lundi 18 avril 2016

A culpa e os conflitos religiosos

A libertação da culpa

Jorge Pinheiro


Algumas reflexões sobre a relação entre culpa e conflitos religiosos a partir da leitura de Culpa e Graça, de Paul Tounier, Ed. ABU, 1985, onde o autor coloca, no capítulo sete, a questão: “Quem pode se sentir culpado sem o ser? Ou sê-lo sem sentir, sem mesmo saber?

Podemos dizer que existem dois tipos de culpa. A falsa culpa, fruto de algum distúrbio psicológico, de um processo autopunitivo, e a culpa verdadeira. Mas, até mesmo a falsa culpa parece esconder uma culpa verdadeira. Ou seja, quer a autopunição ou qualquer outro processo psicótico, parece esconder uma outra culpa, diferente da obsessão apresentada. É para esconder essa culpa verdadeira, real, que o psicótico constrói uma outra: imaginária e obsessiva.

A questão tem solução no fato de que a culpa existe e é aceita pelo conjunto dos estudiosos que analisaram o tema, cada qual apresentando a perspectiva de sua escola ou visão de mundo. Assim, os freudianos mostrarão a frequência culpa-inferioridade; os jungianos, a recusa de aceitação integral de si mesmo; e Martin Buber, a recusa de aceitação do outro. Mas, para nós cristãos, fica claro que a culpa surge nos homens, quando O Eterno reprova no secreto de seus corações, ações e intenções.

A culpa pode ser observada como um fenômeno ou como a quebra de categorias de valor. Mas a maioria dos estudiosos analisa a culpa como fenômeno ou culpa funcional. A partir deste ponto de vista, a culpa seria sempre resultado da sugestão social, medo de tabus, de perda do amor de outrem, quando em choque com padrões originais. O resultado é um autojulgamento, um diferencial entre duas ordens de fenômenos.

Para os protestantes, sem esquecermos a realidade dos fenômenos analisados, a culpa está ligada a categorias éticas de valor, que remetem ao relacionamento entre o Eterno e o serhumano e hierarquizam-se no relacionamento da pessoa consigo mesma e com o próximo.

Assim, a visão funcional reflete diferentes interpretações de culpa, embora todas admitam a existência psicológica da culpa. As categorias éticas de valor vão além da discussão meramente funcional, pois coloca a questão em outro patamar: o importante não é saber se uma conduta é ou não culpada desde o ponto de vista social, mas se ela é ordenada ou não pelo divino de nossa fé.

É importante que a pessoa se liberte das pressões sociais. Mas, qualquer hierarquização de valores só terá sentido se partir da única oposição real entre a verdadeira e as falsas culpas, aquela que parte dos preceitos do Eterno e não das decisões estritamente humanas, do julgamento do Eterno e não do julgamento dos homens.

Mas a autenticidade de uma pessoa não significa que o seu posicionamento é correto em si. Isto porque não existe culpa sem conflito. Não existem conflitos apenas entre grupos ou interesses opostos. O conflito está presente até mesmo nas sociedades mais homogêneas e, logicamente, no humano. Para eliminar o conflito, é necessário retirar-se da vida.

Um pessoa autêntica é aquela que mantêm uma coerência entre o que pensa e o que faz. Essa autenticidade sem conflitos não existe. Sempre haverá momentos em que as duas coisas não se encaixarão. E aí estaremos diante de conflitos e culpa. Mas, ainda que existisse esse humano sem fissuras éticas, caberia perguntar: Até que ponto essa autenticidade tem uma base libertadora? De que vale ser autêntico, se a base de minha autenticidade é a alienação em relação ao eterno, ao próximo e a mim mesmo?

Donde, qual a correlação entre a subjetividade e a culpa? A culpa é sempre subjetiva, mesmo quando verdadeira. Porque, embora seja uma ruptura da ordem de dependência do humano em relação a Deus, é através do psicológico que Deus fala à alma humana. Assim, quer seja consciente ou não, não encontraremos culpa fora da subjetividade. E a cura da culpa, entendida como perdão e salvação do humano através da ação redentora do Eterno, acontecerá, embora não mecanicamente, também na área da subjetividade.

E como imbricamos conflito e culpa? O conflito faz parte da vida humana. É o choque permanente entre as estruturas mentais do ser e a realidade social. Nem sempre o pensar e o agir são harmônicos. Na maioria das vezes resolvem-se através de tensões e conflitos. E, sempre que a solução violenta as estruturas mentais do ser, temos a culpa. Os conflitos podem levar à culpa, mas culpa e conflito não são sinônimos.

Embora a culpa seja construída ao nível da subjetividade, ela parte de uma relação entre estruturas mentais e realidade social. Ou seja, implica sempre em uma ação, mesmo quando essa ação é mental. Nesse sentido, há uma mediação entre a estrutura mental e realidade social. Essa mediação é interação, produz sempre uma objetividade.

E podemos alcançar liberdade de culpa verdadeira, sem limpar primeiro as culpas psicológicas? Bem, a culpa verdadeira, que poderíamos chamar de culpa primordial, aquela que nasce da alienação do ser em relação a Deus, só pode ser curada por um ato do Eterno. Um ato da imanência do Eterno, que vem até ao humano para resgatá-lo de sua culpa. A libertação existencial da culpa real não necessariamente elimina culpas psicológicas. 

A consciência universal da culpa leva todos os homens, quer acreditem ou não em Deus, a tentarem exercer o papel que cabe exclusivamente ao Eterno: julgar o erro. O julgamento humano leva a falsas culpas, o julgamento do Eterno à culpa verdadeira. Quando o humano julga essas duas justiças se confundem perigosamente.

A relação Pater noster / imago Dei produz juízo de valores. Se é assim produz também sentimento de culpa. Na verdade, a relação entre pais e filhos produz juízos de valor. Isto porque a criança vê o mundo através dos pais. E os pais não transmitem às crianças apenas informações isentas de valor e normatização, mas julgamentos e culpas. Ao mesmo tempo, as crianças vivem num mundo imaginário onde, impossibilitadas de modificar a realidade através da práxis, o fazem através do sonho. Logicamente, haverá choques e conflitos entre a realidade da percepção de mundo adulta e esse imaginário infantil.

Os pais plasmam em seus filhos, através de julgamentos, uma série de culpas que chamamos infantis. Essas culpas impedem as crianças de ver e entender a culpa verdadeira. Diante do Eterno essas culpas infantis não pesam, e sim a culpa verdadeira.

Os pais julgam a conduta de seus filhos segundo a ótica dos adultos, com a experiência de vida que têm e seus filhos não. Quando acusam seus filhos de mentirosos, porque contam como verdadeiras as histórias que inventam, os pais não estão entendendo o mundo imaginário da criança. Para a criança o sonho é real. Mas a suspeita pode levá-la àquilo que desconfia. Poderá ser uma adulta mentirosa. Pois os pais construíram culpas na criança. Na verdade, o julgamento dos pais abafa o julgamento do Eterno, impede a criança de ouvir o que Deus está dizendo.

O pais devem educar a criança levando-a a ter um relacionamento pessoal, dela própria, com o Eterno. Devem educar, ou seja, mostrar a culpa verdadeira que todos temos e que só o Eterno cura, e assim afastá-la das culpas infantis, do medo da perda de estima e amor dos outros.  

Como entender o que o apóstolo Paulo escreveu em sua primeira carta aos coríntios (4.1-6), comparando seus argumentos com o conceito de julgamento, de sentimento de culpa, e a culpa real?

O texto é claro. Pouco importa ser julgado por terceiros ou por um tribunal humano. Ele próprio, Paulo, não julga a si mesmo. Sua consciência em nada o acusa, mas nem por isso está justificado. O Senhor é o juiz. Donde, ninguém deve julgar prematuramente, antes que o Senhor venha.

A palavra consciência exprime nas cartas do apóstolo valores propriamente cristãos. Quaisquer que sejam as normas exteriores, o comportamento do humano realiza-se ao nível de duas instâncias: o julgamento dele próprio (Atos dos apóstolos 23.1; 24.16; carta aos romanos 2.14-15; 9.1: 13.5; segunda carta aos coríntios 1.12; e o julgamento do Eterno, ao qual o primeiro julgamento está sujeito, conforme I Co 8.7-12; 10.25-29; e II Co 4.2.

Como enfrentar sentimento de culpa e o sentimento de culpa do próximo? O desafio é resolver a culpa real. Metanóia, perdão e liberdade em Jesus, o Cristo. A partir da liberdade todas as culpas funcionais estão cobertas pelo sacrifício vicário do Messias e somos “verdadeiramente livres”. Nenhuma culpa pesa sobre nós. Mas se nossa consciência continua nos acusando, se os cacoetes do passado permanecem, é bom procurar um profissional da área de Psicologia.

E para terminarmos estas reflexões sobre a libertação da culpa, cabe perguntar o que é saúde psicológica e o que é saúde espiritual?

Ora, saúde psicológica é a relação de equilíbrio entre as ações interiorizadas do humano e as exigências da realidade social. É a sua capacidade de resolver problemas com o menor grau de stress e culpa funcional, respeitando seus julgamentos pessoais.

Já saúde espiritual é aquela relação que nasce do relacionamento do humano que reconhece sua culpa real, liberto pela graça, com o Eterno. É o humano novo, que cresce no Espírito do Eterno, e produz frutos que se projetam na eternidade.


dimanche 17 avril 2016

O caminho da espiritualidade e da liberdade


A halakha[1] da espiritualidade e da liberdade
Jorge Pinheiro, PhD


A este povo dirás: Assim diz Iaveh: Eis que ponho diante de vós o caminho da vida e o caminho da morte. (Jeremias 21:8)

Pois os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos são os meus caminhos, diz Iaveh. (Isaías 55:8)

Primeiros passos ...

Théodore Monod[2] disse que não somos meio termo, mas complemento. Não somos cinza, mas cores do espectro. Na verdade, os escritos judaicos da Era Comum nos dizem que o Eterno construiu o ser humano e, em seguida, retirou-se para que este humano pudesse construir sua liberdade e o seu lugar. Dessa forma, o ser humano é potencialmente autônomo dentro dos limites da existência, constrói livre-arbítrio e, portanto, responsabilidade. 

Os escritos judaicos, entregues no caminhar da diáspora, entendem que o Eterno aposta na construção permanente do ser humano. A criação, vista dessa forma, não está completa, o ser humano, enquanto pessoa e comunidade, continua a criação. Por isso, a construção da espiritualidade é a chave para o futuro humano. É o que leva à criação permanente. Textos do misticismo judaico, como os da Cabala, quando falam do acesso ao mundo do Espírito, perguntam: "Você se tornou o que você é?" 

O ser humano, enquanto pessoa e comunidade, é criador de si mesmo. Sua vida é uma viagem com a finalidade do tornar-se. Ele deve saltar do "conhece a ti mesmo" para "tornar-se quem ele é" e "descobrir para que serve". É a viagem da existência humana, e a liberdade é uma viagem dentro de si mesmo, numa comunhão que engloba o cosmo, e deve ser realizada através do corte da pedra, símbolo do ser humano, do material em direção ao espiritual. 

O macho e o suspiro

"Adão teve relações com Eva, a sua mulher, e ela ficou grávida. Eva deu à luz um filho e disse: — Com a ajuda de Deus, o Senhor, tive um filho homem. E ela pôs nele o nome de Caim. Depois teve outro filho, chamado Abel, irmão de Caim. Abel era pastor de ovelhas, e Caim era agricultor. O tempo passou. Um dia Caim pegou alguns produtos da terra e os ofereceu a Deus, o Senhor. Abel, por sua vez, pegou o primeiro carneirinho nascido no seu rebanho, matou-o e ofereceu as melhores partes ao Senhor. O Senhor ficou contente com Abel e com a sua oferta, mas rejeitou Caim e a sua oferta. Caim ficou furioso e fechou a cara. Então o Senhor disse: — Por que você está com raiva? Por que anda carrancudo? Se tivesse feito o que é certo, você estaria sorrindo; mas você agiu mal, e por isso o pecado está na porta, à sua espera. Ele quer dominá-lo, mas você precisa vencê-lo. Aí Caim disse a Abel, o seu irmão: — Vamos até o campo. Quando os dois estavam no campo, Caim atacou Abel, o seu irmão, e o matou". (Gênesis 4:1-8)

O relato da história de Caim e Abel mostra o embate entre dois irmãos e dois modos de vida: de um lado temos o agricultor e de outro o pastor. A história dos dois irmãos personificam a fratura da "imago Dei" e a consequente alienação humana, em sua diversidade, distanciamento do Criador, alienação psicológica, sociológica e ecológica.

Quando nasce Caim, Eva -- do hebraico חַוָּה, hawa, vivente --, a Mãe, feliz diz: alcancei do Senhor um macho. Que é um trocadilho com o verbo qanah, adquirir, que vai dar a palavra Qayn. Em relação a Abel, seu nome hevel significa sopro, suspiro, uma brisa leve, no sentido de que teve vida curta e não deixou filhos.

A história do choque entre os dois irmãos, entre duas espiritualidades, conta que o Eterno recebeu de bom grado a oferenda de Hevel porque ele "ofereceu as melhores partes ao Senhor". Enquanto Qayn "um dia pegou alguns produtos da terra", ou seja, ofereceu com descuido, o que não lhe deu trabalho, o que tinha de sobra. 

O Eterno valoriza a sinceridade dos sentimentos que gera a oferta e não o contrário, por isso ele disse "odeio, eu detesto as suas festas religiosas; não tolero as suas reuniões solenes. Não aceito animais que são queimados em sacrifício, nem as ofertas de cereais, nem os animais gordos que vocês oferecem como sacrifícios de paz. Parem com o barulho das suas canções religiosas; não quero mais ouvir a música de harpas. Em vez disso, quero que haja tanta justiça como as águas de uma enchente e que a honestidade seja como um rio que não para de correr". (Amós 5:21-24).

Assim a história dos dois irmãos apresenta a metáfora da fratura psicológica, social, ecológica e espiritual da humanidade.

O caminhar sob missão

O caminhar com o Eterno não pode estar separado do colocar-se sob missão do Espírito, pois a construção da liberdade humana nasce da revolução do espírito e confronta as solidões dos caminhos próprios. 

Duas noções fundamentais, a do ser e a do devir, estão intimamente ligadas às ideias da halakha e da revolução permanente do espírito. Só o Eterno é único. Na tradição judaica, quando falamos "Ser" estamos a falar do Eterno. Mas os humanos caminham no sentido de se tornarem ser. Precisam caminhar sua viagem, simbólica, do material em direção ao espiritual, a fim de integrar, interiorizar a simplicidade sublime do Ser Eterno. É nesse sentido que o caminhar deve gerar harmonia, paz que leva à coexistência de progresso e tradição. 

Assim a história dos dois irmãos apresentam a metáfora da fratura psicológica, social, ecológica e espiritual da humanidade.

1. Ao nível psicológico, Qayn e Hevel apontem para o conflito entre o certo e o errado, entre o realizar os desejos na natureza humana e o viver a construção da liberdade humana no caminhar com o Deus Eterno. E neste conflito, quando a natureza humana é vitoriosa o embate resulta em morte, em fracionamento, em cisão do humano que somos.

Ao matar Hevel, Qayn se torna um pária de si mesmo, um nômade marcado pela falta daquilo que constitui a vida plena, a personalidade livre da culpa. Passa a ser uma pessoa que sem norte, que andarilha distante de sua integralidade como ser humano. É ser dividido, fraturado.

2. Ao nível social, Qayn e Hevel simbolizam duas humanidades, divididas, que se confrontam no correr da história.

É conflito permanente entre uma humanidade, simbolizada por Qayn, que se rebela, mata o irmão e através da violência assenhoreia-se da natureza, levando-a ao desequilíbrio e destruição; e outra humanidade, simbolizada por Hevel, que procura a comunhão com seu Criador, com seus irmãos, e com a própria natureza.

3. Ao nível espiritual, e este é o principal centro do relato, Qayn e Hevel apontam para uma fratura na alma humana em sua forma de se relacionar com o Deus Eterno.

Uma dualidade que definiu dois tipos de busca -- uma formal, estereotipada em valores próprios, e outra de colocar-se sob missão à vontade do Deus Eterno.

Espiritualmente, há uma divisão no âmago da alma humana, no relato do conflito entre Qayn e Hevel. É uma parábola do ser humano que sacrifica uma parte de seu ser. Qayn de agricultor passa a andarilho para depois se tornar um construtor de cidades. E Abel de pastor torna-se símbolo da fé sob missão e, num contexto espiritual, de mártir da entrega ao Deus Eterno.

Qayn é a metáfora de uma humanidade que mata dentro de si o Hevel da entrega e da vida plena em sintonia com a vontade de Deus. E para não viver como andarilho, na solidão de si mesmo, Qayn funda uma cidade. É sua forma de dizer não à vontade de Deus Eterno, que considera injusta.

A liberdade do partir do pão

A comunidade de fé, enquanto comunhão, não deve ser obstáculo para o caminhar espiritual. Ao contrário, compreendido o conceito de comunidade, de estar junto para repartir o pão, tal comunhão não deve desenvolver ambição, orgulho ou reflexo xenófobo, mas abertura para o humano. Seu significado não é excluir a fraternidade, mas estendê-la da comunidade em direção a todos os humanos. O objetivo é difícil, mas não há esperança se não perseveramos em direção ao sucesso.

Aprender a liberdade é o primeiro momento dessa construção, comemorada na Páscoa, enquanto caminhar em esperança. Caminhamos em direção ao outro e para cima. Esta tradição foi transmitida aos judeus pela Torá, e está presente nos 613 mandamentos, em que se baseiam a coesão da comunidade judaica. 

O caminhar associado a revolução permanente do espírito deve levar a uma espiritualidade que voa acima de dogmas e formalizações. É um caminhar baseado na fraternidade universal. Donde, tradição e progresso podem fazer sentido na existência do humano, enquanto elo da cadeia da vida. 

Nesse caminhar descobrimos, conforme nos foi revelado, que o Eterno é impensável, incognoscível e impenetrável, mas presente no universo em todos os seus planos. O Eterno não pode ser nomeado. A única designação autêntica é precisamente a rejeição de qualquer definição é "ein Sof"[3], aquele que não tem fim, Eterno. O Espírito absoluto é essência por si só. O Eterno é o único, única manifestação visível do invisível. Mas a harmonia universal resulta da complementaridade dos opostos. A vida é um ponto na eternidade. 

Devemos ser, todos nós humanos, aqueles que esperam pelo mundo do Espírito. E o caminhar na liberdade do Espirito nos leva ao amor, que é chave para a comunhão. Pois, amar o outro é reconhecer que ele também foi criado para a liberdade do Espírito. É com ele caminhar em direção ao sentido pleno da vida. 

O amor dá dignidade ao caminhar. Semeia as sementes da revolta contra a injustiça e a opressão, inclusive religiosa. Reconhece o fato de que o sofrimento é um desequilíbrio do mundo. Mas, a liberdade do Espírito nos dá consciência, de que o amor não pode ser rebaixado a concepções que degradam a dignidade do ser humano. Ou seja, amar o outro não é fé, não é destino, é ato de construção do espírito e da liberdade com todos e todas.

E a halakha se constrói caminhando ...

É por isso que dizemos: Abel, um humano sob missão, foi o primeiro mártir espiritual da humanidade -- aponta para Jesus, o Cristo.

"Jesus foi com os discípulos para um lugar chamado Getsêmani e lhes disse: — Sentem-se aqui, enquanto eu vou ali orar. Então Jesus foi, levando consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu. Aí ele começou a sentir uma grande tristeza e aflição e disse a eles: — A tristeza que estou sentindo é tão grande, que é capaz de me matar. Fiquem aqui vigiando comigo. Ele foi um pouco mais adiante, ajoelhou-se, encostou o rosto no chão e orou: — Meu Pai, se é possível, afasta de mim este cálice de sofrimento! Porém que não seja feito o que eu quero, mas o que tu queres". (Mateus 26.36-39)

"Ele tinha a natureza de Deus, mas não tentou ficar igual a Deus. Pelo contrário, ele abriu mão de tudo o que era seu e tomou a natureza de servo, tornando-se assim igual aos seres humanos. E, vivendo a vida comum de um ser humano, ele foi humilde e obedeceu a Deus até a morte — morte de cruz". (Filipenses 2:6-8)

Eis o desafio da halakha, seguir o caminho aberto por Abel -- da humanidade sob missão à vontade do Deus Eterno. 

Eis o desafio da halakha, seguir o caminho de Jesus, o Cristo -- que ao abrir mão do aparente que se deteriora, nos ensinou a construir a espiritualidade e a liberdade que fazem de cada um de nós humanos de fato. E é este caminhar que nos leva a dizer: não se faça o que quero, mas o que Tu queres. 

Notas

[1] A halakha ou lei judaica, é um ramo da literatura rabínica. Ela trata das obrigações religiosas às quais devem se submeter os judeus em suas relações com o próximo e com o Eterno. Ela engloba todos os aspectos da existência. Aqui vamos utilizar halakha em seu sentido mais amplo de caminho. 
[2] Le Chercheur d’absolu, Le Cherche midi, 1997.
[3] Ein Sof ou ayn Sof, (hebraico אין סוף), na Cabala, é entendido como Deus antes de Sua automanifestação na produção de qualquer reino espiritual, provavelmente derivado do termo de Ibn Gabirol, "o único Infinito". Ein Sof pode ser traduzido por "sem fim", "interminável", "não há fim", ou infinito.

















































Notas políticas de Antenor da Conceição

Notes polítiques d'Antenor da Conceição


Qui sap ... Potser aquestes notes serveixen als companys en el futur. O fins i tot per a mi, quan falla la memòria. Qui sap ... Maquiavel va escriure al príncep, escric per als companys.

En primer lloc, em proposo fer que la discussió sobre la relació entre la construcció del partit revolucionari i el Partit dels Treballadors. I proposo un criteri metodològic.

Les dues bases fonamentals de qualsevol pensament lògic dialèctic se'ls dóna la relació correcta o no per fer entre l'estructura i gènesi. A diferència de l'estructuralisme, que violentament va enfortir després de maig de 1968, es diu que l'essència d'un objecte o un fenomen es troba en l'estructura, però predomina en la gènesi, que no només dóna el que és, sinó que també ho serà. Definir l'essència d'un fenomen només l'estructura és un error d'esquerra, i definir l'essència de la dinàmica estan caient en l'oportunisme o rightsism. Però és la correlació d'aquests dos conceptes lògics que podem treure conclusions correctes.

En general, però vagi amb compte, ja que qualsevol generalització seria un error, es diu que la dinàmica ens dóna l'estratègia i estructura ens dóna les tàctiques, tant generals, com la immediatesa, per obtenir l'estratègia.

Expliquem això sembla complicat, amb aquesta broma "maó i Mandel." Quan Mandel diu: "Arriba el maó" la seva preocupació és l'estructura, maó, i no respon al moviment. És a dir, no respon a la "no". I no només per respondre a la dinàmica pateix una fractura.

Ara ens anem a l'estructura, però per obtenir el impuls. Podem deixar el que tenim, l'estructura, que és un fràgil Convergència Socialista, amb diferències internes, però hi ha tant a nivell de la societat en la lluita de classes. Però quan parlem de la societat en què vivim, la lluita de classes, ja estem parlant sobre la dinàmica. En altres paraules, estem parlant de la "no". Aquí ve l'obertura política, hi ha la democràcia burgesa, s'arriba a la reorganització del partit, no és burgesa, crostes, estalinistes voler acaudilhar la unió moviment de masses, el treball i el comerç. I?

Si no entenem "no" no tenim respostes als "com baixar el cap per aquest maó anomenada democràcia aixafar el nostre cervell." Si entenem el "aquí ve" ens preocupa l'estratègia, és a dir, per què construir un partit bolxevic. No obstant això, aquesta estratègia no tindrà base real si ens oblidem de la vida real, dinàmic i lluita de classes al dia, no inclouen els dos fenòmens més importants dels últims dos anys, el moviment sindical independent i la seva expressió política de partit, el Partit dels Treballadors.

Per assolir l'objectiu estratègic és necessari per tornar al punt de partida. Ha de tornar a la part fluixa, amb una direcció política feble i sense I és exactament d'aquesta estructura, que és el que tenim, veurem com i què tàctiques a implementar per aconseguir aquesta estratègia determinada per la dinàmica.

Trotskisme a nivell de la lògica de formigó va fer una important contribució teòrica, que és el concepte de programa de transició. És a dir, entre dos extrems, el retard real i el real possible, determinar les tàctiques són aquells que tenen elements de fet, l'aparentment menor a vegades es fan imprescindibles. És a dir, entre la realitat i immediata la possible real és necessària la construcció d'un pont, que és un programa, que és una teoria, i que es convertirà en un veritable superior immediat a través de la seva pròpia pràctica. Sembla difícil, però no ho és.

Anem a veure. Avui tenim una fràgil partit, dividit. Tal com és, aquesta festa és per a poc i molt poc temps. Tampoc és tornar al passat: de ser un partit abans de respondre a una altra dinàmica, quan era un moment sense la democràcia, la clandestinitat i el nostre treball era fer propaganda política.

Però la veritable immediata és aquest bastard part fràgil i dividit. La possible real és el partit bolxevic de les masses, hem de construir, de fet, vol donar una resposta al moviment ascendent de les masses, les reivindicacions i els treballadors i dels descontents populars i, més que això, si anem a crear les condicions per a un dia ens posem com una alternativa de poder. Per a això necessitem una teoria, un programa que defineix les tàctiques generals necessaris per arribar al partit revolucionari. Aquesta és la pregunta, quin és el pont, o quines són les mesures que prenem? Però abans de parlar de les mesures que hem d'estar mirant cap al futur, amb el peu en el present.

I ara anem a parlar de les tàctiques generals, és a dir, un pont, o la forma d'inclinar el seu cap abans d'arribar al totxo.

L'aparició del moviment sindical independent a nivell nacional, així com la seva superestructura i partidista expressió política, el Partit dels Treballadors, és un fenomen que ha de guiar la nostra tàctica en general, ja que és el fenomen més important que la realitat ens ha donat en els últims dos anys. El moviment sindical independent i el Partit dels Treballadors és el camí cap a les masses mobilitzades, i la possibilitat de la construcció de les adreces dins del moviment, reconeguts pel propi moviment. No jugar del que vam fer el 1978 amb la Convergència Socialista, perquè ara estem treballant amb una mica més gran, que té la seva pròpia dinàmica. en el millor de nosaltres podem ser els co-autors del crim.

El moviment independent dels treballadors és la tàctica més general. El Partit dels Treballadors és una tàctica dins d'aquesta tàctica general. Depenent de la situació moviment de masses, la reorganització del partit i la força i el posicionament d'altres sectors de l'esquerra, el Partit dels Treballadors es pot transformar en la síntesi d'aquest fenomen és el moviment independent dels treballadors.

Però cal entendre una cosa: els sindicalistes i els treballadors estan prenent un salt en la història del Brasil, lògicament ple de contradiccions. El que per a nosaltres en el pla de la teoria pot ser simple per a ells és una construcció que va costar anys d'experiència. En aquest sentit, les nostres tàctiques immediates en relació amb el moviment dels treballadors i el Partit dels Treballadors és unir forces. Cal tenir en compte que els treballadors estan arribant a PT de treball sindical. Per tant, és un art com combinar les coses. Saber ser pacient en relació amb el treball específic, sense fer un desastre a causa d'errors tàctics en relació amb la política sindical. La clau és treballar en i amb el moviment i el nostre enfortiment i el Partit dels Treballadors. Exactament per què a vegades hem de ser pacients per a l'específica, per poder parlar sobre el que és important. Però, dialècticament, la millor unió som, més confiança tindrem entre els companys.

Però també cal tenir en compte les característiques particulars, subjectius, psicològics, aquest dirigent amb el qual estem treballant. Si és personalista, que és molt comú en els agitadors i els líders del moviment de masses, hem d'evitar que sembli que estem competint amb ella. Sempre cal evitar els arguments més dures i violentes en públic.

[Aquest text va ser data de maig 1984].

samedi 16 avril 2016

Dilma defende ...

Política e protestantismo

Política e protestantismo
Primeira parte


Por que setores do protestantismo são arredios à participação política partidária e à ação junto ao Estado? Resolvi, então, tecer algumas considerações sobre o problema, tomando como referencial, um protestante luterano chamado Karl Barth, que foi um homem ligado, durante toda a vida, ao Partido Social-Democrata Alemão: começou sua militância nos anos 1920 e mesmo depois da segunda guerra mundial se manteve fiel ao partido, até morrer. E nem por isso deixou de ser um teólogo que marcou o pensamento cristão no século XX. Barth escreveu um livro, Comunidade Civil e Comunidade Cristã, que ainda hoje é uma referência quando se deseja pensar a correlação entre fé cristã e política.

Diz Barth que “a orientação da ação política cristã, de uma ação que se compõe de discernimento, juízo e eleição de uma vontade e de um compromisso, está relacionada com o caráter duplo do Estado: possui ao mesmo tempo a possibilidade de oferecer e a necessidade de receber a imagem analógica do Reino de Deus que a igreja anuncia”.

Ora, e por que Barth faz esta referência ao caráter duplo do Estado, vendo nele a imagem analógica do Reino de Deus? Porque sabemos que a autonomia protestante surgiu em oposição à cultura autoritária da Idade Média. A organização econômica e espiritual da Idade Média estava fundada sobre um sistema centralizado da autoridade que, ancorado numa fé sobrenaturalista, sujeitou pessoas e povos.

A Reforma, que partiu do humanismo renascentista, golpeou o sistema de autoridade, trouxe a fé para o mundo cá de baixo, e valorizou a subjetividade da consciência pessoal. A partir de então a autonomia se tornou palavra-de-ordem política, religiosa e teológica. Se a Reforma magisterial levantou a bandeira da liberdade moral e intelectual do indivíduo, os anabatistas e todos os outros irmãos da Reforma radical viram a igreja como organismo autônomo, que deveria ter autodeterminação administrativa, político, e religiosa diante de qualquer instituição civil e, principalmente, do Estado. 

Anulado o sistema centralizado de autoridade, coube ao crente protestante decidir a que comunidade de fé ele queria ligar-se e se desejasse virar às costas a tudo que fosse Estado.

Isso significa que em relação à cidadania representativa, traduzida nas eleições, a cada dois anos protestantes e evangélicos devem se posicionar e escolher o melhor para o país. E é nesse momento que são bajulados e envolvidos com promessas nem sempre sérias ou reais. Mas, eu diria que o que desejamos não deve ser menos do que a rainha mãe do príncipe Lemuel propôs a ele.

sf (gr demokratía) 1 Governo do povo, sistema em que cada cidadão participa do governo; democratismo. 2 A influência do povo no governo de um Estado. 3 A política ou a doutrina democrática. 4 O povo, as classes populares.

Muitos políticos, enganados por maqueteiros e pelos exageros da mídia, pensam que o voto protestante e evangélico é voto de cabresto, dirigido e manipulado por pastores. Estão equivocados. As estatísticas mostram que até mesmo nos agrupamentos evangélicos mais tradicionais, o momento do eleitor diante da urna é pessoal e intransferível.

“O Estado não pode ser uma réplica da Igreja, nem uma antecipação do Reino de Deus. Em sua relação com a Igreja tem realidade própria e necessária e em sua relação com Deus representa – da mesma maneira que a Igreja – um fenômeno puramente humano, acompanhado de todas as características deste mundo temporal. Não se pode pensar em identificá-lo nem com a Igreja, nem com o Reino de Deus. Mas, por outra parte, desde o momento em que está fundado sobre uma disposição particular da vontade divina, e porque pertence na realidade ao Reino de Cristo, não se pode dizer que seja autônomo. Não poderia existir independentemente da Igreja e do Reino de Deus”.

A pessoalização do fenômeno protestante na política é a resposta dos cristãos não-católicos para os problemas terrenos que todos vivemos. Há um deslocamento do plano transcendental e tal postura cumpre um papel político: cada protestante ou evangélico mostra-se auto-suficiente de pastor ou doutrinas no momento da urna. Essa pessoalização frente à sua fé religiosa, às suas lideranças questiona a realidade social desigual e desumana, e possibilita uma resposta representativa e indireta frente aos problemas da nação.

É claro que a posição dos protestantes e evangélicos nem sempre caminha no sentido das sábias palavras da rainha-mãe de Lemuel. Entram aí, a pressão massificadora da mídia e vários outros fatores, alguns, sem dúvida, pessoais e de amizades. 

sf (in+dependência) 1 Estado ou qualidade de independente. 2 Libertação, restituição ao estado livre; autonomia. 3 Caráter independente. 4 Meios de fortuna bastantes que permitem a uma pessoa viver independentemente. I. de plataforma, Inform: capacidade de um programa ou rede de poder funcionar ou conectar-se com tipos incompatíveis de hardware.

Muita gente acha que ser protestante e ação política não se discutem. É o outro lado da moeda. Se por um lado, há gente que pensa, como dissemos acima, que ação protestante é voto de cabresto, há outros que acham que esse tema nem deve fazer parte da pauta protestante de vida. Ledo engano. Precisamos refletir sobre a relação entre violência e democracia e, por outro lado, entre estas e o protestantismo. Um simples olhar sobre a história do Ocidente mostra os imbricamentos existentes entre democracia, cristianismo e violência. Como podemos esquecer, por exemplo, a Inquisição? Ou a noite de São Bartolomeu? Ou mesmo a violência dos invasores europeus na América conquistada? A democracia, e os protestantes brasileiros compreendem essa realidade, conquistada a duras lutas, é o caminho que pavimentamos para colocar de lado a violência que se fez como razão de estado ou em nome de Deus. Nesse sentido, o primeiro sentido da ação protestante traduz o sentido da defesa da democracia e da liberdade.

“Por esta razão não se poderia falar de uma diferença absoluta entre a Cidade e a Igreja por um lado, e a Cidade e o Reino, por outro. Logo, fica uma possibilidade: desde o ponto de vista cristão, o Estado e sua justiça são uma parábola, uma analogia, uma correspondência do Reino de Deus que é o objeto da fé e da prédica da Igreja. Como a comunidade civil constitui o círculo exterior em cujo interior se inscreve a comunidade cristã, com o mistério da fé que ela confessa e proclama. As duas, tanto uma como outra, têm o mesmo centro do qual resulta a primeira, distinta pelo princípio no qual está fundada e pela tarefa que lhe corresponde, se encontra forçosamente na relação analógica com a verdade e realidade da segunda. Analogia no sentido de que a Cidade é capaz de refletir indiretamente, como por um espelho, a verdade e a realidade do Reino que a Igreja anuncia”.

Por isso, talvez, a ação protestante na política deve levar em conta os conselhos da rainha-mãe do príncipe Lemuel e a pergunta do profeta Miquéias (6.7-8), aos israelitas: 

“Será que o SENHOR ficará contente se eu oferecer milhares de carneiros ou milhares e milhares de rios de azeite? Será que deverei oferecer o meu filho mais velho como sacrifício para pagar os meus pecados e as minhas maldades? O SENHOR já nos mostrou o que é bom, ele já disse o que exige de nós. O que ele quer é que façamos o que é direito, que amemos uns aos outros com dedicação e que vivamos em humilde obediência ao nosso Deus”. 

Os protestantes devem se mobilizar por respostas políticas que dirigem à justiça, paz e alegria. E essas coisas, mas do que discursos são ações, que mudam corações e mentes.

sf (solidário+e+dade) 1 Qualidade de solidário. 2 Estado ou condição de duas ou mais pessoas que repartem entre si igualmente as responsabilidades de uma ação, empresa ou de um negócio, respondendo todas por uma e cada uma por todas. 3 Mutualidade de interesses e deveres. 4 Laço ou ligação mútua entre duas ou muitas coisas dependentes umas das outras. 5 Dir Compromisso pelo qual as pessoas se obrigam umas pelas outras e cada uma delas por todas. 6 Sociol Condição grupal resultante da comunhão de atitudes e sentimentos, de modo a constituir o grupo unidade sólida, capaz de resistir às forças exteriores e mesmo de tornar-se ainda mais firme em face da oposição vinda de fora. S. ativa, Dir: solidariedade em que cada um dos credores da mesma obrigação pode exigir do devedor não somente a sua parte da dívida, mas também a dos demais. S. orgânica, Fisiol: relação necessária que se estabelece entre um ato da economia e outro diferente que se produz em ponto muito afastado. S. passiva, Dir: aquela em que cada um dos devedores de um mesmo título responde pela soma total da dívida. S. social: consistência interna de um agregado social; coesão social.

sf (cooperar+ção) 1 Ato de cooperar; colaboração; prestação de auxílio para um fim comum; solidariedade. 2 Organização da vida econômica, baseada no princípio de "fazer retornar o lucro" ao consumidor.

sf (lat foederatione) 1 Polít Associação de Estados num Estado coletivo, conservando cada um a autonomia nos assuntos locais: Federação das duas Rodésias e da Niassalândia. 2 União política de nações; liga. 3 Associação de entidades para um fim comum: Federação das Indústrias.

A ação protestante, segundo Karl Barth


Protestantismo e política




O teólogo Karl Barth escreveu um livro, Comunidade Civil e Comunidade Cristã, que pode nos ajudar numa leitura da correlação entre política e protestantismo. E hoje vou publicar aqui um trecho do capítulo 14, traduzido por mim de uma edição publicada em 1973, em Montevidéu.

“A orientação da ação política cristã, de uma ação que se compõe de discernimento, juízo e eleição de uma vontade e de um compromisso, está relacionada com o caráter duplo do Estado: possui ao mesmo tempo a possibilidade de oferecer e a necessidade de receber a imagem analógica do Reino de Deus que a Igreja anuncia”.

“O Estado não pode ser uma réplica da Igreja, nem uma antecipação do Reino de Deus. Em sua relação com a Igreja tem realidade própria e necessária e em sua relação com Deus representa – da mesma maneira que a Igreja – um fenômeno puramente humano, acompanhado de todas as características deste mundo temporal. Não se pode pensar em identificá-lo nem com a Igreja, nem com o Reino de Deus. Mas, por outra parte, desde o momento em que está fundado sobre uma disposição particular da vontade divina, e porque pertence na realidade ao Reino de Cristo, não se pode dizer que seja autônomo. Não poderia existir independentemente da Igreja e do Reino de Deus”.

“Por esta razão não se poderia falar de uma diferença absoluta entre a Cidade e a Igreja por um lado, e a Cidade e o Reino, por outro. Logo, fica uma possibilidade: desde o ponto de vista cristão, o Estado e sua justiça são uma parábola, uma analogia, uma correspondência do Reino de Deus que é o objeto da fé e da prédica da Igreja. Como a comunidade civil constitui o círculo exterior em cujo interior se inscreve a comunidade cristã, com o mistério da fé que ela confessa e proclama. As duas, tanto uma como outra, têm o mesmo centro do qual resulta a primeira, distinta pelo princípio no qual está fundada e pela tarefa que lhe corresponde, se encontra forçosamente na relação analógica com a verdade e realidade da segunda. Analogia no sentido de que a Cidade é capaz de refletir indiretamente, como por um espelho, a verdade e a realidade do Reino que a Igreja anuncia”.

O texto pode parecer um pouco difícil, mas vale a pena. Desde já, uma boa reflexão sobre o ser protestante e que o Eterno abençoe a todos e todas.