Wendy, ed (1999), Merriam-Webster's Encyclopedia of World Religions. Springfield, MA: Merriam-Webster.
LEE, Jason (2003), The Theology of John Smyth: Puritan, Separatist, Baptist, Mennonite. Macon, GA: Mercer University Press.

vendredi 14 octobre 2011

21 gramas, ou, quanto pesa a sua alma?

Dentro de dois meses, segundo meu editor,
meu novo livro estará nas livrarias do País. E este artigo faz parte dele.
Fique alerta e curta comigo quando ele sair. Abraços, JP
.


"O meu amor é o meu peso. Para qualquer parte que eu vá, é ele quem me leva. O Teu dom inflama-nos e arrebata-nos para o alto. Andamos e partimos. Fazemos ascensões no coração e cantamos o cântico dos degraus”. [1]

Este texto de não é somente belo. Mil e trezentos anos antes de sir Isaac Newton, santo Agostinho intuía que há coisas tão leves, que sobem, ao invés de cair. E que todas as coisas só encontram o repouso quando estão no lugar que deveriam estar.

Para Alejandro González Iñárritu que dirigiu o filme “Vinte e um gramas” a vida é uma história de esperança: você pode ter medo da morte, mas ela virá e, nesse instante, seu corpo se tornará 21 gramas mais leve. E por isso coloca-nos a pergunta: será que é a alma que pesa esses 21 gramas? 

Para Agostinho, teólogo da igreja cristã, "o corpo, devido ao peso, tende para o lugar que lhe é próprio, porque o peso não tende só para baixo, mas também para o lugar que lhe é próprio. Assim, o fogo encaminha-se para cima e a pedra para baixo. Movem-se segundo o seu peso. Dirigem-se para o lugar que lhes compete. O azeite derramado sobre a água aflora a superfície. A água vertida sobre o azeite submerge debaixo deste. Movem-se segundo o seu peso e dirigem-se para o lugar que lhes compete. As coisas que não estão em seu lugar próprio agitam-se, mas quando o encontram, ordenam-se e repousam".[2]

Ora, se tudo tem um peso, por que não a alma. E se a alma tem um peso, o que a leva para cima ou para baixo? Segundo Agostinho, repousamos no dom do Espírito, que é o nosso descanso, é o nosso lugar. É para lá que o amor nos arrebata e que o Espírito levanta o nosso abatimento desde as portas da morte.

O filme Vinte e um gramas explora a existência física e emocional de três casais. O professor universitário Paul Rivers e sua mulher Mary vêem o seu casamento oscilar entre a vida e a morte enquanto ele aguarda um transplante de coração. O ex-presidiário Jack Jordan e sua mulher Marianne lutam para criar os dois filhos, enquanto Jack reafirma seu compromisso com a igreja. Cristina perde o marido Michael Peck e suas duas meninas num acidente trágico que entrelaça destinos e os levará às profundezas da vingança, aos limites do amor e à promessa da redenção.

Assim, Paul, Cristina e Jack são colocados ante a realidade da morte. E ela pesa de maneiras diferentes na vida de cada um. Mas, diante da morte, para que a esperança se faça presente, a vida deve renascer.

Vinte e um gramas é o peso de cinco moedas de cinco centavos, de um beija-flor e, talvez, da alma humana.

O filme vale a pena, embora pese mais que 21 gramas. Mas, depois de ver o filme, não esqueça que o seu peso é o amor, que nos puxa para cima. Ou, como diz Agostinho:

"É o Teu fogo, o Teu fogo benfazejo que nos consome, enquanto vamos e subimos para a paz da Jerusalém celeste. Regozijei-me com aquilo que me disseram: iremos para a casa do Senhor. Lá nos colocará a boa vontade, para que nada mais desejemos senão permanecer ali eternamente".[3]

Ficha Técnica:
Titulo Original: 21 Grams
Ano de Lançamento: 2003
Gênero: Drama Duração: 125 minutos.
Direção: Alejandro González Iñárritu
Roteiro: Guillermo Arriaga, Alejandro González Iñárritu
Elenco: Sean Penn, Naomi Watts, Benicio Del Toro, Charlotte Gainsbourg, Melissa Leo, Clea DuVall, Danny Huston, Carly Nahon, Claire Pakis, Nick Nichols, John Rubinstein, Eddie Marsan.

Notas
[1] Agostinho, Santo, Confissões, Livro XIII, cap. 9, Ed. Abril, São Paulo, 1973, p. 292.
[2] Idem, op. cit., pp. 291-292.
[3]Idem, op. cit., p. 292.





















jeudi 13 octobre 2011

SEMANA TEOLÓGICA em homenagem ao pe. José Comblin

 
Caros amigos e amigas,
Leia o convite. Peço que divulguem a SEMANA TEOLÓGICA via e-mail, rádio, folder impresso. Este evento está organizado pelos grupos e entidades: Grupo Igreja dos Pobres | Movimento Internacional "Somos Igreja" |  Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania - UFPB.
Participe de toda a programação. Abraço, Pe. Eliezer Souza.
Objetivos da  Semana Teológica: Homenagem à figura de Pe. R. José Comblin, rememorando seu
legado de profeta, de missionário, de sociólogo de formador e de teólogo.
Confraternizar, celebrando juntos e compartilhando com seus amigos e amigas de caminhada, momentos memoráveis vividos com Pe. José. Refletir sobre nosso compromisso missionário diante dos desafios atuais. 
A Esperança dos Pobres Vive!
SEMANA TEOLÓGICA em homenagem ao pe. José Comblin
(w 22/03/1923 + 27/03/2011)

Memória, legado e vigência. Pe. José Comblin
Data: 26, 27, 28 e 29 de Outubro das19 às 21:30
Local: Auditório da Reitoria da UFPB

José Comblin (1923 -2011) segue sendo uma figura emblemática para uma incontável multidão de cristãos e cidadãos espalhados pelo mundo, em especial na América Latina. Nele reconhecemos um dos teólogo da aurora da Teologia da Libertação - em especial da Teologia da Enxada, com uma produção privilegiada, seja quanto à qualidade, seja quanto ao seu incansável ritmo de produção, donde a publicação, até o final de seu percurso existencial, de centenas de artigos e dezenas de livros. Para bem além de sua qualidade de exímio teólogo, Pe. José Comblin se mostrou um apaixonado incondicional da causa libertária dos pobres, na perspectiva do Seguimento de Jesus. Pe. José é reconhecido, antes de tudo, como o amigo dos pobres, no meio de quem viveu, no Brasil, no Chile e por onde passou. Deixa-nos um amplo e reconhecido legado também como profeta, como missionário, como sociólogo e como formador. Desse legado também se ocupa essa Semana Teológica, com o propósito de assegurar-lhe vigência também para os próximos anos. Um missionário incansável, nas pegadas do Pe. Ibiapina, a semear a esperança entre o Povo dos Pobres da América Latina, do Brasil, do Nordeste. Enquanto missionário, tornou-se conhecido e exemplar também como profeta, sempre a incomodar, sempre a desinstalar, sempre a denunciar as mazelas e armadilhas dos poderosos e das instituições, e, ao mesmo tempo, a anunciar que ‘‘a esperança dos pobres vive’’! Um teólogo com uma produção vastíssima e de reconhecida relevância e atualidade, a quem muito deve a Teologia da Libertação, desde suas primeiras formulações, e cuja contribuição mais fecunda se deu no campo de seus estudos pneumatológicos (da ação do Espírito Santo no mundo). Um intelectual de inteligência privilegiada, dotado de profunda erudição, que sempre soube combinar com uma capacidade ímpar de clareza, simplicidade e força do testemunho.

SEMANA TEOLÓGICA
A Esperança dos Pobres Vive
Pe. José Comblin
Memória, legado e vigência.
PROGRAMAÇÃO
Dia 26/10 (19 horas)
Comblin, traços de sua vida e de sua obra. (Eduardo Hoornaert e Mônica Muggler)
Dia 27/10 (19 horas)
Lançamento do filme ‘ Dom Fragoso’’, amigo do Padre José e da Igreja dos Pobres. Palavras do Cineasta Francis Vale, do prof. João de Lima, da Irm. Agostina V. de Melo e outras.
Dia 28/10 (19 horas)
Contribuição de Comblin aos estudos sobre a missão do Espírito Santo no mundo. (Pastor Luciano Batista de Souza)
Dia 29/10 (8 horas)
Memória e testemunhos sobre o Pe. José.
Organização: Grupo Igreja dos Pobres; Mov. Somos Igreja
Apoio: Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania / Ufpb

Uma fala que não deve ser esquecida
A Igreja abandonou as classes populares
José Comblin, um dos criadores da Teologia da Libertação, afirmou que a eleição de João Paulo II e de Bento XVI foi manejada pelo Opus Dei "praticando a chantagem, intimidando os cardeais", e que na América Latina o Papa "é mais divino do que Deus". Comblin, belga que vive no Brasil e acaba de visitar o Chile, país em que esteve exilado em 1972, durante o governo da Unidade Popular, explicou ainda que os teólogos da libertação têm hoje mais de 80 anos e "não apareceu uma nova geração" que desse continuidade a esse pensamento. A reportagem é do sítio Religión Digital, 05-01-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Fonte: UNISINOS

"A repressão foi muito forte, terrível, e a ditadura do Papa aqui na América Latina é total e global. Aqui, pode-se criticar Deus, mas não o Papa. O Papa é mais divino do que Deus", asseverou o teólogo.

Segundo Comblin, a Igreja Católica "abandonou as classes populares, salvo os velhos e algumas relíquias do passado".

"Hoje, as universidades e os colégios católicos são para a burguesia. O porvir da América Latina é ser um continente evangélico protestante, salvo sua classe alta. Assim, a Opus Dei e os Legionários de Cristo e todas essas associações que existem de ultradireita vão crescendo nesse setor", opinou, em declarações no Chile à revista El Periodista.

"Onde há um ou dois bispos da Opus Dei no episcopado, intimidam a todos os demais. Os outros ficam calados e só um fala. Esse é um problema de psicologia típico de ditaduras", defendeu.

Segundo Comblin, "foi a Opus el que elegeu João Paulo II e o atual, praticando a chantagem, intimidando os cardeais. O próximo Papa será igual porque a Opus tem um poder muito forte".

O teólogo, de 87 anos, defende que Deus está "em La Victoria e em La Legua (dois bairros populares de Santiago) e na prisão, mas de Roma desapareceu há muito tempo".

"Agora, sempre fica mais claro que o problema é o Papa, ou seja, a função do Papa, uma ditadura implacável com muitas formas de doçura e amabilidade, mas implacável", defendeu.

Comblin defendeu que "o porvir do cristianismo está na China, Coreia, Filipinas, Indonésia. Estima-se que só na China há 130 milhões de cristãos martirizados, porque estão praticamente perseguidos".

O teólogo criticou a eventual canonização de João Paulo II porque seu papado "foi catastrófico". "Todos os que fizeram sua carreira com ele puderam ser cardeais, apesar de sua mediocridade pessoal. Não mereciam nada, mas ele os promoveu. Claro que agora querem canonizá-lo! Uma vez que canonizaram Escrivá, todo mundo sabe que se pode ser santo sem ter virtude alguma", destacou.

Sobre a Opus Dei e os Legionários de Cristo, Comblin afirmou que "têm a confiança da Cúria Romana e depois representam a plena liberdade dada a personalidades que são como os grandes Rockefeller, os conquistadores".

"Como Escrivá de Balaguer, que era um capitalista, o homem que vai triunfar, que vai desfrutar o mundo, que vai ganhar, ser rico, poderoso e que é capaz de criar pessoas totalmente subordinadas, soldados com mentalidade de soldado, esses são todos homens deformados psicologicamente, como são os futuros ditadores", detalhou.

Depois de recordar que do mexicano Marcial Maciel, dos Legionários de Cristo, foi descoberta uma vida paralela e uma fortuna de 50 bilhões de dólares, afirmou que "sua chantagem, sua palavra e sua exigência chegaram aos milionários".

"Hoje, os que trabalharam com ele, seus colaboradores, todos dizem e afirmam que não sabiam nada da vida paralela (de Maciel). Como? Trabalham 40 anos com ele e não sabem de nada, que ele tem uma família, três filhos, que praticou a pedofilia com as crianças, alunos de sua formação, de seus colégios, que tinha um mundo de amantes. Não sabiam de tudo isso? Supõe-se, então, que eles são cúmplices e também têm uma vida paralela", concluiu.

Fonte
Reflexões Teológico-Pastorais

Zizek: o casamento entre democracia e capitalismo acabou

O filósofo e escritor esloveno Slavoj Zizek visitou o acampamento do movimento Ocupar Wall Street, no parque Zuccotti, em Nova York, e falou aos manifestantes. “Estamos testemunhando como o sistema está se autodestruindo. Quando criticarem o capitalismo, não se deixem chantagear pelos que vos acusam de ser contra a democracia. O casamento entre a democracia e o capitalismo acabou". Leia a íntegra do pronunciamento de Zizek,
com tradução do meu amigo Luis Leiria para o Esquerda.net


Slavoj Zizek

Durante o crash financeiro de 2008, foi destruída mais propriedade privada, ganha com dificuldades, do que se todos nós aqui estivéssemos a destruí-la dia e noite durante semanas. Dizem que somos sonhadores, mas os verdadeiros sonhadores são aqueles que pensam que as coisas podem continuar indefinidamente da mesma forma.

Não somos sonhadores. Somos o despertar de um sonho que está se transformando num pesadelo. Não estamos destruindo coisa alguma. Estamos apenas testemunhando como o sistema está se autodestruindo.

Todos conhecemos a cena clássica do desenho animado: o coiote chega à beira do precipício, e continua a andar, ignorando o fato de que não há nada por baixo dele. Somente quando olha para baixo e toma consciência de que não há nada, cai. É isto que estamos fazendo aqui.

Estamos a dizer aos rapazes de Wall Street: “hey, olhem para baixo!”

Em abril de 2011, o governo chinês proibiu, na TV, nos filmes e em romances, todas as histórias que falassem em realidade alternativa ou viagens no tempo. É um bom sinal para a China. Significa que as pessoas ainda sonham com alternativas, e por isso é preciso proibir este sonho. Aqui, não pensamos em proibições. Porque o sistema dominante tem oprimido até a nossa capacidade de sonhar.

Vejam os filmes a que assistimos o tempo todo. É fácil imaginar o fim do mundo, um asteróide destruir toda a vida e assim por diante. Mas não se pode imaginar o fim do capitalismo. O que estamos, então, a fazer aqui?

Deixem-me contar uma piada maravilhosa dos velhos tempos comunistas. Um fulano da Alemanha Oriental foi mandado para trabalhar na Sibéria. Ele sabia que o seu correio seria lido pelos censores, por isso disse aos amigos: “Vamos estabelecer um código. Se receberem uma carta minha escrita em tinta azul, será verdade o que estiver escrito; se estiver escrita em tinta vermelha, será falso”. Passado um mês, os amigos recebem uma primeira carta toda escrita em tinta azul. Dizia: “Tudo é maravilhoso aqui, as lojas estão cheias de boa comida, os cinemas exibem bons filmes do ocidente, os apartamentos são grandes e luxuosos, a única coisa que não se consegue comprar é tinta vermelha.”

É assim que vivemos – temos todas as liberdades que queremos, mas falta-nos a tinta vermelha, a linguagem para articular a nossa ausência de liberdade. A forma como nos ensinam a falar sobre a guerra, a liberdade, o terrorismo e assim por diante, falsifica a liberdade. E é isso que estamos a fazer aqui: dando tinta vermelha a todos nós.

Existe um perigo. Não nos apaixonemos por nós mesmos. É bom estar aqui, mas lembrem-se, os carnavais são baratos. O que importa é o dia seguinte, quando voltamos à vida normal. Haverá então novas oportunidades? Não quero que se lembrem destes dias assim: “Meu deus, como éramos jovens e foi lindo”.

Lembrem-se que a nossa mensagem principal é: temos de pensar em alternativas. A regra quebrou-se. Não vivemos no melhor mundo possível, mas há um longo caminho pela frente – estamos confrontados com questões realmente difíceis. Sabemos o que não queremos. Mas o que queremos? Que organização social pode substituir o capitalismo? Que tipo de novos líderes queremos?

Lembrem-se, o problema não é a corrupção ou a ganância, o problema é o sistema. Tenham cuidado, não só com os inimigos, mas também com os falsos amigos que já estão trabalhando para diluir este processo, do mesmo modo que quando se toma café sem cafeína, cerveja sem álcool, sorvete sem gordura.

Vão tentar transformar isso num protesto moral sem coração, um processo descafeinado. Mas o motivo de estarmos aqui é que já estamos fartos de um mundo onde se reciclam latas de coca-cola ou se toma um cappuccino italiano no Starbucks, para depois dar 1% às crianças que passam fome e fazer-nos sentir bem com isso. Depois de fazer outsourcing ao trabalho e à tortura, depois de as agências matrimoniais fazerem outsourcing da nossa vida amorosa, permitimos que até o nosso envolvimento político seja alvo de outsourcing. Queremos ele de volta.

Não somos comunistas, se o comunismo significa o sistema que entrou em colapso em 1990. Lembrem-se que hoje os comunistas são os capitalistas mais eficientes e implacáveis. Na China de hoje, temos um capitalismo que é ainda mais dinâmico do que o vosso capitalismo americano. Mas ele não precisa de democracia. O que significa que, quando criticarem o capitalismo, não se deixem chantagear pelos que vos acusam de ser contra a democracia. O casamento entre a democracia e o capitalismo acabou.

A mudança é possível. O que é que consideramos possível hoje? Basta seguir os meios de comunicação. Por um lado, na tecnologia e na sexualidade tudo parece ser possível. É possível viajar para a lua, tornar-se imortal através da biogenética. Pode-se ter sexo com animais ou qualquer outra coisa. Mas olhem para os terrenos da sociedade e da economia. Nestes, quase tudo é considerado impossível. Querem aumentar um pouco os impostos aos ricos? Eles dizem que é impossível. Perdemos competitividade. Querem mais dinheiro para a saúde? Eles dizem que é impossível, isso significaria um Estado totalitário. Algo tem de estar errado num mundo onde vos prometem ser imortais, mas em que não se pode gastar um pouco mais com cuidados de saúde.

Talvez devêssemos definir as nossas prioridades nesta questão. Não queremos um padrão de vida mais alto – queremos um melhor padrão de vida. O único sentido em que somos comunistas é que nos preocupamos com os bens comuns. Os bens comuns da natureza, os bens comuns do que é privatizado pela propriedade intelectual, os bens comuns da biogenética. Por isto e só por isto devemos lutar.

O comunismo falhou totalmente, mas o problema dos bens comuns permanece. Eles dizem-nos que não somos americanos, mas temos de lembrar uma coisa aos fundamentalistas conservadores, que afirmam que eles é que são realmente americanos. O que é o cristianismo? É o Espírito Santo. O que é o Espírito Santo? É uma comunidade igualitária de crentes que estão ligados pelo amor um pelo outro, e que só têm a sua própria liberdade e responsabilidade para este amor. Neste sentido, o Espírito Santo está aqui, agora, e lá em Wall Street estão os pagãos que adoram ídolos blasfemos.

Por isso, do que precisamos é de paciência. A única coisa que eu temo é que algum dia vamos todos voltar para casa, e vamos voltar a encontrar-nos uma vez por ano, para beber cerveja e recordar nostalgicamente como foi bom o tempo que passámos aqui. Prometam que não vai ser assim. Sabem que muitas vezes as pessoas desejam uma coisa, mas realmente não a querem. Não tenham medo de realmente querer o que desejam. Muito obrigado

http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=18669

mercredi 12 octobre 2011

Ainda que a figueira não floresça

mesmo assim eu darei graças ao Senhor e louvarei a Deus, o meu Salvador” (Habacuque 3.18).

Ele é o homem do abraço carinhoso, de coração generoso, que carrega quem sofre no colo. Esse Habacuque procura uma profecia de conforto, que dê ânimo ao povo, como se faz com uma criança que chora. Mas não é isso que acontece.

Habacuque reclama da decadência moral dos judeus e lamenta. E quando o Eterno informa que mobilizará os caldeus para exterminar a apostasia, estarrecido Habacuque diz ao Eterno que os caldeus são piores do que os judeus, que são traiçoeiros, e destroem tudo que encontram pela frente. Idolatram sua própria força e capacidade militar, ao invés de dar glória ao Eterno.

Habacuque, porém, sabe que o Eterno é puro de olhos e, por isso, espera a solução que virá dele. No entanto, está perplexo, a justiça do Eterno para com os inimigos caldeus e os judeus apóstatas não virá como fogo do céu, exclusivamente sobre os pecadores, mas como tsuname que avançará sobre inimigos e apóstatas e sobre todos. E o justo não surfará sobre essa maré de destruição -- deverá repousar apenas na sua fé.

Agradecimento, confiança e oração são as chaves espirituais para desvendar os mistérios do governo do Eterno sobre a terra. O espírito de Habacuaque e de seus irmãos vacilam entre o medo e a esperança, mas ao final os julgamentos do Eterno triunfarão alegremente.

Muitas vezes, quando falamos de crise entre as nações, ou de dor e sofrimento entre os cristãos, nos perguntamos se o Eterno está preocupado com essas coisas. A resposta para essas questões estão presentes no rolo de Habacuque. O profeta do primeiro testamento ensina que as nações e os povos são julgadas pelo bem e pelo mal que produzem no mundo. E que esses juízos muitas vezes atingem também os filhos de Deus.

Conhecedor da alienação de Judá e consciente de que os caldeus invadiriam seu país, Habacuque sofre diante do que acontecerá ao seu povo. O profeta ora ao Senhor (3.1-19) e pede que Ele tenha misericórdia no exercício da sua justiça.

E foi assim, num momento extremo de dor, que Habacuque compôs o final do seu livro, o capítulo três, que é um dos poemas mais lindos do primeiro testamento. Nele o profeta mostra que toda a glória e todo o louvor pertencem a Deus.

Glória pelo que Ele é: misericordioso. O Eterno não vem só para julgar, mas também para livrar. “Mesmo que estejas irado, tem compaixão de nós” (3.2).

Glória por sua majestade. Devemos aceitar a sua justiça, não porque entendemos ou deixamos de entender, mas porque Ele é o Eterno e nós somos pó. “Ele pára e a terra treme. Ele olha para as nações e elas ficam com medo” (3.6).

Glória por nos manter firmes na adversidade. Lembre-se: ainda que a figueira não floresça, que não haja uvas nas parreiras, que os campos não produzam alimentos e que o rebanho seja exterminado, Ele está ao seu lado. “O Deus Eterno é a minha força. Ele torna o meu andar firme”. (3.19).

Após as manifestações do Eterno no passado da história do povo, Habacuque canta, agora, a libertação antecipada contra o inimigo, através da interposição da majestade sublime do Eterno, de modo que aquele que crê pode regozijar-se no Eterno da sua salvação. Assim, o capítulo três, um salmo composto para ser cantado e acompanhado por instrumentos, fecha o livro com um lirismo cheio de esperança.

A violência aparentemente bem-sucedida dos caldeus, a apostasia dos judeus, e a maré da justiça de Deus, que varre a Palestina, é o pano de fundo para esse profeta de coração generoso falar de esperança e dizer que o justo viverá por sua fé, hn"Wma/ (emuná), por seu posicionamento consciente e fiel diante da vontade soberana do Eterno.

Por isso, querido irmão, querida irmã, como Habacuque não se esqueça: quando tudo parece perdido, com Deus ainda não está perdido. Quando chegamos ao final de nossos recursos, os recursos de Deus ainda estão disponíveis. E quando a crise, a dor e o sofrimento nos encurralam, precisamos olhar para o alto, porque é Ele quem torna o teu andar firme como o de uma corça e quem te leva para as montanhas, onde estarás seguro (3.19).

Que a fé de Habacuque sirva de exemplo para você e para mim. Do pastor e amigo, Jorge Pinheiro.

 

Eu, você e o eterno

O humano herdou do Eterno nomeado sistemas que possibilitam o relacionamento com a transcendência e viver a presença dessa transcendência na existência material. A imagem do eterno tem um poder extraordinário. Ela afeta a psique do humano com tal força que, diante dela, nos perguntamos: esse imagem é real? E perguntamos isso porque está nomeado que só um é eterno, pai de todos, que está acima de todos e que atua através de todos e em todos (Ef 4.6). Donde, outra questão nos é colocada: somos ou não proprietários do poder? O humano tem o desafio de vencer obstáculos e construir a existência, herdou potencialidades. Não é proprietário do poder do Eterno nomeado, mas não nasceu tabula rasa, deve construir consciência. Trouxemos sistemas que nos possibilitam ser humanos. Somos imago Dei.

Quando olhamos para o humano percebemos que o transcendente é fundante, porque as imagens ancestrais estão relacionadas com a construção da consciência. Ou seja, devemos trabalhar pelo que permanece e que é entregue pelo eterno
(Jo 6.27). Temos, por isso, que descobrir as leis eternas, mas intuímos que, em última instância, brotam da união da transcendência presente nas bordas da existência com o Eterno nomeado. Ou seja, em relação ao Eterno, o humano tem a capacidade de integrar a eternidade no modelo da existência.

O Eterno se identifica com as imagens nomeadas, é espírito de conhecimento e sabedoria que atrai
(Ef 1.17), mas tais imgens nomeadas nem sempre estão conscientes e vivas na existência pessoal. Isto é um perigo, porque a identificação não consciente leva à idolatria, fica-se amarrado por dentro, sem usufruir da possibilidade de saltar do mundo interior em direção à transformação da realidade que alucina.

Quando o eterno não potencializa efetivamente a consciência humana, nem experimentamos o processo de individuação que faz de nós imago Dei, que nos leva ao confronto entre as realidades do que está dentro com o que está fora, não usufruimos do que está nomeado e deve ser construído. Embora a decisão da eternidade é que sejamos filhos, pois fomos gerados por ela em por issom devemos destuir o que é de barro
(Sl 2.7-9). Quando essa construção não se dá, somos sombra. Somos sem destino.
 
O desenvolvimento da consciência retoma as características do Eterno nomeado, pois a todos
foi dado as ferramentas necessárias (Ef 4.7) que possibilitam a construção da relação do que é pessoal com o que é eterno. Isso é desenvolvimento humano. Quando a transcendência brota nas vidas temos consciência dos perigos da existência. E o espírito humano parte para o desafio de criar estruturas para suportar tanto a realidade interna como a realidade externa, a fim de identificar os demônios que querem nos lançar nas profundezas do mar infinito.

O espírito humano deve construir estruturas de diálogo entre as alegrias e as angústias da existência, pois
não há nada melhor do que gozar o resultado daquilo que se faz. Essa é a recompensa (Ec 3.22). Céu e terra é correlação necessária, porque na presença do eterno que se faz consciente a liberdade humana é polaridade, é viver a vida diante da tirania do não-ser.

lundi 10 octobre 2011

Lendo Oséias com Calvino -- capítulo três

O capítulo três completa a metáfora da vida familiar de Oséias.
“Deveras, o Profeta quer dizer que Deus se antecipa a nós com sua mercê; caso contrário, temos o nosso acesso a ele tolhido. Então Deus, de sua boa vontade, adianta-se, estende-nos sua mão e, em seguida, vem o consentimento da nossa fé. Por essa razão Deus, primeiramente, fala aos israelitas, para que eles soubessem que eram agora reputados por povo dele: e então, após Deus haver testificado seu favor, eles respondem: ‘Tu começastes, de agora em diante, a ser nosso Deus’. Por isso, vemos que o princípio de todo bem vem de Deus, quando ele faz de estranhos, amigos, e adota como seus filhos aqueles que outrora eram seus inimigos”. (João Calvino, Comentário de Oseias, cap. 3).

“A essência desse capítulo é que era propósito de Deus guardar, em firme esperança, as mentes dos fiéis durante o exílio, para que não fossem engolfados com desespero que os desfalecesse de todo. O Profeta falara antes da reconciliação de Deus com o seu povo; e ele, esplendidamente, exaltara tal favor quando disse: ‘Vós sereis como no vale de Acor, eu restituirvos-ei a abundância de todas as bênçãos; em uma palavra, vós sereis, em todos os aspectos, felizes’. Mas, no meio-tempo, a miséria cotidiana do povo prosseguia. Deus, de fato, tinha determinado removê-los a Babilônia. Eles podiam, por conseguinte, ter se desesperado sob aquela calamidade, como se toda esperança de libertação lhes fosse inteiramente retirada. Por isso, o Profeta agora revela que Deus restauraria o povo à mercê, de modo que não apagaria imediatamente toda lembrança da ira dele Deus, mas que a intenção era continuar, por um tempo, com certa medida da severidade divina”. (João Calvino, idem, op, cit., cap. 3).

"O Senhor disse-me: ´Ama essa mulher, mesmo que seja amante de outro e viva em adultério. Faz como eu, o Senhor, que amo os israelitas, apesar de se voltarem para outros deuses, desejosos das tortas de uvas´." (v. 1)

Deus mandou que Oséias tomasse de volta a sua esposa, bhea' (aheb) porque Ele tem amor, carinho, amizade por seu povo, por isso  mesmo depois do pecado de idolatria, arrependimento, perdão e reconciliação são possíveis.

"Recuperei então a minha mulher por quinze moedas de prata e seiscentos litros de cevada". (v. 2).

Oséias obedeceu, comprando de volta a sua mulher. O valor pago equivale o valor de uma escrava.

"Mas se o boi matar um escravo ou uma escrava, o boi será apedrejado até morrer e o senhor do escravo ou da escrava, receberá do dono do boi trinta moedas de prata".  (Ex 21:32).

"Por isso lhe digo: ´Viverás comigo por muito tempo. Não pratiques a prostituição, nem te entregues a homem algum. E eu farei o mesmo para contigo´." (v. 3)

Oséias e Gômer não voltaram imediatamente a ter relações conjugais. Ele esperou para ver se ela ficaria longe dos amantes. Não cometeria mais hn"z" (zanah) adultério, fornicação, prostituição.

"Também o povo de Israel ficará por muito tempo sem rei e sem chefes, sem sacrifícios e sem monumentos religiosos, sem insígnias nem dados para oráculos". (v. 4).

Em relação à nação, Deus deixaria o povo sem liderança e sem as coisas necessárias para adorá-lo segundo a lei. Ao mesmo tempo, ficariam sem os ídolos.

"Mais tarde, o povo de Israel voltará a procurar o Senhor, seu Deus, e o descendente de David para seu rei. No futuro, procurarão com todo o respeito o Senhor e os seus favores". (v. 5)

No final, Israel seria reconciliado com Deus. Este versículo se refere à restauração espiritual do povo na nova Aliança. Davi simboliza o Cristo. Os últimos dias se referem à época do novo Testamento. Por meio do Senhor, Israel espiritual se aproxima do Senhor.

"Pois pela fé que vos une a Jesus Cristo säo todos filhos de Deus. Com efeito, todos os que foram batizados em Cristo revestiram-se das qualidades de Cristo. Näo há diferença entre judeus e näo-judeus, entre escravos e pessoas livres, entre homem e mulher. Agora constituem um todo em uniäo com Cristo Jesus. E se säo de Cristo, entäo säo descendência de Abraäo e herdeiros de acordo com a promessa". (Gl 3:26-29),

O povo retorna, mas ainda não está em plena comunhão com o Eterno. Assim o profeta indica um tempo entre a volta do cativeiro e a vinda de Davi (o Cristo) para fazer paz entre o povo e o Eterno.

NONA DISSERTAÇÃO

“Temos agora que considerar a segunda oração, acerca do Rei Davi. O Profeta nos diz que, quando os israelitas forem movidos pelo desejo de buscar a Deus, eles também buscarão a Davi, rei deles. Haviam se apartado, como é bem conhecido, da sua lealdade a ele; conquanto Deus houvesse posto Davi sobre todo o povo por este motivo — para que fossem todos felizes debaixo de seu poder e domínio, e permanecessem a salvo e seguros, como se contemplassem a Deus com seus próprios olhos; pois Davi era, por assim dizer, o anjo de Deus. Então, a revolta do povo, ou das dez tribos, era como uma renúncia ao Deus vivo. O Senhor disse a Samuel: ‘Não foi a ti que desprezaram, mas a mim’ (1Sm 8.7): caso pior ainda com respeito a Davi, a quem Samuel, a mando de Deus, ungira, e a quem o Senhor honrara com tantos elogios notáveis; eles não podiam ter repelido o jugo dele sem rejeitarem abertamente, por assim dizer, ao próprio Deus. Por essa razão, não é sem fundamentos que Oséias, falando da penitência do povo, menciona isto de maneira inequívoca — que eles retornarão a Davi, rei deles: pois não podiam buscar a Deus de coração sincero sem se sujeitarem àquela autoridade legal à qual estiveram presos, não por homens, nem por acaso, mas por ordem de Deus”.

“É absolutamente verdadeiro que Davi era então morto; porém, Oséias aqui expõe, na pessoa de um homem, aquele reino eterno que os judeus sabiam que duraria como o sol e a lua: pois bem conhecida lhes era esta indescritível promessa: ‘Enquanto o sol e a lua brilharem no céu, eles serme-ão fiéis testemunhas, para que o trono de Davi continue’ (Sl 72.5,18). Por isso, após a morte de Davi, o Profeta mostra aqui que seu reino seria para sempre, pois ele sobrevivia em seus filhos; e, como parece, inegavelmente, eles normalmente chamavam seu Messias o filho de Davi. Devemos agora, necessariamente, vir a Cristo: pois Israel não podia procurar seu rei, Davi, que estava morto há muito tempo; mas teriam de buscar aquele Rei que Deus prometera da posteridade de Davi. Tal profecia, então, sem dúvida se estende a Cristo: e fica manifesto que a única esperança de o povo ser reunido era esta, que Deus atestasse que daria um Redentor”.

“Percebemos agora, então, o que o Profeta tinha em vista: os israelitas se tornaram degenerados; e, pela perfídia, deixaram de ser o verdadeiro e genuíno povo de Deus, já que continuavam apartados da família de Davi. O Profeta, falando da plena restauração deles, agora associa Davi com Deus; pois eles não podiam ser restaurados ao corpo da Igreja sem se unirem com os judeus na glorificação da mesma cabeça única. Contudo, precisamos, ao mesmo tempo, lembrar que o rei, a quem o Profeta menciona, não é Davi, que há muito estava morto, mas seu filho, a quem a perpetuidade de seu reino fora prometida”.

“Tal doutrina é especificamente útil para nós; pois ela demonstra que Deus não é para ser procurado exceto em Cristo, o mediador. Qualquer um, então, que abandona a Cristo, abandona o próprio Deus; pois, como João diz: ‘Aquele que não tem o Filho, não tem o Pai’ (1Jo 2.23). E os fatos mesmos provam isso; pois Deus mora na luz inacessível; quão grande, então, é a distância entre nós e ele? A não ser que Cristo, então, apresente-se a si mesmo para nós como uma pessoa intermediária, como podemos nós ir a Deus? Mas então, somente começamos a realmente procurar Deus quando voltamos nossos olhos a Cristo, que voluntariamente oferece a si mesmo para nós. Esse é o único caminho para se buscar a Deus de maneira acertada”.

“Alguns, com mais refinamento, disputam que Cristo é Jeová, porque o Profeta diz que ele é para ser procurado de nenhum outro modo que Deus não o seja. Pela palavra, procurar, o Profeta deveras quer dizer que os israelitas não possuíam nenhum outro meio de estarem a salvo e seguros senão fugindo para debaixo da tutela e proteção do legítimo rei deles, a quem sabiam haver sido divinamente ordenado por eles. Isso, pois, não seria suficiente para confutar os judeus. Eu interpreto a passagem de uma maneira mais simples, como significando que eles buscariam o seu Deus na pessoa do rei, cuja mão e esforços esse tencionava empregar na preservação do povo”.

“Segue-se mais adiante: E eles temerão Jeová e sua bondade nos últimos dias. O verbo djp, pachad, algumas vezes significa: temer, ficar apavorado como aqueles que estão tão aterrados que perdem toda a coragem. Porém, aqui deve ser tomado em um bom sentido, recear, como se afigura evidente pelo contexto. Depois, ele diz: Eles temerão Deus e a sua bondade. Os israelitas antes sacudiram o jugo divino: pois foi uma prova do petulante menosprezo deles erigir um novo templo; inventar, de sua própria volição, uma religião nova; e, em uma palavra, permitirem a si próprios uma desenfreada licenciosidade. Por isso ele diz: Eles, a partir de agora, começarão a temer a Deus, e persistirão no serviço dele”.

“E ele acrescenta, e sua bondade; pela qual ele quer dizer que Deus não seria receado por eles, mas que esse docemente os atrairia para si mesmo, para que obedecessem espontânea, livre e, ainda, jubilosamente: e, indubitavelmente, Deus então nos faz sim realmente temê-lo, quando nos concede uma amostra de sua bondade. Pois a majestade divina infunde-nos terror; e nós, no meio tempo, buscamos lugares escondidos; e, caso nos fosse possível apartar dele, cada um de nós faria isso de forma contente; mas não é adorar a Deus com a devida glória quando fugimos para longe dele. É, então, um senso de sua bondade que nos leva a reverentemente temê-lo. ‘Contigo’, diz Davi, ‘está o perdão, para que possas ser temido’ (Sl 130.4): pois, a não ser que os homens saibam que Deus está pronto para ficar em paz com eles, e se sintam seguros de que ele lhes será propício, ninguém o procurará, ninguém o temerá, pois, sem conhecer isso, não poderíamos senão desejar que sua glória fosse abolida e extinta, e que ele ficasse destituído de autoridade, para que não se tornasse nosso juiz. Mas todo aquele que provou da bondade do Senhor, assim ordena a si próprio para obedecer a Deus. O que o Profeta, então, tem em vista quando diz, eles então temerão a Deus, é isto, que compreenderão que ficaram miseráveis enquanto estiveram alheados dele, e que a verdadeira felicidade é se submeter à sua autoridade”.

“Mas, ainda, tal bondade tem que ser alusiva a Cristo. Alguns tomam wbwf, thubu, por glória, como em Êxodo 33; mas o nexo dessa passagem exige que a palavra seja tomada em seu sentido próprio. E a bondade divina, sabemos, é para ser exibida em nós em Cristo, para que nenhuma partícula dela seja procurada em nenhum outro lugar: pois dessa fonte devemos extrair tudo o que se refira à nossa salvação e felicidade de vida. Que, então, saibamos que Deus não pode ser de coração adorado por nós, senão quando o contemplamos na pessoa de seu Filho, e sabemos que ele nos é um Pai amoroso: por essa razão, João diz: ‘Aquele que não honra o Filho, não honra o Pai’ (Jo 5.23)”.

“Por fim, ele adiciona, no fim dos dias; pois o Profeta queria outra vez fazer lembrar aos israelitas do que ele dissera antes — que eles precisavam de longa aflição, pela qual Deus, gradativamente, reforma-los-ia. Ele então mostra que a perversidade deles era tal, que não seriam trazidos logo a uma mente direita: mas que isso seria no fim dos dias. Ao mesmo tempo, ele consola as mentes dos piedosos, para que eles, pelo cansaço, não ficassem desfalecidos: pois, conquanto não experimentassem de início a bondade divina, o Profeta os lembra de que não havia nenhuma razão para desespero, porque o Senhor manifestaria sua bondade no término dos dias”.

“Podemos acrescentar que tal término de dias teve seu início no retorno do povo. Quando a liberdade foi outorgada aos judeus, para retornarem ao seu país, foi o término ou plenitude de dias de que o Profeta fala. Mas uma série contínua do retorno do povo até à vinda de Cristo precisa, ao mesmo tempo, ser percebida; pois o Senhor, ali, executou mais completamente o que declara aqui por seu Profeta. Por isso, em toda parte na Escritura, em especial no Novo Testamento, a manifestação de Cristo é colocada nos últimos tempos. Esse capítulo está agora explicado” (João Calvino, op. cit., cap. 3)..