dimanche 3 avril 2022

O amor do Deus único

O amor do Deus único

Jorge Pinheiro, PhD

Kadish, vida, morte e reino
Fonte Editorial, 2018.

O amor do Deus único foi revelado no messias através dos seus ensinos e das suas obras, da sua morte na cruz. Quando crescemos na graça e no conhecimento de Yeshua hamashiah, nos revestimos do caráter dele e nos parecemos mais com ele. O caráter de Yeshua se revela em nós através das virtudes que dão o tom da nossa comunhão com os irmãos na comunidade de fé. 

Nossa comunhão com as pessoas, na comunidade de fé, se faz através da misericórdia, que é um relacionamento afetivo e cuidadoso com irmãos e pessoas machucadas e abatidas. Quando Yeshua viu a multidão, ficou com muita pena daquela gente porque eles estavam aflitos e abandonados, como ovelhas sem pastor. Por isso, somos chamados à bondade, prontos para fazer o bem sem olhar a quem; à humildade, numa atitude prestativa; à mansidão, numa relação sem coerção para mudança das pessoas; à longanimidade, com boa vontade para ser tolerante diante da fraqueza das pessoas; ao perdão, já que somos perdoados por haShem caso perdoemos; e à paz, já que como resultado da prática do amor, do perdão e da bondade, a comunidade de fé mostra ao mundo que a reconciliação e a paz podem ser alcançadas em Yeshua. As decisões feitas em justiça e amor constroem a paz que excede a compreensão humana, mesmo nas situações de conflito. 

Nós, criados à imagem e à semelhança do Deus único, somos chamados a viver a experiência cristã como comunidade de fé. Podemos usufruir, como iguais que somos, as bênçãos dessa comunidade nas celebrações de nossa igreja. Somos convocados a conviver no corpo de Yeshua que alcança o mundo, na comunidade de fé da nossa igreja local. 

Portanto, não existe mais condenação para aqueles que estão em Jesus. A lei da ruach da vida em Yeshua te libertou da alienação e da extinção. Coisa impossível ao esforço humano, porque enfraquecido pelo distanciamento, o Deus único enviando o seu filho numa humanidade semelhante à nossa, condenou a alienação, o distanciamento e os alvos errados, a fim de que sua justiça se cumprisse em nós que vivemos segundo o espírito. Com efeito, os que vivem segundo o espírito, as desejam as coisas que são do espírito. 

Na carta do apóstolo Paulo -- que passaremos a chamar de rabino Shaul por ter sido fariseu filho de fariseus --, aos judeus romanos temos dois blocos de textos: um maior, que é o capítulo oito inteiro, e cuja temática é a vida sob a lei do espírito; e um bloco menor (1-5) que trata especificamente da vida emancipada por esta lei do espírito. Esses dois blocos nos dão a linha de pensamento de Shaul: a vida emancipada; a vida exaltada; a vida esperançosa; e a vida exultante. Dessa maneira, o rabino traça o curso da vida, na qual a graça triunfa sobre o esforço humano, e os justos experimentam o livramento da alienação. 

A epístola de Shaul, como um todo, enfoca três blocos temáticos: um que fala da justificação através da emunah; outro que discute a exclusão temporal do povo da estrela, e a inclusão daqueles que não têm o berit milah; e por fim exortações práticas. 

Ao analisar a justificação, mostra que a libertação do ser humano repousa fundamentalmente sobre a emunah, que é fé-posicionamento, proveniente da graça de Yeshua. Essa misericórdia de haShem não depende da lei, porque o homem, em sua natureza pecaminosa, não tem como responder efetivamente às exigências da lei, que expressa a santidade de haShem. Assim, a graça provem do messias, que no seu amor e sacrifício, perdoa os pecados dos humanos. A liberdade da vida cristã, liberdade diante da lei, não depende da própria pessoa, nem do que ela possa fazer, mas daquilo que haShem já fez por ela. 

Há outra carta do rabino Shaul, que também trata dessa relação esforços humanos versus graça, que é a carta escrita aos gálatas. Ali, o rabino escreve sobre a justificação através da emunah, falando da liberdade. 

Sem dúvida, a análise de Shaul parte da Torá e ele escreve aos judeus romanos, e explica que a promessa feita a Abraham teve por base a emunah, já que ainda não tinha realizado o berit milah. 

O texto está inserido numa epístola, forma literária específica, amplamente utilizada pelos apóstolos e pela comunidade de fé primitiva. No capítulo que segue, analisaremos com mais detalhes esta forma literária, inserindo-a no contexto histórico de gregos e romanos durante o primeiro século da Era Comum. A epístola aos Romanos é uma carta de construção sofisticada, porque o rabino Shaul, o apóstolo Paulo cristão, intercala um pensamento central com várias digressões, tornando complexa a conexão das idéias. E o tema que o rabino trata é um assunto eletrizante para a época, mas hoje aceito pela totalidade dos seguidores de Yeshua: povos e raças de todo o mundo podem se tornar seguidores de Yeshua e não somente o povo da estrela. 

Em Romanos 8:1-5, encontramos no grego cinco verbos fundamentais para a compreensão do que o autor estava expondo. São eles: (1) receber alforria, o oposto ao estado de escravidão, não estar sujeito a uma obrigação, livrar, libertar. Te libertou e variantes: me libertou, nos libertou. É um aoristo passado, isto significa que a ação foi plenamente realizada, mas segue vigente no presente. (2) penalidade imposta por condenação judicial, servidão penal, condenar. Também é um aoristo passado. (3) encho, aterro, encho a ponto de transbordar, dou plenitude, cumpro. (4) ando, vivo, dirijo minha vida. (5) penso, ter a mente controlada por, ter como hábito de pensamento, inclinar-se. 

Desses verbos, dois são antônimos, receber alforria versus condenado judicialmente, e levam à oposição que o rabino quer mostrar entre a lei da ruach da vida e a lei da alienação e do extermínio. Assim, ao regime da alienação, o rabino Shaul opõe o novo regime da ruach hakadosh e diz que em nós transborda o que é justo e bom. Esse transbordar o que é justo, o que é bom, só é possível pela união com o messias através da emunah e tem sua tradução no mandamento do amor. Isto porque, não vivemos segundo a materialidade da vida, mas andamos no espírito, ou seja, temos a mente controlada pela ruach. 

A palavra lei aparece setenta vezes no texto de Romanos e sempre tem uma das três conotações: (a) revelação de haShem e de sua santidade, (b) foi dada para esclarecer o que é a alienação, e (c) existe para orientar a vida dos justos. Da mesma maneira, a palavra carne é sempre utilizada com o sentido de natureza humana enfraquecida e natureza humana não regenerada. 

O rabino nos apresenta a operação da ruach hakadosh, entendida como aquela que comunica a vida, aquela que dá liberdade e que intercede junto a Adonai. 

É interessante notar que o texto original de Romanos 8, em grego, começa com dois advérbios intercalados por uma partícula ilativa, que poderíamos traduzir assim: Atualmente, por isso, nada em absoluto pode condenar aqueles que estão em Yeshua. 

Essa partícula ilativa, que é um conectivo, nos leva ao capítulo 7, onde o rabino Shaul mostra que esforços humanos e alienação não são sinônimos. E que há uma grande diferença entre a esforços humanos e a natureza humana. Entre o que é espírito e o que é material. O corpo, com os membros que o compõem interessa a Shaul enquanto instrumento da vida moral. Submetido à tirania da materialidade, à alienação e à destruição, Shaul clama: quem me livrará? E dá "graças a haShem, por Yeshua, nosso senhor". É a partir desse clímax, que dá sequência ao texto, informando que por isso, hoje, nada em absoluto pode condenar os que estão no messias. 

No mundo de gregos e romanos, as cartas particulares tinham em média, cerca de noventa palavras. Já os textos literários, como os de Sêneca, por exemplo, tinham em média duzentas palavras. As epístolas de Shaul, no entanto, eram bem maiores. A menor delas, dirigida a Filemon, tem 335 palavras, e a maior, enviada a igreja de Roma, 7.101 palavras. Assim, podemos dizer que este Paulo, rabino e apóstolo, criou um novo gênero literário, a epístola, maior que as cartas e os textos literários comuns à época, de conteúdo teológico explícito, e dirigida a comunidade específica. 

Quase sempre, as cartas eram ditadas a um escriba profissional, chamado amanuense, que usava uma espécie de taquigrafia durante o ditado rápido. Depois, o amanuense burilava o texto, e o autor, finalmente, editava a carta. Na carta de Shaul aos judeus romanos seu amanuense foi Tércio. 

Quando escreveu sua epístola aos romanos, o rabino Shaul tinha mais de cinquenta anos e vinte e cinco de encontro com o mashiah. Estava ansioso para ministrar nessa comunidade romana, que já era conhecida no mundo, e por isso escreveu a carta que deveria preparar sua futura visita. Foi escrita em Corinto, quando estava levantando uma coleta para as comunidades da Palestina. Partiu, então, para Jerusalém para entregar o dinheiro. Lá foi preso, e acabou sendo levado à Roma, mas como prisioneiro. 

Teólogos como Orígenes e Barth consideram que a carta do rabino aos judeus romanos é o ponto alto dos textos neotestamentários. Ela sedimentou a compreensão de Agostinho e a reforma de Lutero. Calvino considerava que quem entendesse esta epístola estaria com a porta aberta para a compreensão de toda as escrituras judaico-cristãs. E Tyndale disse algo parecido, ao afirmar que a carta é "a parte principal e mais excelente do Novo Testamento, e o mais puro evangelion, isto é, as boas novas a que chamamos Evangelho, e também uma luz e um caminho para penetrar em toda a Escritura". 

Em termos de ensino, Shaul mostrou que a Torá, boa e santa, faz as pessoas conhecerem a vontade de haShem, mas não lhes transmitiu a força para cumpri-la. Deu-lhes consciência de sua alienação e da necessidade que têm de socorro. Esse socorro, inteiramente gratuito, chegou através de Yeshua. E a humanidade, ferida pela alienação, é recriada em Yeshua, podendo agora viver em liberdade e justiça, segundo a vontade de haShem. 

Romanos tem como tema central a revelação da justiça de haShem e a universalidade da obra de Yeshua. E, se Romanos é o centro nevrálgico das Escrituras, o capítulo 8 é o coração da carta. 

O capítulo 8 de Romanos mostra que a lei foi, através do sacrifício de Yeshua, dominada pela graça. E a epístola de Romanos foi fundamental no processo vivenciado pela Reforma. A igreja que rompeu com o catolicismo romano, quer a reformada de Lutero, Calvino e Zwinglio, quer a revolucionária de anabatistas e inspiracionistas, entendeu que o apóstolo Paulo traçou na epístola aos judeus romanos o curso da vida cristã, mostrando que através da graça há vitória plena sobre a alienação. 

Shaul queria deixar claro que as propostas anteriores não tinham razão de ser, pois a obediência à lei nunca logrou êxito. Através de Yeshua, unido a Yeshua pela ruach hakadosh, aquele que crê está livre de sua alienação e pode iniciar uma vida de liberdade, dentro de uma nova lei, a lei da ruach hakadosh da vida no messias Yeshua. 

Os reformados radicais do século dezesseis, contextualizando os ensinamentos de Shaul, entenderam que não havia mais necessidades de obras para se alcançar a liberdade. O que a igreja católica romana proclamava, tanto no que concerne às indulgências, como às obrigações de caridade, estava fora do ensino do rabino nas epístolas aos romanos e aos gálatas, assim como no restante das Escrituras. 

Ainda hoje Romanos apresenta ensinamentos fundamentais para a comunidade de Yeshua: a alienação humana; sua luta interior, a gratuidade da liberdade, a eficácia da vida além da vida e o ser levantado de Yeshua. Mas também fala da justificação através da emunah e a adoção dos justos filhos. É a partir desta hermenêutica que Romanos pode ser interpretado. Teremos, então, uma melhor compreensão daquilo que o rabino Shaul chama da lei da ruach da vida no messias Yeshua e de sua importância no caminhar do cristão. Ah! Se você ainda não leu a carta do rabino Shaul/Paulo aos romanos, não perca tempo. Vale a pena. 

No evangelho de João, Yeshua fala aos judeus sobre a liberdade. Os judeus acreditavam ser livres porque eram descendentes de Abraham. Mas Yeshua apresentou a eles um novo critério de liberdade. 

Em primeiro lugar, os que haviam crido deveriam permanecer na palavra. Yeshua deixava claro que para ser livre não basta apenas crer, e necessário permanecer na palavra. Mas o que é isso? É continuar firme. É uma vida sincera. Permanecer é ter constância e viver Yeshua no dia a dia. 

Mas para ser livre é preciso também conhecer a verdade. E o que é conhecer? Significa permanecer, antes de qualquer coisa. Depois, então, e que se vai inteirar, descobrir. É a partir daí que caminhamos em direção à liberdade. E a liberdade passa a ser a vida distante da escravidão da alienação. Liberdade para Yeshua é viver livre da alienação, das materialidades deste mundo que amarram e impedem o movimento do espírito em nossas vidas. 

Precisamos descobrir o significado dessas duas palavras usadas por Yeshua, permanecer e conhecer. Permanecer na palavra, cumprindo-a, para assim conhecer a verdade. A partir daí seremos livres da alienação que escraviza e leva à ruína, à escravidão e à morte. Que Adonai lhe abençoe e você permaneça na palavra, conheça a verdade e seja livre no Espírito! Esta é a minha oração. 

A Confissão de fé valdense, de 1554, dizia: Cremos que há um só Deus, que é espírito – o criador de todas as coisas – o de tudo, que é sobre tudo, e por tudo e em tudo; o qual deve ser adorado em espírito e em verdade – do qual dependemos continuamente, e a quem rendemos louvor por nossa vida, alimento, abrigo, saúde, enfermidade, prosperidade, e adversidade. Nós O amamos por ser a fonte de toda bondade; e O reverenciamos pois é o ser sublime, que sonda e prova os corações dos filhos dos homens. 

A palavra de haShem nos ensina que o único Adonai vivo e verdadeiro é ruach pessoal, eterna, infinita e imutável. Adonai é ruach, e por isso os que o adoram devem adorá-lo em espírito e em verdade. “Escute, povo de Israel! O haShem, e somente o haShem, é o nosso Adonai”. 

Só existe um Adonai, o pai e criador de todas as coisas. E existe somente um senhor de nossa humanidade, Yeshua, por meio de quem todas as coisas foram criadas e por meio de quem nós existimos. É, existe um só Adonai e uma só pessoa que une Adonai com os seres humanos, o ser humano Yeshua, que deu a sua vida para que todos fiquem livres de sua alienação. Esta foi a prova, dada no tempo certo, de que Adonai quer que todos sejam libertos. 

Adonai é onipotente, onisciente e onipresente. Adonai disse: Eu sou quem sou. E disse ainda: Você dirá o seguinte: “Eu sou me enviou a vocês. Eu sou o haShem, o Santo Adonai de vocês, o criador de Israel e o seu rei. 

Ao Rei eterno, imortal e invisível, o único Adonai, a ele sejam dadas a honra e a glória, para todo o sempre! Amém!. 

Adonai é perfeito em santidade, justiça, verdade e amor. Portanto, orem assim disse o rabino de Nazaré: Pai nosso, que estás no céu, que todos reconheçam que o teu nome é santo. O haShem diz: Eu sou o haShem e não mudo. É por isso que vocês, os descendentes de Jacó, não foram destruídos. Tudo de bom que recebemos e tudo o que é perfeito vêm do céu, vêm de haShem, o criador das luzes do céu. Ele não muda, nem varia de posição, o que causaria a escuridão. 

Adonai é o criador, sustentador, redentor, juiz e senhor da história e do universo, que governa pelo seu poder, dispondo de todas as coisas, de acordo com o seu eterno propósito e graça. No começo Adonai criou os céus e a terra. 

Quando Abrão tinha noventa e nove anos, Adonai apareceu a ele e disse: Eu sou o Adonai todo-poderoso. Viva uma vida de comunhão comigo e seja obediente a mim em tudo. 

Não há outro Adonai como tu, ó HaShem! Quem é santo e majestoso como tu? Quem pode fazer os milagres e as maravilhas que fazes? Estendeste a mão direita, e a terra engoliu os que nos perseguiam. Por causa do teu amor tu guiaste o povo que libertaste; com o teu grande poder tu os levaste para a tua terra santa. Os povos ouviram falar do que fizeste e estão tremendo de medo. 

Adonai é infinito em santidade e em todas as demais perfeições. Adonai, que fez o mundo e tudo o que nele existe, é o senhor do céu e da terra e não mora em templos feitos por seres humanos. E também não precisa que façam nada por ele, pois é ele mesmo quem dá a todos vida, respiração e tudo mais. De um só homem ele criou todas as raças humanas para viverem na terra. Antes de criar os povos, Adonai marcou para eles os lugares onde iriam morar e quanto tempo ficariam lá. “ 

O Altíssimo, o santo Adonai, o Adonai que vive para sempre, diz: Eu moro num lugar alto e sagrado, mas moro também com os humildes e os aflitos, para dar esperança aos humildes e aos aflitos, novas forças. 

Agora, vocês que têm juízo, me escutem. Será que Adonai faria alguma coisa errada? Será que o Todo-Poderoso cometeria uma injustiça? 

Adonai é triuno. O eterno Adonai se revela como pai, filho e ruach hakadosh. Yeshua veio de Nazaré, uma pequena cidade da região da Galileia e foi batizado por João Batista no rio Jordão. No momento em que estava saindo da água, Yeshua viu o céu se abrir e a ruach de haShem descer como uma pomba sobre ele. E do céu veio uma voz, que disse: Tu és o meu filho querido e me dás muita alegria. Portanto, vão a todos os povos do mundo e façam com que sejam meus seguidores, batizando esses seguidores beShem haav vehaben veruach hakodesh. Que a graça do Yeshua, o amor de haShem e a presença da ruach hakadosh estejam com todos vocês! 

O humano não pode se contentar apenas em não fazer o mal, não matar, não cometer adultério, não roubar, não mentir, mas deve fazer o bem. Deve se comprometer com a construção do bem. A resposta de Yeshua ao jovem rico é clara: Se você quer ser perfeito, vá, venda tudo o que tem, e dê o dinheiro aos pobres, e assim você terá riquezas no céu. Depois venha e me siga. 

Imaginamos que uma sociedade justa é aquela que respeita a dignidade humana e, por isso, cumpre os mandamentos de haShem. Até mesmo os ateus, se forem homens e mulheres de bem, deveriam respeitar os mandamentos. Mas, o humano está desafiado a levar em conta as exigências da ética do Sermão da Montanha, que apresenta: 

A universalidade do amor: Amem os seus inimigos e orem pelos que perseguem vocês. Portanto, todo humano deve ir além do que a sociedade propõe e faz. 

A confiança na providência: Não fiquem preocupados, perguntando: onde é que vamos arranjar comida? Ou, onde é que vamos arranjar bebida? Ou, onde é que vamos arranjar roupas. O humano justo sabe que Adonai é o senhor da história, Adonai provedor, e age conforme essa convicção. 

Ir além do que é exigido: Se alguém processar você para tomar a sua túnica, deixe que leve também a capa. O humano deve ser capaz de ir além do que a lei obriga, deve pautar-se pelas leis da caridade, da solidariedade e da fraternidade nas relações com as pessoas. A lei não pode nos obrigar a amar os outros, mas nós devemos amá-los, mesmo que sejam adversários. E em nome desse amor devemos fazer aquilo que habitualmente o mundo secular não faz. 

Quando pensamos no messias, pensamos na pessoa de Yeshua e em sua obra. E no ministério terreno de Yeshua há uma realidade que é central, a cruz. E quando pensamos na cruz vemos que o ministério do Calvário é a prova concreta do amor do pai, ao entregar seu filho. 

Somos justificados pela cruz de Yeshua, e por isso vemos as coisas como elas são, ou seja, entendemos que o perdão de nossas alienações não é fruto de uma contabilidade espiritual. Aliás, o profeta Miquéias já perguntara: O que eu levarei quando for adorar ao Adonai eterno? O que eu oferecerei ao Adonai altíssimo? A cruz de Yeshua é algo inusitado, que precisa acontecer nas nossas vidas para por fim a ira de haShem e derrotar de uma vez por todas os nossos inimigos: o mundo, a materialidade e o adversário. Somente Adonai pode fazer estas coisas e por um ponto final na separação de homens e mulheres, reconciliando-nos consigo, fazendo-nos confiar nele e receber os benefícios da sua vitória. A chave para compreendermos a emunah da cruz de Yeshua está no fato de que não damos nada a Adonai, mas é Adonai quem nos dá algo, o perdão e a vida eterna. 

Quem é justificado, torna-se justo diante de Adonai. E quem é justo foi justificado, e este não é um acontecimento de um momento, passageiro, mas o decreto de uma aliança eterna. Uma vez justificados, justos para sempre, apesar de todos os desafios e trombadas da materialidade. 

O rabino Shaul disse que devemos considerar-nos mortos para a alienação, para o distanciamento e para a separação, mas vivos para Adonai, por estarmos unidos com Yeshua. A compreensão sobre o ministério da cruz está no entendimento de que ele tornou-se o que nós éramos, para que nos tornássemos o que ele quer que sejamos. Adonai torna-se humano, vive a nossa experiência, sofre e morre na cruz, envolto em nossas alienações, sentindo a condenação da ira de haShem para que o poder da alienação, da ira, da morte e do inferno sejam vencidos através da ressurreição e sua vida vitoriosa seja comunicada a nós. 

A emunah na obra de Yeshua na cruz tem que ser algo real nas nossas vidas e não uma constatação meramente racional, pois Yeshua morreu sentindo em si mesmo e em sua consciência a agonia da separação última de haShem. Esta é uma concepção radical sobre a cruz, que deve nos levar a uma reflexão sobre a realidade fundamental da obra de Yeshua em nós e por nós, sem a qual jamais poderíamos receber o poder da vida e da salvação de haShem. Em todo momento novo da vida, pense: Agora que fomos aceitos por Adonai, por meio da fé, temos paz com Ele por intermédio de Yeshua, o nosso Senhor. 

O amor é o ponto mais alto na vida humana. E domínio próprio é obediência e, por isso, tem base no amor, na graça e nas bênçãos da presença de haShem na vida, na intimidade e nos relacionamentos. Yeshua disse que a pessoa que o ama obedeceria aos seus mandamentos. No que tange ao amor, domínio próprio é controle sobre si mesmo, sobre a ambição desmedida, os caprichos, a luxúria e as tentações. É o amor que resiste e persiste. 

O domínio próprio é uma manifestação da ruach hakadosh, definido na capacidade de controlar tendências e impulsos, superando as fraquezas. O domínio próprio está relacionado com a prudência, como característica da pessoa guiada pelo Espírito. O que é demonstrado por um comportamento sábio e equilibrado. 

O rabino alerta: continuem trabalhando com respeito e temor a Adonai para completar a libertação de vocês. Pois Adonai está sempre agindo em vocês para que obedeçam à vontade dele, tanto no pensamento como nas ações. Diz também que todo atleta que está treinando aguenta exercícios duros. E ao falar sobre sua experiência de vida, conta que corria direto para a linha de chegada a fim de conseguir o prêmio da vitória. E Tiago, irmão do rabino de Nazaré, como que completa o pensamento de Paulo, ao dizer que quem tem domínio sobre seus desejos e paixões, receberá como prêmio a vida que Adonai promete aos que o amam. 

Assim, o fruto da ruach hakadosh aponta o amor como o ponto mais alto na vida humana e nos obriga ao amor ao próximo. O amor aqui é ágape e significa querer o bem para as pessoas sem desejar nada em troca. Por isso, Shaul diz que o amor une perfeitamente todas as coisas. Mas não haverá união, nem perfeição se caprichos e paixões controlarem o nosso viver e os nossos relacionamentos. Aqui a palavra haShem quer dizer a ruach. E onde a ruach do HaShem está presente, aí existe liberdade. 

Em seu devocional “A imitação de Jesus”, Thomas à Kempis faz a seguinte oração: “Peço-vos, ó meu benigníssimo Deus! Preservai-me dos cuidados desta vida, para que não me embarace demasiadamente neles; das muitas necessidades do corpo, para que não me escravize a sensualidade; e de todas as perturbações da alma, para que não me desalente sob o peso das angústias. Não falo das coisas que a vaidade humana busca tão empenhadamente, mas das misérias que, pela maldição comum de todos os mortais, penosamente oprimem a alma de vosso servo, e a impedem de elevar-se à liberdade perfeita do Espírito”. 

“Ó meu Deus, doçura inefável! Convertei em amargura toda consolação carnal, que me aparta do amor das coisas eternas e me fascina pelo encanto de um prazer momentâneo. Não me vença, Adonai meu, não me vença a carne e o sangue; não me seduza o mundo, com sua glória passageira; não me faça cair o demônio, com sua astúcia. Dai-me força para resistir, paciência para sofrer, constância para perseverar. Dai-me, em lugar de todas as consolações do mundo, a suavíssima unção do vosso Espírito e, em lugar do amor terrestre, infundi-me o amor de vosso nome!” 

Onde está a ruach do haShem há liberdade. Mas que liberdade é essa, de que fala o rabino Shaul e Thomas à Kempis? É a liberdade de fazer a escolha certa, de deixar de lado a carne e o sangue, a escravidão às muitas exigências do corpo, às seduções do mundo. Escolher a liberdade do Espírito é deixar-se escolher pelo espírito. É escolher o amor do pai, a obediência do filho e a santidade do espírito. Tais escolhas na emunah renovam a vida e vencem a materialidade do mundo. 

É uma experiência que não abandona aqueles que a experimentaram realmente: é a liberdade que leva do medo à confiança, que faz reviver a esperança, que traduz o amor à vida. A liberdade no espírito leva a uma vida criativa. Significa ultrapassar os limites da realidade determinada pelo passado e buscar as possibilidades que não se realizaram. É liberdade que livra da força do mal, da lei das obras e do poder da morte: que leva a uma comunhão direta e eterna com Adonai. Essa é da liberdade no espírito. 

Que os caros leitores e caríssimas leitoras vivam plenamente esta liberdade. Pois, esta mundialização de caos e crise não pode receber o espírito da liberdade porque não o pode ver, nem conhecer. Mas, vocês o conhecem porque Ele está com vocês e vive em vocês.






samedi 2 avril 2022

Um reformador marginal

Que o vento da justiça sopre sobre você, que a paz seja como riachos de águas, e que o fogo do amor traga alegria!


Jorge Pinheiro, PhD

Kadish, vida, morte e reino

Fonte Editorial, 2018


Um reformador marginal 

Somos desafiados, ao ler os textos da Nova Aliança, a buscar as bases judaico-cristãs da política social de Jesus. E aqui faremos isso a partir do texto de Lucas ... 

E, chegando a Nazaré, onde fora criado, entrou num dia de sábado, segundo o seu costume, na sinagoga, e levantou-se para ler. E foi-lhe dado o livro do profeta Isaías; e, quando abriu o livro, achou o lugar em que estava escrito: O Espírito do Senhor é sobre mim, pois que me ungiu para evangelizar os pobres. Enviou-me a curar os quebrantados de coração, a pregar liberdade aos cativos, e restauração da vista aos cegos, a pôr em liberdade os oprimidos, a anunciar o ano aceitável do Senhor. E, cerrando o livro, e tornando-o a dar ao ministro, assentou-se. E os olhos de todos na sinagoga estavam fitos nele. Então começou a dizer-lhes: Hoje se cumpriu esta escritura em vossos ouvidos. E todos lhe davam testemunho, e se maravilhavam das palavras de graça que saíam da sua boca. E diziam: Não é este o filho de José? E ele lhes disse: Sem dúvida me direis este provérbio: Médico, cura-te a ti mesmo; faze também aqui na tua pátria tudo que ouvimos ter sido feito em Cafarnaum. E disse: Em verdade vos digo que nenhum profeta é bem recebido na sua pátria. Em verdade vos digo que muitas viúvas existiam em Israel nos dias de Elias, quando o céu se cerrou por três anos e seis meses, de sorte que em toda a terra houve grande fome. E a nenhuma delas foi enviado Elias, senão a Sarepta de Sidom, a uma mulher viúva. E muitos leprosos havia em Israel no tempo do profeta Eliseu, e nenhum deles foi purificado, senão Naamã, o siro. E todos, na sinagoga, ouvindo estas coisas, se encheram de ira. E, levantando-se, o expulsaram da cidade, e o levaram até ao cume do monte em que a cidade deles estava edificada, para dali o precipitarem. Ele, porém, passando pelo meio deles, retirou-se. (4.16-30). 

... e tomaremos como referenciais a Ben Witherington III e John Howard Yoder. 

Witherington III analisa a marginalidade social de Jesus a partir das realidades expressas pela hierarquia sacerdotal da época em relação a ele. Ao não ter pai conhecido e reconhecido não tinha direito a um nome. Por isso, era visto como alguém de genealogia desconhecida. E o fato de ser nomeado homem de Nazaré, oriundo de uma vila de camponeses e artesãos, pouco conhecida e afastada das rotas comerciais, fazia com que sua identidade geográfica também o desclassificasse como possível figura messiânica. 

Assim, genealogia e geografia faziam dele um judeu socialmente à margem, que, por suas origens, não merecia crédito. Mas, esse homem-sem-nome, esse homem-sem-terra santa iniciou suas atividades de maneira no mínimo inusitada na sinagoga de Nazaré, conforme descreve Lucas. 

Segundo Yoder, na época, não havia nas sinagogas uma leitura dos profetas regularmente prescrita. E o fato de essa passagem não estar presente nos lecionários conhecidos posteriormente, tende a indicar que Jesus a escolheu de propósito. Morris, afirma que essa hipótese corrobora a afirmação de Lucas: “abrindo o livro, achou o lugar onde estava escrito”. Aqui dois detalhes merecem ser realçados: primeiro, é a única referência clara nos Evangelhos de que Jesus sabia ler. E, segundo, por que, ao ler Isaías 61.1-2, ele omitiu uma frase, curar os contritos de coração e acrescentou outra, libertar os oprimidos, que está em Isaías 58.6? Na verdade, utilizou os textos que considerou mais úteis à exposição de sua plataforma político social. 

O uso que fez de termos políticos, como reino e evangelho, mostram que tal seletividade tinha uma finalidade: falar de uma promessa política de intervenção social alternativa àquelas dos poderes presentes na época. Assim, se lermos o texto apresentado por Jesus, numa perspectiva rabínica, estamos diante de uma recorrência às promessas do jubileu, quando as injustiças acumuladas durante anos deveriam ser sanadas. A fala daquele homem de identidade questionada não afirmava que a Palestina seria resgatada na escala temporal, mas que deveria entrar na vida palestina o impacto solidário do ano sabático. 

Da mesma maneira, o reino vindouro surgia enquanto compreensão profética do ano sabático. Nesse sentido, o sábado da semana ampliava-se no sábado dos anos, onde o sétimo deveria ser de descanso e reforma, já que restaurava o que tinha sido exaurido, natureza e pessoas. Essa coleção de regulamentos presente em Levítico concernia ao direito de propriedade da posse da terra e de pessoas, que constituíam a base da riqueza. O propósito era fixar limites ao direito de posse, já que toda propriedade, natureza e pessoas, pertenceria a Adonai. Assim, ninguém poderia possuir a natureza e as pessoas de forma permanente, pois tal direito pertencia a Adonai. E o ciclo de sete anos sabáticos desaguava no quinquagésimo ano, o jubileu messiânico, que só vai aparecer de novo em toda a Primeira Aliança apenas em Números. Mas, Jeremias falou de uma reforma social na Jerusalém sitiada, quando Zedequias proclamou a liberdade dos escravos hebreus. Da mesma maneira, em Isaías encontramos a reforma como parte da visão profética. Nesse sentido, a reforma do jubileu apontava para a reestruturação econômica e sócio-política das relações entre os povos da Palestina. 

É interessante que Flávio Josefo tenha afirmado anos depois da presença de Jesus em Nazaré, que “não existe um único hebreu que, mesmo hoje em dia, não obedeça à legislação referente ao ano sabático como se Moshe estivesse presente para puni-lo por infrações, e isso mesmo em casos que uma violação passaria despercebida”. 

Apesar da afirmação de Josefo, sabemos que um enquadramento econômico e social a partir das disposições de Levítico 25, o que incluía inclusive a redistribuição da propriedade, nunca foi literalmente vivido entre os judeus. Por isso, coube a um sem-terra prometida levantar o discurso do ano da libertação. 

A proposta de reforma do Jesus marginal era a anunciação profética da entrada em vigor de uma era nova, caso os ouvintes aceitassem a notícia. Não estava a se referir a um evento histórico, mas reafirmava uma esperança conhecida de seus ouvintes: a da reforma econômica e sócio-política que deveria mudar as relações entre os povos palestinos. 

E aquele homem de genealogia desconhecida e geografia marginal colocou a centralidade da reforma sobre ele próprio ao afirmar que naquele momento, na sinagoga de Nazaré, a promessa profética se cumpria. E é isso que Lucas vai mostrar na sequência de seu evangelho: o reformador marginal era o messias prometido. 

vendredi 25 mars 2022

É possível dialogar?

Antropologia e religião

Jorge Pinheiro

Prof. Dr em Ciências da Religião



É possível dialogar?



Como encarar o debate religioso? Devemos nos fechar em definições doutrinárias e declarar que todo diálogo inter-religioso leva ao sincretismo e dissolve nossas crenças e fé? É possível o diálogo, reconhecendo diferenças e mantendo cada qual sua identidade religiosa? Para pensar essas questões, vamos fazer uma releitura do texto de José Maria da Silva. A identidade no mundo das religiões, análise desde um olhar localizado [Revista de Estudos da Religião, 2001, no. 4, pp. 14-26].


Mas antes vejamos alguns pressupostos metodológicos que podem nos ajudar a nortear o estudo da questão da identidade religiosa versus desafio do diálogo inter-religioso.


A ciência, e em especial a lingüística, trabalha com o conceito de paradigma. Um paradigma é um modelo, um padrão, um protótipo. É um conjunto de unidades suscetíveis de pesquisa baseada em realizações científicas passadas, que aparecem num mesmo contexto e que são comutáveis e mutuamente exclusivas. No paradigma, as unidades têm, pelo menos, um traço em comum -- forma, valor ou ambos -- que as relaciona, possibilitando conjuntos abertos ou fechados, segundo a natureza das unidades. No primeiro caso, quando essas unidades são formais, temos um paradigma que possibilita a tradução da realidade e, no segundo caso, quando são unidades de valor, temos um paradigma que sistematiza o conhecimento.


Mas há um outro dado importante: em cada época, há paradigmas dominantes, ou seja, aqueles a partir dos quais as pesquisas se realizam, comprometidas com determinadas regras e padrões.


Mas, nenhum paradigma é eterno. Ele pode ser quebrado. Nesse sentido, há quebra do paradigma quando uma visão que transforma a compreensão da realidade, dá a ela nova forma e dimensão, determinando uma releitura da verdade.


Segundo Thomas Kuhn [As estrutura das revoluções científicas, São Paulo, Perspectiva, 1976, p. 38], “para ser aceita como paradigma, uma teoria deve parecer melhor que suas competidoras, mas não precisa (e de fato isso nunca acontece) explicar todos os fatos com os quais pode ser confrontada”. A quebra de paradigma, em última instância, significa mudança da imaginação científica e não um dado a mais numa estrutura de idéias já existente.  


No campo da religião cristã são três os paradigmas geralmente considerados: (1) exclusivismo ou visão eclesiocêntrica; (2) inclusivismo ou visão cristocêntrica; (3) pluralismo ou visão teocêntrica.


O catolicismo romano tem um axioma, formatado por Orígenes, Cipriano e Agostinho – “extra eclesiam nulla salus” -- e retomado pelo Concílio de Florença (1442), que caracteriza esse exclusivismo eclesiocêntrico. Ao dizer, “fora da igreja não há salvação”, o catolicismo romano está afirmando a fé católica é privativa, restrita e incompatível com qualquer outra fé, mesmo cristã. E isto é assim por direito divino entregue à essa igreja, que por assim dizer não tem concorrentes em qualquer outra expressão religiosa. 


No campo cristão protestante, tal espírito ou sistema de exclusão é traduzido na idéia de que “fora do cristianismo não existe salvação”, conforme expõe John Hick [A metáfora do Deus encarnado, Petrópolis, Vozes, 2000, pp. 13-14]. 


Geralmente, o exclusivismo eclesiocêntrico, quer católico, quer protestante, parte de uma interpretação tautológica da revelação, que se baseia no literalismo mítico. Mas, se parte daí, leva também à demonização da diferença, que aparece sempre como heresia ou doutrina sem fundamento e que, por isso, não merece crédito ou atenção. Assim, o que é diferente é sempre execrado, maldito, anátema.


O paradigma que se coloca no outro extremo é o do pluralismo teocêntrico, que parte da revolução copernicana, segundo a qual a realidade não é um todo orgânico, mas é composta de uma pluralidade de entidades independentes, quer materiais, quer espirituais. Ou seja, assim como os planetas giram ao redor do sol, todas as expressões religiosas estão voltadas para Deus.


Este paradigma dissolve a identidade religiosa, negando a qualidade daquilo que é particular a toda expressão religiosa, daquilo que a faz idêntica a ela própria. Ao diluir e até mesmo negar esse conjunto dos caracteres próprios à determinada religião, leva à conclusão de que todas são iguais, ou cumprem iguais funções, já que todas giram ao redor de Deus. 


Mas ao apoiar-se na revolução copernicana, o pluralismo teocêntrico traz para o campo das religiões um problema que não existe em outros campos científicos. Aqui, a afirmação de que todas as religiões são iguais não pode ser constatada pelo exame dos fatos. Ou melhor, a única solução possível seria analisar a fé em cada uma delas. Mas ainda esta solução não seria tão empírica como parece, pois a fé religiosa, por ser exclusiva, só é aceita por aqueles que comungam dela. 


A opção, como propõe teólogos como Hick, é a verificação escatológica, pois “até que a última curva não seja dobrada, nada se saberá de maneira definitiva”, conforme agrega José Maria da Silva [A identidade do mundo das religiões, análise desde um olhar localizado, artigo citado, p. 18]. Ou seja, para sabermos se a base paradigmática do pluralismo procede, quer dizer, que todas as religiões são iguais, temos que esperar o fim do mundo.  


Mas há um terceiro caminho, diferente do paradigma do exclusivismo eclesiocêntrico e diferente do paradigma do pluralismo teocêntrico. É esse paradigma é o inclusivismo cristocêntrico, que vê as religiões naturais como dado da revelação, ou seja, da universalidade salvífica do sacrifício de Cristo na cruz. Nesse sentido, todas elas, estão dentro do axioma apresentado por Paulo em Romanos 2.14-15: “Os não-judeus não têm a lei. Mas, quando fazem pela sua própria vontade o que a lei manda, eles são a sua própria lei, embora não tenham a lei. Eles mostram, pela sua maneira de agir, que têm a lei escrita no seu coração. A própria consciência deles mostra que isso é verdade, e os seus pensamentos, que às vezes os acusam e às vezes os defendem, também mostram isso”.


Nesse sentido, quando falamos de inclusivismo cristocêntrico, estamos falando da abrangência e envolvimento dos tempos da salvação na vida humana em particular e na vida da humanidade. Isto porque a salvação tem um tempo pretérito, conforme explica Paulo em II Tm 1.8-9: “Deus nos salvou e nos chamou para sermos o seu povo. Não foi por causa do que temos feito, mas porque este era o seu plano e por causa da sua graça. Ele nos deu essa graça por meio de Cristo Jesus, antes da criação do mundo”.  


Assim, a alienação e alvos errados dos seres humanos que sentiram a dor e tiveram consciência de sua miserabilidade, ou seja, que se arrependeram, foram perdoados através do sacrifício da cruz, conforme explica Paulo: “Deus ofereceu Cristo como sacrifício para que, pela sua morte na cruz, Cristo se tornasse o meio de as pessoas receberem o perdão dos seus pecados, pela fé nele. Deus quis mostrar com isso que ele é justo. No passado ele foi paciente e não castigou as pessoas por causa dos seus pecados; mas agora, pelo sacrifício de Cristo, Deus mostra que é justo. Assim ele é justo e aceita os que crêem em Jesus”.


Mas se a graça da cruz cobre aqueles que se arrependeram num tempo pretérito à cruz, enquanto perdão jurídico [Rm 5.9, Ef 1.7], acontece também no tempo presente [Tg 1.21, I Pe 1.9], enquanto tempo presente de liberdade [Lc 9.23+, Rm 5.10, Gl 5. 16, 25] e num tempo futuro [Rm 13.11], enquanto tempo de glória [Fp 3.20-21, Gl 1.4, I Pe 1.5, 3.20-21].


Dessa maneira, diferente dos paradigmas do exclusivismo eclesiocêntrico e do pluralismo teocêntrico, o paradigma do inclusivismo cristocêntrico possibilita o diálogo inter-religioso sem diluir nossa identidade cristã, protestante. Não nos isolamos, nem amaldiçoamos aqueles que são diferentes. Ao contrário, o conhecimento da diferença possibilita o diálogo e reafirma nossa identidade.


O paradigma do inclusivismo cristocêntrico afasta-se também do pluralismo teocêntrico e não diz que todas as religiões são iguais e nem diz que cumprem a mesma função salvífica. Não dilui nossa fé num emaranhado de crenças, mas a partir da manutenção de nossa identidade, vê que a expressão da revelação e do fator salvífico da cruz de Cristo, enquanto projeto redentor aconteceu fora do tempo e do espaço, na eternidade, e, por isso, possibilita a todos os seres humanos e à humanidade um encontro com o Criador.


Bem, todo paradigma implica em novidade da imaginação científica. É sempre um novo caminho para novas descobertas. É resposta para o desafio da pós-modernidade. Esbarramos todos os dias na diferença. Como vamos conviver e dialogar com essas diferenças? Talvez o paradigma do inclusivismo cristocêntrico nos ajude.


Em Cristo,

Do pastor e amigo,

Jorge Pinheiro.












 

mercredi 23 mars 2022

Adoratores adorabunt ...

 Adoratores adorabunt patrem in spiritu et veritate


Jorge Pinheiro

Professor doutor em Ciências da Religião


“No entanto, está chegando a hora, e de fato já chegou, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade. São estes os adoradores que o Pai procura. Deus é espírito e é necessário que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade”. João 4.23-24.


Introdução


A adoração pode ser definida como veneração ou culto que se rende a alguém ou algo que se considera sobrenatural, divino e sagrado, bem como rituais e códigos morais que expressam a ação de adorar.


A palavra portuguesa adorar deriva do latim adoratìo, ónis. No mundo helênico, anterior ao nascimento do cristianismo, adoração referia-se a realização de um serviço sacerdotal, no grego leitourgeo. Mas, depois, no cristianismo passou a ser visto como um estilo de comportamento marcado pelo amor, veneração, ou mesmo idolatria por alguém ou alguma coisa que se considerava excepcional, singular. Donde adorar passou a ser entendido como uma forma de paixão.


A palavra adoração foi usada durante séculos no contexto cultural da Europa, marcado pela presença do cristianismo que se apropriou do termo latino. E tanto na antropologia, como na sociologia, foi compreendida como expressão de um tropismo humano em direção ao transcendente, ou seja, como expressão de espiritualidade.


Se tomarmos, por exemplo, o filme “A Paixão de Cristo”, de Mel Gibson, vemos que tanto os críticos como milhões de espectadores não notaram que o filme tratava de um dos temas centrais do cristianismo: a questão da espiritualidade cristã. E é esse tema que pretendo abordar, adoração/ espiritualidade, a partir de um texto clássico, o diálogo entre Jesus e a samaritana.


Para os povos semitas, o que nós hoje entendemos por adoração era traduzido nos gestos de curvar-se, prostrar-se, colocar a cabeça no chão, num ato de total submissão, de entrega, já que aquele diante de quem a pessoa se prostrava poderia decepar-lhe a cabeça. Mas havia um outro gesto, o do beijo, que significava o abrir-se ao espírito e ser por ele possuído. Assim, adorar foi entendido através desses gestuais como submissão e possessão. 


Mas a adoração não é exclusiva dos povos semitas. Os hindus têm, por exemplo, o culto ao rio Ganges, pois acreditam que é mais antigo que a terra e que jorrou do céu e, por isso, pode libertar o homem de seus pecados em vidas anteriores, curar e purificar o corpo e a alma. E eles adoram o Ganges. A adoração é chamada puja e consiste de orações e oferendas. Assim, a idéia de adoração é enriquecida também pelo ato de entregar algo, algo vital, que pode ser alimento, bebida ou mesmo riquezas.


Entendidos esses três componentes do conceito adoração, vamos à discussão do texto onde Jesus conversa com a samaritana e trata da adoração/ espiritualidade cristã. E pensar os versículos 23 e 24. De forma abrangente podemos dizer que espiritualidade é aquela relação do ser com a transcendência, que dá sentido à vida. E exatamente por isso intercalo na nossa reflexão o belo poema de Ada Negri, Atto d´amore.


"Não sei dizer-te quanto te amo Deus no qual creio, Deus que é a vida vivente, aquela já vivida e aquela que é para ser vivida além dos confins do mundo e onde não existe o tempo."


O ser humano, unidade multiforme, tem em seu espírito não uma dimensão parcial da vida, mas irredutível, conforme afirma Lossky. Nesse sentido, o espírito é a totalidade da vida. Nas situações de perda, falta de sentido e de ameaça à vida há sempre experiência com a transcendência, pois mesmo na negação dela há um sentido transcendente. 


Na reconstrução da Europa, depois da Segunda Guerra mundial, o teólogo teuto-americano Paul Tillich disse que a desintegração espiritual da sociedade ocidental já tinha sido prevista por teólogos e estudiosos, no século XIX, mas a necessidade de compreender este fenômeno exigia que nos aprofundássemos em seu estudo. 


Assim, para Tillich, “se não houver espírito, as construções humanas não poderão produzi-lo. Ele, o espírito age ou não age nos indivíduos e nos grupos. E quando age cria seu próprio meio de comunicação. Assim, o espírito se manifesta por meio das palavras, das formas de vida, das instituições sociais e dos símbolos religiosos”.


A idéia espírito, de que nos fala Jesus, nos leva a uma compreensão abrangente de espiritualidade, que não pode ser entendida apenas como sinônimo de piedade ou como conhecimento dos princípios de que se compõe a piedade.


Partindo do senso comum da igreja brasileira, a espiritualidade pode ser vista como uma interpretação particular do ideal evangélico, mas se partimos do que Jesus nos transmite e da contextualização realizada por Tillich podemos dizer que há uma espiritualidade comum à espécie humana, que ela se expressa existencialmente por sermos todos imago Dei.


Quando multidões assistem a um filme como A Paixão de Cristo e são despertadas, cada qual a sua maneira, acerca da miserabilidade humana, constatamos que as pessoas têm atributos potenciais para a espiritualidade. Esses atributos, presentes na imagem de Deus que somos, e que chamo de tropismo à transcendência, nos leva à questão da adoração.


 “Eu não soube; mas a Ti nada escondo daquele que está no profundo. Cada ato da vida, em mim, foi amor. E eu acreditei/ que fosse pelo homem, ou a obra, ou a pátria terrena, ou nascido do meu próprio peso, ou das flores, das plantas, das frutas que caem no chão, da substância, alimento e luz mas foi o Teu amor, que em cada coisa e criatura estás presente. E agora que um a um caíram ao meu lado, os companheiros de estrada, e submissas sopram as vozes da terra, a tua face refulge de esplendor mais forte e tua voz é cântico do gloria”. 


A espiritualidade e o sagrado


Otto, um dos teóricos que se debruçou sobre esta questão, diz que a experiência humana diante do sagrado tem sempre algo intenso e profundo, que ele chama de mysterium tremendum, que traduz o numinoso, o que é transcendente para a realidade do crente, que diante daquilo que o esmaga desenvolve senso de temor. Esse temor é um medo qualitativo, motivo para reflexão e energia que transformado em poder faz dele um adorador. 


Tais experiências com o sagrado encorajam e incorporam no adorador aquilo que lhe é distinto. Apesar dessa relação de aparente intimidade de relacionamento, permanece o abismo entre adorador e sagrado. Dessa maneira, este desejo de saltar sobre o abismo que separa humano e sagrado é em última instância o móvel que dará origem à espiritualidade. 


Se por um lado a crise ocidental pode ser traduzida como uma crise espiritual, por outro essa busca frenética de bens materiais e de consumo aumenta o vazio humano e favorece a busca da espiritualidade como experiência de vida coerente e recomendável. Assim, vivemos numa sociedade em crise espiritual, que procura encontrar a espiritualidade perdida.


A espiritualidade cristã


A espiritualidade cristã foi construída ao redor da cruz. A paixão de Cristo sempre foi entendida por teólogos e crentes como o derramar do dom da vida de Deus sobre os seres humanos. E porque a morte de Jesus Cristo não é derrota, mas sacrifício livremente aceito, a espiritualidade cristã tem sempre dois movimentos:


1. Um movimento em relação ao outro, ao próximo, ao desvalido, àquele que sofre, que é um chamado ao compromisso. Este movimento da espiritualidade em relação ao próximo nós chamamos de serviço. 


A partir desse momento em que a espiritualidade torna-se caminho para Deus através do serviço ao próximo, a espiritualidade tem algo a dizer a todos os nossos relacionamentos, tanto pessoais, como sociais e políticos.


Pode parecer desconcertante relacionar espiritualidade e relacionamentos pessoais, sociais e políticos, mas ao falar de espiritualidade estamos falando do exercício do amor e por relacionamentos pessoais, sociais e políticos entendemos a transformação da sociedade na direção do reino de Deus, para que se faça justiça aos excluídos de tal forma que encontrem vida e salvação. Nesse sentido, a espiritualidade dá sentido à vida pessoal, social e política e torna-se além de profética, transformadora.


2. Mas a espiritualidade tem um outro movimento, que se por um lado está ligado ao rigor da fé, como vemos na oração e nos momentos de contrição, ela se realiza existencialmente, enquanto encontro com Deus. Esse encontro, conforme no diz Jesus, é a adoração e está na raiz da conversão e de todo processo de santificação. É um processo místico, no sentido que mostra nossa miserabilidade diante do insondável mistério de Deus. 


Considerações finais


Por isso, a espiritualidade e, por extensão, a sua expressão de submissão, possessão e entrega, que é a adoração, é profética e transformadora no encontro com o outro, com o humano, e um ato de adoração diante da majestade de Deus.


Ou, conforme nos diz Galilea, a contemplação de Jesus Cristo no irmão que sofre e a contemplação de Deus no Cristo ressurreto são sempre frutos da ação do Espírito em nossas vidas. Esses dois encontros devem ser a base da espiritualidade cristã na alta modernidade e fundamentam todo ato de adoração daquele que crê.


“Ora, Deus que sempre amei – te amo sabendo amar-te; com a inefável certeza que tudo foi justiça, mesmo a dor, tudo foi bem, mesmo o meu mal, tudo para mim Tu foste e sei, me faz temente de uma alegria maior que a morte. Permanece comigo, pois a noite desce sobre minha casa com misericórdia de sombras e estrelas. Que Tu participas, à mesa humilde, o pouco pão e a água pura da minha pobreza. Permanece Tu apenas junto de mim a tua serva; e no silêncio dos seres, o meu coração te entende único”.


Notas


1 Ada Negri nasceu em Lodi, na Lombardia, em 1870, filha de camponeses. Seus primeiros livros refletiam uma consciência social que se opunha às tendências dominantes no fim do século. Mais tarde, a sua poesia incluiu uma afirmação de sexualidade feminina, diferente das tradicionais poesias de amor (Il Libro di Mara, 1919). Ada Negri faleceu em 1945.

2 Tradução do italiano para o português por Jorge Pinheiro.

3 Vadlimir Lossky, A l’image et la ressemblance de Dieu, Paris, 1967, p. 118.

4 Paul Tillich, A Era Protestante, São Paulo, Ciências da Religião, 1992, pp. 275-276.

5 Rudolf Otto, O Sagrado, Lisboa, Edições 70, 1992, pp. 21-22.

6 Segundo Galilea, Espiritualidade da Libertação, Petrópolis, Vozes, 1975, pp. 15-16.



File:Ada Negri 2.jpg


Ada Negri, poeta italiana


dimanche 6 février 2022

Europa e missões

A missão no contexto europeu
Jorge Pinheiro  
Montpellier, 10/12/2020


"Deus é o Criador e o Juiz de todos os homens. Devemos, portanto, compartilhar sua preocupação pela justiça e reconciliação em toda a sociedade humana e pela libertação dos homens de todo tipo de opressão ... expressamos penitência tanto por nossa negligência quanto por ter às vezes considerado o evangelismo e a preocupação social como mutuamente excludentes". John Stott  

Duas ou três coisas

Quando me perguntam por que fazer missão na França, eu parto do que, realmente, está acontecendo hoje na Europa, e que os jornais e revistas nos relatam sobre isso.
Ao som de bateria e teclado, quatro back vocais dão o tom do culto na igreja, enquanto são acompanhados por fiéis que, com os braços erguidos, louvam e repetem as letras projetadas no telão. Logo acima, pode-se ler Dieu est amour. A cena, comum nas igrejas brasileiras, é novidade na França, que viu a fé protestante renascer nos últimos anos.
A presença dos muçulmanos traduziu a primeira abertura para a naturalização da expressão religiosa em lugares públicos na França. Mas isso criou um problema: tanto a condição de migrantes quanto a identidade associada a uma religião com grande visibilidade fez da população muçulmana um alvo de discriminações e intolerâncias.
Mas voltemos aos jornais e revistas francesas. Longe do anonimato das ruas, nas manhãs de domingo na entrada da Église Réformée de Belleville a recepção é calorosa e personalizada. 
“É a proximidade entre nós, os pastores, e nossos fiéis que faz a força do movimento protestante", afirma Amos Ngoua Mouri, pastor da Communauté Évangélique la Bonne Nouvelle, no norte de Paris.
Segundo Frédéric Rognon, professor de Filosofia das religiões na Faculdade de Teologia Protestante de Estrasburgo, na França, "os protestantes expressam a fé de forma contemporânea, enquanto os cristãos tradicionais utilizam ainda modelos antigos que não respondem à realidade da vida atual. 
“O lado da expressão pública da fé protestante, quase publicitário, choca numa cultura francesa que relega a religião ao domínio privado”, afirma Fath, garantindo porém que as coisas estão mudando no país da laicidade. O pastor Mouri, por exemplo, confirma que o movimento protestante é cada vez mais reconhecido.
A presença do Islã na França decorreu da colonização do mundo muçulmano e a questão da presença árabe-muçulmana, ou seja, da migração, tornou-se uma questão fundamental da política da União Europeia. Nas próximas décadas se estima que cerca de 70 milhões de pessoas serão migrantes na Europa. Donde, é inútil negar as razões da crise europeia, já que a gestão da migração, principalmente, a presença muçulmana, deve respeitar os direitos à vida. Mas tanto a União Europeia como os Estados-membros não sabem, nem tem como resolver o desafio.
Para vencer o ódio e construir cidadania, a missão deve defender uma cidadania, por exemplo, que inclua as crianças migrantes, nascidas fora da Europa. O que pode ser enquadrado nas regras do reagrupamento familiar. Ou seja, a cidadania deve ser europeia em primeiro lugar, e ser válida para migrantes e refugiados. Para os povos em diáspora que escolhem esta terra europeia como cidade de refúgio.
Ao se falar de crianças, devemos lembrar que, segundo a UNICEF, o número de crianças refugiadas dobrou entre 2005 e 2015, e essas crianças desenraizadas devem ser levadas em consideração.
Qualquer que seja seu status, uma criança é uma criança. Assim, os milhões de crianças refugiadas que tiveram que deixar seus países devem ser protegidas e ter pleno acesso a todos os seus direitos, garantidos pela Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança. O grande número de crianças afetadas nos obriga a agir. Cada uma delas tem esperanças e sonhos. Conflitos violentos, perturbações causadas pelas mudanças climáticas não devem impedir que essas crianças tenham um futuro.
Para entender a escala do fenômeno, aqui estão alguns dados: 11 milhões de crianças são refugiadas ou requerentes de asilo fora do seu próprio país. Isto é o equivalente à população da Bélgica. 17 milhões de crianças foram deslocadas à força de suas casas. Cerca de 50% das crianças refugiadas vêm da Síria ou do Afeganistão.
Entre 2005 e 2015, o número de crianças migrantes aumentou 21%. Quanto ao número de crianças refugiadas, ele dobrou durante este período. Ou seja, 28 milhões de crianças foram deslocadas à força. Entre os 164 mil refugiados e migrantes que entraram na Europa em 2017, 29 mil são crianças. Mais de 90% das crianças que chegam à Itália estão sozinhas ou foram separadas de suas famílias. Cada uma delas enfrenta perigos consideráveis em sua jornada em busca de segurança. A rota do Mediterrâneo central, que está entre as mais perigosas, também é a mais utilizada. No final do percurso, essas crianças são frequentemente confrontadas com condições de acolhimento deploráveis: detidas, vítimas de discriminação, acumulam traumas que prejudicam o seu desenvolvimento. Muitas delas não têm acesso à educação ou aos serviços básicos de saúde. E outras optam pelo suicídio.
Vamos pensar a partir da teologia. Quando pensamos em missiologia na Europa e logicamente na França, devemos ouvir e ver o grito dos migrantes, muçulmanos e refugiados a partir do conceito de outro. E se não fizermos assim, vamos ver o próximo como se fosse uma projeção, e deixamos de entender a alteridade.
O renascer do protestantismo
Na França, a cada dez dias uma nova igreja evangélica abre as portas, de acordo com dados do CNEF -- Conselho Nacional dos Evangélicos da França.  

“A primeira razão é simplesmente a necessidade de esperança”, explica o sociólogo batista Sébastien Fath, especializado na história do protestantismo francês e autor dos livros Do gueto à rede, o protestantismo evangélico na França; e A nova França protestante, desenvolvimento e crescimento no século XXI.

"O contexto de crise, que atinge a sociedade francesa, tem por consequência um certo número de patologias sociais, como a solidão. O Estado não pode fazer tudo, as prestações sociais e capacidades de intervenção são em geral fragilizadas, pois há menos dinheiro público. A igreja evangélica responde às necessidade que o Estado não se encarrega mais”, avalia Fath, que enfatiza o caráter otimista do discurso evangélico, em um país onde o pessimismo é a regra.

Fath explica que embora a fé cristã esteja chegando a todos as classes sociais, inclusive às mais favorecidas, ela vem atraindo jovens e imigrantes, principalmente aqueles originários das antigas colônias francesas.

"Muitos franceses estão desencorajados diante da crise e da globalização. Há uma certa depressão e uma necessidade de perspectiva”, diz Fath. Já para Étienne L’Hermenault, pastor batista e ex-presidente do CNEF, o crescimento das igrejas evangélicas é fruto da sede espiritual. "A crise não é simplesmente financeira, mas também moral. Há um cansaço de uma sociedade que perdeu muitas referências e que busca valores”, argumenta.

Fath crê que o retorno ao protestantismo está ligado também à crise do discurso político. “Os franceses estão decepcionados com a política. O país que, durante muito tempo exportou pensamento político, se desencantou com as soluções políticas, há 15 ou 20 anos atrás”, avalia.

Evitar a realidade que nos circunda e fugir de uma leitura humana e presencial do Cristo nos remete à frase proposta por Tertuliano de Cartago, escritor cristão do século III, "credo quia absurdum!". Creio porque é um absurdo.

Esse absurdo paradoxal atinge o concreto e nos chama a mergulhar na imensidão do divino humano. Fechemos os olhos e digamos como aquele judeu que se chamou Paulo, o Pequeno: "Os judeus pedem um sinal, e os gregos sabedoria, mas nós pregamos o Cristo crucificado, que é um escândalo para os judeus e uma loucura para os gregos”.

Absurdo, escândalo, paradoxo... assim como o fundamento da fé, a mesma fé que justifica Abraão no meio da loucura de um pai que deve sacrificar o "filho da promessa". Portanto, a fé deixa de ser a emuná hebraica, que define uma posição militar, e se torna um paradoxo. Nenhuma ilusão ou devaneio, mas a loucura da confiança no divino, que não podemos compreender.

Como disse Paul Tillich, herdeiro de Hegel e do jovem Marx, a práxis é a mediação entre a ontologia e a realização da realidade. Essa correlação, que para Tillich se tornará um método, é a busca de superação da dialética anterior, que tratava do conhecimento do ser e de suas manifestações fora da práxis histórica. Devemos, nesta reflexão sobre missão na alta-modernidade europeia fazer essa passagem construindo uma lógica que não será hegeliana nem marxista no sentido clássico, mas buscará correlacionar ontologia, lógica e metodologia na dinâmica da práxis missiológica.

Essa correlação com a exterioridade caracteriza a mobilidade da missiologia integral que é uma missiologia da práxis. Desenvolve, assim, o caminho da correlação entre exterioridade e ontologia face à dinâmica da práxis, tratando de formulações de métodos que acompanham a superposição de horizontes ontológicos. Desse modo, tal missiologia coloca a afirmação da exterioridade como fonte anterior às demandas da ontologia, o que leva a uma intersecção comum: a ética.

Por isso, a missão na alta-modernidade deve ser construída a partir de duas leituras: o próximo como revelação de um mistério que nasce da liberdade, e da igreja como comunidade que denuncia os poderes que negam a milhões de pessoas a possibilidade a bens e direitos. A fé nasce do ato da inteligência -- essa é uma forma de ver. Mas quem, realmente, vai além do que vemos? Em primeiro lugar, a esperança de que o outro se revele. Ou seja, a possibilidade de produção e reprodução da vida que está além da visão do rosto. Assim, missiologia para a Europa na alta-modernidade significa pensar o outro, mas um outro que se revela na história, que é o mistério da nossa liberdade. Acreditar na revelação deste próximo é entender o significado da história.

Para que a missão seja integral devemos descobrir o significado do presente histórico, quer venha da África ou de regiões desfavorecidas do planeta. E o significado do presente histórico é profecia, é a palavra. Mas falar para quem? Na modernidade, falar ao outro nos levou à leitura formal do ir. Atravessar os mares e ir até os confins da terra. Devemos ir, sim. É claro que a profecia deve falar do significado dos acontecimentos presentes para nossa vida cristã. E isso é igreja. Mas, nesta alta-modernidade de caos e crise, o desafio não é apenas ir, mas receber. Vivemos na localidade global, não somos chamados somente a ir, mas a receber, porque muçulmanos, migrantes e refugiados estão entre nós, conosco. Assim, missão na alta-modernidade é receber e viver no chão da vida a realidade da fé.

A missão reconhece a vida do ponto de vista integral: onde o outro se apresenta como próximo, irmão, e não como como estranho, diferente, excluído. E esse é o conceito cristão de outro, sempre próximo, mesmo fisicamente distante, que no encontro nos pede novas atitudes e comportamentos.

A atividade missiológica é uma atividade de confronto que diz respeito a pessoas que sabem que muitas vezes devem discordar, pois não somos espectadores passivos.

A integralidade é uma contribuição para a questão metodológica, pois parte daquilo que está fora da igreja e mesmo do nosso círculo de amizades, que reconhece a existência da liberdade humana como graça de Deus. A lógica da missiologia moderna era dialética, não chegava ao horizonte do mundo, não incluía o outro porque anulava em sua alteridade. Mas, a missão integral nos apresenta um momento antropológico, uma maneira diferente de viver a missiologia, já que é uma missão holística, que abrange tanto o evangelismo e a presença junto às igrejas, quanto a responsabilidade social. 

Desde 1974, a missão integral influencia o mundo latino-americano, mas hoje se faz necessário que seja presença em todo o mundo, em especial na Europa. Ela nos mostra que o ser humano e a comunidade estão localizados além do horizonte da totalidade. Ser integrado, porque o outro é um ser inteiro, é o fulcro para novos desenvolvimentos. No entanto, o ponto de partida do discurso metódico é a externalidade do outro. Como alternativa à dialética que trabalha com a contradição, a identidade e a diferença, o princípio não é o da identidade, mas o da distinção. O estar e ser integral segue uma sequência, a totalidade é posta em causa pelo questionamento provocador do outro. Ouvir a palavra é ter consciência ética, é aceitar a palavra questionadora de quem fala. É ouvir e ver a necessidade real daqueles que estão na Europa, mas que tiveram sua ancestralidade longe dela.

Não podemos esquecer que 2,4 milhões de pessoas de países não pertencentes à Comunidade Europeia imigraram para a Europa em 2018. E que das 446 milhões de pessoas que viviam na Europa em 2019, 21 milhões eram de países que não pertenciam à Comunidade Europeia. Nas próximas décadas, segundo projeções da própria União Europeia, 70 milhões de africanos, principalmente jovens, migrarão para a Europa. O que isso diz a nós missionários?

A missão é holística

Utilizar o método da integralidade da missão significa aceitar eticamente o grito daqueles que chegam fugidos da miséria, da guerra e do extermínio. Essa ação é constitutiva, condição da possibilidade de compreensão: resulta na adoção da exterioridade, lugar do exercício da consciência crítica. 

A integralidade da missão é a afirmação da exterioridade: não é apenas a negação de um estado de coisas. É a superação da totalidade moderna a partir da transcendentalidade daquele que nunca esteve dentro. O momento é crítico por isso: é a superação do pensamento dialético negativo, mas não o nega, porque a dialética não nega a ciência, ela simplesmente a assume e a completa. Afirmar a exterioridade é alcançar o impossível para o sistema, o imprevisível para o todo, que decorre da liberdade. É somente por meio de um envolvimento integral que alguém pode se comprometer com o outro, a ponto de arriscar a vida na luta pela conquista de cidadania e direitos deste outro. Como resultado, a missão integral é prática: é uma uma pedagogia que visa a realização da alteridade humana.

A expressão missão integral foi criada na década de 1970 por membros da Fraternidade Teológica Latino-americana. A palavra integral, em espanhol e em português é usada para descrever a integridade do pão, pão integral, pão de trigo integral. Assim, a expressão é usada para descrever uma compreensão da missão que afirma a importância de expressar o amor de Deus e o amor ao próximo por todos os meios possíveis. Seus teóricos, dos quais eu citaria três, René Padilla, Samuel Escobar e John Sttot, enfatizaram a amplitude do Evangelho e da missão cristã. E usaram o conceito de missão holística para mostrar que a missão não deve se basear na dicotomia entre evangelismo e envolvimento social.

Mas o conceito não é novo: está presente no Novo Testamento e no ministério de Jesus. Missão integral é uma expressão que nos leva à compreensão de que a missão é holística, não é dualista, nem dialética. 

A missão integral já fez uma jornada de cerca de cinco décadas. Em 1966, o Congresso da Missão Mundial da Igreja, realizado em Wheaton, Illinois, reuniu evangélicos de 71 países. A Declaração de Wheaton declarou que "nós somos culpados de um isolamento antibíblico do mundo que muitas vezes nos impede de enfrentar e lidar honestamente com suas preocupações" e a "falha [da igreja] em aplicar os princípios bíblicos a problemas como racismo, guerra, explosão populacional, pobreza, desintegração familiar, revolução social e comunismo”.  

E naquele mesmo ano, o Congresso Mundial sobre Evangelização em Berlim reafirmou a concepção tradicional da missão, que chamamos de moderna. Billy Graham, neste Congresso, disse que se a igreja voltasse à sua tarefa principal de proclamar o evangelho, ela teria um impacto muito maior nas necessidades sociais, morais e psicológicas das pessoas do que poderia alcançar por meio de qualquer outra ação. 

Mas logo depois tivemos o Congresso Internacional sobre Evangelização Mundial em Lausanne, 1974, o mais importante encontro cristão do século XX, que propôs a missão integral como método para chegar aos desterrados neste novo momento da pregação do Evangelho.

Depois do Congresso de Lausanne, a missão integral cresceu. E na Inglaterra, em 1980, se elaborou um documento -- "Um Compromisso Evangélico com Estilo de Vida Simples" --, que reafirmou nosso compromisso com a justiça dentro da concepção de missão.

E em 1982, a Consulta Internacional sobre a Relação entre Evangelismo e Responsabilidade Social entendeu que a responsabilidade social é uma ponte e parceira do evangelismo. Ou seja, os dois são, na verdade, inseparáveis. 

Um ano depois, a Consulta sobre a Igreja, realizada em Wheaton, Illinois, publicou "Transformação: A resposta da igreja às necessidades humanas", que foi a mais profunda afirmação cristã da missão integral. Fez a denúncia da injustiça, e uma crítica àquelas igrejas que através do silêncio dão seu apoio tácito ao status quo sócio-econômico.

Depois de "A Questão Judaica", Marx fez a crítica econômica do cristianismo. Essa crítica foi dirigida às igrejas, porque para Marx elas eram a expressão da miséria. Mas também criticou a religião quando analisou o fetichismo da mercadoria, porque para ele a leitura religiosa do mundo real não desapareceria enquanto as atuais condições de vida não fossem superadas. Mas, em que consiste essa leitura do mundo real? Ora, o olhar religioso vê a existência separada das relações construídas pelo ser humano. E essa existência independente das relações sociais, essa existência irreal, é um reflexo de outro real. Essa divisão entre aparência que oculta a existência e oculta a realidade é esta idolatria do fetichismo da mercadoria. Estranho fetichismo, que consiste nisto: ele oculta o caráter social do trabalho e se manifesta como se este fosse um caráter material dos próprios produtos do trabalho. Ou seja, em relação à mercadoria, e infelizmente para o mundo da religião alienada, a realidade está separada das relações de trabalho, do essencial concreto e de seu produto. Vê-se, então, uma realidade aparente, como se o valor da mercadoria pertencesse de direito à sua própria estrutura independente. É esta visão de mundo alienada, separada da realidade, que a missão integral se propõe denunciar.

Uma missiologia para a Europa na alta-modernidade é uma ética da vida. Não é apenas uma razão estratégica que visa levar a revelação aos alienados de seu destino, mas deve ser capaz de integrar os princípios de vida que posicionem o outro, o próximo e o diferente como análogos.

O sistema-mundo nesta alta-modernidade de caos e crise, ao tornar impossível a produção e reprodução da vida, aprofunda seu caos e crise semeando a exclusão de bens e direitos. As vítimas são milhões de pessoas que estão aqui do nosso lado. Fome e miséria são cavalos do Apocalipse. Cabe, portanto, à missão elevar a ética como recurso diante de uma humanidade em perigo. Esta missiologia é responsável pela solidariedade que parte do critério da vida em relação à morte, da caminhada digna no caminho da fronteira, entre os abismos da irresponsabilidade ética e a paranoia fundamentalista.

Estamos aqui diante do sujeito histórico que aponta para a esperança escatológica, que se abrirá para ir além da alta-modernidade, onde o ser humano terá pleno direito de produção e reprodução da vida. E a missão, exatamente por ser holística, deve compreender que esta ação e esta postura não negam o análogo de Cristo, mas deve deixar de ser uma hermenêutica teórica e se desenvolver como uma presença que leva a uma transformação real.

É por isso que a missão apresenta um princípio universal: a defesa do direito à produção e reprodução da vida de cada ser humano. Esse princípio é objetivo e subjetivamente negado pelo sistema-mundo e pela globalização.

A revelação é palavra

Missão integral é revelação. E revelação é palavra, é linguagem e pessoalidade, é ver o próximo, ouvir a pessoa, caminhar com ela. Por isso, a missão corre no fio da navalha: por um lado está a negação da presença e recepção do diferente, daquele que veio de longe e, por outro, o fundamentalismo pró-integração, que quer fazer dele um igual a nós. Por isso, abrir-se para receber, e tudo o que isso implica, rompe a discussão moderna entre o paradoxo e a dialética do Cristo. Não há paradoxo porque Cristo é análogo e o método é holístico. 

E não nos esqueçamos das palavras do profeta Miquéias (6:8): "O que o Senhor requer de você senão que faça justiça, ame a bondade e ande humildemente com seu Deus". A nossa missiologia mostra que Deus criador e mantenedor existe nesta esperança e nesta possibilidade de produção e reprodução da vida. E Cristo não é uma monstruosidade ou um paradoxo, mas análogo. Assim, os que vem de longe, verão que Deus existe e Cristo é pessoa, Deus que se fez carne por amor a nós.

E volto ao Goddard de "Duas ou três coisas que sei dela", quando ele cita o Tractatus Logico-Philosophicus de Wittgenstein: "Os limites do meu mundo são os limites da minha linguagem." Mas, então, vemos Juliette cruzar Paris e dizer: "Mas o mundo sou eu".


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