O capítulo três completa a
metáfora da vida familiar de Oséias.
“Deveras, o Profeta quer
dizer que Deus se antecipa a nós com sua mercê; caso contrário, temos o nosso
acesso a ele tolhido. Então Deus, de sua boa vontade, adianta-se, estende-nos sua
mão e, em seguida, vem o consentimento da nossa fé. Por essa razão Deus, primeiramente,
fala aos israelitas, para que eles soubessem que eram agora reputados por povo
dele: e então, após Deus haver testificado seu favor, eles respondem: ‘Tu começastes,
de agora em diante, a ser nosso Deus’. Por isso, vemos que o princípio de todo
bem vem de Deus, quando ele faz de estranhos, amigos, e adota como seus filhos
aqueles que outrora eram seus inimigos”. (João Calvino, Comentário de Oseias,
cap. 3).
“A essência desse capítulo
é que era propósito de Deus guardar, em firme esperança, as mentes dos fiéis
durante o exílio, para que não fossem engolfados com desespero que os desfalecesse
de todo. O Profeta falara antes da reconciliação de Deus com o seu povo; e ele,
esplendidamente, exaltara tal favor quando disse: ‘Vós sereis como no vale de
Acor, eu restituirvos-ei a abundância de todas as bênçãos; em uma palavra, vós
sereis, em todos os aspectos, felizes’. Mas, no meio-tempo, a miséria cotidiana
do povo prosseguia. Deus, de fato, tinha determinado removê-los a Babilônia.
Eles podiam, por conseguinte, ter se desesperado sob aquela calamidade, como se
toda esperança de libertação lhes fosse inteiramente retirada. Por isso, o
Profeta agora revela que Deus restauraria o povo à mercê, de modo que não
apagaria imediatamente toda lembrança da ira dele Deus, mas que a intenção era
continuar, por um tempo, com certa medida da severidade divina”. (João Calvino,
idem, op, cit., cap. 3).
"O
Senhor disse-me: ´Ama essa mulher, mesmo que seja amante de outro e viva
em adultério. Faz como eu, o Senhor, que amo os israelitas, apesar de se
voltarem para outros deuses, desejosos das tortas de uvas´." (v. 1)
Deus mandou que Oséias tomasse de volta a sua esposa, bhea' (aheb)
porque Ele tem amor, carinho, amizade por seu povo, por isso mesmo depois do
pecado de idolatria, arrependimento, perdão e reconciliação são possíveis.
"Recuperei
então a minha mulher por quinze moedas de prata e seiscentos litros de cevada".
(v. 2).
Oséias obedeceu, comprando
de volta a sua mulher. O valor pago equivale o valor de uma escrava.
"Mas
se o boi matar um escravo ou uma escrava, o boi será apedrejado até morrer e o
senhor do escravo ou da escrava, receberá do dono do boi trinta moedas de
prata". (Ex 21:32).
"Por
isso lhe digo: ´Viverás comigo por muito tempo. Não pratiques a
prostituição, nem te entregues a homem algum. E eu farei o mesmo para
contigo´." (v. 3)
Oséias e Gômer não voltaram imediatamente a ter
relações conjugais. Ele esperou para ver se ela ficaria longe dos amantes. Não
cometeria mais hn"z" (zanah) adultério, fornicação,
prostituição.
"Também
o povo de Israel ficará por muito tempo sem rei e sem chefes, sem sacrifícios e
sem monumentos religiosos, sem insígnias nem dados para oráculos". (v. 4).
Em relação à nação, Deus
deixaria o povo sem liderança e sem as coisas necessárias para adorá-lo segundo
a lei. Ao mesmo tempo, ficariam sem os ídolos.
"Mais
tarde, o povo de Israel voltará a procurar o Senhor, seu Deus, e o descendente
de David para seu rei. No futuro, procurarão com todo o respeito o Senhor e os
seus favores". (v. 5)
No final, Israel seria reconciliado
com Deus. Este versículo se refere à restauração espiritual do povo na nova
Aliança. Davi simboliza o Cristo. Os últimos dias se referem à época do novo
Testamento. Por meio do Senhor, Israel espiritual se aproxima do Senhor.
"Pois
pela fé que vos une a Jesus Cristo säo todos filhos de Deus. Com efeito, todos
os que foram batizados em Cristo revestiram-se das qualidades de Cristo. Näo há
diferença entre judeus e näo-judeus, entre escravos e pessoas livres, entre
homem e mulher. Agora constituem um todo em uniäo com Cristo Jesus. E se säo de
Cristo, entäo säo descendência de Abraäo e herdeiros de acordo com a promessa".
(Gl 3:26-29),
O povo retorna, mas ainda
não está em plena comunhão com o Eterno. Assim o profeta indica um tempo entre a
volta do cativeiro e a vinda de Davi (o Cristo) para fazer paz entre o povo e
o Eterno.
NONA DISSERTAÇÃO
“Temos agora que considerar a segunda oração, acerca do Rei Davi. O
Profeta nos diz que, quando os israelitas forem movidos pelo desejo de buscar a
Deus, eles também buscarão a Davi, rei deles. Haviam se apartado, como é bem
conhecido, da sua lealdade a ele; conquanto Deus houvesse posto Davi sobre todo
o povo por este motivo — para que fossem todos felizes debaixo de seu poder e
domínio, e permanecessem a salvo e seguros, como se contemplassem a Deus com
seus próprios olhos; pois Davi era, por assim dizer, o anjo de Deus. Então, a
revolta do povo, ou das dez tribos, era como uma renúncia ao Deus vivo. O
Senhor disse a Samuel: ‘Não foi a ti que desprezaram, mas a mim’ (1Sm 8.7):
caso pior ainda com respeito a Davi, a quem Samuel, a mando de Deus, ungira, e
a quem o Senhor honrara com tantos elogios notáveis; eles não podiam ter
repelido o jugo dele sem rejeitarem abertamente, por assim dizer, ao próprio
Deus. Por essa razão, não é sem fundamentos que Oséias, falando da penitência
do povo, menciona isto de maneira inequívoca — que eles retornarão a Davi, rei
deles: pois não podiam buscar a Deus de coração sincero sem se sujeitarem
àquela autoridade legal à qual estiveram presos, não por homens, nem por acaso,
mas por ordem de Deus”.
“É absolutamente verdadeiro que Davi era então morto; porém, Oséias aqui
expõe, na pessoa de um homem, aquele reino eterno que os judeus sabiam que
duraria como o sol e a lua: pois bem conhecida lhes era esta indescritível
promessa: ‘Enquanto o sol e a lua brilharem no céu, eles serme-ão fiéis
testemunhas, para que o trono de Davi continue’ (Sl 72.5,18). Por isso, após a
morte de Davi, o Profeta mostra aqui que seu reino seria para sempre, pois ele
sobrevivia em seus filhos; e, como parece, inegavelmente, eles normalmente
chamavam seu Messias o filho de Davi. Devemos agora, necessariamente, vir a
Cristo: pois Israel não podia procurar seu rei, Davi, que estava morto há muito
tempo; mas teriam de buscar aquele Rei que Deus prometera da posteridade de
Davi. Tal profecia, então, sem dúvida se estende a Cristo: e fica manifesto que
a única esperança de o povo ser reunido era esta, que Deus atestasse que daria
um Redentor”.
“Percebemos agora, então, o que o Profeta tinha em vista: os israelitas
se tornaram degenerados; e, pela perfídia, deixaram de ser o verdadeiro e
genuíno povo de Deus, já que continuavam apartados da família de Davi. O
Profeta, falando da plena restauração deles, agora associa Davi com Deus; pois
eles não podiam ser restaurados ao corpo da Igreja sem se unirem com os judeus
na glorificação da mesma cabeça única. Contudo, precisamos, ao mesmo tempo,
lembrar que o rei, a quem o Profeta menciona, não é Davi, que há muito estava
morto, mas seu filho, a quem a perpetuidade de seu reino fora prometida”.
“Tal doutrina é especificamente útil para nós; pois ela demonstra que
Deus não é para ser procurado exceto em Cristo, o mediador. Qualquer um, então,
que abandona a Cristo, abandona o próprio Deus; pois, como João diz: ‘Aquele
que não tem o Filho, não tem o Pai’ (1Jo 2.23). E os fatos mesmos
provam isso; pois Deus mora na luz inacessível; quão grande, então, é a distância
entre nós e ele? A não ser que Cristo, então, apresente-se a si mesmo para nós
como uma pessoa intermediária, como podemos nós ir a Deus? Mas então, somente
começamos a realmente procurar Deus quando voltamos nossos olhos a Cristo, que
voluntariamente oferece a si mesmo para nós. Esse é o único caminho para se
buscar a Deus de maneira acertada”.
“Alguns, com mais refinamento, disputam que Cristo é Jeová, porque o
Profeta diz que ele é para ser procurado de nenhum outro modo que Deus não o
seja. Pela palavra, procurar, o Profeta deveras quer dizer que os israelitas
não possuíam nenhum outro meio de estarem a salvo e seguros senão fugindo para
debaixo da tutela e proteção do legítimo rei deles, a quem sabiam haver sido divinamente
ordenado por eles. Isso, pois, não seria suficiente para confutar os judeus. Eu
interpreto a passagem de uma maneira mais simples, como significando que eles
buscariam o seu Deus na pessoa do rei, cuja mão e esforços esse tencionava empregar
na preservação do povo”.
“Segue-se mais adiante: E
eles temerão Jeová e sua bondade nos últimos dias. O verbo djp, pachad, algumas vezes significa:
temer, ficar apavorado como aqueles que estão tão aterrados que perdem toda a
coragem. Porém, aqui deve ser tomado em um bom sentido, recear, como se afigura
evidente pelo contexto. Depois, ele diz: Eles
temerão Deus e a sua bondade. Os israelitas antes
sacudiram o jugo divino: pois foi uma prova do petulante menosprezo deles
erigir um novo templo; inventar, de sua própria volição, uma religião nova; e,
em uma palavra, permitirem a si próprios uma desenfreada licenciosidade. Por
isso ele diz: Eles, a partir de agora, começarão a temer a Deus, e persistirão
no serviço dele”.
“E ele acrescenta, e sua bondade; pela qual ele quer dizer que Deus não seria receado por eles, mas que
esse docemente os atrairia para si mesmo, para que obedecessem espontânea,
livre e, ainda, jubilosamente: e, indubitavelmente, Deus então nos faz sim
realmente temê-lo, quando nos concede uma amostra de sua bondade. Pois a
majestade divina infunde-nos terror; e nós, no meio tempo, buscamos lugares
escondidos; e, caso nos fosse possível apartar dele, cada um de nós faria isso
de forma contente; mas não é adorar a Deus com a devida glória quando fugimos
para longe dele. É, então, um senso de sua bondade que nos leva a
reverentemente temê-lo. ‘Contigo’, diz Davi, ‘está o perdão, para que possas
ser temido’ (Sl 130.4): pois, a não ser que os homens saibam que Deus está
pronto para ficar em paz com eles, e se sintam seguros de que ele lhes será
propício, ninguém o procurará, ninguém o temerá, pois, sem conhecer isso, não
poderíamos senão desejar que sua glória fosse abolida e extinta, e que ele
ficasse destituído de autoridade, para que não se tornasse nosso juiz. Mas todo
aquele que provou da bondade do Senhor, assim ordena a si próprio para obedecer
a Deus. O que o Profeta, então, tem em vista quando diz, eles então temerão a Deus, é isto, que compreenderão que ficaram miseráveis enquanto estiveram
alheados dele, e que a verdadeira felicidade é se submeter à sua autoridade”.
“Mas, ainda, tal bondade tem que ser alusiva a Cristo. Alguns tomam wbwf, thubu, por glória, como em Êxodo 33; mas o nexo dessa passagem exige que a
palavra seja tomada em seu sentido próprio. E a bondade divina, sabemos, é para
ser exibida em nós em Cristo, para que nenhuma partícula dela seja procurada em
nenhum outro lugar: pois dessa fonte devemos extrair tudo o que se refira à
nossa salvação e felicidade de vida. Que, então, saibamos que Deus não pode ser
de coração adorado por nós, senão quando o contemplamos na pessoa de seu Filho,
e sabemos que ele nos é um Pai amoroso: por essa razão, João diz: ‘Aquele que
não honra o Filho, não honra o Pai’ (Jo 5.23)”.
“Por fim, ele adiciona, no
fim dos dias; pois o Profeta queria outra
vez fazer lembrar aos israelitas do que ele dissera antes — que eles precisavam de longa
aflição, pela qual Deus, gradativamente, reforma-los-ia. Ele então mostra que a
perversidade deles era tal, que não seriam trazidos logo a uma mente direita:
mas que isso seria no fim dos dias. Ao mesmo tempo, ele consola as mentes dos piedosos, para que eles, pelo
cansaço, não ficassem desfalecidos: pois, conquanto não experimentassem de
início a bondade divina, o Profeta os lembra de que não havia nenhuma razão
para desespero, porque o Senhor manifestaria sua bondade no término dos dias”.
“Podemos acrescentar que tal término de dias teve seu início no retorno
do povo. Quando a liberdade foi outorgada aos judeus, para retornarem ao seu
país, foi o término ou plenitude de dias de que o Profeta fala. Mas uma série
contínua do retorno do povo até à vinda de Cristo precisa, ao mesmo tempo, ser
percebida; pois o Senhor, ali, executou mais completamente o que declara aqui
por seu Profeta. Por isso, em toda parte na Escritura, em especial no Novo
Testamento, a manifestação de Cristo é colocada nos últimos tempos. Esse
capítulo está agora explicado” (João Calvino, op. cit., cap. 3)..
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