vendredi 7 septembre 2012

O Sermão de Santo António aos Peixes

Para meus alunos de Homilética Prática.

O Sermão de Santo António aos Peixes foi proferido na cidade de São Luís do Maranhão em 1654, na sequência de um confronto com os colonos portugueses no Brasil. O sermão é uma peça de oratória criativa, habilidade e poder satírico, que toma alguns peixes (o roncador, o pegador, o voador e o polvo) como símbolos dos pecados daqueles colonos. Com uma construção literária, o sermão louva algumas virtudes humanas e censura os vícios dos colonos. O sermão foi pregado três dias antes do Padre António Vieira embarcar ocultamente para Portugal, a fim de obter uma legislação justa para os índios.



Padre António Vieira
Sermão de Santo António aos Peixes,
pronunciado em São Luís do Maranhão, a 13 de Junho de 1654


Excerto, capítulo 1



Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os pregadores, sois o sal da terra: e chama sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção; mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm oficio de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? Ou é porque o sal não salga, ou que a terra se não deixa salgar. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhes dão, a não querem receber. Ou é porque o sal não salga, e os regadores dizem uma cousa e fazem outra; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar o que eles fazem, que fazer o que dizem. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores se pregam a si e não a Cristo; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites. Não é tudo isto verdade? Ainda mal!


Suposto, pois, que ou o sal não salgue ou a terra se não deixe salgar; que se há--de fazer a este sal e que se há-de fazer a esta terra? O que se há-de fazer ao sal que não salga, Cristo o disse logo: Quod si sal evanuerit, in quo salietur? Ad nihilum valet ultra, nisi ut mittatur foras et conculcetur ab hominibus. «Se o sal perder a substância e a virtude, e o pregador faltar a doutrina e ao exemplo, o que se lhe há-de fazer, é lançá-lo fora como inútil, para que seja pisado de todos. Quem se atrevera a dizer tal cousa, se o mesmo Cristo a não pronunciara? Assim como não há quem seja mais digno de reverência e de ser posto sobre a cabeça que o pregador que ensina e faz o que deve, assim é merecedor de todo o desprezo e de ser metido debaixo dos pés, o que com a palavra ou com a vida prega o contrário.

Isto é o que se deve fazer ao sal que não salga. E à terra que se não deixa salgar, que se lhe há-de fazer? Este ponto não resolveu Cristo, Senhor nosso, no Evangelho; mas temos sobre ele a resolução do nosso grande português Santo António, que hoje celebramos, e a mais galharda e gloriosa resolução que nenhum santo tomou. Pregava Santo António em Itália na cidade de Arimino, contra os hereges, que nela eram muitos; e como erros de entendimento são dificultosos de arrancar, não só não fazia fruto o santo, mas chegou o povo a se levantar contra ele e faltou pouco para que lhe não tirassem a vida. Que faria neste caso o ânimo generoso do grande António? Sacudiria o pó dos sapatos, como Cristo aconselha em outro lugar? Mas António com os pés descalços não podia fazer esta protestação; e uns pés a que se não pegou nada da terra, não tinham que sacudir. Que faria logo? Retirar-se-ia? Calar-se-ia? Dissimularia? Daria tempo ao tempo? Isso ensinaria porventura a prudência ou a covardia humana; mas o zelo da glória divina, que ardia naquele peito, não se rendeu a semelhantes partidos. Pois que fez? Mudou somente o púlpito e o auditório, mas não desistiu da doutrina. Deixa as praças, vai-se às praias; deixa a terra, vai-se ao mar, e começa a dizer a altas vozes: Já que me não querem ouvir os homens, ouçam-me os peixes. Oh maravilhas do Altíssimo! Oh poderes do que criou o mar e a terra! Começam a ferver as ondas, começam a concorrer os peixes, os grandes, os maiores, os pequenos, e postos todos por sua ordem com as cabeças de fora da água, António pregava e eles ouviam.

Se a Igreja quer que preguemos de Santo António sobre o Evangelho, dê-nos outro. Vos estis sal terrae: É muito bom texto para os outros santos doutores; mas para Santo António vem-lhe muito curto. Os outros santos doutores da Igreja foram sal da terra; Santo António foi sal da terra e foi sal do mar. Este é o assunto que eu tinha para tomar hoje. Mas há muitos dias que tenho metido no pensamento que, nas festas dos santos, é melhor pregar como eles, que pregar deles. Quanto mais que o são da minha doutrina, qualquer que ele seja, tem tido nesta terra uma fortuna tão parecida à de Santo António em Arimino, que é força segui-la em tudo. Muitas vezes vos tenho pregado nesta igreja, e noutras, de manhã e de tarde, de dia e de noite, sempre com doutrina muito clara, muito sólida, muito verdadeira, e a que mais necessária e importante é a esta terra, para emenda e reforma dos vícios que a corrompem. O fruto que tenho colhido desta doutrina, e se a terra tem tomado o sal ou se tem tomado dele, vós o sabeis e eu por vós o sinto. 

Isto suposto, quero hoje, à imitação de Santo António, voltar-me da terra ao mar, e já que os homens se não aproveitam, pregar aos peixes. O mar está tão perto que bem me ouvirão. Os demais podem deixar o sermão, pois não é para eles. Maria, quer dizer, Domina maris: «Senhora do mar» e posto que o assunto seja tão desusado, espero que me não falte com a costumada graça. Ave Maria.


Análise literária -- Lithis e Wikipedia

Capítulo I

Introdução: exposição do plano a desenvolver e das ideias a defender (ll.1-59).

Conceito Predicável: texto bíblico que serve de tema e que irá ser desenvolvido de acordo com a intenção e o objetivo do autor "Vos estis sal terrae".

Invocação: pedido de auxílio divino (ll.60-61).

As simetrias evidenciam a estruturação do sermão enquando exercício lógico, que permitem aos ouvintes atingirem mais facilmente o objetivo da mensagem nas respostas à justificação do fato de a terra estar corrompida e na resposta ao que se há-de fazer ao sal que não salga e à terra que se não deixa salgar.

Para atingir a inteligência dos ouvintes, o padre usa argumentos lógicos, sucessivas interrogações retóricas e a autoridade dos exemplos de Cristo, Santo António e da Bíblia. Para atingir o coração dos ouvintes, usa interjeições e exclamações. Ao relatar o que fez Santo António quando foi perseguido em Arimino usa frases curtas (Deixa as praças, vai-se às praias…), ritmo binário, anáforas, enumeração. Os tipos de frase têm relação direta com a entoação. A frase interrogativa termina num tom mais alto, a declarativa num tom mais baixo, etc.

O titulo do Sermão foi retirado da história que se contava a respeito de Santo António. Este teria sido mal recebido numa pregação em Arimino, porém, mesmo perseguido, teria se  dirigido à praia e pregado o sermão aos peixes que o teriam escutado atentamente.

O pregador invocou Nossa Senhora porque era habitual fazê-lo e ainda porque o nome Maria quer dizer "senhora do mar"; os ouvintes do sermão eram pescadores que invocavam a santa na faina da pesca.

Capítulo II

O sermão é uma alegoria porque os peixes são metáfora dos homens, as suas virtudes são por contraste metáfora dos defeitos dos homens e os seus vícios são diretamente metáfora dos vícios dos homens. O pregador fala aos peixes, mas quem escuta são os homens.

Os peixes ouvem e não falam. Os homens falam muito e ouvem pouco.

O pregador argumenta de forma lógica. Partindo de duas propriedades do sal, divide o sermão em duas partes: o sal conserva o são, o pregador louva as virtudes dos peixes; o sal preserva da corrupção, o pregador repreende os vícios dos peixes. Para que fique claro que todo o sermão é uma alegoria, o pregador refere-se frequentemente aos homens. Utiliza articuladores do discurso (assim, pois…), interrogações retóricas, anáforas, gradações crescentes, antíteses, etc. Demonstra as afirmações que faz tirando partido do contraste entre o bem e o mal, referindo palavras de S. Basílio, de Cristo, de Moisés, de Aristóteles e de St. Ambrósio, todas referidas aos louvores dos peixes. Confirma-as com vários exemplos: o dilúvio, o de Santo António, o de Jonas e o dos animais que se domesticam.

Os peixes não foram castigados por Deus no dilúvio, sendo, por isso, exemplo para os homens que pouco ouvem e falam muito, pouco respeito têm pela palavra de Deus. Evidencia-se que os animais que convivem com os homens foram castigados, estão domados e domesticados, sem liberdade.

O discurso é pregado; por isso, envolve toda a pessoa do orador. Os gestos, a mímica, a posição do corpo - a linguagem não verbal - têm um lugar importante porque completam a mensagem transmitida.

Recursos de estilo 

A antítese Céu/lnferno, que repete semanticamente a antítese bem/mal, está ligada quer à divisão do Sermão em duas partes, quer às duas finalidades globais do mesmo. 

A apóstrofe refere diretamente ao destinatário da mensagem e do pregador, aproximando os dois pólos da comunicação: emissor e receptor. A interrogação retórica como meio de convencer os ouvintes. A personificação dos peixes associada à apóstrofe e às atitudes dos mesmos. A gradação crescente na enumeração dos animais que vivem próximos dos homens mas presos. A comparação, "como peixes na água", tem o carácter de um provérbio que significa viver livremente. 

Santo António foi humilde, aceitando sem revolta o abandono a que foi votado por todos, ele que conhecia a sabedoria. O pregador pretende condenar os homens que possuem vícios opostos às virtudes dos peixes.

Capítulo III


O pregador usa o imperativo verbal, a repetição anafórica, a exclamação, a apóstrofe, a leve ironia ("Mas ah sim, que me não lembrava! Eu não prego a vós, prego aos peixes!").



A língua de Santo António teve a força de dominar as paixões humanas, guiando a razão pelos caminhos do bem; foi o freio do cavalo porque impediu tantas pessoas de caírem nas mais variadas desgraças. A língua de Santo António foi a rémora -- um peixe pequeno mas de muita força, representa a força da palavra de Santo Antonio -- dos ouvintes quando estes ouviram; quando o não ouvem, são atingidos por muitos naufrágios (desgraças morais).

Recursos de estilo 

Anáforas: Ah homens… Ah moradores… Quantos, correndo… Quantos, embarcados… Quantos, navegando… Quantos na nau… A interjeição visa atingir o coração dos ouvintes; a repetição do pronome indefinido realiza uma enumeração. Gradações: Nau Soberba, Nau Vingança, Nau Cobiça, Nau Sensualidade; "passa a virtude do peixezinho, da boca ao anzol, do anzol à linha, da linha à cana e da cana ao braço do pescador." O sentido é sempre uma intensificação para mais ou para menos. Antíteses: mar/terra, para cima/para baixo, Céu/Inferno. Palavras de sentido oposto indicam as duas direções do sermão: peixes - homens, bem - mal. Comparações: "… parecia um retrato maritimo de Santo António"; o peixe de Tobias, com um burel e uma corda, era uma espécie de Santo António do mar: as suas virtudes eram como as de Santo António. "… unidos como os dois vidros de um relógio de areia,": o peixe Quatro-Olhos possuía grande visão e precisão. Metáforas: "… águias, que são os linces do ar; os linces, que são as águias da terra": sentido de rapidez e de visão excepcional. 


Considerações

Primeira: Os homens pescam muito e tremem pouco. Segunda: "Se eu pregara aos homens e tivera a língua de Santo António, eu os fizera tremer." O verbo pescar é também metáfora de guerra; uma crítica à presença holandesa. Terceira: "… se tenho fé e uso da razão, só devo olhar direitamente para cima, e só direitamente para baixo". Os peixes são o sustento dos membros de várias ordens religiosas. Há peixes para os ricos e peixes para os pobres. Esta distinção tem por finalidade criticar a exploração dos ricos sobre os pobres.

Capítulo IV


Para comprovar a tese de que os homens se comem uns aos outros, o orador usa uma lógica implacável, apelando para os conhecimentos dos ouvintes e dando exemplos concretos. Os seus ouvintes sabiam a verdade do que ele afirmava, pois conheciam que os peixes se comem uns aos outros, os maiores comem os mais pequenos. Além disso, cita frequentemente a Sagrada Escritura, em que se apoia. Lendo hoje este capitulo, assim como todo o Sermão, não se pode ficar indiferente à lógica da argumentação. As conclusões são implacáveis, pois são fruto claríssimo dos argumentos usados.


O ritmo é variado: lento, rápido e muito rápido. Quando as frases são longas, o ritmo é repousado; quando as frases são curtas, quando se usam sucessivas anáforas nessas frases, o ritmo torna-se vivo, como acontece no exemplo do defunto e do réu. O discurso deste sermão, como doutros, é semelhante ao ondular das águas do mar: revoltas e vivas, espraiam-se depois pela areia como que espreguiçando-se. Uma das características maravilhosas do discurso de Vieira é a mudança de ritmo, que prende facilmente os ouvintes.

A repetição da forma verbal "vedes", que deverá ser acompanhada de um gesto expressivo, serve para criar na mente dos ouvintes (e dos leitores) um forte visualismo do espetáculo descrito.

O uso dos dêiticos -- recurso que tem por objetivo localizar o fato no tempo e espaço sem definí-lom sendo que alguns pronomes demonstrativos podem ser expressões dêiticas bem como certos advérbios -- tem por objectivo localizar os atos referidos, levando os ouvintes a revê-los nos espaços onde acontecem. A substantivação do infinitivo verbal está também ao serviço do visualismo. O verbo deixa de indicar acção limitada para se transformar numa situação alargada. 

Há uma passagem semelhante no momento em que o padre se refere à necessidade de o bem comum prevalecer sobre o apetite particular: "Não vedes que contra vós se emalham…".

Importante

O orador expõe a repreensão e depois comprova-a como fez com a primeira repreensão: dá o exemplo dos peixes que caem no engodo da isca, passa em seguida para o exemplo dos homens que enganam os indígenas e para a facilidade com que estes se deixam enganar. A crítica à exploração dos negros é cerrada e implacável. 

Conclui, respondendo à interrogação que fez, afirmando que os peixes são muito cegos e ignorantes e apresenta, em contraste, o exemplo de Santo António, que nunca se deixou enganar pela vaidade do mundo, fazendo-se pobre e simples, e assim pescou muitos para salvação.

Capítulo V


Episódio do Polvo -- Divisão em partes: Introdução: a aparência do polvo "O polvo… mansidão" (ll.177-179). Desenvolvimento: a realidade "E debaixo… pedra" (ll.179-187).  Conclusão: a consequência "E daqui… fá-lo prisioneiro" (ll.187-189). Comparação: "Fizera… traidor" (ll.190-196). 



A expressão "aparência tão modesta" traduz a aparente simplicidade e inocência do polvo, que encobre uma terrível realidade. O orador usa a ironia. A expressão "hipocrisia tão santa" contém em si um paradoxo: a hipocrisia nunca é santa; de novo, o orador usa uma fina e penetrante ironia: o polvo apresenta um ar de santo, mas encobre uma cruel realidade. Tem a máscara (que é o que quer dizer em grego hipócrita), o fingimento de inofensivo.

O mimetismo é o que o polvo usa para enganar: faz-se da cor do local ou dos objectos onde se instala. No camaleão, o mimetismo é um artifício de defesa contra os agressores, no polvo é um artifício para atacar os peixes desacautelados. O orador refere a lenda de Proteu para contrapor o mito à realidade: Proteu metamorfoseava-se para se defender de quem o perseguia; o polvo, ao contrário, usa essa qualidade para atacar.

Os dêiticos demonstrativos implicam a linguagem gestual e têm por intenção criar o visualismo na mente dos ouvintes. A anáfora, repetição da mesma palavra em início de frase, insiste no mesmo visualismo.

Os verbos que se referem ao polvo estão no presente do indicativo, traduzindo uma realidade permanente e imutável; a forma "vai passando" gerúndio perifrástico, acentua a forma despreocupada dos outros peixes que lentamente passam pelo local onde se encontra o traidor; os verbos que se referem a Judas estão no pretérito perfeito do indicativo porque referem ações do passado. Há ainda o imperativo "Vê", que traduz uma interpelação direta ao polvo, tornando o discurso mais vivo.

O polvo nunca ataca frontalmente, mas sempre à traição: primeiro, cria um engano, que consiste em fazer-se das cores onde se encontra; depois, ataca os inocentes. O texto deste capítulo segue a variedade de ritmos dos outros capítulos e apresenta os mesmos recursos para conseguir tal objetivo. Basta atentar no parágrafo que começa por "Rodeia a nau o tubarão… " e no texto referente ao polvo.

Elemento comum entre Judas e o polvo: a traição. Ambos foram vítimas deste defeito. Elementos diferentes entre Judas e o polvo: Judas apenas abraçou Cristo, outros o prenderam; o polvo abraça e prende. Judas atraiçoou Cristo à luz das lanternas; o polvo escurece-se, roubando a luz para que os outros peixes não vejam as suas cores. A traição de Judas é de grau inferior à do polvo.

Capítulo VI


Peroração: conclusão com a utilização de um desfecho forte para impactar o auditório e levá-lo a pôr em prática os ensinamentos do pregador. O padre quer que os homens imitem os peixes, isto é, guardem respeito e obediência a Deus. Numa palavra, pretende que os homens se convertam (metanóia).


As interrogações têm por objectivo atingirem preferencialmente a inteligência, enquanto as exclamações visam mais o sentimento dos ouvintes. As repetições põem em realce o paralelismo entre o orador e os peixes; as gradações intensificam um sentido.

Graça e conversão

A repetição do som /ai/ (11 vezes) cria uma atmosfera sonora cada vez mais intensa e otimista; a repetição das palavras "Louvai" e "Deus" apontam para a finalidade global do sermão: o louvor de Deus, que todos devem prestar. O verbo no imperativo realiza a função apelativa da linguagem: depois de ter inventariado os louvores e os defeitos dos peixes/ homens, não poderia deixar de apelar aos ouvintes para que louvem a Deus.

A escolha do hino Benedicite cumpre esse objetivo, encerrando o sermão com um tom festivo, adequado à comemoração de Santo António, cuja festa se celebrava. A palavra Amém significa "Assim seja", "que todos louvem a Deus". O quiasmo realizado na colocação em ordem inversa das palavras glória e graça sugere a transposição dos peixes para os homens: já que os peixes não são capazes de nenhuma dessas virtudes, mas os homens sim. Sugere também uma mudança: a conversão (metanóia), porque só em graça os homens podem dar glória a Deus.


Fontes

Lithis -- Análise de texto (www.lithis.net/19)
Wikipedia, a enciclopédia livre

jeudi 6 septembre 2012

Igreja Batista em Perdizes, 70 anos


Segunda-feira, dia 10, venha celebrar conosco os 70 anos da Igreja Batista em Perdizes. Teremos uma sessão solene na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, a partir das 10 horas da manhã. Chegue às 9 horas para tomar seu café da manhã conosco.

E para não se perder, localize-se
Avenida Pedro Álvares Cabral, 201
Ibirapuera

Sobre o não-ser para viver o ser

Compreendi que não há nada melhor do que a gente ter prazer naquilo que faz. Esta é a recompensa. Pois como é que podemos saber sobre o não-ser? – perguntou Qohélet.

Qoh procurou a felicidade e a paz. Foi objetivo e prático na avaliação de seu tempo e constatou que o evento humano está sujeito à lei da alternância, que vai além da explicação imediata: o humano não tem domínio sobre as dinâmicas que governam a morte e a vida. E procurou refúgio na sofia grega. O texto hebraico de Qohélet, com a presença de palavras aramaicas e persas, sugere autoria anônima, situada entre 450 e 200 antes de Cristo, e se apresentou com a apodadura de Salomão.

Qoh procurou entender o ser e o não-ser – aquilo que está fora, além da existência – no jogo de seus movimentos. Percebeu que não tinha controle sobre o movimento dos fenômenos do universo e viu que era preciso respeitar o espaço e o tempo para poder existir dentro do ritmo dos eventos.

Mas ele não foi o único a pensar nessas coisas. A pergunta pelo não-ser, presente na história do humano desde que ele é sapiens, levou à pergunta pelo sentido do ser. Qohélet – em português Eclesiastes e, segundo Haroldo de Campos, O-que-sabe – de forma magnífica, quase à maneira de Nietzsche, trabalhou o tema da morte e da vida e nos levou a pensar sobre a única realidade a que de fato temos acesso: a existência – terreno afetivo e emocional que produz e repousa sobre a riqueza material das humanidades. Qoh numa abordagem existencial discute o ser, sua integralidade e potencialidades.

Mas ele não foi o único a pensar a não-existência e a existência. Górgias (480-375 a.C.) traduziu no pensamento pré-socrático a dúvida sobre o não-ser e, por extensão, sobre o ser. Disse que se existisse alguma coisa, seria ser ou não-ser, ou ser e não-ser juntos. E se o não-ser existe, ele é e não-é ao mesmo tempo. Mas é absurdo dizer que alguma coisa existe e não-existe ao mesmo tempo. Para Górgias, em formulação matemática (pv¬p)v(p^¬p), a proposição “pv-p” é verdadeira. Mas “v” é verdadeiro se e somente se “p” for verdadeiro. Na lógica proposicional do filósofo pré-socrático temos, então, a negação de “p”. Donde, o não-ser não existe. Górgias disse mais do que isso, mas essa constatação, o não-ser não existe, é o que nos interessa nesse momento.

É interessante que Qoh apresentou o não-ser, aquilo que está fora, além da existência, de uma maneira que nos lembra Górgias. Disse que ninguém se lembra do que aconteceu no passado e que até as coisas que acontecerão no futuro também vão ser esquecidas. Que ninguém se lembra dos sábios, assim como ninguém se lembra dos imbecis, pois no futuro todos seremos esquecidos. Há tempo para nascer e tempo de morrer, mas todos caminham para um mesmo lugar, pois tudo vem do pó e tudo volta ao pó.

Disse, ainda, que felicitava os que já morreram mais do que os que estavam vivos. E considerou que mais vale o dia da morte do que o dia do nascimento. Ou, mais vale ir a uma casa em luto do que ir a uma casa em festa. Que ninguém é senhor do dia da própria morte e que nessa guerra não há trégua. Por isso, um cão vivo vale mais que um leão morto, já que os vivos sabem que irão morrer; mas os mortos não sabem de nada e não tem recompensa nenhuma: sua memória já está no esquecimento. O amor, ódio e ciúmes pereceram com eles. E nunca mais participarão de qualquer coisa que se faz debaixo do sol.

A consciência do não-ser remete ao sentido do ser. E aqui há uma diferença básica com Górgias, porque para ele a negação do não-ser é também a negação do ser e, por isso, fez três afirmações que marcaram o pensamento lógico-matemático e balizaram o ceticismo: não dá para dizer que algo existe; se alguma coisa existe não temos como conhecer sua existência; e se o ser existe não temos como explicar sua existência aos outros.

Já o argumento de Qoh, a partir do não-ser, afirma o sentido do ser, único conhecido. A negação do não-ser de Qoh expressa o desejo de ser em abundância, enquanto está, porque tem por limites as bordas do tempo de ser. O ser existe, mas tem espaço e tempo – hoje diríamos é existencial e histórico. Por isso, é melhor o sentido do ser, a intensidade das ações do ser do que ficar na espera do não-ser. Assim, quando o não-ser sinalizar que está chegando e se aproximar, teremos o prazer de ter sido plenamente, com intensidade, de forma abundante.

E, por isso, Qoh nos aconselha a aproveitar a vida, a ir em frente. A comer com prazer e beber alegremente o nosso vinho, pois o Eterno já aceitou deliciado o nosso bem-fazer. Sejamos felizes, diz O-que-sabe. Enquanto vivermos na fumaça desse mundo, curtamos a vida com a pessoa amada, pois essa é a recompensa pelo nosso fazer debaixo do sol. E o que tivermos para fazer, façamos ótimo, porque o não-ser é nada e no nada nada se faz, e no não-ser não existe conhecimento, nem pensamento, nem sabedoria. E depois do ser, vamos repousar no nada.

O fazer da existência vale a pena. O Eterno aprecia esse bem-fazer humano, que tem seu próprio tempo, que integra a existência de cada ser na história dos fazeres humanos. É por isso que Bereshit, o primeiro texto na Torah, apresenta um ponto zero. O tempo zero vai do entardecer à meia-noite. É quando o sol desilumina o nosso espaço de forma gradual. O tempo do não-ser não é uma fratura do tempo, é tempo da história. Qoh não contempla a passagem do tempo, mas a vinda do tempo. O tempo significa nada ou pouco para o Eterno, mas há um sentido de tempo para o humano. A conclusão de Qoh é que temos de ser no tempo para dar valor à eternidade que brota do nada do não-ser.

25/4/2009

Fonte: ViaPolítica/Jorge Pinheiro


 
 

O sonho e a oração

De manhã bem cedo em Paris, cinco horas a menos de fuso horário, cerca de meia-noite no Brasil, eu dormia e sonhei muito claramente com uma senhora que passaria por uma cirurgia. No sonho reuni jovens e começamos a orar.

Ao acordar, em seguida ao sonho, comecei a orar. Pensei em algumas amadas senhoras da Feliz Idade e em outras que não são da Feliz Idade, mas são tão amadas quanto. E minha oração foi: “Senhor, pelo amor a Jesus, seu Filho e nosso Salvador, dê vida a essa irmã, se for uma irmã em Cristo; a essa pessoa, que o Senhor ama, mas pode ainda não ser uma serva sua”.

Os detalhes de um sonho podem ou não ser importantes, mas nosso Deus sempre deixa claro o que Ele deseja de nós. E aqui o centro do meu sonho era: “Jorge, meu filho, ore por esta senhora, ela vai passar por uma cirurgia”.

E como no dia anterior estava estudando o salmo 80, o versículo 15 me veio à cabeça, como oração: “Vem e salva essa parreira que tu plantaste, esse ramo novo que fizeste crescer tão forte”.

O salmo 80 é um pedido a Deus que pode ser resumido no refrão dos versículos 3, 7 e 19: “Restaura-nos, ó Deus; faze resplandecer o teu rosto e seremos salvos”.

O salmo 80 é uma oração dirigida a Deus, o pastor de Israel, que está entronizado acima dos querubins. Nela o salmista clama: “até quando?” Pergunta sobre a duração da ira de Deus contra a nação desobediente. O salmo é um resumo da história do povo de Israel: a fuga do Egito, a conquista da terra prometida, a prosperidade na terra, o castigo pela mão de opressores. Mas aqui o salmista trabalha com a figura de uma videira plantada por Deus. E encerra o salmo pedindo que Deus olhe do céu e veja a circunstância triste do povo e intervenha para salvar a sua videira, o povo querido que está na sua mão direita. E o povo promete fidelidade a Deus.

Querida irmã, querido irmão, eu não sei por quem orei, mas Deus sabe. Nossa história é como aquela do povo de Israel no salmo 80: fugimos do mundo do pecado e isso não foi fácil. Conquistamos as promessas de uma vida nova através de Cristo e isso é muito gostoso e gratificante. Crescemos e prosperamos. Mas, às vezes, sofremos nas mãos adversas das circunstâncias, que podem ser enfermidades ou não.

Diante das circunstâncias adversas nossa arma é a oração. Vou continuar a orar pelas senhoras da minha igreja, pelas pessoas enfermas. Vamos fazer isso juntos, essa semana? Vamos juntos dizer para o pastor de Israel, que está entronizado acima dos querubins: “Restaura-nos, ó Deus; faze resplandecer o teu rosto e seremos salvos”.

E que todas e todos possamos clamar por restauração e prometer fidelidade Àquele que é Fiel. Amém!

Do pastor e amigo, Jorge Pinheiro.

Oremos

lundi 3 septembre 2012

JORGE PINHEIRO: Para ler Baruch

JORGE PINHEIRO: Para ler Baruch: Duas ou três palavras sobre BARUCH O rolo de Baruch é um deuterocanônico da Bíblia. Apesar de não estar na Bíblia hebraica é encontra...

Para ler Baruch


Duas ou três palavras sobre BARUCH

O rolo de Baruch é um deuterocanônico da Bíblia. Apesar de não estar na Bíblia hebraica é encontrado na Septuaginta e na Vulgata. Está ligado aos livros proféticos, Isaías, Jeremias e Lamentações, Ezequiel, Daniel e os doze profetas menores. O texto é apresentado como de autoria de Baruch ben Nerias, escriba de Jeremias. É possível, porém, que tenha sido escrito durante ou logo depois do período dos Macabeus. Na Vulgata, na Bíblia King James e outras versões, a Carta de Jeremias é anexada no fim do livro de Baruch como um sexto capítulo. Na Septuaginta aparece como um livro separado.

Baruch se apresenta

Baruch 1:1-7
Eis o texto do livro escrito por Baruch, filho de Nérias, filho de Maasias, filho de Sedecias, filho de Sedei, filho de Helcias, em Babilônia, no quinto ano, sétimo dia do (quinto) mês. Decorria o tempo em que os caldeus tomaram Jerusalém e a haviam incendiado. Leu Baruch este livro em presença de Jeconias, filho de Joaquim, rei de Judá, e de todo o povo, que para tal fim se reunira, dos nobres, príncipes reais, anciãos e de quantos residiam em Babilônia, às margens do rio Sodi, desde os mais simples até os mais elevados. Ao ouvi-lo, puseram-se todos a chorar e a jejuar, orando ao Senhor. Fizeram, em seguida, uma coleta de dinheiro, de acordo com as posses de cada um, e o produto enviaram a Jerusalém, ao sacerdote Joaquim, filho de Helcias, filho de Salom, assim como aos outros sacerdotes e a quantos ainda com ele se encontravam na cidade.

A mensagem de Baruch

Baruch 1.15-22
Eis o que direis: O Senhor, nosso Deus, é justo. Nós, porém, devemos, hoje, corar de vergonha, nós, homens de Judá e habitantes de Jerusalém, nossos reis e príncipes, sacerdotes, profetas e nossos pais, porque pecamos contra o Senhor. Nós lhe desobedecemos; recusamo-nos a ouvir a voz do Senhor, nosso Deus, e a seguir os mandamentos que nos deu. Desde o dia em que o Senhor tirou nossos pais do Egito até agora, persistimos em nos mostrar recalcitrantes contra o Senhor, nosso Deus, e, em nossa leviandade, recusamos escutar-lhe a voz. Por isso, como agora o vemos, persegue-nos a calamidade assim como a maldição que o Senhor pronunciara pela boca de Moisés, seu servo, quando este fez com que saíssem do Egito nossos pais, a fim de nos proporcionar uma terra que mana leite e mel. Contudo, a despeito dos avisos dos profetas que nos enviou, não escutamos a voz do Senhor, nosso Deus. Seguindo cada um de nós as inclinações perversas do coração, servimos a deuses estranhos e praticamos o mal ante os olhos do Senhor, nosso Deus.



Leituras de Baruch

Clemente de Alexandria cita Baruch 3.16-19, referindo-se à passagem: "Onde estão os chefes das nações que domavam os animais da terra, e brincavam com as aves do céu, que entesouravam prata e ouro, em quem os homens confiavam, e cujos bens são inesgotáveis? Onde estão aqueles que trabalham a prata com dificuldade? Nada resta de suas obras. Desapareceram, desceram à habitação dos mortos, e outros subiram ao lugar deles”.

Agostinho recorre ao texto de Baruch para falar da oração, ao dizer que quando recorremos a ela encontramos paz que excede o entendimento, mesmo quando não sabemos como orar, e a partir daí diz que o Santo Espírito intercede pelos santos.

Na Suma Teológica (III 4 4), Tomás de Aquino cita Baruch 3.38 ao dizer que "o Filho de Deus assumiu a natureza humana, a fim de mostrar-se à vista dos homens”. Esse trecho entra em sua discussão sobre a forma como se dá a união do divino com a natureza humana (III 4). Aquino cita a mesma passagem de Baruch em (III 40 1) para a responder à questão: Cristo se associou aos seres homens ou levou uma vida solitária? (III 40).

O livro de Baruch é utilizado pelos anglicanos e a perícope 4.21-29 é lida na véspera e 4.30-5.9 no dia de Natal, entendidos como profecia messiânica.

Os ortodoxos também utilizam seleções de Baruch, vistos como extensão do livro de Jeremias, e são lidos na véspera de Natal.

Algumas considerações

Podemos ler Baruch como parte da tradição profética de Israel. E compreender que ele nos fala sobre a vida, ao mostrar, numa sequência que tem origem em Moisés, que a vida implica em geração e regeneração, relação dialética que é ato inicial em que a eternidade faz crescer o humano. É obra do infinito. Mas geração e regeneração implicam em arrependimento e fé. Arrependimento é mudança na raiz da vida humana. E fé é a confiança e aceitação da vida como comissionamento. Nessa experiência de vida radical o humano pisa na terra, mas se eleva em direção ao céu. E o céu se derrama em direção à terra através do humano.

Assim, em Baruch, como nos demais profetas vétero-testamentários, a partir da consistência ontológica do humano, podemos compreender a vida. Quando descartamos a reflexão sobre o ser humano a quem a eternidade fala, temos um discurso meramente ideológico, distanciado do homem e da mulher verdadeiros e da realidade em que vivem e transformam. Temos, então, um ser humano-mito, onde naturalidade e historicidade transformam-se em alegoria.

O pressuposto fundamental dessa reflexão baruchiana sobe o sentido da vida traduz a verdade de que a compreensão da eternidade leva à compreensão do humano e de sua existência. Não se trata de conhecer o humano para conhecer o Eterno, porque o finito relativo não é infinito absoluto. Nesse sentido, a vida parte da infinitude absoluta.

Baruch diz no capítulo 5

Tira, Jerusalém, a veste de luto e de miséria; reveste, para sempre, os adornos da glória divina. Cobre-te com o manto da justiça que vem de Deus, e coloca sobre a cabeça o diadema da glória do Eterno. Deus vai mostrar à terra, e sob todos os céus, teu esplendor. Eis o nome que te é dado por Deus, para todo o sempre: Paz da Justiça e Esplendor do temor a Deus! Ergue-te, Jerusalém, galga os cumes e olha para o oriente! Olha: ao chamado do Altíssimo, reúnem-se teus filhos, desde o poente ao levante, felizes por se haver Deus lembrado deles. Quando de ti partiram, caminhavam a pé, arrastados pelos inimigos. Deus, porém, tos devolve, conduzidos com honras, quais príncipes reais, porque Deus dispôs que sejam abaixados os montes e as colinas, e enchidos os vales para que se una o solo, para que Israel caminhe com segurança sob a glória divina. As florestas e as árvores de suave fragrância darão sombra a Israel, por ordem do Senhor. Em verdade, é o próprio Deus quem conduz Israel, pleno de júbilo no esplendor de sua majestade, pela sua justiça, pela sua misericórdia!



mercredi 29 août 2012

O Eterno e os caminhos da Sabedoria

Baruque, capítulo 3

Senhor, todo-poderoso, Deus de Israel, é uma alma angustiada e um coração atormentado que clama a vós: Escutai, Senhor! Tende piedade! Porque pecamos contra vós. Estais sentado sobre um trono eterno, e nós caminhamos para um definitivo aniquilamento. Senhor, todo-poderoso, Deus de Israel, escutai a prece dos mortos de Israel, dos filhos daqueles que pecaram contra vós, que não atenderam à voz do Senhor, seu Deus, e por isso foram levados à desgraça. Não mais tomeis em conta os crimes de nossos pais, lembrai-vos, apenas, nesta hora, do poder de vosso nome.

Sois o Senhor nosso Deus, e nós queremos louvar-vos, Senhor. Por esse motivo é que nos inspirastes o temor a vós e a necessidade de vos invocar. Agora, em nosso exílio, vos louvamos, já que o nosso coração renunciou às iniqüidades de nossos pais, que contra vós pecaram. Olhai! Aqui vivemos em um exílio, para onde nos dispersastes, a fim de sermos objeto de opróbrio, de insultos e maldições, e para carregarmos o peso das culpas de nossos pais, que haviam abandonado o Senhor, nosso Deus. Escuta, Israel, os mandamentos de vida, medita, a fim de que aprendas a prudência. Donde vem, Israel, donde vem, que te encontras em terra inimiga, que definhas em solo estranho, passas por imundo, qual cadáver, és contado entre os ocupantes dos túmulos. Negligenciaste a fonte da sabedoria. Se houvesses caminhado pelas sendas de Deus, poderias habitar para sempre na paz.




Aprende onde se acha a prudência, a força e a inteligência, a fim de que saibas, ao mesmo tempo, onde se encontram a vida longa e a felicidade, o fulgor dos olhos e a paz. Quem jamais encontrou sua morada, e penetrou em seus domínios? Onde estão os chefes das nações que domavam os animais da terra, e brincavam com as aves do céu, que entesouravam prata e ouro, em quem os homens confiavam, e cujos bens são inesgotáveis? Onde estão aqueles que trabalham a prata com dificuldade? Nada resta de suas obras. Desapareceram, desceram à habitação dos mortos, e outros subiram ao lugar deles, os mais jovens viram o dia e habitaram a terra, não descobriram, porém, o caminho da sabedoria, nem conheceram a senda que a ela conduz. Também seus filhos não a alcançaram e longe permaneceram de seu caminho. Dela não se ouviu falar em Canaã nem foi vista em Temã. Mesmo os filhos de Agar, à procura de prudência terrestre, e os negociantes de Madiã e Temã, os amigos de provérbios e os desejosos de prudência, não puderam conhecer o caminho da sabedoria, nem dela obter informações sobre sua pista.

Ó Israel!, quão imensa é a casa de Deus, como é vasta a extensão de seus domínios! Sim, é vasta, imensa, ampla, ilimitada. Lá nasceram os famosos gigantes antigos, de estatura imensa e alma de guerreiros. Não os escolheu Deus, nem lhes mostrou o caminho da sabedoria. E por falta de sagacidade pereceram, vítimas da própria estultícia. Quem escalou o céu a fim de procurar a sabedoria, e a trouxe para baixo das nuvens Quem atravessou o mar para encontrá-la, e a adquiriu, ao preço do ouro mais puro Ninguém conhece o caminho que a ela conduz, nem sabe a pista que lá o possa levar. Somente aquele que tudo sabe a conhece, e por efeito de sua prudência a descobre, aquele que criou a terra para tempos que não findam, aquele que de animais a povoou, aquele que lança o relâmpago e o faz brilhar, que o chama e ele, bramindo, obedece. Brilham em seus postos as estrelas e se alegram, e as chama, e respondem: Aqui estamos. E jubilosas refulgem para o seu criador. É ele o nosso Deus, com ele nenhum outro se compara. Conhece a fundo os caminhos que conduzem à sabedoria, galardoando com ela Jacó, seu servo, e Israel, seu favorecido. Foi então que ela apareceu sobre a terra, onde permanece entre os homens.

lundi 27 août 2012

IV Jornada Científica da Faculdade Teológica Batista de São Paulo

Não dá para esquecer na gaveta a sua pesquisa científica na área da Teologia. Se você já pesquisou academicamente no seu curso de Teologia um tema relevante, faça sua inscrição. Super abraço para todos e todas. Jorge Pinheiro.

As inscrições serão feitas pelo site do evento. Qualquer dúvida deve ser esclarecida por meio do Fale Conosco

Investimento:

alunos R$25,00 (sem almoço)
demais participantes R$45,00 (sem almoço)
Click aqui para fazer a inscrição.


Local – Faculdade Teológica Batista de São Paulo
R. João Ramalho. 466 – Perdizes. Próximo ao terminal Barra Funda.
Telefone (11) 3879-3600 (seg-sex: das 9h30 às 12h00 e das 14h00 às 21h00)
www.teologica.br - cademica@teologica.br  


Data – 15 de setembro de 2012

Hora – Credenciamento: 8h30.
             Abertura 9h

Observações gerais

As inscrições serão feitas pelo site do evento sob coordenação da Secretaria da Faculdade
Os trabalhos inscritos serão postados no site.
A Coordenação acadêmica é responsável pelo encaminhamento dos trabalhos à Comissão Científica e por fazer contato com os inscritos.
A Comissão Científica avaliará os trabalhos e dará retorno à Comissão Organizadora para providências às comunicações e pôsteres.

vendredi 24 août 2012

Noé, bom entre os bons

Esboço de sermão para meus alunos de Homilética -- e para todos os leitores e leitoras do blog












Fontes
Derek Kidner, Gênesis, introdução e comentário, São Paulo, Editora Vida Nova.
Moisés Katznelson, tradutor judaico de La Biblia hebreo-español, Telavive, Editorial Sinai, Israel.
Ruben Sternschein, "Noah, ser bom entre os bons" in Arte e sabedoria milenar semana a semana -- o que a Torá nos diz hoje, São Paulo, Congregação Israelita Paulista, 2012, p. 18.

mercredi 22 août 2012

Aquele que matou Ícaro

Peça em três atos. Todos os personagens estão em cena desde o início, apenas o jogo de luz define o cenário, quando os personagens em cada ato são iluminados. Quando um personagem fala, a luz vai se tornando mais intensa. Quando ele se cala, a luz declina. E quando o outro personagem fala, iluminado, vive processo idêntico. No palco há um espelho, que fala como imagens de televisão. As imagens em bricolagem desfilam enquanto Macário, o espelho, fala. Mas, outras montagens, cenários e luzes são possíveis. O diretor define. Para os leitores, fica o desafio: façam a leitura do texto em voz alta. Depois dos ensaios, convidem os amigos e vizinhos. Encenem. O teatro faz bem à alma.

Primeiro ato
Ao amanhecer, no palácio de Cócalo, rei de Câmico, na costa meridional da Sicília.

Dédalo -- Bom dia, Macário.

Macário -- Bom dia, Dédalo.

Macário (continua) -- Por que você abandonou Ícaro, como Jefté fez com a menina? Eu bem que avisei você, Dédalo. Eu disse para você não fazer como Jefté, que disse: eu queimarei em sacrifício aquele que sair primeiro da minha casa para me encontrar quando eu voltar da guerra. Eu o oferecerei em sacrifício ao Eterno. Você tinha que dominar a sua arte, caso contrário ela se tornaria inimiga, se colocaria à porta do seu coração como uma fera querendo saltar em cima e devorar você. Cabia a você dominá-la.

Dédalo -- Dominá-la! Dominá-la! O que significa isso, Macário? E quando eu me engalfinho com ela, quando dou pernada e levo sopapos da minha arte, para ter controle sobre ela, já não estou tão envolvido, que de bela fera imaginada ela já não é realidade vivida no peito que dói?

Macário -- Mas eu vi quando você abandonou Ícaro. Você o levou lá para cima, acima das colinas, das pastagens de Creta, vagando pelo azul, e não ficaram os dois, um e outro, o par olhando para as ondas debaixo. E vagou com as nuvens, flutuou na imensidão, cheio de prazer e realização. Coitado de você Dédalo, arquiteto de engenho e arte. Você se bastou, deixou o menino se esgueirar alucinado em direção ao sol forte.

Dédalo -- Para você é fácil julgar, Macário. Você é reflexo da minha loucura, assim como foi reflexo dos caminhos de meu filho. Você é meu inverso, como foi dele, você se mexe, mas está fixo. E quando a gente é um ponto fixo e o resto é cenário é fácil julgar. Você é o sagrado que me consome. Você é a minha dimensão apofática, negação daquilo que sou, é martírio, cruz, morte. Através de você mergulho nas trevas. É isso mesmo Macário, reconheço a minha arrogância e desejo, esse é o meu desejo, que no reconhecimento do desvario possa conhecer para além da razão.

Macário -- Eu sei que é por isso que nos vemos todos os dias. Que é por isso que você levanta, fica diante de mim e começamos a conversar. Eu, Macário, sou misterium tremendum que esmaga e leva o medo até a profundidade da sua alma. Esse temor qualitativo, motivo para reflexão e energia, faz de você meu adorador.

Dédalo -- Eu sei, Macário, meu senhor, que necessito ser como você. Quero incorporar aquilo que me é distinto. Mas, apesar de nossa intimidade a cada manhã, permanece esse abismo entre eu, adorador, e você, sagrado. Desejo saltar o abismo que nos separa, e talvez seja esse o móvel que faz de mim espiritual, ao imitar a queda de Ícaro, o amor do filósofo e a insanidade da juventude. Talvez...

Macário -- Agora, não dá mais, Dédalo! Eu vi você abandonar Dédalo. Você o derrubou, você derreteu as asas dele. Com sua imaginação, com suas mãos de escultor você o puxou para a imensidão do Egeu. Você não o olhou nos olhos. Olhos nos olhos. Dois de realização, egocentrados, dois de terror, caindo no abismo. E você continuou seu vôo de prazer profundo. Esqueceu, abandonou, não viu o rosto aterrorizado que mergulhava. Profundo, vil prazer. E você, mestre, fez os olhos temerosos saltarem. Eu vi, Dédalo. E isso você vai ver também, a cada manhã que olhar para mim.

Dédalo -- Ah! Querido Ícaro, estou perdido nos meus labirintos. Vejo seus cabelos cacheados, os olhos negros, instigantes, voadores. O rosto de jovem que sonha, queimado pelo sol esperto. Ah! Miserável homem que sou, quem livrará o meu corpo da morte?

Macário -- Dédalo, a sua confusão já não está, mas também não estão a escultura e o vôo. Você matou Ícaro e metade da sua alma se foi. Vou colocar no seu rosto, a marca dos olhos desesperados, que olham para além do que todo mundo vê. E as pessoas que olharem para você verão que você vê o que elas não vêem. E fugirão de você por isso. E não matarão você porque vão ficar com medo. E essa será a vingança que Ícaro me autorizou dar a você. Vagar sem esperança pelo labirinto da vida.

Segundo ato
Ao entardecer, num orquidário em Jardim, na chapada do Araripe.

Carvoeiro – Eu vejo a dor de Dédalo de maneira diferente. Dédalo sempre esteve sujo como eu. Bicho humano vivia na sombra. Vou prosar uma toada. Dédalo estava preso na mina, que tinha só uma luz do sol iluminada na entrada. Lá desde a infância teve a cabeça e as pernas amarradas de movimentos. Bicho preso, só conseguia ver o que estava diante. Não tinha voltar do rosto e olhar para trás. Mas, atrás dele, a luz do candeeiro do céu alumiava. Entre a ilustração e Dédalo havia um caminho, mas também um tapume alto. Lá estava Dédalo, libertário, infância a dentro...

Maquinista – Não sei aonde você quer chegar, mas Dédalo é um do protesto. Está livre para criar e fazer. Com ele não tem contras, é ranzinza para a norma dos deuses. As amarrações antigas não têm para ele, o que é engenharia é bom. Legal é novidoso, é bênção buscada. Vou ficar afluente! Ser ourudo está no ninho do coração de Dédalo e não conseguir é pecado.

Guarda-chuva – Não sei não. Vocês são complicados. Acho que já está escrito quando se nasce. Sou guarda-chuva e aqui todo mundo me conhece assim. Quando cheguei, ela estava na cama aos berros. Fiz psiu para se acalmar, embora berrar não fosse mau. Peguei jornal e coloquei debaixo dela. Peguei a minha tesoura, linha de algodão e cortei em três pedaços de vinte e cinco centímetros. Peguei o cobertor, na verdade uma colcha fina que estava ao lado da cama. Dobrei em três e coloquei em cima da mulher. Minhas mãos estavam limpas, mas eu esfreguei com álcool.

Carvoeiro – Espera aí guarda chuva, eu quero continuar. Dédalo se livrou dos nós das amarrações, mas não da astúcia das idéias. Desatado, levantou, voltou a cabeça, andou, olhou para a luz. Como o filho, Dédalo sofreu muito: a iluminação foi coisa de dor, mas o deslumbrou e ele não conseguiu ver as gentes por inteiro. Foi isso que aconteceu com Dédalo, o engenho e a arte dançaram na frente dos olhos dele e queimaram! Que confusão, as verdades doeram, e a astúcia das idéias foi bem mais amistosa do que o mundo transiluminado pelo candeeiro do meio-dia! O filho despencou lá de cima e Dédalo foi para a Sicília.

Maquinista – Dédalo se lançou, cheio do espírito, no criar e fazer no mundão besta. É arquiteto virtuoso, de virtude aburguesada. É puro dos modernosos, cheio de economias e racionalidades, e quer que tudo que é criatura seja trabalhador sóbrio e industrioso, aferrado no manejo, destinado na vida amarrada pelos divinos. Dédalo quer tudo que é criatura debaixo do mando dele, que é decreto eterno vindo dos deuses.

Guarda-chuva – Sei não. Vocês são complicados. Acho que coisa má nasce feita. Quando as contrações aumentaram e a bolsa d´água rompeu, coloquei os dois travesseiros que encontrei para amparar a cabeça e as costas da mulher. Ela começou a fazer força, retinha a respiração e segurou as coxas por trás dos joelhos, puxando as pernas. Apareceu a cabeça. Coloquei uma toalha embaixo das nádegas dela. Mas eu não tinha outra toalha para colocar entre as pernas da mulher. Amparei a cabeça roliça da criança com as mãos em concha. Tinha uma membrana, mas retirei. Para complicar, o cordão veio enrolado no pescoço. Coloquei um dedo por baixo do cordão, afrouxei e passei o cordão por cima da cabeça. Disse para a mulher parar de fazer força. Eu queria que a criança nascesse feliz, sorrindo, sem ruína da vida.

Maquinista --- A sina de Dédalo é essa, ficou na especialização, esqueceu que casa de gente é terra e céu. Dédalo é ciborgue, meio gente, meio máquina, e quando fala faz ruído de máquina. E não fala sem máquina. Dédalo tem o estilo da máquina e vai parir máquinas até a última gota de combustível. Mesmo no céu, está preso na mina, como disse o carvoeiro, mas a mina é de ferro, sistema de uso e danação das idéias livres e do fazer gostoso.

Guarda-chuva -- Principio a entender, mas não sei se concordo com vocês. Quando um ombro começou a sair, amparei, e o outro veio saindo também. Segurei o resto do corpo com as mãos. Não puxei o menino, que poderia se chamar Dédalo. Por que não? E o resto do corpo veio em baba de quiabo. Retirei as gosmas da boca e do nariz com um pano. Segurei de ponta cabeça e o resto da baba saiu. Chorou raivoso o choro dos infelizes. Coloquei-o de costas, amarrei o cordão com as linhas de algodão. Dei dois nós, um mais ou menos a quinze centímetros e outro a vinte centímetros do umbigo. Cortei entre os nós. E fiz depois um terceiro nó a dez centímetros do umbigo e cobri o umbigo com um tampão. Entreguei Dédalo para a mãe. Ele já estava agasalhado. Cobri a mulher e fiquei esperando aquela água-viva vir escorrendo. Coloquei num prato, cortei em pedaços pequenos e dei para ela comer. Eu não jogo a vida fora. Por isso, sou guarda-chuva de fama aqui no Jardim.

Terceiro ato
Ao amanhecer, no palácio de Cócalo, rei de Câmico, na costa meridional da Sicília.

Dédalo -- Que tristeza profunda! Minha sem-vida começa agora, é vazio, não há reino, nem fé, nem paciência. Não há utopia: perdi os sentidos, o êxtase, o presente também.

Macário -- É isso mesmo, Dédalo. Para você não há mais iluminação, nenhuma notícia boa. Você começou a vagar com desespero, sem perspectiva, cheio de medo. E olhar o mundo assim é terrível. Não há mais fonte inesgotável para a imaginação, não há mais transformação. Não há mais possibilidades emergentes à luz do futuro prometido.

Dédalo -- Estou na Sicília, no palácio de Cócalo, e o que vejo? Gente sem âmago, só pedaços. Não há sinais, nem caminho. Não há sentido cronológico de término, não há a absoluta necessidade de pensar o fim, não há kairos, significado maior e profundo na história. Não há expectativa, lúdico, alegria, não há um momento de grande emoção.

Macário -- É a sina de olhar o mundo sem ter Ícaro junto. O que parecia ser bom, ao deixar o labirinto para trás, é queda e perda de sentido. A alegria, felicidade e destino escorrem entre os dedos. Sem Ícaro você é só infeliz. E assim fica o que você vê. Por isso, você precisa cada vez mais de mim. Por isso, todos os dias, você tem que olhar e conversar comigo, ver o vivo e o morto, chorar e ter medo. Não há salvação para você. Infeliz, porque o sol derreteu a aventura e o risco. Não há mais tempo oportuno, não existe para você um começar agora de esperança.

mardi 21 août 2012

Lições de existência


As pessoas são tocadas pelo amor. Nada sensibiliza mais o ser humano, talvez por isso o rolo bíblico de Cantares compare a paixão à força da morte, já que os dois estados se nos apresentem como definitivos. Caso você já tenha estado apaixonado ou apaixonada sabe como é.

Versão completa, dublada, para você curtir com calma

Num domingo de janeiro preparei este prefácio de manhã a partir daquilo que chamei Lições de amor. Foi um pensar na gratidão ao Eterno, um jeito de dizer a Ele que o amo. E pensando, me remeti a um filme de 2001, Uma lição de amor (veja acima), que conta a história de um pai com deficiência mental e uma filha, de sete anos, que começa a ultrapassá-lo intelectualmente. No filme, uma assistente social quer levar a menina para um orfanato, alegando que o pai não tem condições de criar a filha. Foi nesse momento que me deparei com dois dois textos, o de Cantares (8.6), já citado acima, e outro, também belíssimo, de um profeta mal compreendido e meio abandonado, Oséias (2.14-23). 

Minha leitura de Deus, um delírio, de Richard Dawkins, não fez o efeito que ele esperava. Na verdade, me levou a uma outra leitura: fiz uma ponte entre as lições de amor do Eterno e a minha paixão por Ele. E foi assim que surgiu esse prefácio, num discurso sobre as minhas provas da existência do Eterno, que divido em três: (1) o “Noturno Opus 9, no. 2” de Chopin, (2) a roda e (3) a raiz quadrada de menos 1. Talvez, você, querido leitor do meu amigo Jorge Luiz Sperandio, esteja achando que estou louco, o que pode não ser mentira, mas se tiver curiosidade e paciência, vai entender o caminho que trilhei. E esse caminho, que vai na contramão do que Dawkins disse, nos ajuda a entender porque Sperandio está preocupado com os temas centrais da fé cristã, criação, pecado e salvação. Enfim, as lições de amor e essas minhas provas da existência do Eterno se correlacionaram, e levam a uma teoria da existência. 

Eternidade e amor estão entrelaçados, e vejo isso quando sou obrigado a pensar uma teoria da existência. E, metodologicamente, como teólogo, a primeira coisa que devo me perguntar é se uma coisa existe ou não existe. E isso significa trabalhar com variáveis: (1) uma coisa existe; (2) uma coisa não existe; (3) uma coisa não existe, mas já existiu, deixou de existir e não existe mais, porém poderia existir. 

Devo pensar também, e essa questão é um pouco mais complexa, que a existência existe. E ainda que eu diga que existência é espaço/tempo, como não temos espaço apenas, ou tempo apenas, a existência existe. Não dá para dizer que a existência não existe, ela é realidade no cosmo, produz diferença no mundo. Caso não existisse a existência, então, nada existiria. 

Mas, outra questão deve ser colocada: se posso falar numa teoria da existência, preciso entender que posso apreendê-la enquanto atos de conhecimento. E ato de conhecimento é uma ação consciente sobre algo que existe ou uma realidade. Por isso, os atos de conhecimento nos remetem a pessoas que são conscientes e podem conhecer a existência através de seus processos e modos. 

As pessoas são tocadas pelo amor. Nada sensibiliza mais o ser humano do que o amor, como dissemos acima. E, por isso, o amor e a morte se nos apresentam como estados definitivos. Caso você já tenha estado apaixonado ou apaixonada sabe como é. 

E Oséias contou que o Eterno disse (2.14-18): “Vou seduzir a minha amada e levá-la de novo para o deserto, onde lhe falarei do meu amor. Ali, eu devolverei a ela as suas plantações de uvas e transformarei o vale da Desgraça em porta de esperança. Então ela falará comigo como fazia no tempo em que era moça, quando saiu do Egito. Mais uma vez ela me chamará de “meu marido”, em vez de me chamar “meu senhor” (meu baal). Nunca mais deixarei que ela diga o nome baal, nunca mais ela falará desse deus. Sou eu o Senhor quem está falando. Naquele dia, farei a favor dela uma aliança com os animais selvagens, com as aves, com as cobras, para que não ataquem a minha amada. Quebrarei as armas de guerra, os arcos e as espadas. Não haverá mais guerra e o meu povo viverá em paz e segurança. Israel, eu casarei com você, e para sempre você será minha legítima esposa. Eu tratarei você com amor e carinho, e serei um marido fiel. Então, você se dedicará a mim, o Senhor. Naquele dia, serei o Deus que atende: atenderei o pedido dos céus, os céus atenderão o pedido da terra, dando-lhe chuvas. E a terra responderá produzindo trigo, uvas e azeitonas. Assim, eu atenderei as orações do meu povo de Israel. Plantarei o meu povo na Terra Prometida para que eles sejam a minha própria plantação. E eu amarei aquela que se chama Não-Amada, e para aquele que se chama Não-Meu-Povo eu direi: “Você é meu povo” e ele responderá: “Tu és meu Deus”. 

Agora, vamos desconstruir o texto de Oséias e relacioná-lo com a teoria da existência. 

Deslumbrar e fascinar são desafios da existência e isso está expresso do texto de Oséias, quando o Eterno diz: “Vou seduzir a minha amada e levá-la de novo para o deserto, onde lhe falarei do meu amor”. A travessia do deserto, quando os hebreus fugiram do Egito, foi um tempo de intimidade com a eternidade, uma porta de esperança, diferente do vale da desgraça, onde o soldado Acã foi condenado à morte por traição. 

Assim, nessa correlação entre eternidade e amor, podemos discutir a existência a partir dos noturnos de Frederico Francisco Chopin. Esses noturnos eram cantos livres, que traduziam as experiências pessoais de Chopin e expressavam sua espiritualidade. Diria que os noturnos desse músico são o deserto do profeta Oséias, espaço/tempo de intimidade com a eternidade. 

Particularmente, sou apaixonado pelo Noturno Opus 9 no. 2, que tem a propriedade de ser uma obra de criação e pertença de um humano sensível. É peculiar, diria inédita e exclusiva. E ao dizer essas coisas, afirmo não apenas que existe, mas sou obrigado a falar de sua natureza, de sua essência. Ou seja, saber que o Noturno Opus 9 no. 2 de Chopin existe, significa dizer que não existem outros Noturnos Opus 9 no. 2. Só existe esse. 

Baal e îche são outros dois desafios da existência 

E as lições de amor nos trazem de volta a Oséias, quando o Eterno diz: “Ela me chamará de meu marido”. E Isaías (54:4-5) conta que o Eterno disse: “Não temas, porque não serás envergonhada; não te envergonhes, porque não sofrerás humilhação; pois te esquecerás da vergonha da tua mocidade e não mais te lembrarás do opróbrio da tua viuvez. Porque o teu Criador é o teu marido; o Senhor dos Exércitos é o seu nome; e o Santo de Israel é o teu Redentor; ele é chamado o Deus de toda a terra”. 

E mais uma vez a correlação entre amor e eternidade me remeteu a outro processo da existência, que vou analisar a partir de uma das mais simples máquinas que construímos: a roda. Todos conhecemos as suas aplicações e sabemos que crescem a cada dia: vão do uso nos transportes à utilização nas mais diferentes máquinas mecânicas. Mas é simples: caracteriza-se pelo movimento de rotação em seu interior. Em mecânica diz-se que o seu fato mais importante é determinado pela a transmissão de força, velocidade e distância, que se dá pela relação entre o diâmetro da borda da roda e o diâmetro do eixo. 

Ora, a roda nos remete ao trocadilho que Oséias fez com a palavra baal, que era o deus da fertilidade dos cananeus, mas cuja palavra significava também senhor e marido. Oséias não quer que sua amada o chame de baal, mas de îche, homem, que por extensão poderia significar também marido e herói. 

Esse exemplo, o da roda, nos ajuda a entender a questão da existência, que não é uma propriedade que pertence, mas é o pertencimento a uma propriedade. Pense na roda, no conceito roda e em todas que existem ou podem existir. A existência da roda consiste em participar de relações de predicados. Assim, a existência da roda significa que pertence a propriedades ou é parte de propriedades. Nesse sentido, a existência é sempre participação na relação de predicados. Como baal ou îche

Celebrar a imagem que transcende é um desafio fundante da existência 

E para sempre você será minha legítima esposa”, disse o Eterno sobre sua amada. Oséias utiliza esse recurso para falar de uma aliança que transcende os predicados definidos pela existência. 

Ou como o Eterno disse ao profeta Jeremias (31.33-34): “Quando esse tempo chegar, farei com o povo de Israel esta aliança: eu porei a minha lei na mente deles e no coração deles a escreverei; eu serei o Deus deles, e eles serão o meu povo. Sou eu, o Senhor, quem está falando. Ninguém vai precisar ensinar o seu patrício nem o seu parente, dizendo: “Procure conhecer a Deus, o Senhor.” Porque todos me conhecerão, tanto as pessoas mais importantes como as mais humildes. Pois eu perdoarei os seus pecados e nunca mais lembrarei das suas maldades. Eu, o Senhor, estou falando”. 

Aqui entra o meu terceiro exemplo dessa correlação entre eternidade e amor e os desafios de uma teoria da existência: a raiz quadrada de menos 1 (√-1). Como vimos, as coisas que existem tem suas propriedades. Quando alguma coisa não tem condições de ter existência comprovada ou não tem pertença/predicados, ela fica fora das leis fundamentais da lógica e da existência dos atos de conhecimento. Por isso, em matemática falamos em unidade imaginária i, enquanto solução da equação quadrática: x2+1=0, da qual decorre x2=−1. 

Ou, dessa séria questão existencial x=√-1, onde a unidade imaginária é i=√-1. Dentro da lógica matemática não posso dizer que este número exista, ele é imaginário porque é um recurso da minha imaginação, pois não há número real cujo quadrado seja negativo. E isso é um fato. Imagina-se, então, que haja números especiais, dotados de propriedades que satisfaçam essa exigência da imaginação. E assim a matemática criou uma classe de números: os imaginários, que não são reais. 

E, agora, voltemos ao filme. O que os amigos do pai deficiente mental entendiam, e a assistente social não, era que havia entre o pai e a filha uma aliança maior, que transcendia em muito suas deficiências intelectuais, uma aliança de amor. 

Dessa maneira, nessa correlação tresloucada entre eternidade e amor digo que uma teoria da existência parte de três fundamentos: (1) a diferença entre existir e não existir, e que essa diferença não é um atributo, não é uma propriedade; (2) a existência não faz parte da essência de cada coisa, mas cada coisa, todas as coisas mostram diferenças entre natureza e existência; (3) a mente transcende, produz representações que agregam conhecimento e constroem sentido para a existência. É o que Dawkins não entende e que Sperandio, com paciência e amor, explica a ele. 

Assim, na correlação eternidade/amor, a existência deslumbra e fascina; é baal e îche; transcende e cria a imagem que alucina. E faça uma boa leitura. 





lundi 20 août 2012

Aqui e agora

Que relação existe entre o tempo presente e o crítica protestante? Para responder a esta questão é necessário antes que nada entender o tempo presente. Falar da situação espiritual do tempo presente [1] pode significar duas coisas. É dizer que vamos de uma situação contingente em direção a um ponto de vista superior. O tempo presente seria, então, parte de uma situação mais geral. O momento presente estaria enquadrado no caminhar do processo histórico. 



E para fazer a leitura desse tempo presente pode-se recorrer à análise histórica, à avaliação crítica ou à construção filosófica. Algumas vezes, porém, algum desses elementos falha. Por isso, não basta observar o tempo presente. Estamos excessivamente ligados a ele, o que nos pode levar a escorregar para um julgamento do ser enquanto aqui e agora e esquecer que devemos estar voltados para o futuro. 


O momento é importante, mas transformar o exame da situação espiritual do tempo presente em apreciação subjetiva é realizar uma redução, é ver a situação como totalidade e permanência. Olhando assim colocamos a situação num patamar elevado e a perspectiva que temos é aparentemente ampla e global, apesar de seu caráter individual e limitado. 

Tal análise do momento pode levar a uma ampla aprovação e tocar emocionalmente setores expressivos da sociedade e comunidades inteiras. Um exemplo foi o trabalho de Spengler, A decadência do Ocidente, onde o filósofo alemão parte da profunda crise de seu país no primeiro pós-guerra e conclui que a cultura ocidental chegou ao fim. 

Esta é uma maneira de ver. Ela pode ser qualificada como parcial e limitada, mesmo quando apresenta análises de conjuntura e perspectivas para o futuro. Mas por que então parcial? Porque não aceita suas responsabilidades. Porque não reconhece os limites daquele que observa, assim como de seu próprio horizonte. [2] 

Mas se existe um nível mais elevado, mais amplo do que este analisado pelo observador, somos levados a falar da situação espiritual do tempo presente, possibilidade que pode ser qualificada de responsável. E é possível chegar a tal patamar de observação? [3]

Caso exista um ponto de vista mais elevado, a partir do qual se posicione um atalaia do tempo presente, como deve ser este mirante? Deve estar numa altura acima de qualquer comparação. Só o absolutamente inacessível, incomparável, incondicionado, livre das amarras do historicismo, pode ser de fato responsável. 

Partindo dessa realidade, pode-se dizer que existiram pessoas que interpretaram a situação espiritual de uma época dada. Eis aqui o ponto de intersecção entre o tempo presente e a crítica protestante. Seguindo a trilha aberta por Tillich, que cita a paixão de Troeltsch no combate ao historicismo, e que terá seus estudos sobre profetismo reconhecidos inclusive por estudiosos judeus, [4] é possível afirmar que o princípio profético traduz inquietude e descontentamento em relação aos acontecimentos sociais e religiosos concretos. 

Há uma semelhante busca ética de respostas entre aquele que encarna a crítica protestante e a ação consciente do intelectual orgânico [5]. Ambos representam determinada comunidade, têm função superestrutural e, apesar de sua organicidade, precisam exercer autonomia em relação às pressões sociais que sofrem. É dessa postura que nasce a força crítica e a compreensão de que diante da realidade há alternativas diferentes daquelas expressas pelo poder. E um poeta nosso expõe isso muito bem. Vamos ouvir Thiago Grulha. 

Notas
[1] Paul Tillich, Kairós II in Christianisme et Socialisme, Écrits socialistes allemands (1919-1931), Les Éditions du Cerf, Éditions Labor et Fides, Les Presses de l’Université Laval, 1992, pp. 255-267, tradução francesa do original Kairós. Zur Geisteslage und Geisteswendung, Gesammelte Werke, 1926, VI, pp. 29-41. 
[2] Idem, op. cit., p. 255. 
[3] Idem, op.cit., p. 255. 
[4] León Epsztein, em A Justiça Social no Antigo Oriente Médio e o Povo da Bíblia, São Paulo, Edições Paulinas, 1990, p. 116 cita E. Troeltsch, Das Ethos der hebraischen Propheten, in Log., 191, p. 1:28. 
[5] “Se e a relação entre intelectuais e povo-nação, entre dirigentes e dirigidos - entre governantes e governados - é dada por uma adesão orgânica, na qual o sentimento paixão torna-se compreensão e portanto saber (não mecanicamente, mas de forma viva), é somente então que a relação é de representação e que se produz o intercâmbio de elementos individuais entre governados e governantes, entre dirigidos e dirigentes, isto é: que se realiza a vida conjunta que, só ela, é a vida social, cria-se um bloco histórico”. Antonio Gramsci, Il Materialismo Storico e la Filosofia di Benedetto Croce, Turim, Einaudi, 1966, p. 115. 


Tempo Para Amar
Thiago Grulha

Olhei no relógio e o dia já se foi
E eu não disse te amo pra ninguém
Até tive chances mas deixei pra depois
Quanta coisa na vida eu deixei pra depois também,
Pra depois também
Estava com pressa
Não abracei meus pais
Não escutei a quem pedia atenção
Pra correr e vencer, deixei amigos pra trás
Estou ganhando o mundo
Perdendo meu coração

Quem não tem tempo para amar
Morre por dentro a cada segundo
Nós fomos feitos para amar
O amor de Deus transforma o mundo

Olhei no relógio e ainda é cedo, eu sinto a alma amanhecer
O amor perfeito lança fora o medo
Quem decide amar, decide viver
Decide viver

Quantos esperam o nosso olhar de amor
Palavras que confortem o coração
Em dia de guerra, de ódio e rancor

Só o amor de Deus é que traz salvação

Quem não tem tempo para amar
Morre por dentro a cada segundo
Nós fomos feitos para amar
O amor de Deus transforma o mundo

Quem não tem tempo para amar
Morre com o tempo a cada segundo, a cada segundo
Nós fomos feitos para amar
O amor de Deus transforma o mundo
O amor de Deus transforma o mundo
O amor de Deus transforma tudo.

dimanche 19 août 2012

A dúvida e a situação-limite humana

“A existência humana é a elevação do ser à dimensão da liberdade. O ser se liberta das cadeias da necessidade natural. Torna-se espírito e adquire liberdade de se questionar a si mesmo, o seu ambiente, de questionar a verdade e o bem e de decidir a seu respeito. Entretanto, há nessa liberdade certa falta de liberdade, pois somos todos compelidos a decidir. ‘Essa inevitabilidade da liberdade, de ter que decidir, cria profunda inquietude da existência; é por esse meio que a existência passa a ser ameaçada’. Tudo isso, porque somos confrontados por uma exigência incondicional de escolher o bem e de realizá-lo, na mesma medida em que isso não pode ser alcançado. Conseqüentemente, o ser humano, na sua dimensão espiritual carrega em si uma ruptura, que também se manifesta na sociedade. Não é possível fugir dessa exigência. Ao enfrenta-la jamais se reveste de segurança absoluta. Trata-se pois do que Tillich chama de ‘situação humana limite’: todas as seguranças que construímos são questionadas e as possibilidades humanas alcançam e descobrem seus limites”. James Luther Adams, O conceito de era protestante segundo Paul Tillich, in Paul Tillich, A Era Protestante, SBC, Ciências da Religião, 1992, p. 301.

“Observamos aqui um dos aspectos mais originais e notáveis da doutrina da justificação em Tillich. Lutero aplicava essa doutrina apenas à vida religiosa-moral. O pecador, não obstante ser injusto era ‘justificado’. Tillich aplica a mesma doutrina igualmente à esfera religiosa-intelectual. Nenhuma autoridade tem o direito de exigir, na verdade, a aceitação de qualquer crença ‘correta’ de quem quer que seja. A devoção à verdade é suprema; é devoção a Deus. Existe sempre um elemento sagrado na integridade que conduz à dúvida mesmo sobre Deus e a religião. Na verdade, se Deus é a verdade, Ele é a base e não o objeto das questões a seu respeito. Qualquer lealdade à verdade será sempre religiosa, mesmo quando acabar constatando a falta de verdade. Parafraseando Agostinho, a pessoa que duvida com seriedade terá de dizer: ‘Duvido, logo sou religioso’. O divino se faz presente até mesmo na dúvida. O ateísmo absolutamente sério pode se dirigir ao incondicional; pode ser uma forma de fé na verdade. Vê-se aqui a conquista da falta de sentido pela consciência da presença paradoxal do ‘sentido na própria falta de sentido’. Assim é ‘justificado’ aquele que duvida. A única atitude fundamentalmente irreligiosa é, então, a do cinismo absoluto com sua completa falta de seriedade”. James Luther Adams, idem, op., cit., pp. 302-3.

vendredi 17 août 2012

IDC 106.2 FM, Herzliya, Israel


IDC Radio is a college radio station operated from IDC Herzliya, Israel.
IDC Radio offers varied quality talk and music programs.

Imagem e dignidade


Shelach Lechá
Rabino Ruben Sternschein
17 de agosto de 2012
29 de av de 5772
BY CONGREGAÇÃO ISRAELITA PAULISTA

Nem sempre a vaidade é superficial. Nem sempre o marketing é uma mentira ou uma inflação de uma pequena verdade em prol de um interesse mesquinho e egoísta. Nem sempre promover uma imagem é apenas egolatria e poder.

Na parashá da semana, Deus resolve acabar com uma grande quantidade dos hebreus libertados pois eles temem a liberdade e preferem voltar à escravidão egípcia. “Compram” com facilidade o conto de dez dos doze espiões que foram mandados a analisar a Terra de Israel e seus habitantes, segundo o qual a terra consome seus habitantes e quem resiste são gigantes que jamais permitirão que ninguém se introduza nela.

Nesse momento Moshé intervém em favor dos hebreus e convence Deus com um argumento típico de um assessor de imagem: “O que vão dizer os egípcios sobre um Deus que tirou seu povo para matá-lo no deserto por falta de capacidade para levá-lo com vida até o destino final?

Alguns mestres medievais como Rabi Itschak Arama e Rabi Abarbanel reclamaram absortos, dizendo: como é possível que Moshé pense que Deus se importaria com Sua imagem e, acima de tudo, justamente diante de pagãos como os egípcios!

Nachmânides sugere uma solução magistral: não era a Sua imagem em si, pela sua vaidade, pelo seu “ego”, o que preocuparia Deus e Moshé, mas sim o que implicaria para a humanidade e para o mundo um Deus que destrói tudo, uma dinâmica mundo-Deus determinada e caracterizada pela raiva e pelo mútuo afastamento. Ou seja, o cuidado da imagem por motivos altruístas, pelo bem de quem observa a imagem, interpreta-a, incorpora-a e reage a ela.

Nossa imagem tem a ver com o que representamos e não apenas com quem somos. Se um judeu identificado como tal age corretamente em público, cedendo um assento a uma grávida no metrô, ajudando um idoso a atravessar a rua, contribuindo com a campanha do agasalho, fazendo negócios limpos, logo os judeus como coletivo são identificados com esses valores.

Se um judeu liberal, um cipiano, participa de sua comunidade com entusiasmo, aprende, pensa, ensina, se comove e vive uma vida mais significativa, logo o judaísmo liberal e a CIP serão identificados como algo de valor e significado.

Da maneira como falemos com nossos filhos, pais e cônjuges, quem nos vir e ouvir aprenderá como ser adulto.

O israelense Shmuel Yosef Agnon, Prêmio Nobel de Literatura em 1966, escreveu que quando alguém falece dizemos o Cadish porque nos preocupamos com a imagem que fica da vida diante do afastamento desse ser querido. O Cadish tenta continuar sustentando Deus e o mundo e sua dignidade na hora de perda de quem representava tudo isso.

Que possamos nesta semana compreender tudo o que representamos e manter a maior dignidade possível de nossas múltiplas imagens. Em prol dos que delas aprendem a viver e ser.

Shabat shalom,
Rabino Ruben Sternschein



Números 14.13-19
13 E disse Moisés ao SENHOR: Assim os egípcios o ouvirão; porquanto com a tua força fizeste subir este povo do meio deles. 14 E dirão aos moradores desta terra, os quais ouviram que tu, ó SENHOR, estás no meio deste povo, que face a face, ó SENHOR, lhes apareces, que tua nuvem está sobre ele e que vais adiante dele numa coluna de nuvem de dia, e numa coluna de fogo de noite. 15 E se matares este povo como a um só homem, então as nações, que antes ouviram a tua fama, falarão, dizendo: 16 Porquanto o SENHOR não podia pôr este povo na terra que lhe tinha jurado; por isso os matou no deserto. 17 Agora, pois, rogo-te que a força do meu Senhor se engrandeça; como tens falado, dizendo: 18 O SENHOR é longânimo, e grande em misericórdia, que perdoa a iniqüidade e a transgressão, que o culpado não tem por inocente, e visita a iniqüidade dos pais sobre os filhos até à terceira e quarta geração. 19 Perdoa, pois, a iniqüidade deste povo, segundo a grandeza da tua misericórdia; e como também perdoaste a este povo desde a terra do Egito até aqui.