Notas políticas de
Antenor da Conceição
Quem sabe... Talvez essas notas
sirvam para os camaradas, futuramente. Ou mesmo para mim, quando a memória
fraquejar. Quem sabe... Maquiavel escreveu para o príncipe, eu escrevo para os
camaradas.
Em primeiro lugar, proponho que
se faça a discussão sobre a relação entre a construção do partido
revolucionário e o Partido dos Trabalhadores. E proponho um critério
metodológico.
As duas bases fundamentais de
qualquer pensamento lógico dialético são dadas pela relação correta ou não que
se faça entre estrutura e gênese. Ao contrário do estruturalismo, que se
fortaleceu violentamente após o Maio de 1968, dizemos que a essência de um
objeto ou de um fenômeno está na estrutura, mas predomina na gênese, que não dá
somente o que é, mas também o que vai ser. Definir a essência de um fenômeno
apenas pela estrutura é um erro esquerdista, e definir a essência pela dinâmica
é cair no oportunismo ou no direitismo. Mas é da correlação desses dois
conceitos lógicos que podemos tirar conclusões corretas.
De uma forma geral, mas
cuidadosa, já que qualquer generalização seria um erro, dizemos que a dinâmica
nos dá a estratégia e a estrutura nos dá as táticas, tanto as gerais, como as
imediatas, para chegarmos à estratégia.
Explicamos isso, que parece
complicado, com aquela piada do “tijolo e do Mandel”. Quando Mandel diz “lá vem
o tijolo” a sua preocupação se prende à estrutura, ao tijolo, e não dá resposta
ao movimento. Ou seja, não responde ao “lá vem”. E exatamente por não responder
à dinâmica sofre uma fratura exposta.
Ora, nós partimos da estrutura,
mas para chegar à dinâmica. Nós partimos do que temos, da estrutura, que é uma
Convergência Socialista frágil, com divergências internas, mas que existe tanto
ao nível da sociedade, como da luta de classes. Mas, ao falarmos da sociedade
em que vivemos, da luta de classes, já estamos falando da dinâmica. Ou seja,
estamos falando do “lá vem”. Lá vem a abertura política, lá vem a democracia
burguesa, lá vem a reorganização partidária, lá vem burgueses, pelegos,
estalinistas querendo acaudilhar o movimento de massas, operário e sindical. E?
Se não entendemos o “lá vem” não
temos respostas para o “como baixar a cabeça para que esse tijolo chamado
democracia não esmague nossos miolos”. Se entendermos o “lá vem” vamos nos
preocupar com a estratégia, ou seja, com o porquê construir um partido
bolchevique. Mas essa estratégia não terá base real se esquecermos a dinâmica,
a vida real e diária da luta de classes, incluídos aí os dois fenômenos mais importantes
desses dois últimos anos, o movimento sindical independente e sua expressão
político-partidária, o Partido dos Trabalhadores.
Para chegarmos à meta estratégica
é necessário voltar ao ponto de partida. É necessário voltar ao partido frouxo,
com uma direção frágil e sem política e é exatamente a partir dessa estrutura,
que é o que temos, que veremos como e quais as táticas que implementaremos para
chegar àquela estratégia determinada pela dinâmica.
O trotskismo ao nível da lógica
concreta fez um aporte teórico importante, que é o conceito de programa de
transição. Ou seja, entre dois extremos, o real imediato e o real possível, o
determinante serão aquelas táticas que tomando elementos da realidade, às vezes
aparentemente secundários, se transformam em imprescindíveis. Ou seja, entre o
real imediato e o real possível é necessário construir uma ponte, que é um
programa, que é uma teoria, e que se tornará um real imediato superior através
da própria práxis. Parece difícil, mas não é.
Vejamos. Hoje temos um partido
frágil, dividido. Assim como está, este partido serve para pouco e nenhuma
época. Também não serve para voltar ao passado: ser um partido que
anteriormente respondia a outra dinâmica, quando se vivia uma época sem
democracia, de clandestinidade e o nosso trabalho era fazer propaganda
política.
Mas o real imediato é esse
desgraçado partido frágil e dividido. O real possível é o partido bolchevique
de massas, que precisamos construir se, de fato, quisermos dar uma resposta ao
movimento ascendente das massas, às reivindicações e insatisfações operárias e
populares e, mais do que isso, se quisermos criar as condições para um dia nos
colocarmos como alternativa de poder. Para isso precisamos de uma teoria, de um
programa que defina as táticas gerais necessárias para chegarmos ao partido
revolucionário. Eis a questão, qual será a ponte, ou quais serão as medidas que
tomaremos? Mas antes de falar nas medidas, temos que estar de olho no futuro,
com o pé no presente.
E agora vamos falar de táticas gerais,
ou seja, da ponte, ou de como baixar a cabeça diante do tijolo que vem.
O surgimento do movimento
sindical independente a nível nacional, assim como sua expressão
superestrutural e político-partidária, o Partido dos Trabalhadores, é um
fenômeno que deve nortear nossa tática geral, já que é o fenômeno mais
importante que a realidade nos deu nos dois últimos anos. O movimento sindical
independente e o Partido dos Trabalhadores é o caminho em direção às massas
mobilizadas, e à possibilidade de construir direções dentro do movimento,
reconhecidas pelo próprio movimento. Não é a reprodução do que fizemos em 1978
com a Convergência Socialista, porque agora estamos trabalhando com algo maior,
que tem sua própria dinâmica. Poderemos quando muito ser co-autores do crime.
O movimento independente dos
trabalhadores é a tática mais geral. O Partido dos Trabalhadores é uma tática
dentro dessa tática geral. Dependendo da situação do movimento de massas, da
reorganização partidária e da força e posicionamento de outros setores da
esquerda, o Partido dos Trabalhadores poderá transformar-se em síntese desse
fenômeno que é o movimento independente dos trabalhadores.
Mas é necessário entender uma
coisa: os sindicalistas e trabalhadores estão dando um salto na história do
Brasil, logicamente cheio de contradições. O que para nós, ao nível da teoria
pode ser simples, para eles é uma construção que custou anos de experiências.
Nesse sentido, nossa tática imediata em relação ao movimento dos trabalhadores
e ao Partido dos Trabalhadores é somar forças. Devemos levar em conta que os
trabalhadores estão chegando ao PT a partir do trabalho sindical. Dessa
maneira, é uma arte saber combinar as coisas. Saber ser paciente em relação ao
trabalho específico, sem fazer uma confusão por causa de erros táticos em
relação à política sindical. O fundamental é o trabalho sobre e junto com o
movimento e nosso fortalecimento nele e no Partido dos Trabalhadores.
Exatamente por isso, às vezes, teremos que ser pacientes em relação ao
específico, para poder conversar sobre o que é fundamental. Mas,
dialeticamente, quanto melhor sindicalistas nós formos, mais confiança teremos
entre os companheiros.
Mas é necessário, também, levar
em conta as características particulares, subjetivas, psicológicas, desse líder
sindical com quem estamos trabalhando. Se ele é personalista, o que é muito
comum em agitadores e dirigentes do movimento de massas, devemos evitar parecer
que estamos competindo com ele. Devemos sempre evitar as discussões mais duras
e violentas em público.
Um texto antigo de Antenor da
Conceição – agosto de 1980.