Um, dois, três... Na contramão com Aristófanes | ||
. | ||
| ||
Os corpos entendem as solidões, as loucuras dos desejos, os abismos do prazer. Se após a união dos corpos, a solidão é parceira, o corpo é este pedaço de mim nunca completado. Ou seja, num momento de sinceridade, amamos ter alguém em quem confiar, e se possível a ponto de podermos revelar nosso lado íntimo. É, acho que gostaríamos muito poder confiar àqueles que gozam de nossa intimidade alguns dos sentimentos que guardamos lá dentro. Talvez, por isso, nos sentimos atraídos por grupos de relacionamentos como facebook, twitter e outros. É isso mesmo, no raso e no fundo, queremos amar e ser amados. Às vezes no silêncio da noite/ Eu fico imaginando nós dois/ Eu fico ali sonhando acordado/ Juntando o antes, o agora e o depois (“Sozinho”, de Caetano Veloso e Peninha). Por isso, a pergunta procede: o que nos impede de abrir o coração e amar? Tememos riscos? Que riscos? Vamos pensar sobre isso com o poeta Aristófanes, lá no Banquetede Platão. Ele disse que antigamente a natureza não era como é hoje. Nossos ancestrais eram duplos, mas tinham uma unidade perfeita. Cada homem constituía um todo, de forma esférica, com costas e flancos arredondados. Tinham quatro mãos, o mesmo número de pernas, dois rostos idênticos num pescoço redondo, mas uma cabeça única para o conjunto desses dois rostos opostos um ao outro. Tinham quatro orelhas e dois órgãos sexuais. Por que você me deixa tão solto?/ Por que você não cola em mim?/ Tô me sentindo muito sozinho Essa dualidade genital explica por que não havia dois e sim três gêneros na espécie humana: os machos, que tinham dois sexos de homem, as fêmeas, que tinham dois sexos de mulher e os andróginos, que tinham ambos os sexos. O macho, conta o poeta, era filho do Sol, a fêmea filha da Terra, a espécie mista da Lua, que participa do Sol e da Terra. Todos tinham uma força impressionante, e, por isso, tentaram escalar o céu e combater os deuses. Para puni-los, Zeus decidiu cortá-los em dois, de cima a baixo, como se corta uma laranja. Então se acabou a completitude, a unidade, a felicidade! A partir de então cada um é obrigado a buscar o outro pedaço. Agora, estamos separados de nós mesmos. Esse desejo de busca é o que Aristófanes chamava amor, e, quando satisfeito, é a condição da felicidade. Somente o amor reconstrói a natureza, ao fundir dois seres num só. Por isso, para o poeta uma pessoa seria homoafetiva, heteroafetiva ou andrógina, conforme a unidade perdida. Assim, a partir do mito, Aristófanes considera que quando uma pessoa -- tenha ela inclinação por homens ou mulheres – encontra a sua metade, transforma-se num prodígio de amor e ternura. Por que você me esquece e some?/ E se eu me interessar por alguém?/ E se ela, de repente, me ganha? Essa é a definição do amor fusional de Aristófanes, que faria voltar à unidade da natureza primeira, que libertaria da solidão, e que seria, tanto nesta vida como na outra, a maior felicidade a ser alcançada. Mas, por necessitar duas pessoas tal fusão, hoje, é sempre um momento e, por isso, longe de abolir a solidão, a confirma. Se as almas pudessem se fundir seria outra coisa, mas são os corpos que se fundem, por um momento. Caetano nos dá a trilha http://www.youtube.com/watch?v=wb4RauhteFA Daí o fracasso. Todos querem ser um só, mas eis todos mais do que nunca sendo dois, sempre. Por isso, os romanos diziam que post coitum omne animal triste. Mas se o amor não nasce dessa fusão de corpos, nasce o prazer. Ou, podemos dizer, os corpos entendem mais de Eros do que os especialistas. Os corpos entendem as solidões, as loucuras dos desejos, os abismos do prazer. Se após a união dos corpos, a solidão é parceira, o corpo é este pedaço de mim nunca completado. Detalhe: Platão detestava Aristófanes. E o relato hebreu, que mergulha nas profundezas da existência, não deixa por menos, somos dois mesmos, sempre. E é do diferente, do divergente, que deve nascer a unidade. Ou como disse o homem de Nazaré, e ambos serão uma só carne. E se isso é bênção ou maldição, acho que depende de cada dois. Ou você me engana/ Ou não está madura/ Onde está você agora? (“Sozinho”, de Caetano Veloso e Peninha). 6/11/2010 Fonte: ViaPolítica/O autor |
vendredi 10 février 2012
Os corpos entendem de solidões
mardi 7 février 2012
Um sermão necessário
A Realidade da
Graça
Ler: Evangelho de Lucas 4.14-30
Introdução
A graça é algo intocável, que está além de nós, que
vem do Eterno. Mas, através da presença de Jesus, que vive em nós, essa graça
intangível se transforma em vida, em realidade visível e palpável.
A graça do Eterno vai além de nós, é independente de
nós, mas ao ser vivida, nós faz portadores dela. Eu e vocês sabemos que a fé
vem pelo ouvir, porque assim nos diz a Palavra do Eterno. Essa Palavra
maravilhosa vem do Eterno, para nós. Ao ser vivida por nós continua sendo
transcendente, mas também passa a ser imanente, passa a ser realidade divina
vivida por nós.
Assim surge a fé, enquanto poder que transforma e
leva graça aos homens e mulheres deste mundo. Essa notícia tão especial, esse
Evangelho da graça, muda as vidas e as comunidades. É a Palavra que veio do Eterno, que invadiu nossas vidas, que podemos recebê-la, pronunciá-la e deixar
que transforme tudo que está ao nosso redor.
A realidade da graça, ao ser vivida e pregada, vai
transformando a o mundo e sua história. E é isso que aprendemos com Jesus, que
ao inaugurar seu ministério terreno, apresentou àquela pequena comunidade da
Galiléia seu programa de ação. O programa do Evangelho de Jesus Cristo.
A primeira parte da missão de Jesus (4.14–9.50) é
toda situada na Galiléia (cf. 23.5; At 10.37). Ao contrário de Mateus (15.21;
16.13) e Marcos (7.24-31; 8.27), Lucas abre a comissão de Jesus com a cena da
pregação na sinagoga de Nazaré (4.16-30), que descortina toda a seqüência do
evangelho: o anúncio da salvação fundamentado nas promessas do Antigo
Testamento e inspirado pelo Espírito, a salvação dos não judeus, a rejeição
de seus compatriotas e a tentativa de assassinato.
No texto, Lucas descreve duas questões centrais: em
primeiro lugar o programa de Jesus e, em segundo lugar, o destinatário da
mensagem. Assim, os versículos 18 e 19 apresentam o programa e os versículos
23-27 seu público, os gentios.
O programa
Jesus foi ungido, escolhido pelo Eterno, e sob a ação
do Espírito – ação esta que caracteriza o verdadeiro profeta – tem como
missão proclamar e libertar. Seu programa é formado por quatro pontos:
[A] anunciar a boa nova aos pobres.
[B] proclamar a libertação aos cativos.
[C] dar vista aos cegos.
[D] por em liberdade os oprimidos.
O programa destaca duas idéias a de
anunciar/proclamar/pregar e a de libertar/salvar.
Anunciar/ proclamar
A idéia de proclamar está presente no Antigo
Testamento, já que a missão profética era, sobretudo, proclamatória. De Samuel
a Jeremias – incluídos nesse período de ouro homens como Samuel, Natã, Gade,
Azarias, Elias, Eliseu, Joel, Miquéias, Micaías, Isaías e Jeremias -- esses
anunciadores da vontade de Deus falaram aos reis e ao povo. Advertiam,
repreendiam, encorajavam. Falavam de julgamentos e de promessas espetaculares.
Traduziam grandeza de caráter e força moral.
E assim também foi o último período da profecia
hebraica, de Ezequiel a Malaquias. No período helênico, graças às reuniões nas
casas de oração, sinagogas, a proclamação se generalizou. As Escrituras eram
lidas e interpretadas.
João, o batista, foi um anunciador da chegada do
reino. E Jesus, ali na sinagoga de Nazaré, colocou em seu programa a tarefa da
proclamação.
Libertar/ salvar
O conceito de libertação no Antigo Testamento parte
da idéia de livramento e de segurança. A pessoa de um libertador no AT traduz
sempre a imagem do libertador como alguém que arrebata um povo da destruição
(Jz 18.28). E no Novo Testamento, o
libertador era aquele que soltava os israelitas da escravidão (At 7.35), ou que
arrancaria a nação da impiedade (Rm 11.26).
Para todo o judeu, na época de Jesus, o ato mais
característico de libertação ocorreu sob a liderança de Moisés, quando Deus
salvou seu povo da escravidão aos egípcios e o libertou no deserto do Sinai (Ex
12.31—14. 31).
É fundamental entender que a libertação da
escravidão egípcia definiu para os judeus do período helênico o paradigma da
libertação como um ato de Deus que não visava apenas o alívio de uma situação
desastrosa. Mas, e aí está a chave do conceito de aliança, para que livres
possam servi-lo. Essa idéia fundamenta o conceito de aliança e da
espiritualidade judaica até o primeiro século.
O texto usado por Jesus é a leitura de Isaías
61.1-2. Ao ler o texto e dizer que ele próprio é o cumprimento da profecia,
Jesus cria uma nova hermenêutica, que será amplamente utilizada por todos os
escritores do Novo Testamento. Ele é o intérprete inspirado, ungido, no
cumprimento do que foi anunciado e que está presente nesse kairós para o
desenlace dos últimos tempos – proclamar o ano aceitável do Senhor.
Partindo dessa hermenêutica, os escritores do NT, e Lucas entre eles, lerão o
Antigo Testamento à luz do fato Jesus. [Um jubileu na era da pos-modernidade,
Sandra Mansilla, in Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana no
33, p. 150, São Paulo, Vozes, 1999].
Uma questão atual
Em
nenhum lugar das Escrituras Sagradas vamos encontrar uma fórmula ou proposta
acabada de governo. A busca de um ideal divino de governo é uma herança da
filosofia grega. O que encontramos nas Escrituras são exigências normativas
quanto à justiça. [Walter Elwell, Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja
Cristã, vol. II pp. 209-210, São Paulo, EVN, 1990].
Um estado moderno é bem diferente dos impérios
antigos, embora alguns dos problemas humanos como a fome, a opressão e as
guerras aparentemente sigam antigos padrões. Por isso, se por um lado devemos
olhar as diferenças, por outro é necessário analisar semelhanças que
possibilitam definir respostas éticas para as sociedades. De todas as maneiras,
devemos avaliar de modo crítico nossas tradições políticas e ideológicas à luz
da compreensão bíblica do conceito de justiça.
Hoje, um quinto da humanidade não têm condições
mínimas de sobrevivência e milhares morrem de fome todos os dias. Milhões de
pessoas não têm onde morar, não têm roupas, nem água limpa, nem cuidados
médicos. Não têm oportunidades na área de educação e emprego e estão condenadas
a levar uma existência miserável, sem qualquer possibilidade de promoção
pessoal para si próprias e para suas famílias. Essas pessoas são oprimidas pela
desigualdade econômica brutal de que são vítimas e pelos diversos sistemas
econômicos que provocam e perpetuam essa situação.
Outras sofrem opressão política. São-lhes negados os
direitos humanos básicos, através de regimes autoritários, muitas vezes
religiosos. Quando protestam são presas sem julgamento, torturadas e mortas.
Uma ilustração: Indonésia, ano 2000. Igrejas e milhares de casas dos cristãos foram
incendiadas. Em algumas aldeias houve cristãos
assassinados. Os ataques aconteciam aos domingos durante os cultos.
No dia 11 de março mais de 30 pessoas foram mortas. As aldeias Buhobuho,
Wewemo, Sangowo e Sakita foram "limpas" da presença cristã. O Pr.
Marthinus Banyo da aldeia Sakita levou os cristãos às selvas, fugindo durante sete
dias.
Outras
pessoas, ainda, são vítimas da discriminação por causa de sua raça ou gênero. E
aqui transcrevemos uma carta, de uma missionária que estava na
Alemanha e trabalhou com refugiados do Kosovo. "Um ano depois de iniciados
os 78 dias de bombardeios da Otan em Kosovo, completado neste mês de março, a
vida de milhares de fugitivos está longe de voltar ao normal. Dos 900 mil
kosovares albaneses que deixaram suas casas, 70 mil continuam longe delas.
Sobretudo mulheres sofrem os traumas da guerra e da violência sexual praticada
pelos sérvios. Isabela Stock, da organização Medica Mondiale, de Colônia, na
Alemanha, conta que pelo menos cem bebês nascidos em Pristina e nas redondezas
foram abandonados pelas mães por terem sido gerados em estupros".
Mas também nós, todos nós, somos oprimidos por
problemas universais que parecem não ter solução, como a exploração irracional das fontes
de energia não renováveis, a destruição do meio ambiente, a violência nos
grandes conglomerados urbanos, etc.
Todas essas condições têm suas raízes na
alienação humana e exige de nós uma radical resposta de amor. Somente o Evangelho pode revolucionar o coração da pessoa. Nada pode tornar uma pessoa mais
humana do que a presença do evangelho. Mas não podemos nos restringir à proclamação
verbal. Além da evangelização mundial, o povo de Deus deve se comprometer com a
ação social, o auxílio, o desenvolvimento e a busca da justiça social e da paz.
[Evangelização e Responsabilidade Social, relatório da Consulta
Internacional realizada em Grand Rapids sob a presidência de John Stott, São
Paulo, ABU, pp. 15 e 16].
Embora
a reconciliação da pessoa com a pessoa, de um povo com outro povo, não seja
reconciliação com Deus, nem a ação social evangelizadora, nem a libertação
política salvação, evangelização e envolvimento sócio-político são parte
do dever cristão. Ambos são necessárias expressões de nossas doutrinas
acerca de Deus e da pessoa, de nosso amor para com o próximo e da nossa
obediência a Jesus Cristo.
A mensagem da libertação é também uma mensagem de
juízo sobre toda forma de alienação, de opressão e de discriminação, e não
devemos ter medo de denunciar o mal e a injustiça onde quer que existam. Quando
alguém recebe a Cristo nasce no reinar do Eterno e, conseqüentemente, deve
buscar não somente manifestar como também divulgar a sua justiça em meio a um
mundo ímpio. A salvação que alegamos possuir deve transformar a totalidade de
nossas responsabilidades pessoais e sociais. [Responsabilidade Social Cristã
in Pacto de Lausanne, parágrafo 5].
Considerações
Movido por seu espírito missionário, o evangelista
Lucas destaca no texto que estamos analisando os tempos do Messias e os tempos
da comunidade cristã, deixando claro para seus leitores que o ano do Senhor teve
início naquele kairós pronunciado na sinagoga de Nazaré.
Para nós, o kairós de Jesus significa o
nascimento de um novo estar, um estar que se caracteriza pelo anúncio de uma
novidade. Mas como anunciar esta a novidade quando, aparentemente, fazemos
parte de uma geração alienada e apática?
Quando comparamos o texto acima com dois outros de
Lucas (At. 2.42-47 e 4.32-35), que fala da comunidade cristã nascente, vemos que os cristãos de Jerusalém entendiam que a ecclesia devia ser
construída sob um estado de convivência que possibilitasse vida plena a todos.
É aqui que as águas se dividem e somos chamados a
romper com a indiferença que congela os corações e paralisa as ações. Homens e
mulheres em todo o planeta têm a urgência de um recém-nascido, reclamam vida e
vida em abundância. Somos chamados a nos deixar despertar pelo choro e pelo
clamor dos despossuídos, oprimidos por ordens sociais corruptas, por dependências e por adversários da vida.
É tempo de anunciar a boa notícia a despossuídos de bens e oportunidades. É tempo de libertar escravos. É tempo de fazer cegos verem. É tempo de salvar oprimidos.
A boa nova de Cristo
liberta os pobres (Ef 1.3). A graça de Cristo liberta os cativos (Gl 5.1,13).
Cristo, a luz da vida, dá vista aos cegos (Jo 1.9; 8.12). O jugo de Cristo
liberta os oprimidos (Mt 11.29-30; 1Pe 5.7).
É
tempo de anunciar o hoje do Senhor Jesus.
Naquele sábado, na sinagoga de Nazaré, Jesus expôs o
programa de seu ministério, que é o programa da comunidade cristã. A graça do Senhor deve
ser noticiada a todos e todas, seu público é o mundo. A ressurreição
deu o imprimatur do Eterno a este programa e à igreja cabe, no poder do
Espírito, levá-lo até os confins da terra.
Cremos realmente nisso? Façamos um exame de
consciência. Depois, então, sejamos coerentes com o que cremos e façamos do Programa
de Jesus o nosso programa.
lundi 6 février 2012
Estudo Interreligioso
PROGRAMA
Filmagens de cultos em quatro províncias diferentes em Moçambique: Maputo, Gaza, Manica e Sofala. Abril a Junho de 2009. Duas no sul e duas no norte.
A alegria no louvor a Deus!
Fevereiro/ Março
A existência de Deus e os argumentos cosmológico, teleológico, axiológico e suas avaliações.
Abril
A coerência do teismo: necessidade, onipresença, onisciência, onipotência e suas avaliações.
Maio/ Junho
O problema do mal e as doutrinas cristãs: Trindade, encarnação e o particularismo cristão e suas avaliações.
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
BECKWITH, Francis J., CRAIG, William L., e MORELAND, J. P., Ensaios Apologéticos, São Paulo, Hagnos, 2006.
GOUVEA, Ricardo Quadros, org., vv.aa., O que eles estão falando da igreja, São Paulo, Fonte Editorial, 2011.
PINHEIRO, Jorge, Teologia Bíblica e Sistemática, o ultimato da práxis protestante, São Paulo, Fonte Editorial, 2012.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
PINHEIRO, Jorge “Matei porque me pisou” e “Sobre o não-ser para viver o ser” in Teologia humana pra lá de humana, São Paulo, Fonte Editorial, 2010.
______________, “A doutrina da eleição – calvinismo, arminianismo e o equilíbrio da doutrina batista” in Revista Teológica, São Paulo, Ano 4, no. 5, 2008.
ROCHA, Alessandro, org., vv.aa., Ecumenismo para o século XXI, Paulo, Fonte Editorial, 2011
SANTO ANSELMO, Livre arbítrio e predestinação, uma conciliação entre a presciência e a graça divina, São Paulo, Fonte Editorial, 2006.
samedi 4 février 2012
Filosofia II
PROGRAMA
Fevereiro/ Março
O círculo teológico. Teologia e filosofia – resposta e resposta
O círculo em que se situa o teólogo é diferente daquele do filósofo. Ele acrescenta aos “a priori do mistério” o critério da mensagem cristã. Enquanto o filósofo procura permanecer geral e abstrato em seus conceitos, o teólogo é intencionalmente específico. O teólogo entra no círculo teológico com um compromisso concreto, como membro da igreja cristã para cumprir suas funções essenciais, sua interpretação teológica da revelação e da realidade. A filosofia e a teologia formulam a pergunta pelo ser. Mas elas o fazem de perspectivas diferentes. A filosofia lida com a estrutura do ser em si mesmo; a teologia lida com o sentido do ser para nós. Dessa diferença surgem tendências convergentes e divergentes entre teologia e filosofia.
Textos:
Tillich, Paul, Teologia Sistemática, São Leopoldo, Sinodal, 2005, Introdução, B 3-7.
Pinheiro, Jorge, Deus é brasileiro, as brasilidades e o Reino de Deus, São Paulo, Fonte Editorial, 2008, Introdução e capítulo 1.
Abril/ Maio
A razão e a pergunta pela revelação
Quando falamos de razão podemos trabalhar com dois conceitos, um ontológico e outro técnico. O primeiro predomina na tradição clássica e o segundo principalmente a partir do empirismo inglês. Mas como estes conceitos nos levam à pergunta pela revelação?
Textos
Tillich, op. cit., parte 1, item 1A-C.
Pinheiro, op. cit., capítulo 2.
Maio/ Junho
A vida e suas ambiguidades
O conceito ontológico de vida e sua aplicação universal nos levam aos dois tipos de considerações, a essencialista e a existencialista. Essas considerações, em última instância, falam da unidade multidimensional da vida. O que nos leva aos processos e ambigüidades existenciais da vida e a perguntar pela vida sem ambigüidades, a vida eterna.
Textos
Tillich, op. cit., parte 4, item 4A-C.
Pinheiro, op. cit., capítulo 3.
BIBLIOGRAFIA
TILLICH, Paul, Teologia Sistemática, São Leopoldo, Sinodal, 2005.
PINHEIRO, Jorge, Deus é brasileiro, as brasilidades e o Reino de Deus, São Paulo, Fonte Editorial, 2008.
BIBLIOGRAFIA AUXILIAR
Severino, Antonio Joaquim, Filosofia, São Paulo, São Paulo, Cortez, 1992.
Pinheiro, Jorge, Teologia Bíblica e Sistemática, o ultimato da praxis protestante, São Paulo, Fonte Editorial, 2012.
Chauí, Marilena e outros, Primeira filosofia: lições introdutórias, São Paulo, Brasiliense, 1984.
DICIONÁRIOS DE FILOSOFIA
Japiassu, Hilton e Marcondes, Danilo, Dicionário Básico de Filosofia, Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1989.
Abbagnano, Nicola, Dicionário de Filosofia, São Paulo, Mestre Jou, 1970.
Teologia Prática V -- Culto e Adoração
Programa
CONTEÚDO
Compreensão de termos: culto, liturgia, louvor e adoração cristãs (breve observação do culto e liturgia em outras tradições religiosas). O que há de errado/certo com “nossos” cultos? Fundamentação bíblico-teológica do Culto e Liturgia -- cruz, graça, esperança memória. Por que cultuar -- liturgia do serviço e gratidão. Como se faz o Culto? Elementos Fundamentais -- liturgia da palavra e liberdade: corpo, criatividade, cultura, emoção e razão. Quando se faz o Culto? Liturgia do tempo: calendário e ano litúrgicos. Quem participa do Culto? Liturgia do povo: inclusão; culto para a crianças ou com crianças? Onde se faz o Culto? Liturgia do lugar: presença de Cristo e santificação do espaço. Diversidade litúrgica e tendências de Culto no Brasil e no mundo: relevância do Culto e Liturgia para a o mundo/comunidade, igreja local, família e vida da pessoa.
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
PINHEIRO, Jorge, Teologia Bíblica e Sistemática, o ultimato da práxis protestante, São Paulo, Fonte Editorial, 2012.
SCHNEIDER-HARPPRECHT, C. (org.), Teologia Prática no contexto da América Latina. São Paulo/ São Leopoldo: ASTE/ Sinodal, 1998.
VON ALLMEN, J.J., O Culto Cristão: Teologia e Prática. 2ª ed. São Paulo: Aste, 2006.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
ALLEN, R., BORROR, G., Teologia da Adoração. São Paulo: Edições Vida Nova, 2002.
PORTO, Humberto. Liturgia Judaica e Liturgia Cristã. São Paulo: Paulinas, 1977.
SHEDD, R.P. Adoração Bíblica. São Paulo: Edições Vida Nova, 1987.
WHITE, James F., Introdução ao Culto Cristão. São Leopoldo: Sinodal: 1990.
vendredi 3 février 2012
Realidade Brasileira Programa
Primeiro semestre 2012 Programa
Fevereiro - Março
As brasilidades e o princípio
protestante
O processo civilizatório -- Povos
germinais / O barroco e o gótico / Atualização histórica
Abril
Protestantes, pentecostais e ecumênicos. O campo
religioso brasileiro e seus personagens
Maio - Junho
Classe e poder/ distância social/
classe e raça. O destino nacional. As dores do parto / confrontos
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
MENDONÇA, Antonio Gouvêa, Protestantes,
pentecostais e ecumênicos, o campo religioso e seus personagens, São
Bernardo do Campo, UMESP, 2008.
PINHEIRO, Jorge, Deus é
brasileiro, as brasilidades e o Reino de Deus, São Paulo, Fonte Editorial,
2008.
RIBEIRO, Darcy, O povo brasileiro,
a formação e o sentido do Brasil, São Paulo, Companhia das Letras, 2002.
BIBLIOGRAFIA
COMPLEMENTAR
FREYRE, Gilberto, Casa Grande & Senzala, São
Paulo, Global Editora, 2003.
LERY, Jean de, Viagem à terra do
Brasil, ler capítulos VIII, XV e XVII disponíveis no site da UFRGS,
http://www.ufrgs.br/proin/versao_1/viagem/index.html
_____________ & SANTOS, Marcelo, Manual
de História da Igreja e do Pensamento Cristão, São Paulo, Fonte Editorial,
2011.
Teologia Sistemática II Programa
Programa Primeiro Semestre 2012
Fevereiro/ Março
Angelologia,
Antropologia e a Doutrina do pecado
Angelologia -- Quem são os anjos: a
tradição mítica dos povos do antigo Oriente Médio e os relatos bíblicos. Antropologia -- O ser
humano real: biológico, psicológico, sociológico, moral, filosófico, teológico.
Os dois sentidos da imagem de Deus e a analogia relationis. Alienação e pecado -- A natureza
da hamartia. A terminologia bíblica a respeito da hamartia no Antigo Testamento e no Novo Testamento. O
problema da solidariedade na alienação: reino do mal, a explicação dialética e
a polêmica Pelágio/ agostiniana.
Abril/ Junho
Trindade e Cristologia
A Trindade e as suas três compreensões clássicas: a católica oriental,
a católica ocidental e a protestante reformada. Jesus, o Cristo, uma identidade
construída. O Cristo da fé e o Jesus histórico. Jesus num mundo de exclusão,
ontem e hoje. A cruz de Cristo na Soteriologia. A cruz e suas realizações.
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
PINHEIRO, Jorge, Teologia Bíblica e Sistemática, o ultimato da práxis protestante
São Paulo, Fonte Editorial, 2012
Ferreira,
Julio Andrade, Antologia Teológica,
Sao Paulo, Fonte Editorial, 2008.
MCGRATH, Alister E., Teologia sistemática, histórica e filosófica,
São Paulo, Shedd Publlicações, 2005.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
Braaten, Carl e Jenson, Robert, Dogmática Cristã, São Leopoldo, Sinodal, 2005.
CULLMANN, Oscar, Cristologia do Novo
Testamento, São Paulo: Hagnos, 2008.
PINHEIRO, Jorge, Deus é brasileiro, as
brasilidades e o Reino de Deus, São Paulo, Fonte Editorial, 2008.
jeudi 2 février 2012
lundi 30 janvier 2012
samedi 28 janvier 2012
Omissão e consentimento
A pergunta que faço e esta é uma questão teológica é como se transforma nossa concepção do mal quando o abordamos em toda a sua banalidade. A primeira coisa que me ocorre é que o bem será sempre um movimento de vida, com total ausência do consentimento da alienação.
Donde, seguindo a trilha de Aurelio Artera (Mal consentido, la cumplicidade del espectador indiferente, Madri, Alianza Editorial, 2010), o mal banal desconstrói a substância ontológica da alienação, exatamente porque ao analisá-lo em sua estrutura microfísica aparentemente perde sua pretensão metafísica. Mas este é o caminho que a teologia deve fazer, despojar o mal da auréola que herdou da tradição escolástica, desnudá-lo de sua roupagem de festa luciferina e estudá-lo como encarnação de pessoas normais.
Quando fazemos assim vemos que diante do mal social, o comum é limitar suas dimensões ao mal cometido e ao mal sofrido. Ou seja, tudo se resume à dualidade agressor/vitima.
No Brasil, não temos muita intimidade com a filosofia basca, por isso vou pensar esta questão transversalmente com Artera, que fornece a nós teólogos reflexões magistrais: A compaixão, apologia de uma virtude sob suspeita (1996) e Mal consentido, a que me referi acima. Ele trabalha outras questões referentes a ética e política, cujos textos vou deixar de lado nessas meditações portenhas.
Partindo da compreensão, como o faz Artera e também o apóstolo Tiago, de que erra aquele que sabe fazer o bem e não o faz, todo mal consentido em relação ao cometido não deixa de ser um mal e um mal tão real como o que se comete e o que se padece, temos um paradoxo: na omissão a deficiência se torna eficaz, a ausência se faz presente e a passividade extremamente ativa.
Quando falamos em consentimento ou omissão estamos falando de ação social. Ou seja, há uma fazer alienante, um fazer mal que nasce de nosso consentimento ou de nossa omissão, em relação ao um e a todos. Mas do que ato passivo, o mal consentido, o mal por omissão é ativo e tão destruidor como aquele do agressor. Nenhum de nós quer ser definido como agressor de seu próximo ou como sofredores de violência, mas o mal consentido transformou-se numa maneira de não-vida social.
A Naira faz fotos. E eu poso, passeando entre livros na segunda mais linda livraria do mundo, El Ateneo de Buenos Aires. A primeira, segundo o jornal The Guardian, é a Selexys Dominicanen Boekhandel em Maastricht.
Mas voltemos à questão da alienação cotidiana ou o mal perpretado por cada um, por todos, socialmente, nos consentimentos e omissões da não-vida diária. O apóstolo Paulo nos diz que quem realiza o mal, seja quem for, paga por ele. Ou seja, consentimento e omissão são ações degeneradoras e destruidoras. Atinge ao que consente, ao omisso e a todos. O mal banal, que de fato nunca é banal, quebra o movimento da vida, cria a trombada. Produz um choque de nossas existências. E essa construção do mal consentido e omisso não acontece de uma hora para outra. São necessários alguns milhares de segundos, tijolo por tijolo, argamassa e muita falta de imaginação. E a falta de imaginação é trilha assassina.
Paro aqui com uma frase do profeta Ezequiel: se uma pessoa de coração deixar de fazer o bem e começar a fazer o mal cotidiano será que ele vai viver? Conclua você. Beijos.
mardi 24 janvier 2012
O menino e o rifle
Gaviões e Passarinhos, filme de Pier Paolo Pasolini
Fomos chamados à liberdade. O que significa isso? Bem, talvez falar de corvos, gaviões e passarinhos ajude...
Em 1965, Pier Paolo Pasolini, um dos gênios do cinema italiano, filmou Gaviões e passarinhos, história que vi como metáfora sobre liberdade e consciência política. Numa estrada vazia, um senhor (Totó) e seu filho (Ninetto Davoli) encontram um corvo que fala. O corvo os transforma em dois monges franciscanos e eles são obrigados a pregar para gaviões e passarinhos. O próprio Pasolini diria:
“Nunca criei um filme tão desarmado, frágil e delicado como esse. Ele não se parece com meus filmes anteriores e não se parece com nenhum outro filme... Seu surrealismo tem pouco a ver com o surrealismo histórico, mas fundamentalmente com o surrealismo das fábulas”.
O filme é uma parábola sobre a crise do socialismo, representada pelo corvo, na Itália dos anos 1950. “Totó e Ninetto representam os italianos inocentes, que não se envolvem na história, que conquistam a primeira noção de consciência ao encontrar o marxismo no semblante do corvo”, afirmou Pasolini.
Ter vivido parte da infância em fazenda, no sul de Minas, foi um privilégio que marcou minha vida, não somente fornecendo memórias para a velhice, mas plasmando conteúdo que amo e defendo: a liberdade.
Talvez seja essa compreensão telúrica da liberdade, que fez de mim, já na alta maturidade, batista, e me permitiu construir uma ponte entre o pensamento liberal inglês e o socialismo religioso de Paul Tillich.
Voltemos à minha infância. Meu tio Ary tinha uma Winchester 44 na casa da fazenda. E eu olhava para aquela arma com respeito e paixão. Eu e milhares de pessoas mundo afora.
Os rifles Winchester 44, conhecidos como papo amarelo, foram populares no interior do Brasil e nos Estados Unidos: símbolo de uma época, como a pistola Colt e os cavalos quarto de milha.
Conta-se que Lampião, quando começou sua vida guerrilheira, usava uma Winchester 44, que os sertanejos chamavam de cruzeta. Segundo o historiador Frederico Pernambucano de Mello:
"Lampião tinha uma paixão pelo rifle cruzeta, não somente por ser arma de estréia, mas também por ter permitido criar um processo de aceleração de tiros. Ele conseguiu transformar a arma em um modelo automático. A transformação permitia que o rifle, quando usado, produzisse um clarão que, segundo os sertanejos, alumiava como um lampião".
A Winchester era mágica e eu amava ver meu tio usando-a contra alvos imóveis: latas velhas e garrafas. Mas, certa tarde, um gavião começou a piar e a fazer círculos no céu. O gavião, accipiter nisus, é uma ave de rapina pequena, de cauda comprida e vôo certeiro. Pia forte, assustando suas presas, geralmente pequenos pássaros e pintos soltos na pastagem.
E era isso mesmo que aquele gavião estava planejando: atacar os pintinhos que, juntos com a galinha, corriam de um lado para o outro, em pânico.
Meu tio pegou a Winchester, que reinava numa das paredes da sala, e me chamou. Fomos para a varanda e ele começou a seguir os círculos do gavião. Esperou. Quando o gavião mergulhou em direção aos pintos ele atirou.
E eu vi o gavião explodir em penas.
Onde nos leva a liberdade quando não temos consciência do que ela significa? A vida em liberdade significa a aceitação da exigência incondicional de realizar a verdade e fazer o bem.
Ao reconhecer a existência de uma situação-limite, de ameaça à vida e à existência, devemos entender que:
(1) não podemos virar as costas ao mundo; (2) aquilo que é eterno deve ser expresso em relação à situação presente; (3) a realidade da graça deve ser expressa com ousadia e risco; (4) e o poder transformador do Evangelho deve expressar uma fé não superficial, que vai à raiz.
Por isso, como na parábola de Pasolini, somos chamados a pregar para gaviões e passarinhos. Somos livres em Cristo: chamados a viver o desafio incondicional de realizar a verdade e fazer o bem.
lundi 23 janvier 2012
A mãe e a hora de Jesus
Casamento judeu no Marrocos, por Eugène Delacroix (1798-1863)
Sermão vespertino de 22 de janeiro de 2012
Pr. Jorge Pinheiro
Pr. Jorge Pinheiro
Versículo-chave
“Deste modo, em Caná da Galileia, Jesus realizou o primeiro dos seus sinais. Assim manifestou a sua glória e os seus discípulos creram nele”. (João 12.11)
“No terceiro dia (depois do encontro com Felipe e Natanael), houve um casamento em Caná da Galileia. A mãe de Jesus estava lá. 2 Jesus e os seus discípulos também foram convidados. 3 A certa altura da boda faltou vinho. Então a mãe de Jesus disse-lhe: "Já não há vinho!" 4 Jesus respondeu: "E que temos tu e eu a ver com isso, mulher? A minha hora ainda não chegou". 5 Ela então disse aos criados de mesa: "Façam tudo o que ele disser". 6 Havia ali seis vasilhas de pedra das que os judeus utilizavam para as suas cerimônias de purificação. Cada uma levava uns cem litros de água. 7 Jesus mandou aos criados: "Encham de água essas vasilhas". Eles encheram-nas até acima. 8 Depois disse-lhes: "Tirem agora um pouco e levem ao mestre de cerimônias para ele provar". Eles assim fizeram. 9 O mestre de cerimônias provou a água transformada em vinho. Não sabia o que tinha acontecido, pois só os criados é que estavam ao corrente do fato. Mandou então chamar o noivo 10 e observou-lhe: "É costume nas bodas servir primeiro o vinho melhor e só depois de os convidados terem bebido bem é que se serve o menos bom. Mas tu guardaste o melhor até agora!" 11 Deste modo, em Caná da Galileia, Jesus realizou o primeiro dos seus sinais. Assim manifestou a sua glória e os seus discípulos creram nele. 12 Depois disto, Jesus desceu até Cafarnaum, com a sua mãe, os seus irmãos e os discípulos, e ficaram lá alguns dias”. (João 12.1-12)
1. Um estranho diálogo
“A certa altura da boda faltou vinho. Então a mãe de Jesus disse-lhe: Já não há vinho! “E que temos tu e eu a ver com isso, mulher? A minha hora ainda não chegou” (João 2.3-4).
“A certa altura da boda faltou vinho. Então a mãe de Jesus disse-lhe: Já não há vinho! “E que temos tu e eu a ver com isso, mulher? A minha hora ainda não chegou” (João 2.3-4).
“O que há entre nós” era uma expressão judaica, que aparece tanto no Antigo (Jz 11.12; 2Sm 16.10; 1Rs 17.18) como no Novo Testamento (Mt 8.29; Mc 1.24; Lc 4.34).
Maria, presente na festa de casamento, pediu para que Jesus manifestasse a sua glória. Aqui temos um diálogo aparentemente estranho. Há uma pedido de Maria e há uma resposta algo seca, como se Jesus quisesse fugir ao pedido. Assim começa a história do primeiro milagre público de Jesus. Mas, mãe e filho se conheciam muito bem.
Maria era uma mãe judia piedosa. Mas o que era uma mãe judia piedosa? A família judia, nas tradições antigas, recitava na entrada do shabat o último capítulo de Provérbios, como referência e tributo a esposa e mãe ideal. Esposa e mãe eram vistas como pessoas alegres, compreensivas, reverentes. Ela dava o tom espiritual cotidiano da família. Reunia os filhos em torno de si, quando pronunciava a benção das luzes, preparava a casa para as festas. E, importante, era a conselheira de toda a família. Aquela mãe piedosa conhecia o seu filho. E o filho conhecia a sua mãe. Assim, naquele diálogo não houve discussão, Maria expôs o problema e se dirigiu aos empregados da casa: "Façam tudo o que ele disser". É... ela conhecia o seu filho.
Mas o clamor de Maria remete ao clamor humano diante das limitações, do fim da alegria e da felicidade que trombam com a perda de sentido, com a morte. O vinho acabou. Na caminhada humana, o vinho sempre acaba, permanece diante de nós a alienação, o atravessar errantes o deserto não escolhido. A frase de Maria é de todos nós humanos... o vinho acabou!
2. A hora de Jesus
“A minha hora ainda não chegou” (João 2.4).
“A minha hora ainda não chegou” (João 2.4).
Mas, qual era a hora de Jesus? Era a hora da manifestação da sua glória. E essa hora se aproximava, dirá mais tarde o apóstolo João (7.30; 8.20; 12.23-27). O pedido de Maria transformou-se assim numa antecipação simbólica da manifestação da glória, que teve seu anticlímax, seu momento de terror e tristeza, na cruz, e seu clímax, seu momento maior, na ressurreição. Como Moisés (Ex 4.1-9), Jesus deveria realizar sinais para mostrar que tinha sido enviado pelo Pai. Esses sinais e maravilhas deveriam chamar seus discípulos à fé.
Ele disse à mãe que ainda não chegara o momento da manifestação maior de sua glória. Não do seu ministério, que já iniciara com seu batismo, tentação no deserto e escolha dos primeiros discípulos. Por isso, João se refere ao casamento de Caná como o terceiro dia a partir da escolha de André, irmão de Pedro, Filipe e Natanael.
Dias depois, numa discussão no templo de Jerusalém, “os chefes dos judeus perguntaram-lhe: "Que sinal nos mostras para poderes fazer isto?" Jesus respondeu: "Destruam este santuário e eu em três dias o hei-de levantar”. (João 2.18-19).
A transformação de água em vinho apresentou-se, então, como uma antecipação da ressurreição, fim definitivo do clamor humano, da perda de sentido, das lágrimas... A ressurreição de Jesus foi e é a manifestação de sua glória. E, por isso, o apóstolo Paulo clamará: “se não há ressurreição, comamos e bebamos, porque amanhã morremos” (1Coríntios 15.32)
“Deste modo, em Caná da Galileia, Jesus realizou o primeiro dos seus sinais. Assim manifestou a sua glória e os seus discípulos creram nele” (João 12.11).
3. Para meditarmos juntos: Eu, você e a hora de Jesus
Como os discípulos, eu e você vimos a glória de Jesus. Ele fez esses sinais para que eu e você crêssemos. Cremos que Jesus é o rei da glória?
Como os discípulos, eu e você vimos a glória de Jesus. Ele fez esses sinais para que eu e você crêssemos. Cremos que Jesus é o rei da glória?
“Cristo ressuscitou dos mortos e é a garantia de ressurreição para os que morreram. Assim, se por meio de um homem começou a morte no mundo, por outro homem começou a ressurreição dos mortos. Deste modo, unidos a Adão todos estão sujeitos à morte e unidos a Cristo todos voltarão a receber a vida” (1Coríntios 15.20-22).
AMÉM
samedi 21 janvier 2012
A teologia brasileira de Selton Mello
"O Palhaço é um filme analógico", diz Selton Mello
A busca de identidade é um tema fundante da teologia. Está presente nos onze primeiros capítulos do livro de Gênesis e depois renasce em personagens matriciais, como por exemplo, Jó, Jonas, Davi, entre outros. Mas é também o fundo da história do filme O Palhaço dirigido por Selton Mello, que também atua, ao lado de Paulo José.
"É uma época de filmes muito tecnológicos. 'O palhaço' é um filme analógico. São tantos efeitos visuais, truques e criaturas criadas por computador no cinema de hoje que acho que as crianças vão acabar estranhando os personagens do Circo Esperança. esses personagens parecem seres de outro planeta, porque elas nem imaginam que existe esse mundo do circo", disse em entrevista a Paulo Tiefenthaler no Festival de Cinema de Paulínia.
Se o filme fosse em branco e preto seria um cult, já que foca a crise de identidade que fere o palhaço Benjamin, que trabalha no circo do pai. No meio das estradas desse mundão besta, vemos a perdidez de Benjamin em relação ao caminho, ao destino, que movem o fado de sua vida -- fazer os outros rirem.
"Quando Benjamim segue em direção da cidade de Passos, que é um centro urbano, tive medo do filme afundar. Era um perigo que eu corria. O fato de eu ter escalado Ferrugem, Loredo e Moacyr para esse núcleo da cidade mantém o caráter circense do filme. Porque eles são espécies de palhaços ou arquétipos disso. Além disso, são referências para mim. Quis homenageá-los", comenta.
O tema é bíblico, humano, universal. Todos encaramos dúvidas e destino. As alegorias circenses são espelhos do vazio de identidade do palhaço Benjamin, que acaba por ser salvo por circunstâncias laterais, como acontece na vida. Fica porém uma frase emblemática, nas palavras do pai e do filho, que às transversas, nos remete à leitura popular, cheia de mineirice, do velho Calvino:
"o gado bebe leite
o rato come queijo
e eu sou palhaço"
jeudi 19 janvier 2012
Às margens do Garonne
Eu estava hospedado no Hotel de France e dividia o apartamento com Jean Richard, naquela época diretor da Faculdade de Ciências da Religião na Universidade Laval, em Quebec, no Canadá. O hotel era e é confortável, mas sem luxo. Fica na Rue d´Austerlitz, ao lado da praça Wilson, florida e cheia de restaurantes com mesas nas calçadas. Ótimo lugar para ler despreocupado, comer devagar e ver o movimento.
Tirei aqueles dias da viagem para estudar mais uma vez a carta de Paulo aos Romanos. Usei o texto francês da Bíblia de Jerusalém e o comentário de Guy Lafon, do Instituto Católico do Paris.
Na abertura do Colóquio Internacional da Associação Paul Tillich em Língua Francesa, Jean Richard falou sobre “Doutrina social, teologia da libertação e socialismo religioso”. Ele é um especialista em Paul Tillich. Foi também um dos responsáveis pela tradução para o francês das obras do período alemão de Tillich. Dessas, três devem ser citadas por sua importância para a Teologia da Cultura: “Christianisme et socialisme”, “Écrits contre les nazis” e “La dimension religieuse de la culture”.
Para Richard, conforme expôs em sua Comunicação, “o horizonte filosófico e teológico de Tillich, nos anos 1920, tem uma amplidão surpreendente. Desde 1919, ele dirigiu seus estudos sobre a questão do socialismo religioso, a partir da idéia de uma teologia da cultura e do princípio protestante”.
“Segundo a interpretação que Tillich faz, explica Jean Richard, é o princípio protestante que permite superar a dicotomia do profano e do sagrado, do natural e do sobrenatural. Isto porque a justificação pela graça significa que a graça da salvação opera independentemente das condições religiosas: tanto na ordem do profano como na ordem do religioso”.
“É neste sentido que Tillich vai interpretar a expressão socialismo religioso. O socialismo religioso não é o socialismo da Igreja; nem um socialismo consagrado pela religião, um socialismo absolutizado. É um movimento plenamente profano, mas que na sua profanidade se abre para a transcendência do Incondicionado”.
“Tal conceito aparece junto com a elaboração filosófica e teológica do socialismo religioso que Tillich situa no quadro de uma teologia da cultura. Fica evidente que Tillich, desde o início de seus estudos, sobrepõe a oposição entre libertação sociopolítica e salvação cristã, oposição que não é, no fundo, mais que uma figura da dicotomia entre natural e sobrenatural, profano e sagrado”, afirmou o professor canadense.
Curti o Garonne, rio limpo e azulado que banha a cidade. Ao lado de sua margem direita, perto dos jardins da praça Saint Pierre, há um bar agradável com internet. Dele escrevi e-mails de amor para Naira. Nos dias ensolarados que tive a bênção de viver lá, o azul suave do rio se confundia com o céu e fazia contraste com o rosa da cidade.
Jean Richard
Eu e Jean Richard trocamos umas quantas idéias sobre o socialismo religioso de Tillich, que entendemos como uma crítica a toda forma de socialismo, ou de política, que quer se absolutizar, que se coloca acima do Incondicionado.
“O socialismo que queremos, disse Tillich, é aquele que coloca na teoria e na prática a questão da possibilidade de que a vida tenha sentido para todos os indivíduos da sociedade e que se esforce para responder a esta questão no plano da realidade e do pensamento”.
“Tal socialismo não é apenas um movimento político, é mais que um movimento proletário. É um movimento que procura apreender cada aspecto da vida e cada grupo da sociedade”. [Christianisme et Socialisme, Écrits socialistes allemands (1919-1931), Les Éditions du Cerf, Éditions Labor et Fides, Les Presses de l’Université Laval, 1992, p. 346].
Toda estrutura política pressupõe poder e, consequentemente, um grupo que o assuma. E como todo grupo de poder é também um conglomerado de interesses opostos a outras unidades de interesses, sempre necessita correção.
Assim, quando no poder, todo grupo, seja socialista ou não, necessita de correção. É o que justifica a democracia e a faz necessária enquanto sistema que incorpora correções contra o uso errôneo da autoridade política. [Paul Tillich, Teologia de la cultura y otros ensayos, "Entre la heteronomia y la autonomia", Buenos Aires, Amorrortu Editores, 1974, pp. 239-240].
Toulouse é um centro intelectual da ordem dominicana. E nós, a convite, usamos para nossas palestras e debates as dependências da Faculdade de Teologia do Instituto Católico. A universidade católica de Toulouse nasceu em 1229. Foi gostoso estar lá. Aquele antigo convento medieval, cheio de histórias, convida ao silêncio e à reflexão.
Entrei numa velha igreja dominicana, de arquitetura normanda, com linhas curvas e elegantes, sem imagens, apenas com uma cruz limpa ao fundo. Uma jovem tocava música renascentista no órgão de tubos. A igreja, vazia, parecia que ia levantar vôo.
Orei em Romanos, “quem poderá nos separar do amor de Cristo...” e deixei que o Espírito falasse ao meu espírito.
mercredi 18 janvier 2012
O assassinato como uma bela arte
“O
errar o alvo está à porta, à sua espera.
Ele quer dominá-lo, mas você precisa
vencê-lo”
Conversa do Eterno
com Caim
Li
sobre a Sociedade para a Promoção do
Vício e sobre o Clube do Fogo do
Inferno, fundados por Sir Francis Dashwood. Li também sobre a Sociedade para a Supressão da Virtude.
Essas
associações existiram na Inglaterra do século XIX, mas, sem dúvida, a mais radical
delas era a Sociedade para o
Encorajamento do Assassinato, formada por aficionados em assassinatos e especialistas
em carnificinas.
Os
membros desta última sociedade faziam a apologia do assassinato e da
destruição. Consideravam o assassinar uma arte e viam muita utilidade nela. Bem,
não sei se você já parou para pensar no ato de assassinar. É quase certo que
não, mas um escritor inglês, Thomas De Quincey (1785-1859), um sujeito
estranho, que morava em lugares imundos, só saia à noite, e durante cinquenta
anos foi um “comedor de ópio”, parou para pensar no assunto e escreveu um livro
chamado “Do Assassinato como uma das Belas Artes”. Li e reli esse livro
muitas vezes e ainda o tenho na minha biblioteca.
De Quincey
tinha uma coluna diária na Westmorland
Gazette, onde só escrevia sobre crimes terríveis. E justificava sua preferência
dizendo que tais artigos levavam os leitores a uma profunda reflexão moral.
Não sei se ele
tinha razão, mas hoje vou conversar com você sobre o assassinato. “Portanto – como disse De Quincey -- que nos seja permitido tirar o melhor
partido de um mau assunto; que o tratemos esteticamente, e verifiquemos se o
podemos aproveitar dessa maneira. Secamos nossas lágrimas e gozamos a sensação
de descobrir que uma transação que, considerada moralmente chocante, se for
julgada pelos critérios do gosto, revela-se uma obra muito meritória”.
“Segundo este princípio, cavalheiros,
proponho-me a guiar-vos os estudos desde Caim ... Através desta grande galeria
do assassinato, que nos seja permitido vagar de mãos dadas, juntos, em
admiração deliciada. O primeiro assassinato é conhecido de todos. Como inventor
do assassinato e pai da arte, Caim deve ter sido um gênio de primeira grandeza.
Todos os Cains foram homens de gênio...”.
“Assassinei
um homem porque me feriu,
assassinei um moço porque me machucou.
Se sete
pessoas são mortas para pagar pela morte de Caim,
então se alguém me matar serão
mortas setenta e sete pessoas da família do assassino” Lameque conversa
com suas mulheres
Bem, se você
não está chocado, vamos seguir. De Quincey faz algumas propostas para a
realização de um assassinato. “Quanto à
pessoa, suponho evidente que deve tratar-se de um homem bom; porque, se não for
esse o caso, ele poderá estar, ao mesmo tempo, contemplando a possibilidade de
cometer assassinato”.
Ainda
quanto à pessoa, “a vítima escolhida deve
também possuir uma família de crianças inteiramente dependentes de seus
esforços, de modo a aprofundar o pathos”.
Quanto
à oportunidade e ao lugar, “o bom senso
do praticante o tem geralmente guiado para a escolha da noite e da intimidade.
Contudo, não tem havido falta de casos que esta regra foi abandonada com
excelentes efeitos”.
De
Quincey, segundo especialistas, escreveu trechos inteiros de seu livro sob o
efeito do ópio, mas paradoxalmente ele nos leva a pensar sobre que razões,
motivos ou deleites levariam um ser humano a assassinar outro.
Por
ser tal ato terrível, nossa vida é protegida por leis e é, por isso, que as
guerras são execradas. Mas, muita gente tenta justificar o injustificável. De
Quincey se baseia na beleza do ato e na possibilidade do prazer, mas outros
argumentam numa possível necessidade de prevenção contra um mal futuro. Mas,
cuidado, como canta Lameque, quando não há arrependimento, a alienação -–
pessoal ou social -- sempre se multiplica.
“Vocês
são filhos do Diabo, e querem fazer o que o pai de vocês quer.
Desde a criação
do mundo ele foi assassino e nunca esteve do lado da verdade”.
O homem de
Nazaré conversa com líderes religiosos
E
já no final deste texto, eu me lembrei da “Inscrição para uma lareira”
de Mário Quintana, quando o poeta afirma que “a vida é um incêndio: nela/ dançamos salamandras mágicas/ Que importa
restarem cinzas/ se a chama foi bela e alta?/ Em meio aos toros que desabam/
cantemos a canção das chamas! Cantemos a canção da vida,/ na própria luz
consumida”.
Não,
a vida não precisa ser um inferno. Que o poeta me perdoe, mas não necessitamos
cantar a vida na própria luz consumida! Por que cantar a destruição se o Eterno
se fez pessoa para que tenhamos vida plena?
Por
causa da alienação e da cultura da morte, João, o carinha do amor, disse
que o mundo está estirado sobre a malignidade. Mas podemos dizer não à apologia
do assassinato e da violência. Repousemos sobre o Nazareno,
ele é a canção da vida!
Fontes
Thomas
de Quincey, Do Assassinato como uma das Belas Artes, Porto Alegre,
L&PM, 1985.
Mário
Quintana, Melhores Poemas, seleção de Fausto Cunha, São Paulo, Global,
1983.
Inscription à :
Articles (Atom)