As origens do pensamento solidário
Jorge Pinheiro, PhD
O pensamento solidário é o produto da evolução econômica e religiosa, que foi lentamente preparado e que se apresentou como pensamento político a partir da Renascença, da Reforma e com o surgimento do capitalismo. Ele surgiu em oposição ao pensamento autoritário da Idade Média e sedimentou suas bases nas criações culturais dos últimos séculos.
A ideia da busca da construção de sociedades mais justas e solidárias só pode ser compreendida a partir desse desenvolvimento e seu surgimento esteve ligado diretamente a esta evolução. Deve-se reafirmar, porém, que foi do interior do cristianismo que brotaram as ideias de economias e políticas solidárias e que um pensar solidário sem estes pressupostos é um equívoco. Aqueles que defendem uma economia, uma política, enfim, uma sociedade solidária devem compreender sob que princípios tal solidarismo repousou.
A organização econômica e religiosa da Idade Média estava fundada sobre um sistema de centralização da autoridade que, ancorado em leituras do sobrenatural, associava a natureza e o transcendente numa unidade que submetia pessoas e instituições.
A Reforma protestante, surgida a partir do pensamento humanista, que brotou a partir da Renascença, golpeou o sistema de autoridade, trouxe a fé pessoal, livre de amarras, para o plano formal, ao recorrer à autoridade das Escrituras. E, no plano material, valorizou a subjetividade da consciência.
Assim, apoiada formalmente sobre as Escrituras, a religião protestante produziu novas contradições, apesar do sistema centralizado da autoridade medieval já estar em frangalhos. Coube, a partir daí, às pessoas decidirem a que grupo queriam ligar-se: aos católicos ou aos protestantes.
Tal situação, no entanto, por razões geopolíticas, levou às guerras religiosas, fazendo com que as ideias de construção de sociedades livres e solidárias vivessem um processo lento, pois de cada lado, católicos e protestantes viviam a falsa esperança de que poderiam chegar a uma vitória exclusiva. Com o fim dos combates o que se viu foi que as oposições às confissões se tornaram permanentes. Dessa maneira, brotou a consciência autônoma nos mais variados campos, que se plasmou como consciência europeia ocidental, passando assim a atacar as muralhas autoritárias das religiosidades. E não deixou subsistir sob o solo protestante nada mais que os destroços do constrangimento autoritário.
E, ao nível do pensamento e da metodologia da produção científica, René Descartes golpeou o autoritarismo eclesiástico ao afirmar que a certeza que temos de nós mesmos é o princípio de toda certeza objetiva. E que, embora a autoridade não possa me livrar da dúvida, é em mim mesmo, na minha pessoa, somente, que se enraíza a certeza. Temos então, o Iluminismo, que constata: toda tradição deve ser submetida à crítica. Está dada a partir desse momento, no plano teórico, a possibilidade da busca da construção de sociedades justas e solidárias.
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