Numa leitura escatológica milenarista, Harriet Stowe considerava que a escravidão não era apenas um pecado do Sul, mas que a culpa era nacional e, por isso, o juízo seria nacional.
No livro, A cabana do pai Tomás, atacava a consciência nacional escravista na esperança de que uma purificação da alma dos Estados Unidos livrasse o corpo político da vingança divina.
É interessante que o argumento de Wilberforce na Inglaterra, exposto em suas campanhas, sobre a inviolabilidade do conceito de que todos os homens são iguais, foi usado por Abraham Lincoln no ato de 1863, que aboliu a escravidão nos Estados Unidos.
Lincoln, cujo mandato se desenrolou em meio à Guerra de Secessão, compartilhava a visão de Wilberforce de que era uma imoralidade possuir outro ser humano e citava o inglês em seus discursos. Com a guerra, veio a vitória do norte e a abolição da escravatura. Finda a escravidão, a discussão sobre a industrialização, os danos humanos, misérias e exclusão que produziam entraram na ordem do dia. Surgiram assim os “protestantes públicos” que, ao contrário dos “privatistas”, falavam de cristianismo social, evangelho social, serviço social.
Expoentes desse pensamento foram Washington Gladden, pastor congregacional de Ohio, o escritor Charles Sheldon, que produziu uma obra até hoje famosa, Em Seus Passos Que Faria Jesus? e o pastor batista Walter Rauschenbusch.
Rauschenbusch
(1861-1918) era de origem alemã. Levantou a questão do evangelho social, a
partir de uma leitura que combinava a responsabilidade social como o socialismo
utópico. Defendeu uma democracia econômica e política e propôs uma atuação
através dos sindicatos.
“Nossa economia
política tem sido por muito tempo o oráculo de um deus falso. Ensinaram-nos a
ver as questões econômicas do ponto da vista dos bens e não do homem. Disseram-nos
como a riqueza é produzida e dividida e consumida pelo homem, e não como a vida
e o desenvolvimento do homem podem melhorar e serem promovidos pela riqueza
material. É significativo que a discussão do consumo da riqueza esteja
negligenciada na economia política, contudo a questão humana é a mais
importante de todas. A teologia deve ser cristocêntrica, mas a economia
política deve tornar-se antropocêntrica. O homem é cristianizado quando põe
Deus acima de si próprio, a economia política será cristianizada quando colocar
o homem acima da riqueza. É isso que uma economia política socialista faz”,
afirmou em Christianity and
the social crisis.
No mesmo livro,
dizia que “nada dará a classe trabalhadora uma compreensão real de seu status
de classe e de seu objetivo final do que a luta permanente para conquistar suas
reivindicações mínimas e para eliminar as pressões reacionárias contra seus
sindicatos. Nós partimos do princípio de que uma organização fraternal da
sociedade não terá força se for apoiada apenas por idealistas. Ela (a
organização fraternal da sociedade) necessita da sustentação firme da classe
trabalhadora, cujo futuro econômico depende do sucesso desse ideal. A classe
trabalhadora industrial é, consciente ou inconscientemente, a força para a
realização desse princípio. Assim, aqueles que desejam a vitória, desde um
ponto de vista religioso, terão que fazer uma aliança com a classe
trabalhadora. Mas o princípio protestante da liberdade religiosa e o princípio
democrático da liberdade política levam à vitória através da aliança da classe
média, que também deseja a conquista do poder, com a classe trabalhadora; dessa
maneira, o novo princípio cristão, que busca uma organização fraternal da
sociedade, deve aliar-se para a conquista que ambos querem”.
Acho que estou
em boa companhia, principalmente quando me lembro de Martin Luther King Jr.,
pastor e um dos maiores ativistas da causa social em todos os tempos.
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