vendredi 11 mars 2011

A antropologia da imagem de Deus

O shemá era a oração que duas vezes por dia os judeus elevavam ao Eterno. Essa prece reconhece Deus como único e diz que deviam amá-lo com todo leb, com toda nefesh e com toda meod, conforme Deuteronômio 6.5.
 
Leb e lebab, que os gregos traduziram por cardia e nós por coração, nos falam dos movimentos do corpo humano. Leb e sua variante lebab ocorrem oitocentos e cinquenta e oito vezes nas Escrituras hebraicas, das quais oitocentos e quaorze se referem ao coração humano. Expressam a noção antropológica de que somos movidos por sentimentos e emoções que movimentam e dirigem nossos membros e corpo. Têm a realidade anatômica e as funções fisiológicas do coração enquanto expressões das atividades do ser humano, que levam às disposições de ânimo como alegria e aflição, coragem e temor, desejo e aspiração, e também às funções intelectuais como inteligência e decisão da vontade, que na cultura ocidental atribuímos ao cérebro. Nas passagens do livro de Gênesis que nos falam do leb constatamos que a antropologia se apresenta como uma psicologia teológica. Assim, leb tem um significado antropológico que fala daqueles aspectos que nos levam aos movimentos do sentir, do querer e do agir, que compõem a personalidade humana.

Meod, que os gregos traduziram por dynamis, e nós por força, aparece trezentas vezes nas Escrituras hebraicas, e traduz a idéia de intensidade e abundância. Em alguns textos, como no caso do crescimento do povo hebreu no Egito, meod aparece ligado à idéia de reprodução, de muitos filhos, o que nos leva a uma compreensão diferente do termo dynamis em grego, que nos fala de uma força física externa ao ser humano. Em hebraico podemos entender meod como potência, aquela força, aquela energia que faz de nós seres criadores, tanto no sentido biológico como intelectual. Seria potência que identifica o ser humano, capacidade de gerar que faz o humano crescer e multiplicar-se.

Nefesh, que os gregos traduziram por psyché, significa garganta, respiração, fôlego, pessoa, vida e alma,[1] e nos fala da plenitude daquilo que é humano, conforme encontramos em Gênesis 2.7. Dessa maneira, nefesh possibilita um rico diálogo com o texto de Gênesis e nos permite uma reconstrução dos significados da natureza humana.

A expressão nefesh leva a uma concepção de exterior versus interior,[2] que tem por base Deuteronômio 32.9, quando afirma que “uma parte de Iaveh faz seu povo”. Mobiliza assim em diferentes níveis essa força criacional, que constitui uma parte de Deus. A matéria-prima utilizada por Deus na modelagem humana é ordinária, enquanto material pertencente a ordem comum de “ló nefesh”: inanimados e animais. É o sopro de Deus que faz especial essa matéria ordinária. Mas será que estamos somente diante de um símbolo ou, de fato, a força criacional de Deus transmite à matéria ordinária não somente vida, mas transfere intensidade e profundidade? De certa maneira, não é absurdo dizer que os seres celestiais são criaturas integralmente espirituais. Sua existência procede do exterior da força criacional de Deus. A exteriorização traduz-se no fato de que a força criacional se dá através da palavra, da palavra criadora de Deus. Nesse sentido, nefesh procede da interioridade de Deus e por isso é conhecida como “ein sof”, que vem de seu interior. “Ele soprou” deve ser entendido como continuidade da afirmação anterior “façamos o ser humano” (Gênesis 1.26), de maneira que nefesh liga céu e terra, o que está acima e o que está abaixo. Por isso, dizemos que a natureza humana é superior à natureza angélica, porque procede da interioridade de Iaveh. Traduz ação mediadora e conjuntiva da força criacional. Donde, a natureza humana procede de atributos divinos não ostensivos, discretos, que se traduzem em integridade holística, pluralidade social, sabedoria, compreensão e abertura à transcendência. Nefesh entende-se e revela-se enquanto natureza que se torna compreensível e inteligível. É transbordamento e transparência do Espírito de Deus, que indica transbordamento e transparência no humano, daquilo que relaciona o que está em cima com o que está em baixo. Da leitura de Gênesis 2.7 podemos constatar que o texto fala de respiração e daquilo que o humano passa a ser: ele não tem uma nefesh, ele passa a ser uma nefesh.

O texto e o pensamento literário dos hebreus são sintéticos. Daí que a chave para chegarmos a uma compreensão analítica dele exige identificar com que parte do corpo o ser humano pode ser comparado e onde o agir humano faz interface com nefesh, utilizando para isso textos que apresentam diferentes sentidos de nefesh. Embora a expressão nefesh apareça 755 vezes nas Escrituras hebraicas e seja traduzida seiscentas vezes na Septuaginta por “psyché”, garganta e estômago podem ser tomados por paradigma e transmitem a idéia de necessidade, de algo difícil de ser saciado. Nesse sentido, a palavra alma nos dá uma tradução incompleta, pois a idéia é que “Iaveh Deus formou o ser humano do pó da terra e insuflou em suas narinas o seu hálito e o ser humano se tornou um ser vivente que necessita Dele para ser saciado”.

Nefesh não traduz algo bom ou mal, mas a realidade das necessidades fundamentais e imprescindíveis da alma humana, que ao não serem ou não estarem preenchidas por Deus produzem alienação, individualismo, descrença, ignorância e idolatria. Mas como o sopro de Deus pode ter gerado um ser humano com tal índole de insaciabilidade? Se entendermos a nefesh como o órgão das necessidades vitais, dos movimentos emocionais da alma, somos levados a entender o pensamento sintético hebreu ao ver a nefesh como síntese da própria vida. Assim, as necessidades humanas criadas pelo próprio Deus só podem ser saciadas por Ele.

“Quem me encontra, encontrou a vida e alcançou benevolência de Iaveh. Quem não me acha, faz violência à sua nefesh. Todos os que me odeiam, amam a morte”. Provérbios 8.39 e seguintes.

No relato de Gênesis 2.7 o ser humano é definido como nefesh hayah, um ser vivente, que necessita ser saciado. Quando integrado ao seu Criador, nefesh é transbordamento e transparência do Espírito de Deus, que indica transbordamento e transparência no humano, daquilo que relaciona o que está em cima com o que está em baixo. Mas essa natureza também se vai constituir enquanto expansão dos significados da imagem de Deus, em graça e amor. “Ele soprou” traduz o fato de que as coisas do intelecto e do coração expressam-se através dos órgãos da fala, em especial, garganta e boca, que possibilitam o sopro. Nefesh como substantivo ganhou vários sentidos, sendo garganta um deles, e assim é usado em Provérbios 23.2, quando diz “põe uma faca à tua garganta, se fores uma pessoa de grande apetite”. A garganta ou goela é por onde entra e sai a respiração, o ar. O ser vivente, então, ganhou a designação nefesh, ser respirador. No caso do humano refere-se basicamente à forma que o espírito e a inteligência, sem forma em si, assumiu ao animar o corpo.[3] Esse padrão simboliza a interioridade da natureza humana. Portanto, para que o humano possa dar intensidade e profundidade a sua inteligência precisa de amor e graça, que nascem da interioridade de Iaveh. Em Gênesis 2.7, “ele soprou” significa que Aquele que soprou o fez numa determinada direção e com objetivo definido. Aqui, direção e objetivo traduzem destinação.

Esse é o destino do humano: ter sua nefesh integralmente saciada por seu Criador e a partir daí relacionar-se com Ele, com o universo, com seus semelhantes e consigo mesmo. Nesse caso, temos uma nefesh em equilíbrio, plena do Espírito de Deus, o que se traduz em integridade holística, pluralidade social, sabedoria, conhecimento e abertura à transcendência. A ruptura dessa integridade produz alienação, individualismo, descrença, ignorância e idolatria. A antropologia da nefesh em Gênesis nos fala sobre a imagem de Deus e nos dirige a uma pesquisa teológica do humano, da humanidade, da pessoa e da comunidade, da pessoa e da ordem social, da pessoa enquanto excluído, da pessoa enquanto eleito, da humanidade e seu destino, ou seja, da vida para o mundo, do amor para o próximo e da criação para todos.

Diante disso, devemos nos perguntar que princípios podem nortear tal pesquisa teológica? Sem dúvida, o princípio arquitetônico, enquanto revelação, fé objetiva, base e eixo da teologia. E logicamente o princípio hermenêutico, ou seja, a interpretação dos aspectos históricos e lingüísticos dessa revelação. Devemos partir, logicamente, da razão filosófica, que produz ordenação, mas não devemos esquecer a razão científica, enquanto leitura fenomenológica da natureza da antropologia e nem da razão ordinária, enquanto universalidade do senso comum. É bom lembrar, que toda análise metodológica, consciente ou inconscientemente, no correr da história da teologia, tem levado inexoravelmente a diferentes compreensões do fato teológico. Isto porque o princípio arquitetônico depende do que colocamos como base da estruturação geral da revelação e porque o princípio hermenêutico parte sempre de uma ou de múltiplas visões filosóficas que podem ser utilizadas como instrumentos de interpretação da história da revelação. Ou seja, quer queiramos ou não, a ideologia define a hermenêutica, pois o saber sempre está sob o risco de ser arrebatado pela ideologia, já que a ideologia permanece à espreita enquanto código de interpretação. Enquanto intelectuais temos amarras, pontos de apoio, somos transportados pela substância ética.[4]


Aqui reside a dificuldade, toda teologia é transitória. Reflete um momento de compreensão da revelação e de sua história. Mas, em nosso trabalho, utilizaremos a antropologia que as Escrituras nos oferecem como um instrumental hermenêutico para compreender o homo brasiliensis. Isto porque embora não seja antropologia, a teologia nos oferece um roteiro antropológico legítimo. No centro da fé cristã se encontra Jesus Cristo, Deus e ser humano, revelador do divino e do humano. E se a teologia fala da divindade, ela fala a homens e mulheres, fala sobre um Deus que encarnou e que ama os homens e mulheres. Está a serviço do humano.[5] Não podemos fugir a essa realidade, por isso, teologicamente, nosso objetivo é fazer a partir da própria compreensão do humano uma leitura da imagem de Deus que responda aos questionamentos e necessidades teológicas das brasilidades.

No livro das origens lemos: “agora vamos fazer os seres humanos, que serão como nós, que se parecerão conosco. Eles terão poder sobre os peixes, sobre as aves, sobre os animais domésticos e selvagens e sobre os animais que se arrastam pelo chão”. (Gênesis 1.26). Ora, se todo o universo é o mundo do ser humano, conforme afirmam os dois relatos da criação e o salmo oito, em que sentido o ser humano é a imagem de Deus? Como Deus conferiu ao humano essa correspondência?

A partir da antropologia bíblica podemos ver que em primeiro lugar o homo sapiens é fruto de uma intervenção de Deus. Há uma concessão de encargo que diferencia o ser humano do resto da criação. Ele é apresentado como um momento sublime, especial, como um ser que coroa toda a ação criadora de Deus. Ele recebe responsabilidade e poder de decisão. Em relação a esta discussão, considero elucidativa a exposição que apresenta a imagem de Deus através de três concepções: substantiva, ou seja, física e psicológica; relacional, ou seja, com um tropismo à transcendência e possibilidade de relacionamento com Deus; e funcional, que se dá através da ação cultural do ser humano.

Acredito, porém, que privilegiar uma dessas concepções em detrimento das outras duas é perder a riqueza do ser humano enquanto imagem de Deus. Por isso, aqui correlacionamos as três concepções, já que formam uma totalidade. Em segundo lugar, Deus deixa claro a finalidade da decisão de criar um ser pessoal, segundo sua imagem. Tal ser deverá ter uma relação especial com o restante da criação. Deus cria e entrega ao ser humano sua criação. Este ser pessoal deverá estar sobre ela, numa relação de trabalho, produção e administração. O ser humano relaciona-se com a criação e através do uso e de suas descobertas em relação a ela, mantém uma permanente relação com Deus. Em terceiro lugar, a imagem de Deus é traduzida na relação que mantém com as criaturas, já que é uma relação de domínio. Ele reina sobre o universo produzido pelo poder criador de Deus. Mas aqui há um detalhe sutil: este direito de domínio não lhe é próprio, ele reina enquanto imagem de Deus. Ele não é proprietário, nem tem autonomia irrestrita sobre a criação. Imagem de Deus traduz também abertura à transcendência. Aqui estão dados os elementos que nos permitem entender porque faz parte da humanidade o abrir-se à transcendência e viver com ela. Há um deslumbramento permanente diante do absoluto, do sobrenatural e do mistério. Estamos diante de um ser que pode pensar o que não está aqui e agora, e que pode refletir sobre o que vai além da realidade factual. E é por poder pensar tais realidades que não podem ser vistas, que o ser humano enquanto imagem de Deus pode refletir sobre a eternidade e relacionar-se com o transcendente. Assim, ao ser feito imagem de Deus, o próprio Deus transfere à humanidade a capacidade de relacionar-se com Ele.

Adão é um ser plural. Esse ser humano de que fala Gênesis 1.26, que deve ser uma imagem de Deus, não é uma pessoa em particular, pois a continuação do texto fala que eles dominem. Assim, estamos diante da criação da humanidade e o domínio do universo não é dado a uma pessoa, mas a comunidade dos homens. Ninguém pode ser excluído da autoridade de domínio dada por Deus à humanidade. Da mesma maneira, em Gênesis 1.27 temos uma outra característica fundamental dessa mesma humanidade: ela é formada por homens e mulheres. Para alguns teólogos, como Karl Barth,[6] tal explicação de Gênesis 1.27b, de uma humanidade formada por dois sexos, é apresentada por Deus “quase à maneira de definição”. Logicamente, há uma intenção para que o texto bíblico se aprofunde em tais minúcias. É a de apresentar como o universo criado deveria ser administrado: através da convivência de seres que se completam e se amam. Ou seja, esse ser plural só poderia exercer o domínio através da comunidade, completando-se como homem e mulher.

E para onde aponta o domínio? Todo o universo é o mundo do ser humano, por isso há a total desmitização da natureza. Não há astros divinos, terra divina, nem animais divinos. Todo o universo pode tornar-se o ambiente do ser humano, seu espaço, que ele pode adaptar às suas necessidades e administrar. E como ele consegue isso? Através da cultura, enquanto processo social e objetivo de sujeição da natureza, e através da necessidade de expansão e domínio, pessoal e subjetivo, que é peculiar a todo homem e mulher livres. Mas, o afastamento de Deus fez com que a humanidade perdesse sua capacidade de ser imagem de Deus viva e eficaz. Seu caráter inicial está distorcido e o mal perpassa todas suas ações. Assim, o ser humano lançou-se ao domínio de seus iguais, inclusive através do derramamento de sangue; suprimiu o equilíbrio e a mútua ajuda entre homem e mulher; mitificou a ciência e técnica; e lançou-se à destruição da própria natureza. Cristo é “a verdadeira imagem do Deus invisível” (Colossenses 1.15, cf. 2 Coríntios 4.4) e a Ele cabe fazer, a nível escatológico, aquilo que à humanidade tornou-se impossível. “Foi-me dado todo o poder no céu e na terra, por isso, indo, fazei discípulos em todas as nações...” (Mt 28.18).


[1] Nelson Kirst, Nelson Kilpp, Milton Schwantes, Acir Raymann, Rudi Zimmer, Dicionário Hebraico Português & Aramaico Português, São Leopoldo/Petrópolis, Sinodal/Vozes, 1988. Verbete: vpn, p. 159.
[2] Raphaël Draï, La Pensée Juive et L’Interrogation Divine, Exégèse et Épistémologie, Paris, Presses Universitaires de France, 1996, p. 414.
[3] L. Byron Harbin, Teologia do Antigo Testamento (apostila), São Paulo, Faculdade Teológica Batista de São Paulo, 1997, p. 32.
[4] Paul Ricoeur, Interpretação e Ideologias, RJ, Francisco Alves, 1990, pp.94-95.
[5] Antonio Manzatto in Teologia e Literatura, São Paulo, Edições Loyola, 1994, p. 41.
[6] Citado por Hans Walter Wolff, in Antropologia do Antigo Testamento, São Paulo, Edições Loyola, 1975, p. 215.

mardi 8 mars 2011

A Whiter Shade Of Pale - Procol Harum


A Whiter Shade of Pale / composição de Gary Brooker, Keith Reid e Matthew Fisher

We skipped the light Fandango
Turned cartwheels 'cross the floor
I was feeling kind of seasick
But the crowd called out for more
The room was humming harder
As the ceiling flew away
When we called out for another drink
The waiter brought a tray
And so it was later
As the Miller told his tale
That her face, at first just ghostly
Turned a whiter shade of pale
She said there is no reason
And the truth is plain to see
But I wandered through my playing cards
And would not let her be
One of sixteen vestal virgins
Who were leaving for the coast
And although my eyes were open
They might just as well've been closed
And so it was that later
As the Miller told his tale
That her face, at first just ghostly
Turned a whiter shade of pale, turned a whiter shade of pale
Turned a whiter shade of pale, turned a whiter shade of pale

Dançamos o suave fandango
Girando pelo salão
Eu estava meio tonto
Mas o pessoal queria mais
E comentava cada vez mais
Enquanto o teto rodava
Quando pedimos outra bebida
O garçom trouxe uma bandeja
E foi mais tarde
Quando Miller contava sua história
Que seu rosto que já estava fantasmagórico
Ficou ainda mais pálido
Ela disse que não havia motivo
E que a verdade é cristalina
Mas eu consultei as cartas do baralho
E não permitiria que ela fosse
Uma das dezesseis vestais virgens
Que partiam para o litoral
 [duas hipóteses: referência à história judaica da filha de Jefté
(Juízes 11.37-40) ou às vestais romanas,
que faziam voto de castidade]
E embora meus olhos estivessem abertos
Daria no mesmo se estivessem fechados
E foi mais tarde
Quando Miller contava sua história
Que seu rosto que já estava fantasmagórico
Ficou ainda mais pálido

A quarta-feira não é de cinzas


Milhões esqueceram a sugestão do apóstolo Paulo 
-- "alegrai-vos sempre no Senhor, outra vez digo: alegrai-vos" -- aos filipenses (4.4)
e agora mergulham numa quarta-feira de cinzas. 
Puro pó. 
Mas, a quarta-feira não precisa ser de cinzas. 
Lembremo-nos da estrada de Emaús. 

1. O passado e o futuro
Quando pensamos na ressurreição pensamos em duas coisas: lá atrás na história, Deus ressuscitou Jesus. E lá na frente, um dia, Deus vai nos ressuscitar. Assim, a ressurreição tem passado e futuro. São duas colunas: passado e futuro. Mas e hoje? Será que a ressurreição tem alguma coisa a ver com o meu presente?

2. Os limites da existência
E a nossa esperança era que fosse ele quem iria libertar o povo de Israel. Porém já faz três dias que tudo isso aconteceu”. (Lucas 24.21). Essa foi a palavra daqueles dois discípulos na estrada de Emaús.

A morte personifica os limites da existência. A morte personifica medo existencial, fim da esperança, perda do sentido da vida. E naquele entardecer, naquela estrada, os discípulos entristecidos afirmaram que, com a morte de Jesus, havia morrido algo na vida deles...

Assim como a morte do esposo mata algo na esposa, como a morte do amigo mata algo naquele que fica, a morte de Jesus matara naqueles dois discípulos a vida que dava sentido ao caminhar de cada um deles.

Foi isso que aconteceu com aqueles discípulos de Emaús: vagavam à noite pela estrada da vida, cabisbaixos, derrotados. A vida não tinha mais sentido para eles. E é assim que acontece conosco muitas vezes: andamos desesperançados, derrotados pela realidade que esmaga a vida e destrói o futuro. Vivemos numa quarta-feira de cinzas.

3. O novo nasce pela fé na ressurreição
Mas eles insistiram com ele para que ficasse, dizendo: Fique conosco porque já é tarde, e a noite vem chegando. Então Jesus entrou para ficar com os dois. Sentou-se à mesa com eles, pegou o pão e deu graças a Deus. Depois partiu o pão e deu a eles. Aí os olhos deles foram abertos, e eles reconheceram Jesus”. (Lucas 24.29-31).

O novo nasce quando nos reunimos com o irmão ao redor da mesa, ouvimos a Palavra e repartimos o pão. Vencemos as crises quando redescobrimos o sentido da ressurreição. E ela é mais que uma lembrança do passado e um futuro de esperança. É um fato presente, uma bênção da integridade de Deus para nossa vida presente.

A ação de Deus que no passado trouxe Jesus à vida é a mesma que a cada dia nos dá força. Mas lembre-se: a descoberta da ressurreição não é um ato solitário. É um ato solidário, que implica em ouvir a Palavra e repartir o pão. A ressurreição de Jesus é a expressão permanente do compromisso irrevogável de Deus conosco.

E viva a ressurreição! A quarta-feira não é de cinzas.

lundi 7 mars 2011

Le doux plaisir de la vie en Christ


Philippiens 4.1-7

Introduction

Verset 1 – Quelle église ce ça? 

La ville de Philippe : colonie romaine, statut dans l'empire, citoyens romains. L´église a été fondée par deux femmes et un geôlier : Lydie, fabricante de colorant rouge de Tiathyre, en Asie. Actes 16.14. Jeune esclave, qui avait été possédée par des démons. Actes 16.16-23. Un geôlier qui était presque suicidaire. Actes 16.27-34. Ville où Paul et Silas ont été maltraités, arrêtés et ont été délivrés grâce à un séisme.

Paul leur parle avec amour, comme à une famille. Il dit que sa joie est comme une couronne, comme une guirlande, comme dans les mariages, comme dans une fête. Et il donne des conseils parce que nous sommes toujours dans la joie.

Qu´est-ce que nous devons faire pour être joyeux :

1. Avoir un même cœur.
Verset 2 – Concorde. Opposé à discorde. Concorde, avec le même cœur, harmonie. 

2. Avoir largeur de cœur
Verset 5 – Sérénité, amabilité. Opposé à brutalité, grossièreté. Largeur de cœur implique une ouverture vers les autres. Savoir écouter, ce qui facilite le pardon. Bienveillance, sérénité. On ne doit pas juger, parce que de Dieu est le jugement et la vengeance. Dieu est proche. Il reviendra. A Lui revient le jugement. C´est le chemin d´une église pleine de convivialité et agréable. Mais il y a aussi un dernier défi :

3. Avoir un coeur reconnaissant
Verset 6 – L´anxiété ou un coeur reconnaissant? Qui exerce un contrôle total sur sa vie ? Jesus.  Mais attention: l´anxiété c´est une marmite sous pression. Angoisse, incertitude, sentiments croissants de malheur. C´est imaginer toujours pour l'avenir des dangers inexistants. Elle produit des explosions en actes et en paroles. C´est une perte d'énergie.

Conclusion
Mais comment vaincre la discorde, la grossièreté et l'anxiété? Cela passe par la relations avec Dieu. La joie est fruit d'une vie de relations avec l'Esprit Saint. La joie c´est un signe de la présence de l'Esprit Saint dans la vie du chrétien. La joie c´est le doux plaisir de la vie en Christ.

Philippiens 4. 1-7

1 Ainsi donc, mes frères bien-aimés, vous que je désire tant revoir, vous qui êtes ma joie et ma récompense, c’est de cette manière, mes chers amis, que vous devez tenir ferme, en restant attachés au Seigneur. Conseils de Paul 2 Je recommande à Evodie et à Syntyche [deux anciennes collaboratrices de Paul opposées maintenant par un différend suffisamment grave pour qu’il soit parvenu aux oreilles de l’apôtre] de vivre en parfaite harmonie, l’une avec l’autre, selon le Seigneur; je les y invite instamment. 3 Toi, mon fidèle collègue [Paul s’adresse à l’un des responsables de l’Eglise. Peut-être le mot sysygos traduit par collègue est-il le nom du responsable. L’apôtre jouerait ainsi sur le sens de ce nom, comme il l’a fait dans Phm 11], je te le demande: viens-leur en aide, car elles ont combattu à mes côtés pour la cause de l’Evangile, tout comme Clément et mes autres collaborateurs dont les noms sont inscrits dans le livre de vie. 4 Réjouissez-vous en tout temps de tout ce que le Seigneur est pour vous. Oui, je le répète, soyez dans la joie. 5 Faites-vous connaître par votre amabilité envers tous les hommes. Le Seigneur est proche. 6 Ne vous mettez en souci pour rien, mais, en toute chose, exposez vos besoins à Dieu. Adressez-lui vos prières et vos requêtes, en lui disant aussi votre reconnaissance. 7 Alors la paix de Dieu, qui surpasse tout ce qu’on peut concevoir, gardera votre cœur et votre pensée sous la protection de Jésus-Christ.

C´est le doux plaisir de la vie en Christ.



mardi 1 mars 2011

A religião enquanto dialética

Georg Wilhelm Friedrich Hegel 
Nasceu em 1770, na cidade de Stuttgart, 
e morreu em 1831, em Berlim

Para o jovem Hegel, a religião reconcilia a reflexão e o amor, unindo-os no pensamento. A vida religiosa, que é a vida do amor, realiza a exigência da filosofia de reconciliar as oposições do finito e infinito. Ou seja, substitui religião por Cristianismo. O cristianismo reconcilia a reflexão e o amor unindo-os no pensamento, ou na percepção, usando a linguagem do apóstolo Paulo.

Assim, para Hegel a tarefa da filosofia é a construção do Absoluto pela consciência superando oposições. Como esses contrários podem ser reconciliados, produzem o processo dialético. Pois, como já vimos acima, o finito não pode ser pensado sem o infinito, pois não é um conceito isolado e sem conteúdo próprio. O finito consiste em ser um momento do infinito. O finito é atingido pela negação, mas não é simples negação, uma vez que é limitado por outro que não é ele mesmo. Ou seja, o finito é uma negação do infinito, no sentido que é uma particularidade, um momento, uma determinação. Sempre que se determina, se nega. Por exemplo, se numa sala de aula, um professor chama pelo nome um aluno, naquele momento ele está negando todos os demais alunos e determinando um único apenas.

Por isso, devemos negar a negação e afirmar que o finito é mais que o finito, ou seja, que é o momento da vida do infinito. O processo que resolve a oposição é o processo dialético: finito e infinito não são mundos separados. Sempre que se tem o final do processo, se tem a identidade, porque contém todas as diferenças. O conhecimento para Hegel é um processo que nunca se dá no início, mas no final. O conhecimento é sempre histórico. Como se conhece a roseira? Vendo-a crescer. Para Hegel, o conhecimento está-se dando na vida.

Fonte: PINHEIRO, Jorge e SANTOS, Marcelo, Manual de História da Igreja e do Pensamento Cristão, São Paulo, Fonte Editorial, 2011, p.305.
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mercredi 16 février 2011

De volta ao Apocalipse

Introdução


O Apocalipse não é um livro de segredos, mas uma revelação que nos apresenta Cristo como chave para compreensão da história. Trata-se de uma linguagem simbólica, empregada por causa das condições de perseguição que afligiam a igreja, no tempo em que foi escrito. Deus foi se revelando aos poucos, através da história, e no Apocalipse ele completa essa revelação. Por uma linguagem cifrada, é verdade, Deus revela o quanto nos ama, e como, através do Cristo vitorioso, prepara a nossa salvação. 

Apokálipsis em grego quer dizer revelação. O verbo apo-kalyptôo significa revelar algo obscuro. O Apocalipse é um livro que retrata uma relação entre o passado, o presente e o futuro. Ele se abre com a revelação de Jesus, como Messias, a testemunha fiel e verdadeira, o primogênito dos mortos, o rei dos reis e o Senhor dos senhores, o libertador e aquele que criou, para o Pai, um povo santo. 

Embora o autor chame o livro de profecia, alguns exegetas vêem nele um estilo semelhante às epístolas do NT. Alguns estudiosos vêem no Apocalipse uma releitura interpretativa que os cristãos do primeiro século teriam feito do AT.

Na verdade, essa visão tem algum fundamento, pois o livro usa o evento do êxodo como protótipo das grandes libertações que vêm de Deus. A escatologia do Apocalipse realiza-se no tempo presente. O incidente central do livro, transformador da história, é a morte e a ressurreição de Jesus. A revelação centra sua pregação na presença do ressuscitado, que ocorre no mundo e na história. 

O Apocalipse une analogia e história, escatologia e política, consciência e transformação. A mensagem dos mártires vencendo a Besta, por exemplo, é uma lição de fé e libertação. O livro foi escrito no tempo em que a Igreja se instaurava. O cristianismo foi, desde o início, um movimento profético-apocalíptico... O Apocalipse não tem uma exegese padrão, uniforme e consolidada. Existem teorias de interpretação bem diversas, algumas até opostas. É preciso ir com cuidado e observar as diversas fontes".[1]

Assim, o Apocalipse pode parecer um livro estranho e impenetrável se paramos nos detalhes de suas representações simbólicas, porque o Apocalipse pertence a um gênero literário, em que as visões fazem parte de seu estilo. 

Mas o livro torna-se fascinante, quando se considera que exalta a vitória de Cristo através da história dos homens, não seguindo o desenrolar desta história, mas fornecendo sua interpretação histórica. 

João, seu redator, é identificado com o autor do quarto evangelho. Conquanto esta identificação levante alguns problemas, pode-se acreditar que o Apocalipse tenha sua origem nos meios joaninos de Éfeso.

O Apocalipse passo a passo

Estamos então nos últimos anos do primeiro século, no fim do reinado do imperador Domiciano. O culto do imperador divinizado se espalha e torna-se o teste da lealdade política: todo bom cidadão deve participar dele. Os cristãos professam a existência de um só Deus e um só Senhor. Recusam esta idolatria que é o culto imperial, expõem-se ao martírio. Para compreender o Apocalipse é preciso que esta situação seja lembrada.[2]
 
"O que diz o espírito às igrejas”
Ler o cap. 1.
A obra se apresenta como uma carta: tem um endereço (1,4); como uma profecia: é a Palavra de Deus (1,2-3), e João arrebatado pelo Espírito, escuta e vê (1,10 e 12) como os profetas de outrora; como um apocalipse (revelação, 1,1); por isso a visão de João (1,12-20) se sobrecarrega com elementos simbólicos.
  • A saudação da carta tem uma estrutura trinitária; Deus e o Espírito têm uma breve menção (1,4). João se detém mais no Cristo: três títulos lhe são dados, sua obra é resumida, sua vinda anunciada.
  • Na primeira visão, é o Cristo que se manifesta. Qual o sentido dos elementos descritos nos versículos 13-16? (cf. BJ notas). Como ele se apresenta nos versículos 17-18?
Ler os cap. 2 e 3.
Cada uma das sete cartas às Igrejas se compõe dos mesmos elementos: escrita em nome do Cristo evoca a situação concreta da Igreja a que se dirige e termina com uma promessa.
  • De que maneira Cristo é designado em cada carta? Diante das tribulações suscitadas pelos pagãos ou falsos doutores as Igrejas reagem com fidelidade, ou relaxamento. Que promessas são feitas aos vencedores?
"Ao que está sentado no trono e ao Cordeiro, louvor e glória”.
Ler os cap. 4 e 5.
Com o quarto capítulo, o céu se abre e João é convidado a entrar (4,1). O desenrolar e o objetivo da história, visto do lado de Deus lhe vão ser revelados. Assim ele poderá fazer compreender às Igrejas o sentido do que estão vivendo. 

No céu, João vê primeiro celebrar-se um culto em torno de um trono, no qual alguém está sentado.
  • Que representam as personagens que a celebram? Como se exprime sua adoração?
Deus tem na mão um livro selado que ninguém pode abrir enquanto Cristo não tiver vindo. Somente ele revelará o seu conteúdo, entre as aclamações dos personagens celestes (5,1-14).
  • Por que Cristo é chamado Leão, depois de Cordeiro?
  • Que significa a posição e o estado do Cordeiro no versículo 6?
  • Conforme os cânticos que o aclamam, é digno de que e por que?
Ler os cap. 6 e 7.
O Cordeiro abre sucessivamente os sete selos do Livro. A abertura dos quatro primeiros provoca na terra a saída de quatro cavaleiros, cujo simbolismo é indicado por uma expressão tirada de Ezequiel (6,8; cf. BJ).
  • À oração dos mártires, convidados a esperar ainda a vingança (5º selo), responde a cólera divina que começa a se desencadear (6º selo): contra quem?
Diante da cólera de Deus, quem pode resistir (6,17)? O resto da visão nos vai contar. Ela distingue na terra (7,1-8) o grupo dos 144.000, pertencentes às 12 tribos de Israel, o povo que Deus elegeu (marcou com seu selo). Aparece em seguida, no céu, uma grande multidão, que ninguém podia contar, vinda de todos os povos cuja identificação é fácil. Esta multidão passou pela tribulação: agora está salva e canta (7,9-17).
  • De quem lhe veio a salvação (10)? E de que modo (14)?
Ao 7º selo segue-se um tempo de silêncio (8,1). Novas visões explicitarão o que estava apenas esboçado na visão dos selos.

"Será consumado o mistério de Deus"
Ler os caps. 8-9 e 11-14-19.
Novamente tudo parte de Deus, que age através de seus anjos (8,25). Estes, ao som de suas trombetas (ainda uma série de sete) desencadeiam sobre a terra quatro espécies de flagelos paralelos aos quatro primeiros selos, mas que se inspiram nas pragas do Egito (8,6-12; cf. Ex 7-10). A quinta e a sexta trombeta fazem surgir batalhões demoníacos, cujo aspecto é horrível e a ação maléfica (9,1-19).
  • Contudo, Deus tem intenções de salvação deixando o campo livre a esse monstro. Qual é, conforme 9,20-21?
A sétima trombeta suscita cantos de louvor, no céu.
  • Qual o objeto desses cantos em 11,15 e 17?
O terceiro "Ai" chega. A sétima trombeta, como o sétimo selo, não põe fim a nada. Ela abre novas perspectivas de julgamento, mas também de salvação (11,18-19). 

Ler o cap 10,1-11.13.
Entre o soar da 6ª e da 7ª trombeta, dois episódios se intercalam: o do "primeiro livro" (10,1-10) e o das duas testemunhas (11,1-13). O primeiro prepara o futuro (a seqüência dos capítulos do Apocalipse), o segundo explicita um passado ainda recente. 

O anjo do arco-íris tem uma dupla função: traz um livrinho aberto e faz uma proclamação.
  • Como a postura do Anjo e suas palavras indicam o soberano domínio de Deus?
João recebe a confirmação de sua missão de profeta (10,8-11). Ela é dirigida "contra" povos e reis.
  • Que sorte está reservada à cidade santa? (v. 2 e 13) e por que? O texto não é esclarecido por 21,24 e 13,35?
  • Os adoradores, no entanto, são poupados e há sobreviventes. Ter-se-á notado igualmente que as "testemunhas" partilham o destino de seu Senhor (7,12). Assim estabelece-se o seu reino (cf. sétima trombeta).
"A hora da perseverança e da fé"
Ler o cap. 12.
Centro e talvez chave do Apocalipse joanino, este capítulo dá a conhecer, numa visão grandiosa, as razões da perseguição dos cristãos.
Dois sinais antagônicos aparecem: uma Mulher, um Dragão (v. 1-5).
O menino arrebatado para junto de Deus é o sinal da queda do dragão (v. 7-9). Enquanto o céu aplaude (12,10-12), terríveis ameaças pesam sobre a Mulher e sobre o resto de sua "descendência": os cristãos.
  • Mas a vitória de seu Filho está assegurada. A Mulher encontra um refúgio no deserto, onde Deus protege e alimenta seu povo (12,6 e 13-16).
Ler o cap. 13.
Depois desta revelação capital sobre a luta que continua por detrás dos acontecimentos da história, podemos, com toda serenidade, ver aparecer dois animais monstruosos (tudo o que é demoníaco é hediondo, cf. 12,3 ou 4,2-19). Eles representam duas realidades de todos os tempos: o poder político e as ideologias religiosas e todas as que o poder põe a seu serviço. (João pensa no culto imperial favorecido pelas religiões da época).
  • Que relações existem entre o Dragão e os animais? [E] Entre os dois animais? Qual é a tática de cada um dos Animais e como se comportam os homens diante deles?
Ler o cap. 14.
Em face dos animais e de seus partidários, se levantam o Cordeiro e os que O seguem, já vistosos, cantando o cântico novo (14,1-5). Esta visão vem acompanhada de aclamações angélicas (14.6-13).
  • Que dizem estas, nos desígnios de Deus, a propósito dos adoradores da Besta e dos fiéis do Senhor?
Em seguida dois quadros paralelos vêm simbolizar o julgamento divino (a ceifa e a vindima; 14.14-20).

“Caiu Babilônia, a grande!”
Ler os cap. 15 e 16.
João contempla no céu anjos portadores de taças, mas antes mesmo que eles tenham derramado seu conteúdo (a cólera de Deus) sobre a terra, o povo dos vencedores entoa no céu o cântico do Cordeiro (15.1-4).
  • Este cântico exalta a obra de Deus: em que termo e por que?
Depois as sete taças das últimas sanções divinas se derramam, em rápida sucessão.
  • A quem elas atingem (v. 2.6.10)? Obtêm o resultado esperado (v. 9.11)?
O Dragão e seus animais tentam, como último estratagema (12,16) lutar ainda, mas em vão: está terminado! A sétima taça produz o terremoto que o número sete traz habitualmente (17-21), mas desta vez ele é o sinal do fim. 

Ler o cap. 17.1-19,10.
Uma nova figura aparece, que lembra o primeiro animal (cf. 13,1-10): a figura feminina de "Babilônia", personificando Roma, a capital do Império. 

Ela ocupa o trono com uma glória insolente; por isso sua queda é espetacular, enquanto o povo de Deus, para não partilhar seu destino, se afasta dela (18,1-8). 

Então se eleva a tríplice lamentação dos reis, dos mercadores e dos marinheiros, surpreendidos diante do fim súbito de uma tão poderosa cidade (18,9-20), enquanto há júbilo no céu.
  • Um anjo, com um gesto simbólico, proclama a ruína definitiva. Qual é o refrão?
  • Então ressoa a aclamação litúrgica (qual?) da multidão celeste, louvando a Deus por seus julgamentos e a glória de seu reino.
"As núpcias do Cordeiro"
Uma deslumbrante visão se apresenta subitamente: o céu se abre para dar passagem a um cavaleiro resplandecente, que vai travar os últimos combates. 

Ler o cap. 19.11-20,15.
O cordeiro se transformou em guerreiro.
  • De onde vem o sangue que tinge o seu manto? Com que arma combate? Os nomes que lhe são dados são suficientes para defini-lo? Cf. 19,12.
Tudo cede diante dele; seus inimigos são sucessivamente eliminados: os reis, os animais, e por fim, depois de um último combate, o dragão (19.19-20,10).
  • Agora já estamos no fim dos tempos. Satã está completamente vencido, mas já o estava há muito tempo (cf. 12,5) apesar das aparências contrárias. Da mesma forma, os mártires não cessaram nunca de partilhar o triunfo do Cordeiro e sua vida (20,4.6). A morte, por seu turno, é vencida e os homens julgados segundo suas obras (20,11-15).
Ler o cap. 21.1-22,5.
O mundo antigo desapareceu e uma visão radiosa ocupa seu lugar. João contempla, vinda do céu, em todo seu esplendor, a Cidade Santa que é a Esposa do Cordeiro.
  • A primeira representação dela é destinada a por em relevo o poder criador de Deus (21,1 e 5,6) e a nova Aliança que acaba de instaurar. Por que termos esta é evocada nos versículos 3 e 7?
A descrição da Nova Jerusalém se inspira largamente em Ezequiel (cf. Ez 40-48). Como ele, João examina a cidade do exterior até o coração da cidade.
  • Por que se interesse ele pelos fundamentos da muralha (21,24), pelas portas (21,12-13.25), pelos materiais de construção? Qual é o sentido das imagens de luz?
  • João suprimiu o Templo (por quê?), mas guardou a fonte: de onde brota ela? Quais os habitantes da cidade e qual sua ocupação?
No epílogo de sua obra (22,6-21) João atesta com firmeza a autenticidade de suas visões e a urgência de sua mensagem. O próprio Jesus anuncia sua vinda. Para lhe responder, exprimindo o voto de todos os que têm sede, o Espírito se une à Esposa:
"Amém! Vem, Senhor Jesus!"


[1] Antônio Mesquita Galvão. Apocalipse ao alcance de todos. In: O Recado. O Recado Editora, São Paulo/SP, Brasil, 2002. n.179, pp.1-95.
[2] Louis Monloubou e Dominique Bouyssou, Encontro com a Bíblia, Novo Testamento, São Paulo, Editora Lumen Christi, pp. 96-102.

mardi 15 février 2011

Manual de História da Igreja e do Pensamento Cristão

 Às amigas, colegas, companheiras e irmãs -- válido também no masculino plural

Gostaria de ver todas e todos no lançamento do livro do prof. Marcelo Santos, e meu também, no sábado, dia 26 de fevereiro, na Livraria Martins Fontes, na Avenida Paulista 509, a partir das 15h30. O livro não é voltado apenas para estudantes de filosofia, história e teologia, mas aqueles que desejam conhecer de forma direta e objetiva a história da igreja cristã e o pensamento que produziu nesses dois mil anos. Marcelo e eu vamos vibrar em ver você lá. Apareça. Jorge Pinheiro.



lundi 14 février 2011

A família de Oséias segundo Calvino

[Eu sei que hoje poucos lêem Calvino, o que é uma pena. Afinal, o próprio Jacobus Arminius (1560-1609) disse dele:  “Depois da leitura da Escritura, a qual ensino, inculcando tenazmente, mais do que qualquer uma outra… Eu recomendo que os Comentários de Calvino sejam lidos... Pois afirmo que, na interpretação das Escrituras, Calvino é incomparável, e que seus Comentários são para se dar maior valor do que qualquer outra coisa que nos é legada nos escritos dos Pais — tanto que admito ter ele um certo espírito de profecia, em que se distingue acima dos outros, acima da maioria, de fato, acima de todos”. E eu concordo com ele. O trecho abaixo, em português, foi traduzido de uma versão em ingles, feita a partir de uma edição impressa em Genebra em 1567. Leia e descubra Calvino. Vale a pena, mesmo que você não concorde com ele. Jorge Pinheiro].

Vá, ele diz, toma para ti uma mulher de devassidões e filhos de devassidões; e adiciona-se a razão, pois pela fornicação, ou libertinagem, tornou-se a terra dissoluta. Indubitavelmente, fala ele aqui dos vícios que o Senhor há muito agüentava com inexprimível paciência. Pela devassidão pois a terra se tornou desenfreada, para que não siga a Jeová.

Muito labutam aqui os intérpretes, pois parece mui estranho que o Profeta tomasse por esposa uma meretriz. Dizem alguns que esse foi um caso extraordinário6. Decerto uma tal liberdade não teria sido tolerada em um mestre. Vemos o que Paulo requer em um bispo, e não há dúvidas de que o mesmo era requerido anteriormente nos Profetas: que suas famílias deveriam ser castas e livres de toda nódoa e mancha. Teria sido pois expor o Profeta ao escárnio de todos caso tivesse ele adentrado um bordel e tomado para si uma prostituta; pois ele não fala aqui apenas de uma mulher não casta, mas de uma mulher de devassidão, o que significa uma meretriz comum, pois é ela chamada uma mulher de devassidão, que desde muito tempo estava habituada a isso, a qual expunha a si mesma a todos, para gratificar-lhes o desejo, a qual se prostituía a si própria, não uma ou duas vezes, nem para alguns homens, mas para todos. Que tal fosse feito pelo Profeta parece mui improvável. Mas alguns replicam, como disse eu, que isso não deve ser reputado como regra comum, pois foi um mandamento extraordinário de Deus. E, todavia, não parece coerente com a razão, que o Senhor, dessa forma injustificável, faça com que seu Profeta seja desprezível; pois como podia ele esperar ser recebido ao aparecer diante do público, após haver trazido sobre si mesmo uma tal desgraça? Se ele houvesse se casado com uma mulher tal como a que é aqui descrita, deveria ter se ocultado por toda a vida em vez de se incumbir do ofício profético. A opinião de quem pensa que o Profeta tomara uma esposa semelhante à aqui descrita, por conseguinte, não é provável.
 
Depois, um outro motivo, totalmente irresolúvel, milita contra eles; pois não apenas se ordena ao Profeta que tome uma esposa de devassidão, mas ainda filhos de devassidão, gerados por prostituição. Logo, é como se ele mesmo houvesse cometido prostituição7. Pois, se dissermos que ele se casou com uma mulher que dantes se conduzira com alguma indecência e falta de castidade (como Jerônimo em detalhes argumenta para desculpar o Profeta), a escusa é frívola, pois ele não fala somente da esposa, mas também dos filhos, visto que Deus teria a prole toda como sendo adulterina, e isso não podia ser o caso de um casamento legal. Por isso, quase todos os hebreus concordam com esta opinião, que o Profeta não esposou realmente uma mulher, mas que lhe foi ordenado a fazer isso em uma visão. E veremos no capítulo terceiro quase a mesma coisa descrita; contudo, o que está ali narrado não podia realmente ter sido feito, pois é mandado ao Profeta que se case com uma esposa que violara sua fidelidade conjugal e, depois de a ter comprado, retê-la em casa por um tempo. Isso, sabemos, não foi feito. Segue-se então que isso foi uma representação exibida ao povo.

Alguns objetam dizendo que a passagem inteira, tal como dada pelo Profeta, não pode ser compreendida como aludindo a uma visão. Por que não? Porque a visão, dizem, foi dada só a ele, e Deus tinha em consideração o povo todo, em vez do Profeta. Porém, pode ser, e é provável, que visão nenhuma foi apresentada ao Profeta, mas que Deus apenas lhe ordenou proclamar o que lhe tinha sido dado como responsabilidade. Logo, quando o Profeta começou a ensinar, ele iniciou com algo desse jeito: “O Senhor me coloca aqui como em um palco, para vos fazer saber que me casei com uma mulher, uma mulher habituada a adultérios e prostituições, e que por ela gerei filhos”. O povo todo sabia que ele não fizera tal coisa; porém, o Profeta assim falou a fim de pôr perante seus olhos uma vívida representação. Tal, pois, foi a visão, uma exibição figurada, não que o Profeta soubesse disso por uma visão, mas o Senhor lhe ordenara a relatar tal parábola (modo de dizer), ou tal comparação, para que o povo pudesse ver, como num retrato vivo, a torpeza e perfídia desse. É, em suma, uma exibição, na qual a coisa mesma não é somente apresentada em palavras, mas também é colocada, por assim dizer, diante dos olhos deles de forma visível. A razão é acrescentada: pois pela devassidão a terra se tornou dissoluta.

Vemos agora então como as palavras do Profeta devem ser entendidas; pois ele assumiu um personagem perante o público, e nesse personagem ele disse ao povo que Deus lhe havia ordenado tomar para sua esposa uma meretriz, e por ela gerar filhos adulterinos. Seu ministério não se tornou, devido a isso, desprezível, pois todos eles sabiam que ele sempre vivera virtuosa e sobriamente; todos sabiam que sua casa era isenta de todo vitupério; mas aqui ele se exibia nesse suposto papel, como o fez, uma imagem viva da vileza do povo. Tal é o significado, e não vejo nada forçado nesta explanação; e vemos, ao mesmo tempo, o sentido dessa oração: Pela devassidão a terra se tornou dissoluta. Oséias poderia ter dito isso numa palavra só, mas ele se dirigia ao surdo, e sabemos quão grande e quão estúpida é a loucura daqueles que se deleitam em suas próprias superstições e que não podem suportar qualquer censura. O Profeta, então, não teria sido levado em consideração, a menos que tivesse exibido, como em um espelho perante os olhos deles, o que desejava que fosse compreendido por eles, ainda que houvesse dito: “Se nenhum de vós pode conhecer a si mesmo de modo a reconhecer sua pública vileza, se sois vós tão obstinados contra Deus, pelo menos agora saibais, pelo meu personagem simulado, que sois todos adúlteros, e vossa origem provém de um bordel imundo, pois Deus assim declara a respeito de vós; e, como não estais dispostos a receber uma tal declaração, é agora posto perante vós em meu suposto papel”.

(...)
Dissemos nós, na Dissertação de ontem, que Deus ordenou a seu Profeta que tomasse uma mulher de prostituições, mas que tal não foi, em realidade, feito; pois que outro efeito podia ter tido isso, senão fazer com que ele se tornasse desprezível a todos? E, dessa maneira, sua autoridade teria sido reduzida a nada. Porém, Deus somente quis mostrar aos israelitas, mediante uma tal representação, que eles se jactavam sem razão; pois nada tinham que fosse digno de encômio, mas eram, de todos os modos, ignominiosos. É dito então: Oséias foi e tomou para si Gômer, a filha de Diblaim. rmg,,, Gômer, em hebraico, quer dizer falhar; e algumas vezes significa, ativamente, consumir; e, por isso, Gômer tem o sentido de consumo. Contudo, Diblaim são pastas de figo, ou figos secos reduzidos a uma pasta. Os gregos as chamam palaqav, palathas. 

Os cabalistas dizem aqui que a esposa de Oséias foi chamada por esse nome, porque aqueles que são muito dados à libertinagem finalmente caem em morte e corrupção. Assim, consumo é a filha de figos, pois por figos eles entendem a doçura das concupiscências. Mas ficará mais simples dizer que essa representação foi exibida ao povo, que o Profeta pôs diante deles, em vez de uma esposa, consumo, a filha de figos; ou seja, que colocou perante eles pastas de figos ou palaqav, representando Gômer, que quer dizer consumo, e ele adotou uma maneira similar à dos matemáticos, quando descrevem suas figuras — “Se isso for tanto, então aquilo é tanto”. Podemos então compreender a passagem, que o Profeta aqui dá, para nome de sua esposa, as pastas deterioradas de figos; de modo que ela era consumo ou putrefação, nascida de figos, reduzida em tais pastas. Pois ainda persisto eu na opinião que ontem expressei, que o Profeta não entrou em um lupanar para tomar uma esposa para si: pois, de outro modo, teria ele gerado bastardos, e não filhos legítimos; pois, como foi dito ontem, a situação da esposa e dos filhos era a mesma.

Entendemos agora, então, o verdadeiro sentido deste versículo, como sendo que o Profeta não se casou com uma prostituta, mas apenas exibiu-a perante os olhos do povo como se ela fosse a corrupção, nascida de pastas de figos putrefatas. 

Segue agora que a mulher concebeu — a imaginária, a esposa tal como representada e mostrada. Ela concebeu, diz ele, e deu à luz um filho: então disse Jeová a ele, Chame seu nome Jizreel. Muitos vertem laurzy, Yzre’el, para dispersões, e seguem o parafraseador caldeu. Pensam também que esse termo ambíguo contém alguma alusão; pois, como urz, zera, é semente, supõem que o Profeta, indiretamente, vislumbra a vã jactância do povo; pois eles a si mesmo se chamavam a semente eleita, por que haviam sido plantados pelo Senhor; por isso o nome Jizreel. Porém, o Profeta aqui, de acordo com tais intérpretes, expõe essa loucura para desprezo; como se dissesse:
 
“Vós sois Israel; mas, em um outro aspecto, sois dispersão: pois, como a semente que é lançada em várias direções, assim o Senhor vos espalhará, e assim destruir-vos-á e lançar-vos-á fora. Pensais de vós mesmos haverdes sido plantados nesta terra, e terdes um lugar do qual nunca sereis abalados ou arrancados; contudo, o Senhor, com sua própria mão, agarrar-vos-á para vos lançar às mais remotas regiões do mundo”. Tal sentido é o que muitos intérpretes dão; nem nego eu que o Profeta faça referência às palavras semeando e semente; disso não discordo: apenas me parece que o Profeta olha mais para longe, e dá a entender que eles estavam inteiramente degenerados, e não eram a verdadeira nem a genuína linhagem de Abraão.
 
Fonte
João Calvino, Comentário sobre Oséias
Baseado na tradução inglesa de John Owen feita a partir do original em latim. Título da primeira versão inglesa de 1816: Commentaries on the Twelve Minor Prophets. Volume First: Hosea. Tradução para o português: Vanderson Moura da Silva. Edição: Felipe Sabino de Araújo Neto. Capa: Raniere Menezes. Primeira edição em português: Março/2008.
WEB: monergismo.com