mardi 18 juin 2013

Líderes do Passe Livre no programa Roda Viva


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Direito à cidade:
mobilidade urbana e tarifa zero
Diego Augusto Diehl, Greicy Rosa e Victor Alexander Mazura


Sob a bandeira do “Direito à Cidade”, diversos movimentos sociais se organizam para reivindicar direitos considerados fundamentais para o livre desenvolvimento das potencialidades humanas. Tais direitos, porém, são sistematicamente negados às classes subalternas, postas à margem da cidade, de seus serviços e dos bens sociais que esta produz, em nome dos interesses de pequenos grupos de uma elite privilegiada, historicamente detentora do poder político.

Exemplo deste embate ocorre na luta pela mobilidade urbana, entendida como essencial para se garantir o pleno acesso à cidade e à efetivação de outros direitos, como saúde, educação, cultura, etc. Para isso, considera-se essencial democratizar o transporte coletivo, considerado serviço público essencial pela Constituição Federal, o que vai de encontro aos interesses do capital privado, que obtém grandes lucros a partir da operação deste sistema.

A proposta da “tarifa zero”, que visa abolir o regime de remuneração do serviço público de transporte coletivo a partir de taxas (ou preços públicos) em favor de um novo modelo de tributação que onere as classes mais abastadas da cidade, torna este embate ainda mais dramático, recorrendo-se ao Direito de forma cada vez mais sistemática, ora para defender, ora para atacar esta proposta, que visa revolucionar a forma de organização da cidade e impulsionar a Reforma Urbana.

1) A cidade capitalista e o direito à cidade

Nas últimas décadas, antigas reivindicações da classe trabalhadora vêm ganhando relevo sob moldes de novas bandeiras e novas formas de luta social, mais complexas e ao mesmo tempo resultantes do processo histórico de luta política preconizada por movimentos populares das mais variadas espécies, porém basicamente identificadas enquanto carentes de um dado bem social. Assim, cidadãos sem terra, sem moradia, sem educação, sem renda, sem alimentação, sem reconhecimento, enfim, sem direitos, buscam, ainda que sob grandes dificuldades, organizar-se para que, coletivamente, concretizem materialmente o direito que lhes fora negado.

Nesse sentido, o direito à cidade também é considerado inacessível a uma parcela considerável da população que nela vive, que, marginalizada do acesso aos bens sociais produzidos no contexto urbano, passa a lutar pela democratização da cidade. Conforme Henry Lefevbre, “o direito à cidade se manifesta como forma superior dos direitos: direito à liberdade, à individualização na socialização, ao habitat e ao habitar. O direito à obra (à atividade participante) e o direito à apropriação (bem distinto do direito à propriedade) estão implicados no direito à cidade”[1].

Trata-se, portanto, de um direito de caráter amplo, que abrange o direito à moradia, mas não se restringe a ele. Significa, na verdade, a materialização de todas as necessidades humanas, desde as mais elementares até aquelas consideradas mais “sofisticadas”, no contexto de um sujeito que vive na cidade.

Não é a toa, portanto, que o direito à cidade é reivindicado por diversos movimentos sociais e organizações da sociedade civil, mobilizados pela concretização de direitos como moradia, saúde, educação, cultura, lazer, etc. Com isso, reivindicações que antes pareciam absolutamente segmentadas e isoladas na sociedade passam a ser vistas conectadas com outras demandas e outros direitos igualmente negados na (e pela) cidade, sob um mesmo “pano de fundo”.

É o fenômeno urbano, portanto, que tece os contextos das lutas por direitos por parte daqueles e daquelas que vivem na cidade. A rede de ligações entre estas diferentes realidades observadas dentro da cidade exige, por parte de cada sujeito, a compreensão acerca dos elementos que influenciam o modo de funcionamento das cidades contemporâneas, tornando mais consciente e organizada a atuação dos coletivos e organizações que lutam pela efetivação do direito à cidade.

Seria possível estabelecer uma espécie de “lógica geral” do “funcionamento” das cidades, independente de sua localização global? A resposta pode parecer contraditória, mas pode-se dizer que sim e que não, ao mesmo tempo. É que o processo de formação da cidade contém em si elementos em comum, mas que não podem ser acriticamente assimilados de forma que uma cidade européia seja tomada acriticamente como parâmetro de comparação com uma cidade latino-americana.

A história da Humanidade demonstra que a formação das cidades está diretamente relacionada ao estágio do desenvolvimento das forças produtivas da sociedade. Foi apenas a partir do momento em que o homem descobriu as formas de manipular a terra e consumir alimentos plantados a partir de técnicas agrícolas que tornou-se possível a fixação em um território fixo [2].

A partir da fixação no território, inicia-se um processo mais complexo de divisão social do trabalho, e aquilo que antes eram pequenos clãs de caçadores se tornaram grandes aglomerados humanos cuja principal atividade era a agricultura [3]. Com o desenvolvimento da organização destas sociedades (também no seu sentido religioso, cultural, etc.), ocorre um rápido processo de crescimento do aglomerado, que ganha as feições de uma cidade.

A cidade, nos dizeres de Raquel Rolnik [4], passa a funcionar como um “ímã de gente”, sendo que, já neste momento, há uma mudança na relação do homem com a terra e o território. O surgimento da propriedade privada, nesse sentido, é essencial para compreender o processo de desenvolvimento da cidade, que passa a se organizar a partir do conflito entre as diferentes classes sociais, identificadas a partir das funções econômicas que cada qual desempenha na cidade.

Não é possível, porém, estabelecer um painel de “semelhanças” entre cidades sob diferentes formas de organização de seu modo de produção econômica e das diferentes classes sociais que nela se encerram. É por isto que a cidade antiga (composta por escravos e aristocratas) é distinta da cidade feudal (composta por servos e senhores feudais), que é distinta por sua vez da cidade capitalista (composta por proletários e burgueses). Tampouco é possível estabelecer paralelos mecanicistas entre cidades sob diferentes posicionamentos geopolíticos, ainda que sob um mesmo modo de produção (cidades capitalistas européias e cidades capitalistas latino-americanas, por exemplo).

Assim, diferentemente das cidades européias, nascidas em muitos casos sob a forma da cidade antiga ou medieval, as cidades latino-americanas nasceram já sob o contexto de organização da cidade capitalista, com uma posição radicalmente diferente daquela desempenhada pelas “metrópoles” européias. É nesse sentido que Milton Santos afirma que “todas as cidades latino-americanas nasceram a serviço das relações internacionais com os países mais evoluídos”, visto que “a cidade surgiu a serviço de uma colonização verdadeiramente arraigada” [5].

Assim, sob o jugo da colonização européia, que invadiu as Américas e impôs seus interesses econômicos aos nativos locais [6], as cidades latino-americanas passaram a se organizar em face das principais atividades econômicas desenvolvidas, como a expansão agrícola e a exploração mineira. Nesse sentido, as cidades mantiveram inicialmente apenas a função de abrigar a burocracia estabelecida pelas metrópoles européias, preocupadas a cobrança de tributos e com o escoamento da produção, o que explica o fato de as primeiras cidades se localizarem na faixa litorânea.

O fenômeno urbano apenas foi verificado de forma mais generalizada no Brasil a partir da terceira parte do século XX, reproduzindo com suas peculiaridades o processo ocorrido na Europa a partir do fim da Idade Média. O processo de expulsão dos trabalhadores do campo para as cidades, associado ao desenvolvimento do capitalismo industrial impulsionado pela burguesia enriquecida com a atividade mercantil, inaugurou uma fase mais acelerada da formação das cidades.

“O campo brasileiro moderno repele os pobres, e os trabalhadores da agricultura capitalizada vivem cada vez mais nos espaços urbanos. A indústria se desenvolve com a criação de pequeno número de empregos e o terciário associa formas modernas a formas primitivas que remuneram mal e não garantem a ocupação” [7]. Com estas palavras, Milton Santos identifica com precisão o processo que leva à formação das principais cidades brasileiras, o que não ocorre sem conseqüências drásticas, senão vejamos: “A cidade, onde tantas necessidades emergentes não podem ter resposta, está desse modo fadada a ser tanto o teatro de conflitos crescentes como o lugar geográfico e político da possibilidade de soluções” [8].

É sob esta unidade dialética da produção de conflitos e da geração de soluções que funciona o processo geral da luta de classes dentro da cidade capitalista, que, ao transformar a terra em mercadoria, promove um amplo processo de segregação espacial que esconde e ao mesmo tempo evidencia claramente os conflitos de classes instaurados na cidade.

Nesse sentido, a experiência brasileira foi de uma velocidade arrebatadora. De país eminentemente agrário no início do século XX, passou por um amplo processo de mecanização da agricultura que concentrou ainda mais a propriedade agrícola, expulsando grandes quantidades de trabalhadores rurais para as cidades, onde seriam utilizados no processo de produção industrial, acelerado pela política de substituição de importações e fortalecimento da indústria nacional verificado a partir da década de 1930, e impulsionado nas décadas seguintes. Já ao final do século, as cidades brasileiras são abaladas em suas estruturas de cidades industriais, sob o modelo de substituição de importações, para se tornarem cidades sob o império do capitalismo financeiro [9].

A chegada ao Brasil do capitalismo financeiro, entendido como a fusão do capital industrial com o capital bancário [10], gera novas contradições dentro da cidade capitalista, que passa a se organizar em favor das grandes firmas, conforme Milton Santos: “a urbanização corporativa, isto é, empreendida sob o comando dos interesses das grandes firmas, constitui um receptáculo das conseqüências de uma expansão capitalista devorante dos recursos públicos, uma vez que estes são orientados para os investimentos econômicos, em detrimento dos gastos sociais” [11].

Como se vê, as conseqüências desse processo são dramáticas. As cidades industriais brasileiras, organizadas com o intuito de segregar a classe trabalhadora através da mercantilização da terra e das atividades de especulação imobiliária, passam a disponibilizar ainda menos recursos para ampliar a prestação de serviços essenciais às populações da periferia. As convulsões sociais que este processo gera, como não poderia deixar de ser, são respondidas através de extrema violência por parte dos aparelhos repressivos do Estado, que busca manter a “lei e ordem” em favor da manutenção das relações de produção (capitalistas) desta cidade.

Mais do que nunca, os serviços públicos disponibilizados pelo Estado à classe trabalhadora têm como único intuito, na fase atual do capitalismo financeiro, a reprodução ampliada do capital. É nesse sentido que o transporte coletivo deve ser compreendido, não como um serviço prestado à coletividade em prol do direito de ir e vir, mas como um serviço essencial para promover o deslocamento da classe trabalhadora, que vive nas periferias da cidade, para o local de trabalho, onde ocorre o processo de produção e circulação de mercadorias, necessários à geração de capital e à apropriação de mais-valia por parte dos donos dos meios de produção.

Alijado de meios para intervir neste serviço público, em face da falta de recursos e à sua própria composição política, o Estado, controlado por sua classe dominante, se tornou nesta nova fase do capitalismo brasileiro um mero regulador da prestação de serviços, cujo acesso se torna cada vez mais dispendioso, o que acarreta, na prática, no desrespeito aos direitos mais fundamentais da classe trabalhadora, como é o caso do direito a saúde, educação e mesmo o direito à cidade.

Desta forma, o direito à cidade se torna um direito auferível apenas por aqueles que tenham condição econômica para tal. Para isso, cada vez mais pessoas são levadas a aderir ao transporte individual (através de mecanismos de endividamento que oneram grande parte do orçamento das famílias trabalhadoras) e cada vez menos pessoas utilizam o transporte coletivo, conforme veremos a seguir. 

2) Transporte coletivo: serviço público ou mercadoria?

Há no Brasil, hoje, 18 regiões metropolitanas com mais de 1 milhão de habitantes, segundo o IBGE [12]. O transporte coletivo é indispensável para o acesso à cidade nestes grandes centros, caracterizada principalmente pelo surgimento de grandes metrópoles, que, devido à segregação urbana, conseqüência típica da mercantilização do solo preconizada pelas cidades capitalistas, tornam longas as distâncias a serem percorridas dentro das cidades, para o acesso a direitos e serviços básicos por parte das classes subalternas.

Agrava esta situação a ocupação desordenada do solo, provocada pela especulação imobiliária, que cria grandes vazios urbanos em regiões com bom acesso a bens e serviços, e, por outro lado, obriga as populações mais carentes a habitar regiões afastadas do centro da cidade e de seus equipamentos, como escolas, hospitais e mesmo parques. Há de se considerar também que há equipamentos que, por sua natureza, não podem ser construídos em todos os bairros de uma cidade, como universidades e hospitais especializados. Desta forma, grandes parcelas da população são obrigadas a ocupar áreas sem qualquer infra-estrutura, dependentes de meios de transporte para chegar até ela. Neste quadro, torna-se imperiosa a necessidade de garantir o acesso de todos ao sistema de transporte coletivo da cidade.

Entretanto, como mencionamos anteriormente, os sistemas de transporte coletivo não foram construídos visando a garantia da mobilidade urbana. Mas, se ele não foi pensado para tal fim, que outro fim estaria ele a assegurar? Para compreender melhor a situação, vamos traçar um panorama jurídico acerca do transporte coletivo de passageiros.

A Constituição Federal dispõe que os transportes coletivos são serviços públicos com caráter essencial, e que os Municípios devem prestá-lo direta ou indiretamente, sendo, neste último caso, sob o regime de concessão ou permissão [13].

Serviços públicos são como toda a atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade, mas fruível singularmente pelos administrados, prestada sob o regime de Direito Público. A doutrina administrativista clássica dá grande relevo à categoria dos serviços públicos, a ponto de doutrinadores afirmarem que a função primordial da Administração Pública é oferecer utilidades aos administrados, não se justificando a existência do Estado senão para tal desiderato [14]. O Estado pode prestar estes serviços direta ou indiretamente, ou seja, ou a Administração presta o serviço, ou ela delega para particulares sua execução, o que sempre depende de licitação. Importante frisar que, mesmo quando delegados a entes privados, os serviços públicos continuam a ser regidos pelo regime de Direito Público, que dá à atividade desenvolvida prerrogativas e restrições especiais.

A licitação deve ocorrer, obrigatoriamente, sempre que o Poder Público delegar a exploração de serviços públicos a terceiros, através de concessão ou permissão, nos termos do artigo 175, da CF. A licitação é um processo administrativo, por ser composta por diversos atos administrativos isolados, que tem por objetivo proporcionar igualdade de condições entre os fornecedores e desta forma fazer com que o Estado possa decidir pela melhor proposta. Ela é regida pela lei federal 8.666/1993, que também disciplina o contrato administrativo, editada pela União e válida para todas as esferas do Estado brasileiro, embora os demais entes federativos possam ter leis próprias, desde que compatíveis com a lei nacional.

Cabe diferenciar concessão e permissão, nos termos da legislação vigente. Permissão é conceituada pela doutrina como o ato administrativo unilateral, em que a Administração delega a execução de serviço público a particular, facultando ao permissionário a realização do serviço público. Diversos doutrinadores, como Bandeira de Mello [15] e Di Pietro [16] consideram que este instituto não se aplica a contratos celebrados por prazo certo, e com características negociais, muito comuns em serviços públicos como o transporte coletivo. Já a concessão é definida como a atribuição da prestação do serviço a terceiro feita de maneira negocial. Quem receber a concessão, exercerá o serviço por sua conta e risco, explorando-o diretamente, sob o regime de Direito Público.

O art. 175 da CF dispõe à lei o papel de estabelecer o regime das empresas concessionárias, os contratos, os direitos dos usuários, a chamada “política tarifária” e a qualidade do serviço. Na esfera nacional, a lei 8.987/1995 é diploma geral sobre concessões, que regulamenta as licitações da União, Estados, Municípios e Distrito Federal, embora neste caso os demais entes federativos também possam legislar sobre concessões, desde que suas normas sejam também compatíveis com a lei nacional. O supracitado art. 30 da CF atribui competência legislativa aos Municípios nos assuntos de interesse local, dentro dos quais se enquadra o transporte coletivo.

As concessões e permissões de serviço público não podem ser confundidas com simples contratos administrativos para a prestação de serviços, que, conforme se verá adiante, é outro recurso disponível à Administração Pública para efetivar a prestação de serviços e a realização de obras públicas.

A concessão de serviços públicos se opera, após a licitação, através dos termos estabelecidos no contrato administrativo, que é produto da manifestação da vontade de duas ou mais partes, neste caso a Administração, motivada pelo interesse público, e o concessionário, sobre a qual incidem os diversos institutos contratuais importados do direito privado. Bandeira de Mello conceitua contrato administrativo como aquele que é travado entre a “Administração e terceiros, que por força de lei, de cláusulas pactuadas ou do tipo do objeto, a permanência do vínculo e as condições preestabelecidas assujeitam-se a cambiáveis imposições de interesse público, ressalvados os interesses particulares do contratante privado” [17].

Um dos princípios mais importantes do contrato administrativo é o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, que visa estabelecer a igualdade entre as obrigações assumidas pelo contratante, na hora do ajuste, e a contraprestação econômica obtida, como forma de proteção do lucro do particular. Para que isto ocorra, o Estado é quem assume os riscos e ônus de restabelecer a cláusula de lucro do ente particular, abalada tanto em face de situações geradas pela própria Administração (teoria do fato do príncipe) quanto por variações econômicas às quais nenhum dos contratantes tenha influenciado (teoria da imprevisão).

A garantia do equilíbrio econômico-financeiro do contrato por parte da Administração faz com que haja uma situação de “capitalismo sem risco” por parte das empresas concessionárias, visto que a estas cabe apenas vencer a competição instituída pelo processo licitatório (suscetível, por sinal, a fraudes ou mesmo à sua dispensa indevida, como é o caso do município de Curitiba), sendo que as eventuais perdas que deveriam ser assimiladas pelasempresas privadas são assumidas pela coletividade, o que, no caso do transporte coletivo, se restringe aos seus próprios usuários, tendo em vista que a tarifa é considerada a principal fonte de remuneração do serviço.

Aqui começamos a responder a pergunta: quais objetivos que o atual modelo de transporte urbano persegue? Ou melhor, quais interesses estão representados e qual a função do transporte público na atual conjuntura urbana do país? Veremos.

Em praticamente todas as cidades brasileiras o serviço de transporte coletivo urbano é operado pela iniciativa privada, que busca não o atendimento das necessidades da população, mas o lucro. Além disso, pululam pelo país contratos administrativos precários ou vencidos, feitos sem licitação, claramente ilegais. Estes contratos, mesmo ilegais, protegem apenas os interesses dos capitalistas, em detrimento da maioria da população.

A proteção ao lucro dos empresários de ônibus resulta em tarifas de ônibus cada vez mais inacessíveis, devido ao seu custo. Dados do DENATRAN informam que 40% da população brasileira não tem acesso ao transporte público, devido ao preço das tarifas. Em 2005, a Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda avaliou que a tarifa de ônibus urbano foi, dentre o grupo dos preços administrados, um dos itens que mais pressionou a inflação medida pelo IPCA nos 6 anos anteriores, atrás apenas da energia elétrica, outro serviço público submetido às “regras de mercado”, através da privatização de companhias estatais em muitos Estados da Federação.

Pode-se também indicar como indício da exclusão causada pelas tarifas a irrisória evolução do número de passageiros pagantes nos últimos anos. Em Curitiba, que é considerada modelo em gestão do sistema de transporte coletivo (em grande parte devido à criação de uma imagem ilusória pelo chamado “city marketing” [18]), o número de passageiros pagantes em 1988 era de 301.454.151, enquanto em 2006 registrou-se 303.506.299, sendo que em 2004 chegou-se a 284.013.188, menor índice de passageiros pagantes registrados durante este período. No país, dados do Governo Federal apontam para uma redução de 40% na demanda pelos ônibus urbanos, responsáveis por 90% do atendimento ao transporte coletivo de passageiros, em São Paulo, Rio de janeiro, Belo Horizonte, Recife, Porto Alegre, Salvador, Fortaleza e Goiânia.

Os números apresentados demonstram que, não obstante tenha ocorrido um crescimento populacional significativo das cidades nos últimos 20 anos [19] , a mesma variação não ocorreu quanto ao número de passageiros pagantes do sistema de transporte coletivo, o que se explica devido aos constantes aumentos tarifários, que, associados à deterioração deste serviço público, levou uma parcela da população a aderir ao transporte individual (ainda que para isso tenha assumido grandes ônus decorrentes do endividamento) e outra parcela ainda mais significativa a andar a pé.

Devemos ainda lembrar que a maior parte das pessoas que passaram a habitar Curitiba neste período, provenientes em sua maior parte de movimentos migratórios internos, foi forçada a habitar regiões desprovidas de equipamentos urbanos e distantes dos locais onde se concentram os empregos, ou seja, dependentes do transporte urbano de passageiros para conseguir a efetivação de direitos e o acesso aos serviços que a cidade oferece. Este processo que empurra a miséria para longe dos olhos da burguesia, para a periferia das cidades, tem outro efeito, que é aumentar a distância dos deslocamentos, pressionando ainda mais o custo da tarifa.

vendredi 14 juin 2013

Quando as massas ocupam as ruas...

Algumas questões teóricas sobre o movimento de massas

A palavra massa, para Paul Tillich [Masse et Esprit, Études de philosophie de la masse] [1], transformou-se em slogan político e social. Expressão esta que conota superioridade e idolatria. Por isso, quando se deseja discutir seriamente o conceito massa é necessário definir seus contornos e esfriar um pouco a fervura do slogan. [2]



Segundo Tillich, há dois conceitos de massa, um formal e outro material, o primeiro de ordem psicológica e sociológica e o segundo de ordem histórica e social. [3] Em termos formais, a massa consiste numa associação de pessoas que, na associação, deixam de ser indivíduos. Sua individualidade se perde e ele se submete à coletividade. A pessoa se torna um átomo, desprovido de suas qualidades, seu movimento próprio, e se transforma em pura quantidade subordinada ao movimento da massa. Através da psicologia das massas pode-se ver como a alma perde sua forma individualizada uma vez que toma a forma da massa e como o indivíduo entra em contradição com ele próprio, já que é um átomo da massa ou um ser bem singularizado. [4]

Tillich considera que no movimento psíquico da massa alguns elementos se separam e se isolam, adquirindo eficiências por eles próprios. Isto porque um indivíduo é o resultado de uma longa evolução interior e sua alma está ligada a milhares de liames à vida da alma em sua totalidade, que assim torna-se autônoma. [5] Na massa, as forças de inibição, de reflexão e de matizações caducam. Tudo se transforma. Assim, podemos resumir essas transformações em duas leis. A lei da imediaticidade, segundo a qual a massa não reflete, mas é. Ela tem uma existência objetiva, não subjetiva como afirmou Hegel, ela é em si, não para si. [6]

A massa não sabe porque ela faz aquilo que faz. Quando acede a ela própria é sempre através de certos indivíduos, um orador ou chefe. A massa é imediata, vive inteiramente o presente, sem ligações com o passado ou o futuro, sem lembranças ou reflexões. Suas motivações são irracionais. Mas para Tillich, a lei da imediaticidade explica o desabrochar dos instintos biológicos imediatos, que estavam inibidos. Também mostra a existência de um princípio espiritual imediato que se faz presente, que pode ser traduzido como o abandono ao instinto do momento em direção à disponibilidade da revelação espiritual do presente, revelação de uma espiritualidade subjetiva impura. [7]

Ou seja, a irracionalidade das motivações pode dirigir ao irracional de baixo, à demência, ou ao irracional de cima, à novidade criadora. A outra lei da psicologia das massas, segundo Tillich, é a lei da amplificação. Se a vida espiritual do indivíduo perde suas inibições, se tal fato se repete em cada indivíduo presente, como num alternador, o vivido por um, suscita em outro experiência idêntica, porque a massa vivencia ela própria o ser massa.  Essa lei nos leva a dois aspectos da vida da alma, o aspecto emocional e o aspecto intelectual.

Em todo movimento da massa podemos observar a força do entusiasmo, a amplificação das paixões, da coragem, que podem levar ao seu sacrifício e destruição. Do lado intelectual, a lei da amplificação age de forma mais discreta, porque o processo de reflexão não convém à massa por causa de sua complexidade. [8] De certo ponto de vista, explica Tillich, o indivíduo está mais alerta que a massa, mas a massa pode se elevar bem acima das consciências subjetivas, com suas intuições mais simples, mas também maiores e também com sua clarividência disso, que prepara o espírito objetivo no momento presente. [9] A amplificação pode levar ao monumental e ao heroísmo, mas também ao demoníaco e à destruição. E as intuições da massa podem se conformar ao espírito ou lhe ser refratário[10]

As leis da psicologia das massas são leis naturais, afirma Tillich. Elas são sempre válidas e necessárias onde uma pluralidade se encontra reunida. Elas têm valor para todos os estamentos sociais, para um grupo de marginais, assim como para uma assembléia de nobres. Com ironia superior, elas regem uma reunião de convencidos individualistas, assim como explicam o sentimento de superioridade existente na palavra massa, quando usado como slogan [11]. Segundo Paul Tillich, no conceito material de massa, a essência de um grupo de homens determinado é ser essencialmente formado conforme a psicologia das massas. [12]

Por isso, no sentido histórico do termo, a massa, quer sejam classes ou ordens, raças ou círculos, partilha do destino de ser excluído de toda formação espiritual individual. Vemos, então, que para Tillich a imediaticidade da massa faz com que desabroche nela instintos biológicos que estavam inibidos no indivíduo, o que traz à tona um princípio espiritual imediato: a disponibilidade à revelação espiritual do momento presente.

Essa imediaticidade é o que leva a massa ao irracional de baixo, à demência, ou ao irracional de cima, à novidade criadora. Ao lado da imediaticidade, os aspectos emocional e intelectual são amplificados. As forças do entusiasmo e da coragem são amplificadas de tal modo que podem levá-la ao sacrifício e destruição. Assim, a massa se eleva acima das consciências individuais com intuições simples, mas com clarividência disso. Este processo prepara o espírito objetivo no momento presente. Quando objetivamente a massa vive esse processo de espiritualização, nela, religião e cultura se misturam. A esse primeiro momento de evolução da massa Tillich chama de massa mística.

No contexto geral de uma análise do socialismo, não se pode deixar de levar em conta que a evolução histórica dá nascimento a diferentes tipos de massa, conforme o modelo de desenvolvimento das relações entre religião e cultura. [13] O primeiro estado consiste em uma unidade onde os dois ainda não se distinguem. Uma segunda etapa é marcada pela autonomia da cultura: assim, ela se diferencia mais e mais da religião, a ponto de gerar a secularidade moderna. Mas esta ruptura e separação são catastróficas tanto para a cultura como para a religião. E serão então superadas pela etapa final da teonomia, caracterizada pela presença de conteúdo religioso em todas as formas autônomas da cultura. [14]

Podemos facilmente reconhecer os elementos desse esquema na descrição que Tillich faz dos diferentes tipos de massa. A massa mística corresponde à religião de origem: é a fusão dos indivíduos numa única comunidade que engloba tudo. Vem em seguida a etapa da autonomia, onde os indivíduos se diferenciam cada vez mais da comunidade de origem, até tornarem-se completamente independentes e separados. Mas ainda é massa sem forma e cultura, que não se colocou em movimento e caminhou para um estado de individualização. Essa é o estado de massa técnica ou mecânica, característico da moderna sociedade industrializada. [15]

A partir daí surge a perspectiva de uma etapa final onde a massa e a individualidade pessoal formarão uma nova união, uma síntese nova, chamada massa orgânica, que corresponderá ao ideal da teonomia. Logicamente, nem sempre se caminhará em direção a este ideal: mas o tempo histórico que orienta nessa direção é o da massa dinâmica [16]. Dessa maneira, para Tillich, a massa dinâmica é sempre revolucionária, não unicamente no sentido político do termo – inclusive este é o sentido menos freqüente --, mas sempre em um sentido de fé espiritual e social. É necessário que ela seja revolucionária, porque o sentido de seu movimento é precisamente ir além do estado de massa e todas as formas que são responsáveis por este regulamento. [17]


Assim, para Tillich o movimento da massa dinâmica parte da massa mecânica e é essencialmente um movimento de libertação: o movimento da massa dinâmica parte da massa mecânica, já existente ou em perigo de aparecer, e visa a supressão da massa, visa à massa orgânica, não importando que esse começo seja ou não atendido[18]

Vemos aqui que Tillich tem uma compreensão diferente daquela de Gramsci, que entende a vanguarda enquanto intelectualidade orgânica, mas não vê a massa em processo dinâmico que pode levar ao surgimento de uma massa orgânica. Sem desejar fazer um confronto entre os dois pensadores, tocamos apenas no ponto que metodologicamente nos interessa: a vanguarda não se limita ao militante ou intelectual, é um processo maior que tem na massa orgânica uma dupla ação, de liderança da sociedade e de transformação da situação-limite. 

Uma tal visão abre perspectivas interessantes na análise e compreensão de diferentes situações históricas. A questão da transformação da sociedade, as reivindicações cidadãs e democráticas são compreendidas melhor através do caminho metodológico construído por Paul Tillich em seus escritos socialistas. E como ele afirmou, todas as questões convergem para uma mesma resposta: a humanidade deve ter origem nas profundezas de um novo conteúdo, onde será superada a oposição entre massa e personalidade. Onde um novo conteúdo será produto da graça e do destino. [19]




[1] Publicado em Berlim e Frankfurt por Edições da Comunidade Operária, em 1922, e mais tarde em Christianisme et Socialisme, Écrits socialistes allemands (1919-1931), Les Éditions du Cerf, Éditions Labor et Fides, Les Presses de L’Université Laval, 1992, pp. 48-112.
[2] Idem, op.cit., p. 75.
[3] Idem, op.cit., p. 75.
[4] Idem, op.cit., p. 76.
[5] Idem, op.cit., p. 76.
[6] Idem, op.cit., p. 76.
[7] Idem, op.cit., p. 76.
[8] Idem, op.cit., p. 77.
[9] Idem, op.cit., p. 77.
[10] Idem, op.cit., p. 77.
[11] Idem, op.cit., p. 77.
[12] Idem, op.cit., p. 77.
[13] Jean Richard, Introduction au Tillich Socialiste, La masse prolétarienne, in Paul Tillich, Christianisme et Socialisme, Écrits socialistes allemands (1919-1931), Les Éditions du Cerf, Éditions Labor et Fides, Les Presses de L’Université Laval, 1992, p. XLI.
[14] Idem, op.cit., p.XLI.
[15] Idem, op.cit., pp. XLI-XLII.
[16] Idem, op.cit., p. XLII.
[17] Idem, op.cit., p. XLV.
[18] Paul Tillich, Masse et Esprit in Christianisme et Socialisme, Écrits socialistes allemands (1919-1931), Les Éditions du Cerf, Éditions Labor et Fides, Les Presses de L’Université Laval, 1992, p. 81.
[19] Idem, op. cit., p.72.

Ma maison là bas...


samedi 8 juin 2013

JORGE PINHEIRO: Religião, guerra e paz

JORGE PINHEIRO: Religião, guerra e paz: Nota nº 292 Declaração do Ibas sobre o confito em Gaza 21/11/2012 - (English version bellow) Índia, Brasil e África do Sul express...

Religião, guerra e paz

Nota nº 292
Declaração do Ibas sobre o confito em Gaza


21/11/2012 -

(English version bellow)

Índia, Brasil e África do Sul expressam sua mais firme condenação da violência em curso entre Israel e Palestina, que ameaça a paz e a segurança da região. Os países do IBAS lamentam profundamente a perda de vidas humanas e expressam sua preocupação pelo uso desproporcional e excessivo da força.

Eles exortam as partes a cessarem imediatamente toda a violência, a exercerem o máximo de moderação e evitem tomar qualquer ação que possa agravar ainda mais a situação. Eles sublinham a sua expectativa de que o Conselho de Segurança das Nações Unidas fará o máximo no cumprimento de suas responsabilidades em relação a essa grave situação.

Eles também sublinham a necessidade urgente de levantar o bloqueio a Gaza, que continua a agravar a já difícil situação socioeconômica e humanitária prevalecente.

Os países do IBAS expressam seu firme apoio aos esforços de mediação do Governo do Egito, da Liga dos Estados Árabes e do Secretário-Geral da ONU com vistas a obter um cessar-fogo negociado entre as partes.

Os países do IBAS acreditam que apenas a diplomacia e o diálogo levarão à resolução da crise atual, o que torna ainda mais urgente retomar as negociações diretas entre Israel e a Palestina, que levem a uma solução abrangente para a questão palestina, ou seja, a realização da solução de dois Estados.

Tendo em vista a iminente consideração da Questão da Palestina por parte da Assembleia Geral da ONU, Índia, Brasil e África do Sul expressam o seu apoio à solicitação da Palestina de ser-lhe concedido o status de Estado observador do Sistema das Nações Unidas.
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A religião e a construção da paz
A partir de uma entrevista de Jorge Pinheiro à revista Defesa da Fé, Ano 9, Número 71.

A religiosidade faz parte do ser humano?

Jorge Pinheiro – O ser humano é potencialmente espiritual, e essa espiritualidade se expressa de várias formas, sem precisar de um lugar definido. A religião ocupa um espaço privilegiado na espiritualidade, que é a dimensão da profundidade do espírito humano. Por isso, a busca humana por sentido de vida dirige essa potencialidade na construção de religiões.

O que isso prova?

Jorge Pinheiro – Que a religião está presente em todas as ações do espírito humano: na ética, na estética, no conhecimento. Por isso, quando alguém rejeita a religião em nome da ética, da estética, ou da busca do conhecimento, em última instância está a rejeitar a religião em nome da própria religião, porque a espiritualidade é formadora de sentido.

Como o senhor distingue a religiosidade da espiritualidade?

Jorge Pinheiro – A espiritualidade é a relação da pessoa com a transcendência. Nesse sentido, a espiritualidade é a totalidade da vida. A religião, por sua vez, traduz uma dimensão dessa espiritualidade. Por exemplo, quando se assiste a um filme ou se lê um livro e somos despertadas, cada qual à sua maneira, para a miserabilidade humana, vemos aí uma expressão da espiritualidade. As experiências humanas com o que é sagrado envolvem escolha, disciplina e prática, e levam o ser humano às experiências religiosas, porque a religião traduz o que é sagrado para a vida do fiel. Dessa forma, a espiritualidade tenderá sempre a ser traduzida em religiosidade.

A diversidade religiosa brasileira é resultado de que fatores?

Jorge Pinheiro – Em relação à realidade brasileira percebemos mais diversidade confessional do que religiosa. Oitenta e nove por cento dos brasileiros confessam ser cristãos, cuja fé está presente no desejo de justiça e solidariedade. Diante dessa religiosidade cristã invisível, podemos dizer que quase todos os brasileiros são cristãos em alguma medida. Tomemos, como exemplo, a igreja católica, que não pode ser analisada como una, pois abriga diferentes manifestações de religiosidade. Além dessa pluralidade católica, há centenas de igrejas evangélicas que incluem as históricas, as pentecostais, as neopentecostais e as importações mais recentes, produtos da globalização.

A religião é um fator de agregação ou desagregação social?

Jorge Pinheiro – Pode ser uma coisa ou outra. Talvez seja melhor trabalharmos com um exemplo: a posição de setores da igreja evangélica durante os anos da ditadura militar no Brasil. Algumas igrejas apoiaram o governo militar, e tivemos até casos de torturadores evangélicos, membros de igrejas importantes. Assim, a religião desagrega quando usufrui das benesses do Estado e se torna correia de transmissão da corrupção e da violência, real ou simbólica. A religião agrega quando defende a vida humana. Com isso, constatamos que pode ser uma coisa ou outra.

Essa é uma triste marca em nossa história.

Jorge Pinheiro – Sim. É claro que seria um erro uniformizar a atuação dos evangélicos nesse período, até porque muitos deles também foram torturados. Mas o certo é que muitos evangélicos, cooptados pelo regime, foram cúmplices de torturas e mortes. 

Em que a fé cristã ajudou a melhorar o mundo?

Jorge Pinheiro – Para entendermos o papel do cristianismo, é necessário, antes, compreender que o Deus cristão é um Deus do tempo e da história. Isso significa, que é o Deus que atua na história visando uma meta final. Com o cristianismo e sua mensagem, o círculo trágico da sucessão dos deuses do politeísmo, com poderes ilimitados e injustos sobre os povos, foi superado. Cristo salva o universo, essa é a mensagem cristã em sua essência. Ou seja, a plenitude da história se correlaciona ao reinar universal de Deus, reinado da justiça e da paz.

Qual será o papel da religião no futuro?

Jorge Pinheiro – A religião sempre teve e continuará a ter um papel político: a defesa da justiça. As pessoas compreendem a necessidade da justiça e a política, com base no poder, cumpre uma função legítima quando serve às reivindicações da justiça. Às vezes, infelizmente, as religiões se perdem, caem na espiritualidade negativa, ao negarem a diferença, e se tornam instrumentos da discriminação. Não estamos isentos disso. Ao contrário, presenciamos esse tipo de postura no fundamentalismo religioso. Mas, o diálogo entre as religiões, para cumprir um papel positivo, deve se apoiar na busca incondicional da justiça.

Como o senhor vê a relação dos Estados com a religião?

Jorge Pinheiro – Para entendermos esta questão, vale a pena nos reportarmos a uma entrevista do filósofo Hans Georg Gadamer, concedida em 1999, às vésperas de completar cem anos de idade. Na ocasião, ele disse que “o respeito pelas outras religiões é um bem que pode nos salvar da catástrofe, mas o caminho para a salvação tem inimigos dentro e fora da Igreja”. Em outras palavras, estava a dizer que, devido ao fato de muitos países possuírem tecnologias capazes de destruir a vida sobre o planeta, o diálogo franco entre as religiões é indispensável. Ainda segundo o filósofo luterano, o problema consiste nas confissões religiosas que são muito diferentes, tornando difícil encontrar uma linguagem comum. Até para os diferentes ramos do cristianismo é difícil o entendimento.

Qual seria, então, a alternativa para que os governos possam buscar paz para essas zonas de conflitos?

Jorge Pinheiro – Talvez devessem partir daquilo que todas as culturas e religiões têm em comum. E, segundo Gadamer, esse tema unificador está relacionado aos direitos humanos. Neste sentido, a questão não é tanto a discussão sobre a possibilidade de manutenção de Estados laicos, mas a construção de um diálogo interreligioso que possibilite a construção da paz mundial. E isso só será possível quando os líderes religiosos de diferentes credos e pontos de vista não impedirem a construção de princípios comuns de defesa da vida humana.

A igreja cristã está preparada para lidar com este quadro de pluralismo?

Jorge Pinheiro – Não é possível falar de pluralismo religioso sem falar de poder, fica uma questão: amor e poder são compatíveis? As igrejas, como qualquer outra ordem social instituída, têm uma existência objetiva que remete à prática do serviço ao próximo. Para isso, não podemos deixar que as igrejas (confissões e denominações) se tornem totalitárias, ou seja, mesmo como Igreja de Cristo não podemos negar os limites de nosso poder. E esse limite é o amor. Dessa forma, poderemos conviver pacificamente com as outras religiões e seguir o caminho da justiça.

Qual é o papel da apologética neste contexto religioso?

Jorge Pinheiro – Karl Barth negava a necessidade da apologética. Dizia que Deus não tem necessidade de que o defendam. Já Tillich entendia a teologia como apologética. Concordo com Tillich, mas defendo uma apologética do amor. Entendo que a apologética só tem sentido se antes houver testemunho. Por isso, quando falo de apologética do amor estou resgatando Karl Barth, que só entendia vida cristã na plenitude do Espírito. Aí está a chave da questão: sem plenitude do Espírito não há vida cristã, nem testemunho, e, logicamente, a apologética que sair daí não terá amor. Antes, será uma arma de guerra: conduzirá à violência.

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India, Brazil and South Africa express their strongest condemnation of the ongoing violence between Israel and Palestine, that threatens the peace and security of the region. The IBSA countries deeply regret the loss of human lives and express their concern over the disproportionate and excessive use of force.

They urge the parties to immediately cease all violence, to exercise maximum restraint and to avoid taking any action that may further exacerbate the situation. They stress their expectation that the United Nations Security Council will do its utmost in the fulfillment of its responsibilities in regard to this serious situation.

They also stress the urgent need for to lift the blockade on Gaza which continues to worsen the already dire socio-economic and humanitarian situation in Gaza.

The IBSA countries express their strong support to the mediation efforts of the Government of Egypt, the League of Arab States and the UN Secretary-General aimed at achieving a negotiated ceasefire.

The IBSA countries believe that only diplomacy and dialogue will lead to the resolution of the current crisis, which makes it even more urgent to resume direct talks between Israel and Palestine, leading to a comprehensive solution to the Palestinian Question i.e. the achievement of a two-state solution.

In view of the upcoming UN General Assembly discussion on the Question of Palestine, India, Brazil and South Africa express their support for Palestine's request to be accorded Observer State status in the United Nations system.

jeudi 30 mai 2013

Instruções escritas para a vida

Instrucciones Escritas Para La Vida
Rav Noaj Weinberg

El Pueblo Judío tiene tanto una serie de "Instrucciones Escritas para vivir" como una serie de "Instrucciones Orales para Vivir". Las instrucciones escritas se llaman: la Biblia, y las instrucciones Orales se llaman: el Talmud.

El camino número 14 de los 48 caminos hacia la sabiduría es: "bemikrá", es decir, "el estudio de las instrucciones escritas".

La Biblia tiene tres partes, con un total de 24 libros: La Torá - los cinco libros de Moshé, que fue entregada al pueblo Judío por D-os en el Monte Sinai, los Profetas (D-os habló con varios profetas como ser Isaías, Jeremías, Ezequiel) - quienes transmitieron mensajes importantes al Pueblo Judío, y las Escrituras - que incluyen los libros de Proverbios, Salmos, el libro de Esther y otras enseñanzas inspiradoras.

Sin tomar en cuenta si uno cree o no en la Divinidad de estos textos, el hecho es, que muchas cosas de la sociedad occidental están basadas en ideales de la Torá. La Biblia introdujo al mundo conceptos como la libertad, igualdad de los derechos de dignidad, tolerancia, educación universal, caridad, amor a tu prójimo, etc…

Más aún, los rabinos enseñan que la Torá es el "plano de la creación", lo cual significa que cualquier cosa que quieras saber sobre la vida lo puedes encontrar en la Torá. Lo único que tienes que hacer es buscar y preguntar las cosas adecuadas.

Cuando estudiamos Torá, no estamos estudiando un texto abstracto del mundo antiguo, pasado de moda. Estamos estudiando la manera en como D-os quiere que vivamos de la mejor forma en la tierra. De hecho, nos inmiscuimos en el texto para descubrir la esencia del Judaísmo, que es la esencia de nosotros mismos.

Todos deberían estudiar Torá profundamente, aunque sea una vez en la vida.

Después de todo es el libro más vendido de todos los tiempos!

Comunicación Intergaláctica

Imagina que estás por recibir un mensaje del espacio, diciéndote que escribas ciertas instrucciones. Si no entendieras el significado del mensaje ¿qué es lo que harías? Las escribirías… y después las estudiarías!

De esta misma manera, no debes determinar que un párrafo de Torá es irrelevante sólo porque al principio no le encuentras sentido alguno. Es increíble como mucha gente está dispuesta a desacreditar el valor de la Torá inclusive sin haber hecho el esfuerzo de estudiarla!

Mira más profundamente lo que te está diciendo cada sección de la Torá, tanto cuando los mensajes parecen obvios como cuando no. Si algo en la Torá no es claro - sigue preguntando, buscando, escarbando.

Discútelo con otra gente. Averigua lo que realmente significa. Pregunta: "¿Cuál es el mensaje y cómo lo vivo?".

Y que no se te olvide… aprender hebreo. No hay forma de entender correctamente la Torá cuando está traducida. Sociedades enteras han mal interpretado la Biblia debido a malas traducciones!

Por ejemplo, la Torá usa diez diferentes Nombres de D-os. Estos Nombres no se refieren a diferentes dioses, sino que, por el contrario, se refieren a diferentes aspectos de D-os. Cada "Nombre" nos enseña algo único, pero en otro idioma están todos traducidos de la misma forma - y así se pierde mucha profundidad en el entendimiento.

El Tesoro Nacional

Lee la Biblia inteligentemente. Presta atención. La Torá no está relatando sólo historia y cuentos. Por el contrario, es "Torat Jaim"- literalmente: "instrucciones para la vida". Por esta razón, cada detalle contenido en ella es en si mismo un mensaje de cómo uno debe incrementar el valor y la calidad de su vida.

Todas las historias y mandamientos son mensajes filosóficos, que esperan ser revelados por una mente intelectualmente activa. Este es el enfoque que debemos tener al estudiar Torá. Si el mensaje es obvio, revisa debajo de la superficie. Si parece fuera de lo común, identifica el principio básico que debes aprender de eso.

Por ejemplo, en Génesis 18, Abraham está a la mitad de una conversación con D-os, cuando tres "extraños" pasan por su tienda. Inmediatamente Abraham corre a servir a los huéspedes. Ahora bien, ¿tiene sentido que haya dejado de hablar con D-os para ir a ayudar a extraños?!

De aquí aprendemos un principio muy profundo para la vida: es más importante "ser" como D-os, es decir, preocuparte por las necesidades de los demás, que hablar con D-os (ej. tener una experiencia espiritual).

Cada frase de la Torá tiene un significado infinito, no importa cuán insignificante parezca superficialmente. Fechas, nombres, números, eventos y linajes están ahí para enseñarnos algo. El diluvio, la torre de Babel, la división del Mar de los Juncos - todos estos eventos contienen la sabiduría más profunda de vida. La Torá es nuestro tesoro nacional. Revísalo!

La Torá: Herramientas Para Adquirir Grandeza

Todos quieren grandeza. Pero ¿qué dirías si pudieras ser tan grande como D-os? Luchar por este objetivo es en realidad uno de los 613 mandamientos!

¿Cómo llegas a eso?

Léela. Si todavía no has aprendido a leer hebreo, ve a una librería judía y cómprate una buena traducción.

Estúdiala. Observa lo que D-os nos dijo acerca de la vida. No esperes hasta que tu vida esté casi acabada.

Entiéndela. Haz preguntas hasta que entiendas el mensaje que contiene.

Compara cualquier aparente contradicción y resuélvela. No existen diferencias "accidentales".

Organízala. La sabiduría solamente es útil cuando la tienes en la punta de tus dedos. La Torá debe ser tu Enciclopedia, almanaque e índice para vivir.

Repásala, para poder recordarla.

Intégrala. Haz que las ideas sean parte de tu realidad. Estudia las instrucciones y aplica los principios a tu vida. Constantemente!

Profundízala. Cada vez intenta llegar a un nivel más profundo. La sabiduría de la Torá es infinitamente profunda.

Nunca Dejes de Estudiar

Tu educación académica pudo haber acabado, pero el estudio de la vida debe seguir por siempre. Cada idea y entendimiento nuevo es otro nivel de crecimiento. Puede ser que llegue el momento en el que llegues a ser igual de bueno que un "profesional". Pero en la vida nunca llegarás a ser la persona "buena" que puedes llegar a ser - porque puedes ser "bueno", pero una vez que lo eres, puedes hacerte "buenísimo".

La primera oración que se le enseña a un niño es: "Torá tzivá lanu Moshe, morashá kehilat Iaacov"- "la Torá fue ordenada a nosotros por medio de Moshé y es la herencia de cada Judío". La Torá fue ideada para todos. No está en el dominio de una clase privilegiada. Por el contrario, es un documento vivo que respira, es la sangre que le da vida al pueblo Judío. Es importante e indispensable que en todo momento nos involucremos personalmente en su estudio y práctica. Como dice (Iehoshúa 1:8): "Pensarás en ella día y noche".

El estudio de Torá está reconocido como la mitzvá más importante, porque abre la puerta para la observancia de otras mitzvot. Como dice el Talmud (Shabat 127a): "El estudio de Torá es igual a la suma de todas las otras mitzvot".

Rabí Akivá, en el Talmud, plantea que esperar que un judío viva sin Torá es como esperar que un pez viva sin agua.

Repasa la porción semanal de la Torá dos veces: Una vez solo y otra vez escúchala en la sinagoga en Shabat. Haz preguntas. Continúa estudiando toda tu vida.

El Tiempo Para Estudiar Es Ahora!

Maimónides escribe (Mishné Torá, Leyes del Estudio de Torá 3;7):

"Probablemente uno dice: "Voy a posponer mis estudios hasta que haya hecho dinero, y después regresaré y estudiaré. Voy a posponer mis estudios hasta que compre lo que necesito y piense menos en mi negocio y después regresaré y estudiaré".

Si piensas así, nunca tendrás el mérito de adquirir la Corona de la Torá. Por el contrario, haz tu trabajo algo temporario y tu estudio algo permanente. No digas: "Cuando tenga tiempo voy a estudiar", porque puede ser que nunca tendrás tiempo libre".

Hay gente que utiliza la excusa: "Estoy demasiado viejo para empezar a estudiar". Pero el estudioso del Talmud, Rabí Akivá, empezó a estudiar el Alef-Bet a los 40 años. Es el mismo Rabí Akivá que llegó a ser el más grande de su generación teniendo 24,000 alumnos!

Hay gente a la cual le cuesta trabajo empezar a estudiar porque no se imagina convirtiéndose en un estudioso - entonces "¿para qué empezar?" - se pregunta. Pero esa es una manera errónea de pensar. Cada gota de Torá es preciosa y eterna.

¿Por Qué La Torá Escrita es un Ingrediente Para la Sabiduría?

- La Torá es el libro que cambió al mundo - ¿cómo podemos no leerla?

- El propósito de los Profetas es recordarnos que debemos vivir una vida con la realidad de la Torá.

- Las Escrituras enfatizan el mensaje de D-os en un estilo poético. Es una ventana inspiradora de D-os para el mundo.

- La Torá está tan fresca como hace 3,500 años.

- Estudiar es una meta constante. Mientras vas madurando y tu conciencia de la realidad incrementa, podrás ir entendiendo los conceptos que pensaste que sabías bien.

- La Torá te ayudará a encontrar tu propia esencia.

- No saldrías a la carretera sin un mapa. Al andar por la vida, no dejes la Torá atrás.

Biografía del autor:

Rav Noaj Weinberg fue el fundador y director de Aish HaTorah Internacional. Por más de 40 años con sus programas educacionales atrajo a cientos de miles de Judíos de vuelta a su herencia.

Que la lectura de este artículo sea un mérito para elevar su alma.